EUA debatem legalidade de armas impressas em 3D; veja como funcionam
Kits com peças para a montagem de fuzis e pistolas podem ser comprados por 1.000 dólares na internet; impressão total em casa exige conhecimento
Há dez anos, fabricar armas de fogo usando impressoras 3D
poderia parecer enredo de ficção científica. Mas, em 2018, a prática se
tornou realidade. No início da semana, um juiz federal dos Estados Unidos
proibiu temporariamente a publicação de manuais para imprimir fuzis
AR-15 e uma arma de plástico chamada de Liberator, que utiliza essa nova
técnica.
A decisão pode dar início a uma batalha
judicial entre organização pró-armas, como a Associação Nacional do
Rifle (NRA, na sigla inglesa), e autoridades contrárias à distribuição
desses arquivos. A Defense Distributed, organização sem fins
lucrativos sediada no Estado do Texas, havia obtido permissão do governo
americano para desenvolver e divulgar arquivos digitais que poderiam
simplesmente ser baixados por qualquer pessoa para imprimir armas em
casa. A permissão fora concedida com base no princípio da liberdade de
expressão e de publicação, garantida pela primeira emenda da
Constituição dos Estados Unidos.
Algumas autoridades, incluindo os governos
dos estados de Washington e da Califórnia, se mobilizaram para frear a
iniciativa. Elas argumentam que as armas de plástico não são rastreáveis
e representam um perigo para a segurança das comunidades americanas.
Até o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, um aliado da NRA,
publicou em seu Twitter que a proposta “não parece fazer muito sentido”.
O fundador da Defense Distributed, Cory
Wilson, indicou que vai recorrer da decisão do juiz federal Robert
Lasnik, da cidade de Seattle, que impediu a publicação dos arquivos ao
menos até o próximo dia 10. Wilson argumenta que tem direito
constitucional de distribuir os materiais.
A arma de plástico chamada de Liberator, aquela proibida por decisão da Justiça Federal americana, pode ser fabricada integralmente em casa, com impressora 3D, em menos de 24 horas e ao custo de 150 reais. A única peça a ser adicionada ao modelo de plástico impresso é um prego comum. Mas não se trata de um produto durável. Ao ser disparada uma única vez, a arma derrete.
Há outras opções no mercado online para a compra das peças e a montagem em casa, como um brinquedo, de armas bem mais potentes, como um fuzil AR-15 e uma pistola automática Glock . Os portais do eBay e da Amazon oferecem, ao custo total de cerca de 1.000 dólares, esses kits de ghost gun.
Essas armas fantasmas tendem a se tornar objetos do desejo de pessoas mal-intencionadas e de organizações criminosas, além de enormes desafios para os setores de segurança pública e privada. Ao contrário das pistolas e rifles que podem ser comprados em lojas, feiras de armas e até em supermercados americanos, as impressas não têm número de série. Não são, portanto, rastreáveis pela polícia.
O que é a impressão 3D?
A impressão 3D é uma tecnologia relativamente moderna que permite a fabricação de objetos a partir de fios de polímero (geralmente, o ABS, plástico comum em forma de filamento), de alumínio, de nylon, de alguns metais e de filamentos especiais biodegradáveis ou misturados a fibras de carbono. A partir dos dados tridimensionais, gerados em softwares específicos, a impressora deposita o material em camadas, seguindo padrões milimétricos e muito específicos.
A possibilidade de impressão de objetos permite uma série de aplicações específicas que, em tese, barateiam o custo da prototipagem de peças –– de celulares a partes de veículos. A maior vantagem, no entanto, é a possibilidade de criação de peças sob medida e bastante específicas, que vão de próteses individualizadas no campo da saúde a partes detalhadas de estruturas de aviões.
Há duas tecnologias principais em uso atualmente. A impressão FDM (sigla em inglês para modelamento em deposição fundida) é a mais comum e barata. Trata-se da tecnologia utilizada para a fabricação de armas em impressão 3D, que está em julgamento nos Estados Unidos. Uma impressora 3D FDM custa entre 250 e 100.000 dólares americanos.
Outra tecnologia bastante difundida é a SLA/DLP, conhecida em português como estereolitografia, com impressoras que custam entre 2.000 e 200.000 dólares americanos.
Por fim, há uma terceira tecnologia bastante comum conhecida como impressão manufatura ou Fresa-CNC. Esse tipo de impressora cria objetos tridimensionais de maneira oposta às anteriores — a partir de um bloco maciço de polímero, madeira, metal ou pedra preciosa, o equipamento retira material, esculpindo o objeto em 3D. A tecnologia ainda é a mais cara e tem aplicação industrial também — custa entre dois mil e 500.000 dólares americanos adquirir uma Fresa-CNC.