Surgiram diversas versões sobre o alcance do dispositivo previsto no artigo 142 da Constituição Federal, que
trata do acionamento das Forças Armadas, constituídas pela Marinha, Exército, e Aeronáutica,
para reprimirem eventuais “ameaças” à
Pátria, ou garantirem a integridade dos
Três Poderes Constitucionais, por um
lado e ,secundariamente, para reprimirem agressões à “lei” e à “ordem”.
Todo o mundo mete o “bedelho” nessa matéria, mas poucos têm a capacitação
necessária para “destrinchar” essa
verdadeira “confusão” política e
jurídica, especialmente à luz da hermenêutica jurídica, ciência que interpreta
as normas jurídicas.
Essa dificuldade
é perfeitamente compreensível. É preciso fazer uma verdadeira “mágica”, uma
“ginástica”, para interpretar esse “quebra-cabeça” que os confusos constituintes de 88 escreveram na “carta”. Parece
que o objetivo principal da “confusão” foi o de causar “confusão”, e por
isso jamais ser usado. E sem dúvida foram bem sucedidos, no que fizeram. Ninguém consegue entender o real sentido
que quiseram emprestar ao citado conteúdo “constitucional”. É preciso fazer grande
esforço para “desvendá-lo”. Esse artigo da constituição, portanto, foi uma
verdadeira “pegadinha” que fizeram com o povo brasileiro.
Mas para discussão, debate, e deslinde dessa “juris
quaestio”, a reprodução do citado dispositivo constitucional se torna
imperativa. Ei-lo:
“CF, artigo 142: As Forças Armadas, constituídas pela
Marinha, pelo Exército ,e pela Aeronáutica, são instituições nacionais
permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob
a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria,
à garantia dos Poderes Constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e
da ordem.” Nos termos do “caput” do artigo 142, da CF, portanto, são
duas as diferentes situações em que as Forças Armadas deverão, ou poderão
“intervir”. Na primeira, as Forças Armadas agirão ” para “defesa da Pátria”, ou
dos “Poderes Constitucionais”.
Mas apesar de constar que as Forças Armadas subordinam-se à “autoridade suprema do
Presidente da República”, em nenhum momento
esse artigo define em que condições,
e qual será autoridade competente
para convocá-las, fazer esse
“chamamento” constitucional , nas hipóteses de
“defesa da Pátria”, ou “garantia dos Poderes Constitucionais”.
É evidente, portanto,que esse poder constitucional, pertence
exclusivamente às próprias Forças Armadas , ao Poder Militar em si mesmo,
de forma autônoma e independente, que
poderão atender, ou negar, eventual
convocação nesse sentido ,do seu
“Chefe Supremo”, o Presidente da República. Mas como a competência para esse eventual enfrentamento pertence exclusivamente às Forças Armadas, ao
Poder Militar, que para isso possuem não só a “autonomia” necessária, como
mais que isso, a SOBERANIA, é evidente
que a dita “intervenção” poderá ser decretada diretamente pelas próprias Forças Armadas, independentemente do
chamamento, ou convocação, de quem quer que seja, inclusive do Comandante
Supremo das Forças Armadas, que é seu
“comandante ”, mas não o seu “ditador”.
A segunda hipótese de “intervenção” das Forças Armadas não
tem qualquer mistério. Para enfrentamento de
ameaças ao “ império da lei”, e à
“manutenção da ordem”,qualquer um dos
chefes dos Três Poderes Constitucionais (do Poder Executivo,do Legislativo,ou
do Judiciário) terá competência para fazer essa convocação.
Mas nenhum deles,
repita-se, nem mesmo o próprio
Presidente da República, Comandante Supremo das Forças Armadas, tem poderes
suficientes para convocar “sozinho” as Forças Armadas ,frente as “ameaças à pátria”, e para “garantia dos
poderes constitucionais.
Mas em 1999, onze
anos após a Constituição de 88 ,foi aprovada a Lei Complementar ,“prometida”
pelo parágrafo 1º do citado artigo 142 da CF, ou seja, a LC Nº 97/99, com o
objetivo de esmiuçar o citado artigo constitucional. Mas essa “Emenda” foi
“pior que o soneto”. Aumentaram a confusão reinante, que já não era pouca. Além
disso, ela contrariou a Constituição. É,
portanto, absolutamente INCONSTITUCIONAL, apesar de nunca ter sido assim
declarada pelo STF, nem provocada pelas
poucas entidades legitimadas a fazê-lo.
As contrariedades dessa LC à Constituição, que “emenda”, começam
no artigo 15: ”O emprego das Forças Armadas, na defesa da Pátria, e na garantia
dos Poderes Constitucionais, da lei da
ordem...é de responsabilidade do Presidente da República...”. A redação desse
artigo transforma o Presidente da República num
DITADOR das Forças Armadas, ao invés de seu ”Comandante
Supremo”,dispondo diferentemente da Constituição.
O artigo (142) da Constituição , “complementado” (pelo
art.15 da LC 97/99), não autoriza o Presidente da República, apesar de ser o
Comandante Supremo das Forças Armadas, a acioná-las para defesa da Pátria, ou dos Poderes Constitucionais, competência essa
exclusiva do próprio Poder Militar, seja
atendendo eventual chamamento do seu Comandante em Chefe, seja decidindo por
iniciativa própria, autônoma, soberana.
Mas esse citado artigo 15 da LC 97/99
também contraria a Constituição ,no momento em que “mutila” os poderes
dos Chefes dos Poderes Legislativo e
Judiciário, para decidirem sobre o emprego das Forças Armadas na manutenção da
“Ordem” e da “Lei”, conforme mandamento
do artigo 142 da Constituição. Mas é isso exatamente o que faz o parágrafo 1º do art. 15 da LC
97/99,estabelecendo “competir (somente)
ao Presidente da República o emprego das FA, por iniciativa própria, ou em ‘atendimento
a PEDIDO manifestado por quaisquer dos Poderes Constitucionais ,por intermédio
dos Presidentes do STF, do Senado, ou da Câmara dos Deputados. “
Mas aí reside nova “infração constitucional”. Na eterna disputa de prestígio e influência no Poder Legislativo,entre a Câmara e o Senado, nunca
ficou claro qual dessas casas
legislativas teria na sua respectiva presidência, a
“representação legal” do Poder
Legislativo, se o Presidente da Câmara, ou
do Senado. Mas parece que essa resposta estaria
na “ordem” da substituição do
Presidente da República ,nos seus afastamentos temporários do cargo, onde o
Presidente da Câmara dos Deputados, precede o Presidente do Senado, nessa
substituição.
[A questão sempre suscitada quando se interpreta ser a decisão de emprego das Forças Armadas de responsabilidade e competência do Presidente da República, é suportada pela redação confusa do artigo 142, da CF;
Como bem lembra o articulista, os constituintes de 88, adotaram uma redação 'esclarecedora' que confunde - coisas de excesso de democracia.
A redação confusa permite que a LC 97, de 1999, seja válida, ou não, para complementar = esclarecer - quem manda nas FF AA. Tal interpretação, por óbvio, dependerá do interprete e da conjunto do momento.
Uma, a tal legalista - especialmente quando nada se quer decidir - é a de que uma LC não pode modificar, inovar, a Carta Magna, gerando tal decisão a carência de outra decisão do STF sobre quem autoriza o emprego das FF AA - no popular: se o presidente do STF, do Poder Legislativo ou da República, pode, isoladamente, determinar ao Comandante de uma das Forças singulares = que autorize a Força que comanda realizar determinada ação.
(cabe aqui um parêntese: se a ordem partir do Presidente do STF ou do Presidente do Poder Legislativo, a Constituição estará sendo contrariada, já que estabelece que as Forças Armadas estão sob o comando Supremo do Presidente da República - não pode existir mais que um Comandante Supremo = Supremo sustenta a interpretação de ser único.)
- outra, que vou chamar de Ayres Britto - memória: ele, no governo Dilma, em decisão monocrática autorizou que o decreto da engarrafadora de vento Dilma, que regulamentava a Lei de Acesso à Informação, inserisse um parágrafo no artigo 6º, aumentando o alcance daquela lei.
Como se tratava de norma que alcançava servidores públicos, foi aceita.
No caso, decide que uma LC pode optar por esclarecimento que modifica virtualmente uma lei e fica tudo sob a iniciativa única do presidente da República = se o Presidente do STF quer determinada ação das FF AA solicita ao Presidente da República, valendo o mesmo para o Chefe do Legislativo - cabendo ao Poder Executivo aceitar ou negar.
Afinal, foi a falta do advérbio APENAS que criou a interpretação virtual pelo Supremo do artigo 226, § 3º da CF, que permitiu o casamento gay.
- Concluindo, temos também uma terceira posição que parece merecer a simpatia do ilustre Sérgio, e que se enquadra mais em uma situação nos moldes do Preâmbulo do Institucional nº 1.
Clique aqui para ler aquele preâmbulo.]
Clique aqui para ler aquele preâmbulo.]
Enquanto a Constituição preceitua que os “Três Poderes
Constitucionais” (Executivo,Legislativo , e Judiciário) , poderão acionar o
artigo 142 da CF, para garantia da “lei e da “ordem”, a LC 97/99,com referência exclusivamente ao Poder legislativo,”bifurca” esse poder
,atribuindo-o “aos Presidentes”,tanto do Senado, quanto da Câmara . Com essa redação, a LC 97/99, não
“dispôs”, simplesmente, sobre o artigo 142 da Constituição, mas o INOVOU, ALTEROU,
atribuição jamais conferida a uma Lei Complementar.
Sérgio Alves de Oliveira - Advogado e Sociólogo