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domingo, 27 de outubro de 2019

Câmara e OAB estudam mudar Lei de Improbidade Administrativa - O Globo

Bernardo Mello

[pergunta que não quer calar: OAB já legisla?

curioso é que a mudança que pretendem, alivia o administrador corrupto,  por facilitar que desonestidade seja considerada apenas incompetência.

Para variar, a OAB pretende que o Supremo legisle, modificando as partes que facilitarão a impunidade.]

Ministro do STJ afirma que mudanças têm o objetivo de separar o administrador de má fé do incompetente

A Câmara dos Deputados e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) discutem, em frentes distintas, alterações na Lei de Improbidade Administrativa que limitariam as punições em casos em que houve danos aos cofres públicos. O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Mauro Campbell Marques defende que a alteração debatida atualmente no Congresso não “afrouxa” o combate à corrupção, mas “separa o joio do trigo”. 
 
Para o ministro do STJ, o entendimento da nova proposta é que “não existe corrupção culposa”. A OAB prepara uma ação com teor semelhante para levar ao Supremo Tribunal Federal (STF). A peça, que ainda será discutida em comissão especial da própria OAB antes de ser submetida ao Conselho Pleno, em novembro, deve argumentar que a improbidade não pode ser caracterizada quando há apenas equívoco de administradores públicos. 

Marques coordenou um grupo de juristas que elaborou o projeto para alterar mais de 30 pontos da lei. O projeto, apresentado na Câmara pelo deputado Roberto de Lucena (Podemos-SP), tramita em uma comissão especial presidida por Tadeu Alencar (PSB-PE). — O projeto separa o administrador de má fé, que age com dolo de prejudicar a administração em seu benefício, do administrador ignorante e incompetente. Ninguém é corrupto por incompetência, por imprudência ou por negligência — afirmou o ministro do STJ.
Entre as alterações estão a redução de tempo mínimo de suspensão de direitos políticos, a possibilidade de acordo conduzido pelo Ministério Público e a definição da improbidade apenas como ação dolosa. 

Projeto enfrenta críticas de juristas
O projeto da Câmara dos Deputados que altera a Lei de Improbidade Administrativa tem como objetivo evitar punições a servidores e políticos quando não se comprova a intenção de enriquecer ou de lesar o patrimônio público. Essa possibilidade já foi alvo de críticas de juristas.

O promotor Adriano Brito de Assis, representante da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), discordou da necessidade de que se configure intenção para aplicar a lei de improbidade em caso de dano ao patrimônio público. Em audiência pública organizada pela comissão especial na Câmara, o promotor ressaltou que o projeto já aumenta a proteção de investigados ao permitir acordos com o Ministério Público (MP) em diferentes fases do processo.—Pode-se fazer ajustes em relação às sanções, mas a improbidade culposa por erro grosseiro deveria ser preservada. Trata-se de algo recorrente no regime disciplinar de agentes públicos, especialmente aqueles com altas responsabilidades — afirmou.

Levantamento feito pelo Instituto Não Aceito a Corrupção apontou 11.607 condenações por improbidade administrativa entre 1995 e 2016. No período de 19 anos, o ressarcimento aos cofres públicos ocorreu em 7 a cada 10 vezes quando houve comprovação de dano ao erário ou enriquecimento ilícito. Nos casos em que houve apenas uma ação que atentasse, de modo geral, contra a moralidade da administração pública, a taxa de ressarcimento caiu para 3 a cada 10 condenações.
Advogados ouvidos pelo GLOBO defendem uma atualização da lei de improbidade, sancionada em 1992 pelo então presidente Fernando Collor de Mello, mas também veem componentes políticos no projeto.

Rodrigo Matheus, membro do conselho do Instituto de Advogados de São Paulo (IASP), afirma que a redução do tempo mínimo de perda dos direitos políticos trazida pelo projeto — de oito para quatro anos em alguns casos só teria justificativa técnica se as punições atuais fossem “exageradas”. O advogado, no entanto, concorda com a restrição a condutas culposas. — Não se pode conceber que um mero erro seja caracterizado com ato de improbidade — avaliou.

O advogado eleitoral e procurador do Estado de Pernambuco Walber Agra afirmou que a legislação atual tem descrições “muito abstratas e genéricas”. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) já havia criticado, ao instalar a comissão especial para avaliar o projeto, o que classificou como “generalizações mal feitas” criadas pela lei atual.
É preciso reduzir a arbitrariedade — afirmou Agra.
A condenação por improbidade é um dos elementos que pode impedir a disputa de cargo eletivo, segundo a Lei da Ficha Limpa. Para aplicar a lei, o entendimento atual do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já exige que se configure intenção, e não apenas um erro.
Este projeto vai no sentido da Ficha Limpa, o que leva a uma certa homogeneização das interpretações da legislação — disse o advogado Cristiano Vilela.

Bernardo Mello - Publicado em O Globo


terça-feira, 24 de abril de 2018

Quem vai ganhar?

A conjuntura não é mais pautada pela crise econômica, mas pela ética na política, devido à Operação Lava-Jato, na qual caciques políticos, sobretudo dos grandes partidos, correm risco de ir para a cadeia

O lado bom das incertezas sobre as eleições de 2018 é a alternância de poder, um dos fundamentos de qualquer democracia digna desse nome. Muito da angústia e da insegurança que todos sentimos em relação ao futuro do país decorre de não sabermos quem vai ganhar as eleições, o que é natural, e do risco de que alguém com o qual não concordamos nem um pouco possa vir a ganhar a eleição, o que é compreensível, mas nem por isso deve alimentar pensamentos de viés antidemocrático. Além da alternância de poder, o outro pilar do regime democrático é o direito ao dissenso, ou seja, de ser oposição.

 Tantos os vencedores quanto os derrotados precisam se conformar com o resultado das urnas e respeitar as regras do jogo, pois a vitória não é um cheque em branco nem a derrota, o fim do mundo. A primeira garantia de que estamos em pleno processo democrático é o calendário eleitoral. Ninguém fala em adiar as eleições e seria um completo contrassenso fazê-lo a essa altura do campeonato, com um governo de transição que resulta de um processo de impeachment e goza de baixíssima popularidade. O presidente Michel Temer perdeu o protagonismo reformista que lhe permitiu enfrentar a recessão, reduzir a inflação abaixo da meta e baixar a taxa de juros Selic a níveis inéditos. 

Quaisquer reformas macroeconômicas ou institucionais, doravante, dependerão do resultado das eleições e do programa de governo que sair vitorioso das urnas. O máximo que pode ser feito agora é a adoção de algumas medidas microeconômicas que melhorem o ambiente de negócios.  A conjuntura não é mais pautada pela crise econômica, mas pela ética na política, devido à Operação Lava-Jato, na qual caciques políticos, sobretudo dos grandes partidos do país, estão diante do risco de ir parar na cadeia, como aconteceu com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e talvez aconteça, ainda nesta semana, como ex-governador mineiro Eduardo Azeredo (PSDB). Não por acaso uma ampla coalizão de forças trabalha para mitigar a legislação que promove o expurgo de políticos corruptos que estão sendo impedidos de disputar as eleições com base na Lei da Ficha Limpa e da jurisprudência que possibilita a execução imediata da pena de condenados em segunda instância, como é o caso dos dois citados.

Agora mesmo, o Congresso acaba de aprovar uma lei de improbidade administrativa eivada de inconstitucionalidades, pois limita a atuação dos órgãos de controle do Estado, entre os quais os Tribunais de Contas (que são ligados ao próprio Poder Legislativo e não ao Executivo ou Judiciário), o Ministério Público, a Polícia Federal e a Receita Federal. [os órgãos públicos, entre os quais os citados em destaque, precisam ter responsabilidade pelo resultado de suas ações quando incorretas.
Inaceitável que o Janot faça a bagunça que realizou ao acusar o presidente Temer, desorganizou toda a recuperação econômica e todo  o processo de tramitação das reformas, a denúncia foi rejeitada (não existe provas a sustentá-las, inclusive delações que foram usadas correm o risco de anulação) e Janot sai ileso, não sendo responsabilizado pelos prejuízos que causou ao Brasil.
Quanto as inconstitucionalidades que porventura existam na lei sob comento, o STF, em que pese suas 'escorregadas', continua sendo o guardião da Constituição, possuindo competência para expurgar do texto legal o que entender inconstitucional.]  De igual maneira, discute-se a limitação do foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal, o que pode ser uma boa iniciativa, desde que não haja mudança de jurisprudência quanto à condenação em segunda instância. Caso isso ocorra, a impunidade dos crimes de colarinho branco voltará a ser uma marca registrada do país.

Patrimonialismo
Esse debate sobre a impunidade é acompanhado com grande interesse pela opinião pública, o que dificulta retrocessos em relação à legislação contra corrupção. Até agora, por isso mesmo, todas as tentativas de acabar com a Lava-Jato fracassaram. Com a proximidade das eleições, essa situação ganhou tamanha importância que passou a ser a principal prioridade dos eleitores. É uma mudança de paradigma comparável ao que aconteceu com a inflação, depois do Plano Real. O problema é que a inflação crônica talvez tenha sido mais fácil de derrotar do que o velho patrimonialismo de nossas elites políticas e oligarquias, que substituiu a escravidão como fonte de acumulação de riqueza e privilégios, perpetuando as desigualdades em nosso país.


A propósito, nossas desigualdades regionais têm muitas causas, vão desde as limitações de natureza geográfica às condicionantes histórias da construção do Estado brasileiro. Talvez a principal seja exatamente o patrimonialismo. Com certeza, por isso mesmo, a aposta na industrialização diferenciou a elite paulista. Entretanto, muita água já rolou. O problema do desenvolvimento regional demanda uma política tributária que altere a relação entre estados produtores e estados consumidores na circulação das mercadorias. Essa é outra variável do processo eleitoral.

A terceira variável é a iniquidade social, que está associada ao patrimonialismo e às desigualdades regionais. Também tem a ver com a igualdade de direitos e de oportunidades, no lugar do paternalismo; e com políticas sociais estruturantes, que levem em conta, simultaneamente, a necessidade de investir fortemente na educação e no empreendedorismo; e a prioridade do gasto no combate à miséria e na proteção dos mais vulneráveis.

Blog do Luiz Carlos Azedo - CB