Criou-se
no Brasil de hoje algo que nunca existiu antes na história deste país,
desde 1500, e que talvez não tenha existido em país nenhum do mundo: o
governo que não acaba.
Já tivemos todo o tipo de governo por aqui,
inclusive alguns que não foram ruins.
Mas não havia acontecido, até
hoje, o fenômeno do governo que não acaba nunca. É o caso de Jair Bolsonaro.
Daqui a pouco vai fazer três meses que o homem saiu da Presidência e
foi morar nos Estados Unidos.
Não manda em absolutamente mais nada. Boa
parte do que fez em seu governo está sendo demolida. Diante da
monumental artilharia de acusações destinada a impedir que ele se
candidate algum dia a uma nova eleição, seu futuro político parece
variar entre o nulo e o não existente.
Só lhe parece sobrar, agora, uma
missa de réquiem – mas, na prática, não está sendo assim.
Ao contrário:
parece que Bolsonaro continua despachando todos os dias do
Palácio do Planalto.
Fala-se mais dele do que de qualquer outra coisa.
O assunto, agora,
é uma prodigiosa história sobre um estojo de joias que ele deveria ter recebido do governo da Arábia Saudita,
não recebeu porque a coisa ficou presa na alfândega, mas teve a
intenção de receber, conforme se acusa – o que, segundo os peritos que a
mídia ouviu a respeito do caso, deixa aberta uma avenida nova em folha
para acusações criminais contra o ex-presidente.
[lembrem-se que a CPI da Covid - merecidamente mais conhecida como 'circo parlamentár de inquérito' - tentou acusar o presidente Bolsonaro (retiramos o EX, afinal o governo declarado eleito insiste em que o presidente anterior continue despachando no Planalto, manter o EX é desnecessário) de prevaricação em uma compra que não ocorreu.]
Para um homem já
acusado pelos inimigos de genocídio, rachadinha, prevaricação, ligação
com milícias, rolos não concluídos na compra de vacinas, tentativa de
dar um golpe de Estado nas
desordens do dia 8 de janeiro em Brasília e
sabe lá Deus o que mais, parece não haver necessidade nenhuma de mais
pancada –
se Lula, o PT e a esquerda conseguissem mesmo o que estão
querendo, isso tudo seria suficiente para deixar Bolsonaro na cadeia
pelos próximos 1.500 anos. O motivo por que ele permanece no coração da
vida política e do noticiário é outro.
A intenção, aí, é esconder as
bananas de dinamite que o governo Lula, com as decisões que vem tomando
desde a posse, armou para explodir em cima da população.
Estão semeando
vento como nenhum governo semeou antes neste país; se continuarem assim,
vão colher uma tempestade perfeita.
É infantil achar que
Bolsonaro vai resolver esse problema, e os demais problemas de Lula,
aparecendo todo dia no Jornal Nacional. Quando o cidadão encher o tanque
do carro, daqui a X tempo, e ver o preço que pagou, não vai se lembrar
de joias nem achar que está diante de uma “suspensão da desoneração” dos
combustíveis — vai culpar o governo, direto, pela conta que recebeu.
Não adiantará nada, aí, querer que prendam o morto.
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S.Paulo