Ruy Castro
Os soldados estarão espirrando juntos nos quartéis?
Graças a Jair Bolsonaro, atualmente na Presidência da República, o Ministério da Saúde está sendo ocupado pelos militares. Significa que, por falta de gente do ramo, leia-se médicos, no comando, a Covid-19 continuará rompante no país. Mas faremos alguns progressos. Nos hospitais, por exemplo, os pacientes serão acordados a corneta. Haverá juramento matinal à bandeira, rufo de tambores à visita de um coronel e revista diária de tropas, digo, enfermeiros, pelo oficial de serviço.
[os tempos são outros, mas é sempre bom lembrar do então deputado Márcio Moreira Alves.
Textos com títulos igualando militar a papagaio, debochando de práticas corriqueiras na caserna, começam a surgir.
Os profissionais da Saúde estão, de forma merecida e espontânea, recebendo honras, respeito e reconhecimento.
Os militares podem até alguns não considerarem dignos de honrarias, reconhecimento - mas DEVEM ser respeitados, da mesma forma que outras categorias.]
O que nos leva a uma pergunta. Já que nossos generais não acreditam em
besteiras como confinamento, quarentena e distanciamento social, e não
se conformam com que os escritórios, fábricas, igrejas, lotéricas e até
manicures estejam parados, como anda a coisa entre eles? A julgar pela
nova orientação do ministério, os militares não devem estar impondo ao
seu pessoal os cuidados que muitos de nós, paisanos covardes, achamos
prudente seguir.
Assim, pode-se imaginar que, neste momento, os quartéis estão cheios de
rapazes marchando juntos, fazendo ginástica juntos, dando tiro juntos,
dormindo juntos e acordando juntos, e também tossindo, assoando-se e
espirrando juntos. Um soldado e um cabo, capazes de fechar sozinhos o
STF, levarão a mão à testa centenas de vezes por dia, de acordo com o
número de continências que terão de bater para o sargento. Não é um
risco?
Mais perguntas. Se se distribuir máscaras à tropa, serão de lona
verde-oliva para combinar com a farda?
Fuzis e granadas estão sendo
higienizados?
Cavalos são sujeitos à Covid?
E como vai o estoque de
cloroquina na caserna? Sabendo-se que o Chefe Supremo das Forças Armadas
é um camelô especializado na droga, ela deve estar sendo servida
compulsoriamente no rancho.
Bom sinal. Sinaliza que o governo talvez comece a cuidar de parte da
população. Pena não ser a minha parte. Não passo de um reles reservista
de terceira.
Ruy Castro, Colunista - Folha de S. Paulo
*Ruy Castro, jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.