Revista Oeste
Em nome do combate à desinformação, criou-se no Brasil uma espécie de Ministério da Verdade
Ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB-MA), e o presidente do Senado
Federal, Rodrigo Pacheco | Foto: Geraldo Magela/Agência Senado
Começou a nova legislatura. A presidente do Supremo Tribunal Federal fez um discurso firme em defesa da democracia, condenando os atos golpistas do dia 8 de janeiro, e lembrou que não existe democracia sem liberdade de imprensa. Enquanto isso, um colega seu tuitava apenas “democracia inabalada”, e recebia de parte do público as congratulações por sua implacável defesa da democracia. Já o presidente do Congresso Nacional descreveu sua gestão como basicamente impecável. Tudo muito lindo. Se ao menos fosse verdade…
Liberdade de imprensa? Será que isso inclui a perseguição contra o único veículo de comunicação com penetração nas rádios e na televisão, que culminou na demissão de vários comentaristas com viés mais à direita por insuportável pressão do sistema?
Temos jornalistas com redes sociais censuradas, com contas bancárias congeladas e até passaportes cancelados, tudo isso pelo “crime de opinião” criado pelo STF.
Isso faz parte de uma democracia saudável, por acaso?
Em nome do combate à desinformação, criou-se no Brasil uma espécie de Ministério da Verdade.
Em seu discurso como candidato à reeleição, Pacheco disse que as famílias brasileiras não podem ficar sujeitas a mentiras.
Ou seja, o presidente do Congresso resolveu o que é verdade ou mentira e defendeu a censura a quem discorda dele logo depois?
Pacheco comemorou sua vitória com figuras como Renan Calheiros, Randolfe Rodrigues, Omar Aziz e companhia. É esse o Brasil democrata, da pacificação, da lei, da honestidade e do bom senso?
Pacheco, aliás, foi reeleito como presidente do Senado. Houve denúncias de muitas torneiras abertas e prometidas pelo PT aos senadores indecisos, assim como ligações que ministros teriam feito a alguns senadores.
Se isso for verdade é um escândalo! Por lei, um juiz deve ser apartidário. Um ministro supremo não pode ter um candidato preferido, muito menos externar isso ou fazer campanha. Muito menos quando se sabe que é o STF que julga tais senadores por conta do foro privilegiado.
Cenoura e bastão: as formas mais eficazes de “persuadir” alguém são o incentivo de prêmios ou a ameaça de punição.
Foi isso que aconteceu na eleição para o comando do Senado?
Se sim, então não podemos mais falar em democracia. A esperança do brasileiro decente vai se esvaindo a cada dia.
O discurso do vitorioso Pacheco mencionou independência entre os Poderes, mas todos já perceberam que o Senado, sob seu controle, virou uma espécie de puxadinho supremo, subserviente aos mandos e desmandos monocráticos dos ministros.
Tanto o senador Rogério Marinho como o senador Eduardo Girão fizeram discursos muito sóbrios e firmes sobre a necessidade de restabelecer no país o Estado de Direito, mas pelo visto os interesses particulares dos senadores indecisos falaram mais alto.
Pacheco comemorou sua vitória com figuras como Renan Calheiros, Randolfe Rodrigues, Omar Aziz e companhia.
É esse o Brasil democrata, da pacificação, da lei, da honestidade e do bom senso?
Não dá para culpar quem vai jogando a toalha e desistindo do país. O mistério é como o Brasil ainda não afundou de vez com essa turma!
Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Na Câmara vimos a bancada de oposição assumir com gritos e placas de Fora Lula, mas a verdade é que a margem de manobra da oposição fica cada vez menor. O instrumento de freio e contrapeso falhou.
O fatídico 8 de janeiro deu o pretexto para que o sistema avance ainda mais contra as liberdades.
E o sistema é poderoso demais, como ficou claro.
Agora é se reagrupar para mitigar os estragos, para tentar salvar o que for possível de nossa democracia cambaleante. Mas não será tarefa trivial.
Afinal, os ícones desse sistema alegam que, graças a eles, a democracia está “inabalada”.
Com um pouco mais de esforço e empenho dessa turma, quem sabe o Brasil não chega a um patamar venezuelano de democracia?
Lá, não custa lembrar, Lula dizia que há excesso de democracia.
Adoraria ser mais otimista, mas minha consciência me obriga a fazer uma análise sincera para meu leitor.
E a realidade é que o prognóstico não é nada animador. Apertem os cintos!
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Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste