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segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Inquérito de Toffoli ainda faz ‘diligencias sigilosas’ - Blog do Josias


Prestes a completar aniversário de nove meses, o inquérito secreto aberto por Dias Toffoli em 14 de março continua realizando "diligências sigilosas". Sem previsão de término, a investigação invadirá o ano de 2020. O pretexto é apurar a origem de notícias falsas sobre o Supremo Tribunal Federal e de ameaças aos seus ministros. A CPI do Congresso sobre fake News solicitou ao Supremo o compartilhamento dos dados recolhidos na investigação. Relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes negou o pedido. Datada de 28 de novembro, a resposta de Moraes chegou à comissão nesta quinta-feira (5).


"O referido inquérito ainda aguarda a conclusão de diligências sigilosas", anotou Alexandre e Moraes no ofício enviado à CPI. A comissão parlamentar deve reiterar o pedido de compartilhamento das informações. Na semana passada, durante o julgamento que consolidou a legalidade do repasse de dados sigilosos dos órgãos de controle para o Ministério Público e as polícias, Dias Toffoli referiu-se à Receita Federal e ao antigo Coaf de forma desairosa. Classificou os órgãos de controle como fornecedores de material para "investigações de gaveta, que servem apenas para assassinar reputações".

Entretanto, Toffoli parece não se constranger em manter a sua própria investigação de gaveta. A iniciativa flerta com a ilegalidade. Em vez de requisitar a abertura de inquérito à Procuradoria-Geral da República, Toffoli preferiu agir "de ofício", por conta própria. Toffoli escorou-se no artigo 43 do regimento interno do Supremo. Prevê que o presidente da Corte pode instaurar inquérito se o crime tiver ocorrido "na sede ou dependência do tribunal". Como não foi isso o que ocorreu, Toffoli tornou-se protagonista de uma gambiarra jurídica. Transformou todo o território nacional numa versão hipertrofiada da sede do Supremo.

O ministro Marco Aurélio Mello levou os lábios ao trombone na época: "O que ocorre quando nos vem um contexto que sinaliza prática criminosa? Nós oficiamos o procurador-geral da República, nós oficiamos o estado-acusador. Somos estado-julgador e devemos manter a necessária equidistância quanto a alguma coisa que surja em termos de persecução criminal".


[Observação:  recomendamos o post linkado, mas, destacamos nosso entendimento que a conduta dos promotores do evento funk 17 devem ser investigados, indiciados e punidos - a responsabilidade na área cível e criminal de quem promove um evento, sem condições adequadas de segurança, não pode ser esquecida.]

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

O crime e a política

A atuação do Ministério Público deve se ater estritamente ao campo jurídico. Tudo o que passa daí cai no terreno da política, fora de sua competência. 

A Operação Lava Jato deve perseguir os crimes, não a política

Na semana passada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou ao Supremo Tribunal Federal a terceira denúncia, por organização criminosa, contra lideranças de um partido político. Antes haviam sido acusados políticos do PP e do PT. Agora, foi a vez de integrantes do PMDB. Os três casos parecem confirmar que a Procuradoria-Geral da República (PGR) faz uso distorcido do material recolhido pela Operação Lava Jato, dando por certo que os partidos são organizações criminosas. Ou, pior ainda, que a atividade política pressupõe a prática criminosa.

Uma coisa é a existência de criminosos em algumas legendas, outra coisa é que a legenda seja uma organização criminosa. Uma terceira, ainda, é que a política seja necessariamente espúria. Além de ser um tratamento abusivo das provas, já que se deduzem coisas que não estão nos autos, a confusão promovida pelo Ministério Público conduz à mais perigosa das conclusões, nunca dita, mas habitualmente insinuada: a equiparação entre atividade política e atividade criminosa.

Segundo a denúncia apresentada na sexta-feira passada, os senadores Renan Calheiros (AL), Romero Jucá (RR), Edison Lobão (MA), Valdir Raupp (RO) e Jader Barbalho (PA) e os ex-senadores José Sarney e Sérgio Machado “integraram núcleo político de organização criminosa estruturada para desviar em proveito próprio e alheio recursos públicos e obter vantagens indevidas”, tendo recebido R$ 864 milhões em propina por contratos na Petrobrás. O caso refere-se a um inquérito da Operação Lava Jato, aberto em março de 2015. A PGR sustenta que a atuação dos políticos do PMDB causou prejuízos de R$ 5,5 bilhões à Petrobrás e de R$ 113 milhões à sua subsidiária Transpetro.

Certamente, cabe à Justiça averiguar as provas contra esses políticos. Se não deve haver espaço para qualquer tipo de impunidade, muito especialmente a lei deve ser cumprida quando se refere à atuação de pessoas que ocupam ou ocuparam altos postos na vida pública. No caso, os denunciados são, ou já foram, membros do Senado Federal. Tais elementos não permitem, no entanto, afirmar que o PMDB e outros partidos políticos são organizações criminosas.

É importante entender o que dizem as investigações da Lava Jato. Elas revelaram que, nas administrações petistas, foi instalado um sistema criminoso no núcleo do poder público, com a cooptação de vários políticos de diferentes legendas. Isso não é o mesmo que dizer, como equivocadamente tenta induzir a PGR, que os partidos políticos eram organizações criminosas. Por mais que haja criminosos num partido, isso não transforma o partido numa organização criminosa.

Reconhecer essa realidade não representa qualquer desculpa para os políticos que desviaram recursos ou causaram prejuízos aos cofres do Estado, das estatais e das empresas de capital misto. Havendo provas de seus crimes, devem ser exemplarmente punidos. O que não se deve fazer é confundir os papéis de cada um dentro do esquema criminoso. Ao se apresentar determinado partido como um “quadrilhão”, apresentam-se seus integrantes como quadrilheiros, o que é evidentemente equivocado. O fato inegável é que, se se abrigam na legenda alguns criminosos, a maioria dos que nela militam é honesta.

Além de causar uma injustiça à honra de políticos honestos, essa deliberada confusão reforça o distanciamento e, em muitos casos, a rejeição da população em relação à política e suas instituições, como se fossem todas corruptas. Assim, a política fica parecendo uma prática ineficaz, esbanjadora e criminosa por definição. E, nesse caso, a democracia será tão vil quanto a política. A indistinção de papéis ainda beneficia o verdadeiro chefe do sistema criminoso, que se vê premiado com a possibilidade de ser encarado apenas como um criminoso a mais, sem uma adequada avaliação de sua responsabilidade, multiplicada pelo exercício de função pública.

A atuação do Ministério Público deve se ater estritamente ao campo jurídico. Tudo o que passa daí cai no terreno da política, fora de sua competência. A Lava Jato deve perseguir os crimes, não a política. E se criminosos se aproveitam da política para exercer seu ofício asqueroso, é justamente nessas horas que é mais necessário o estrito respeito às alçadas institucionais de cada agente da lei, na preservação simultânea da ordem e da democracia.


Fonte: Editorial - O Estadão