Heleno nega desmatamento e mostra radicalismo
Bolsonaro atacou o IBGE após a alta do índice de desemprego. Agora seus ministros criticam o Inpe, que aponta uma escalada no desmatamento da Amazônia
O desmonte dos órgãos de controle ambiental começou a produzir os
efeitos esperados. O desmatamento da Amazônia disparou na primeira
quinzena de maio. A cada hora, a floresta perdeu uma área verde
equivalente a 20 campos de futebol. Isso apenas nas unidades de
conservação, como parques e florestas nacionais. Os dados são do Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Há
três décadas, o órgão usa satélites para monitorar, em tempo real, a
devastação da floresta. O trabalho é respeitado pela comunidade
científica e orienta a Polícia Federal e o Ibama no combate a crimes
ambientais. Agora está sob ataque do governo de Jair Bolsonaro.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, já disse que os números do
desmatamento “não são precisos”. Em janeiro, ele anunciou o plano de
gastar R$ 100 milhões na contratação de um sistema privado de
monitoramento. O Inpe precisou lembrá-lo de que já faz isso desde 1988,
por um custo bem menor: R$ 2,8 milhões anuais. Na quarta-feira, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto
Heleno, avançou algumas casas na rota do negacionismo. Em entrevista à
GloboNews, ele endossou a tese de que a agenda do meio ambiente seria
controlada por um complô internacional.
O ministro também desmereceu o sistema que mede a destruição da
Amazônia: “Esses dados do desmatamento eu coloco muito em dúvida. Se nós
somarmos o percentual de desmatamento que anualmente aparece no jornal,
o Brasil já estava sem uma árvore. Isso também é muito manipulado”,
disse. Heleno costuma ser descrito como um moderado num governo cheio de
radicais. Ao inflar teorias conspiratórias e brigar com dados oficiais,
ele se aproxima de personagens como a pastora Damares Alves e o
diplo-olavista Ernesto Araújo.
Na manhã de quinta, o coordenador de monitoramento do Inpe, Cláudio
Almeida, apresentou números à Câmara. Ligado ao Ministério da Ciência e
Tecnologia, o órgão emitiu 26 mil alertas de desmatamento no ano
passado. A média de acerto é de 95%. “Isso mostra a falácia do argumento
de que o nosso sistema não é eficaz”, afirmou. No início do mês, o Ministério Público Federal anunciou a abertura de
1.410 processos contra desmatadores. As ações usam as imagens de
satélite do Inpe. “São dados absolutamente confiáveis. Desqualificá-los é
uma prática inaceitável”, diz o subprocurador-geral Nívio de Freitas,
chefe da área ambiental do MPF.
Em 2018, o Brasil registrou a maior taxa de desmatamento da Amazônia em
uma década. Neste ano a destruição tende a ser maior, com risco de
superar os 10 mil quilômetros quadrados. “Isso seria uma tragédia”,
resume o engenheiro florestal Tasso Azevedo, que define o trabalho do
Inpe como “referência mundial” no setor. Ele coordena o projeto
MapBiomas, que une universidades, ONGs e empresas de tecnologia para
mapear o uso da terra no país. Os sinais de alta no desmatamento ajudam a explicar o bombardeio contra o
instituto que monitora a floresta. A tática já foi usada por Bolsonaro
quando estatísticas mostraram o aumento do desemprego no início do
governo. Em vez de reconhecer o problema, o presidente atacou o IBGE.