Foi tensa, polêmica e cansativa a sessão da última quarta-feira no
Supremo Tribunal Federal. Com legítimos argumentos jurídicos e uma boa
dose de malabarismos verbais travestidos de tecnicismo, os ministros da
mais alta corte de Justiça do País concluíram que cabe ao Parlamento
avalizar decisões do STF que punam cautelarmente, com o afastamento do
cargo, parlamentares no exercício de seus mandatos. Não foi uma decisão
fácil. Cinco ministros votaram contra e o voto de desempate foi
proferido pela presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia. Sensata,
embora vacilante, ao declarar o veredicto, a ministra restabeleceu,
ainda que temporariamente, a indispensável harmonia entre os poderes
constituídos. A postura equilibrada da ministra, no entanto, lhe colocou
como alvo de rigorosas críticas da direita, do centro e da esquerda.
Mas, jurista experiente, Cármen Lúcia sabe que não está no comando do
STF para ser popular e sim para defender a Constituição e assegurar o
estado Democrático de Direito, independentemente do currículo dos
cidadãos que compõem os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.
Parte significativa dos petardos disparados contra a presidente do
STF afirma que o veredicto da quarta-feira deturpa o conceito da
imunidade parlamentar e favorece a condenável prática da impunidade, uma
vez que deputados e senadores envolvidos em delitos poderiam, em tese,
serem protegidos por seus pares. É verdade que no Legislativo – assim
como no Judiciário – o chamado espírito de corpo costuma se sobressair,
mas usar essa distorção para atacar a decisão tomada pelo Supremo na
semana passada não passa de discurso populista de ocasião. O STF não
determinou que parlamentares não sejam atingidos pelas decisões do
Judiciário. Ficou estabelecido é que as decisões cautelares que
impliquem em afastamento do cargo, obtido pelo voto popular, é que
deverão ser avalizadas pela Câmara ou pelo Senado.
Na verdade, o que assegura a impunidade e gera enorme e justificada
indignação popular é a lentidão com que o Judiciário trata das questões
envolvendo as autoridades detentoras de foro privilegiado, entre elas
deputados, senadores e também membros do Judiciário. Levantamento feito
pela FGV Direito do Rio de Janeiro mostra que na Suprema Corte respondem
a inquéritos já instaurados 33 senadores e 152 deputados eleitos em
2014. Além desses, há casos que tramitam pelos gabinetes do STF há mais
de cinco anos sem que sejam levados a julgamento ou a imposição de
medidas cautelares.
É essa lentidão, provocada muitas vezes por um
extraordinário número de recursos, que inviabiliza a punição àqueles que
delinquiram e agiram contra os interesses do eleitor e do País. A
história do deputado Paulo Maluf ilustra isso muito bem. Na última
terça-feira, a primeira turma do STF manteve a condenação a que o
deputado foi submetido de sete anos, nove meses e dez dias de cadeia
pelos crimes de lavagem de dinheiro e desvios de recursos públicos
durante o período em que foi prefeito de São Paulo, entre 1993 e 1996.
Ainda cabe recurso e Maluf continua zombando dos brasileiros. O deputado
deixou a Prefeitura de São Paulo há 21 anos e até agora não foi punido.
Isso é impunidade e ela se dá sob as barbas da mais alta corte de
Justiça do País. [importante no julgamento em comento é ter a serventia de lembrar que as leis são impessoais, portanto, não podem ser usadas com o fim específico (as vezes até adaptadas) de punir determinado transgressor.
Um exemplo que sempre salto aos olhos é o caso da punição criada pelo falecido ministro Teori Zavascki, especialmente para punir o deputado Eduardo Cunha.
O então ministro entendeu que Cunha deveria deixar de ser deputado e sabendo ser impossível sua cassação pelo STF, decidiu criar a figura da 'suspensão do mandato parlamentar' (punição inexistente na legislação pátria), decretou a punição e o Supremo desrespeitando todo o ordenamento jurídico, incluindo e principalmente a Carta de 88, referendou tal absurdo.]
Fonte: Mario Simas Filho, diretor de redação da revista ISTOÉ
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sexta-feira, 13 de outubro de 2017
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