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terça-feira, 1 de maio de 2018

1968 - Mão de ferro - O dia que quase mudou a história


Frente a frente, o regime militar e os estudantes tiveram a chance de evitar o AI-5

As ruas do centro do Rio ainda exibiam vestígios da Passeata dos Cem Mil, o mais contundente protesto lançado contra o regime militar, uma semana antes, quando as portas do Palácio do Planalto foram abertas em 2 de julho de 1968 para receber uma comissão de professores e líderes estudantis. O país estava em pé de guerra, mas aquele improvável gesto de diálogo, que juntava na mesma sala o  presidente Costa e Silva e representantes das ruas incendiárias, era a chance de se evitar o pior. Se as partes tivessem chegado a um consenso, ainda que nenhum dos lados acreditasse nisso, o ano poderia ter terminado sem a mão de ferro da ditadura [da chamada ditadura, visto que ditadura, dura mesmo, produzindo milhares de mortos e prisioneiros, é aquela que segue orientação comunista - que produziu mais de 100.000.000 de mortos nos países por onde passou ou permanece. Se o Movimento Revolucionário de 31 de março, mereceu ser chamado de A REDENTORA o Ato Institucional nº 5 foi o SALVADOR do Brasil, evitando a morte de milhões de brasileiros sob o tacão comunista]  baixando o Ato Institucional nº 5, o AI-5.

O encontro de Costa e Silva com a comissão popular dos Cem Mil, como ficou conhecido o grupo recebido em Brasília pelo presidente, tinha tudo para não acontecer. No mesmo dia da passeata histórica, 26 de junho, um comando da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), grupo de luta armada de esquerda, [que tinha entre seus membros a ex-presidente 'escarrada', Dilma Rousseff, e como especialista em explosivos o famigerado assassino Diógenes de Oliveira, pluriomicida conhecido como Diógenes do PT,  atualmente anistiado e pensionado]  havia lançado um caminhão com explosivos contra o quartel-general do 2º Exército, no Ibirapuera (SP), matando o sentinela Mário Kozel Filho. Pouco antes, no dia 21 de junho, uma batalha campal no Rio, opondo estudantes e policiais militares, terminou com 21 mortes no episódio que ficaria conhecido como “Sexta-Feira Sangrenta”.
 Trecho de um  filme - com adaptações convenientes aos seus produtores
A má vontade de ambos os lados era evidente. Militar da “linha dura’’, o general Jayme Portella, chefe do Gabinete Militar da Presidência, convencera-se de que as agitações eram a vanguarda de uma conspiração maior, com apoio externo, para enfraquecer “o governo e a oposição, levando o país rumo ao imprevisível”, como contou em suas memórias. Por outro lado, as lideranças estudantis suspeitavam que o regime não queria diálogo algum, mas apenas dividir o movimento e, assim, enfraquecê-lo.

A resistência mútua acabou dobrada pela persistência de uma batina. Coube ao esforço do bispo-auxiliar do Rio, dom Castro Pinto, fechar a trégua para a audiência. Recebido dias antes pelo presidente, ele teve de aguentar calado Costa e Silva reclamando da presença de freiras nas passeatas. Os estudantes também o viam com desconfiança. O objetivo do bispo, sustentou o então líder estudantil José Dirceu no livro “Abaixo a ditadura’’, era “organizar os ‘verdadeiros estudantes’ e abrir então um diálogo, ajudando assim a ditadura a legitimar uma representação fora do nosso movimento”. 

Ao governo, dom Castro Pinto prometeu frear a escalada de protestos. “A nova passeata, que fora anunciada com um comparecimento de grandes proporções, com a interferência de Don Castro Pinto, foi de fato muito reduzida”, recordou-se o general Portella em “A Revolução e o governo Costa e Silva”. O governo convencera-se, mas faltavam os estudantes. Havia pelo menos três correntes distintas, uma a favor do diálogo irrestrito, outra contrária e uma terceira, defendida pelo então estudante Vladimir Palmeira, que queria um diálogo crítico, para afastar a ideia de intransigência e desmascarar o que suspeitava ser um blefe oficial.

Para a surpresa de todos, Costa e Silva marcou a audiência para 2 de julho. Eleita por aclamação, a comissão dos Cem Mil era formada pelo escritor Hélio Pelegrino, pelo professor José Américo Pessanha, pelo padre João Batista e pelos estudantes Marcos Medeiros e Franklin Martins. “Eles seguiram para Brasília um tanto incrédulos”, disse José Dirceu em “Abaixo a ditadura”. A pauta de reivindicações tinha três eixos: a imediata libertação dos estudantes presos nos protestos de rua, mais verbas para a educação e a reabertura do restaurante do Calabouço, quartel-general do movimento estudantil no Rio, fechado desde 28 de março, quando a PM matou no local o secundarista Edson Luís. 

Há versões desencontradas sobre o encontro, que variam de acordo com o posicionamento ideológico dos cronistas. Jayme Portella disse que os dois representantes do movimento estudantil chegaram ao Palácio do Planalto em mangas de camisa, sendo imediatamente repreendidos. Para uma audiência presidencial, só terno e gravata, mas Marcos e Franklin, afirmou o militar, teriam se recusado a vestir os trajes oferecidos. (O presidente) porém, decidiu recebê-los assim mesmo, mas lhes daria uma lição de compostura que serviria para a vida toda”, relatou o general.

A ONÇA E A VARA CURTA
A primeira “lição de compostura’’, segundo o então secundarista e futuro guerrilheiro Alfredo Sirkis em “Os carbonários — memórias da guerrilha perdida’’, foi dada pelo próprio general Portella, que teria dito à comissão que ela estava “cutucando a onça de vara curta’’. ‘‘Finalmente, apareceu o seu Arthur (Costa e Silva). Segundo eles, correspondia fielmente à imagem popular. Não entendia direito as coisas. Parecia desinformado’’, disse Sirkis.

Chefe de Gabinete Pessoal do presidente, o coronel Hernani D'Aguiar garantiu no livro “Estórias de um presidente’’ que, inicialmente, Costa e Silva procurou ser afável, apontando os lugares marcados dos ministros e dizendo que poderiam “escolher o ministério que quisessem”. O coronel disse que o presidente aceitava algumas das reivindicações “dentro de certos termos”: soltaria os presos que não tivessem crimes graves, mandaria fornecer refeições boas e baratas aos estudantes e conseguiria mais verbas para a educação.

Na visão dos estudantes, contudo, não foi bem assim. “A conversa foi sumária. O marechal-presidente negava-se a abrir o Calabouço, dizia ser do STM (Superior Tribunal Militar) o caso dos presos e, quanto ao problema das verbas e outras reivindicações, não prometia nada”, rememora Sirkis. “Pavio curtíssimo, irritou-se com a primeira objeção apresentada e saiu do gabinete batendo a porta: os senhores não sabem dialogar”, conta o autor de “Carbonários”.

No dia seguinte, as machetes informavam que o diálogo do presidente com os estudantes não havia chegado ao fim. A onça, cutucada pela escalada crescente de protestos nas ruas e de ações armadas, mostraria as garras cinco meses depois. O AI-5, que poderia ter sido evitado se a audiência tivesse terminado de outra forma, levaria o país a um longo e sangrento período de terror.

O Globo