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domingo, 11 de fevereiro de 2018

Chefão da PF deseja que o país se finja de bobo



O chefão da Polícia Federal, Fernando Segovia, sinalizou que o inquérito contra Michel Temer no caso dos portos deve ser arquivado, porque “se houve corrupção não se tem notícia ainda de dinheiro de corrupção”. Ele declarou também que o delegado que interrogou o presidente por escrito ''pode ser repreendido”. Ou pior: “Pode até ser suspenso.” Dizer que essas declarações são impróprias é pouco. Segovia perdeu o recato. À frente da Operação Abafa a Jato, ele esqueceu de maneirar. É como se pedisse ao país para se fingir de bobo pelo bem de Temer.



No afã de socorrer o presidente, Segovia tornou-se um personagem desconexo. Quando há mala de dinheiro no lance, ele diz que não há corrupção. E lamenta que a investigação tenha sido tisnada pela pressa. Quando ainda não se chegou à grana, ele recomenda o arquivamento apressado —embora não descarte o roubo: “Se houve corrupção…” Nos dois casos, fica-se com a sensação de que a PF é comandada por um detetive que considera inconveniente arriscar a estabilidade do governo por algo tão supérfluo e relativo como a verdade. Melhor combinar que nada aconteceu. E não se fala mais nisso.



Segovia chegou ao topo com o apoio do suspeito José Sarney e o aval do denunciado Eliseu Padilha. Sua posse na direção da PF foi ornamentada com a presença de Temer, o primeiro presidente da história denunciado criminalmente no exercício do mandato. Na sua primeira entrevista, o delegado rasgou, por assim dizer, relatório em que a PF informara ter reunido evidências que apontam, “com vigor”, para a participação de Temer nos malfeitos que levaram à filmagem do seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures recebendo propina de R$ 500 mil da JBS. ''Uma única mala talvez não desse toda a materialidade criminosa que a gente necessitaria para resolver se havia ou não crime, quem seriam os partícipes e se haveria ou não corrupção'', disse Segovia na ocasião. Criticou a pressa de procuradores e agentes federais. Com razão, sustentou que uma apuração mais lenta e criteriosa levaria aos destinatários finais da mala. [mesmo não agradando aos que querem a qualquer custo Michel Temer preso por corrupção, ainda não se chegou, de forma incontestável, indefensável, ao destinatário, ou destinatários, da mala.
Poderia até ser destina a Temer, essa suspeita até que tem alguma razoabilidade - só que ser razoável não é prova.]

Segovia esqueceu apenas de mencionar um par de detalhes: 
 1) O interlocutor de Joesley Batista no grampo do Jaburu é Temer; 
 2) Na conversa, o presidente indicou Rocha Loures como preposto, pessoa de sua mais estrita confiança. [sem definir que entre as atribuições de seu preposto existe a de conduzir malas com dinheiro.] De resto, o delegado esquivou-se de anunciar uma providência. Poderia ter dito algo assim: “Farei o que estiver ao meu alcance para que as lacunas da investigação sejam preenchidas.” De repente, o doutor invade novamente o palco para desqualificar o inquérito que pode resultar na terceira denúncia contra Temer. 

Como se fosse pouco, Segovia achou conveniente ameaçar o delegado responsável pelo inquérito dos portos, Cleyber Malta Lopes. O presidente ficou uma arara com o teor do interrogatório que lhe chegou por escrito. E Segovia tomou-lhe as dores, dispensando ao subordinado um tratamento de criminoso, passível de repreensão ou suspensão. [o presidente se irritar co o teor das perguntas é um direito que tem; só que entre não gostar do teor das perguntas e constatar, com provas, ser o tratamento dispensado pelo delegado ao presidente da República, existe uma grande distância.
Natural, que Temer tem o direito de ser respeitado por qualquer pessoa, delegado da PF ou não, já que ocupa um cargo que exige uma 'liturgia' no trato a sua pessoa e quem violar este direito pode ser alvo de representação, investigação e conforme o resultado, punição.
Só que Temer, é o que se conclui pela conversa do Segovia,  apenas reclamou informalmente junto ao diretor-geral da PF não representou contra o delegado.]

De fato, o delegado Cleyber precisa se explicar. Cometeu vários crimes. O primeiro foi o de existir. Este poderia ser classificado como um crime menor, uma contravenção tolerável. A coisa tornou-se grave quando, além de existir, o doutor acionou o olfato. Foi ainda mais longe: abriu os olhos.  Finalmente, percebeu-se que o investigador da PF, num claro desafio à ordem estabelecida, cometeu um crime imperdoável: investigou. [visto que o delegado não foi alvo de representação por parte do presidente Temer, tão pouco foi flagrado cometendo algum crime, nada há a ser investigado.]

Para desassossego de Segovia, o delegado Cleyber e sua equipe não estão sozinhos no seu esforço para subverter as regras do jogo.