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segunda-feira, 15 de abril de 2019

A última noite

Por seis domingos, milhões de pessoas ao redor do mundo vão assistir ao mesmo tempo aos episódios finais de 'Game of Thrones'

O que torna uma série grande? Se a resposta começar pela história que os números contam, a televisão contemporânea não conhece série maior do que Game of Thrones: uma recordista em custo (ao norte de 100 milhões de dólares por temporada), recordista em audiência (na sétima temporada, 30 milhões de espectadores por episódio só nos Estados Unidos) e, lamentavelmente, recordista também em pirataria (estima-se que essa mesma sétima temporada tenha sido pirateada 1 bilhão de vezes). Nunca se montou, também, uma operação tão ambiciosa: como uma versão moderna de Júlio César e Marco Antônio, os criadores David Benioff e D.B. Weiss estabeleceram o quartel-­general da produção na Irlanda do Norte e orquestraram sua campanha de ocupação da cultura pop revezando-se entre Belfast e os postos avançados na Croácia, na Islândia, no Marrocos, na Espanha e em Malta.

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QUEBRANDO TABUS - Lena Headey e Nikolaj Coster-Waldau como os gêmeos e amantes Cersei e Jaime: incesto, violência crua e muita nudez (HBO/Divulgação)

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GoT virou uma potência, mas estreou como uma aposta incerta. Fantasias vão bem no cinema, mas tendem a claudicar na TV: nem as telas menores são o palco ideal para elas nem os recursos de produção costumam fazer jus às exigências visuais do gênero. Ademais, a saga escrita pelo americano George R.R. Martin era popular, mas nem de longe nos termos de O Senhor dos Anéis. O americano Peter Dinklage, que faz Tyrion Lannister, recebeu ressabiado o convite dos produtores:

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A habilidade decisiva de Benioff e Weiss, entretanto, é outra. Veja-se o caso dos atores de estatura extraordinária de GoT. Não há muitos bons papéis por aí para homens na casa dos 2 metros de altura, mas a dupla achou lugar para vários deles: por exemplo, Ian Whyte (o gigante Wun Wun, 2,16 metros), Kristian Nairn (Hodor, 2,13), Hafthór Júliús Björnsson (Montanha, 2,06), Rory McCann (Cão de Caça, 1,98). E então a série fez algo quase miraculoso: deu a eles arcos dramáticos de verdade. O tímido, gentil e medroso Hodor carregou Brandon Stark por toda Westeros pronunciando uma única palavra — o próprio nome. Kristian Nairn o repetiu 101 vezes enquanto esteve em cena, e achou para ele nuances tocantes. O escocês Rory McCann, por sua vez, brilhou ao transformar Cão de Caça, um brutamontes cruel, em um homem que nunca deixará de ser um brutamontes, mas não suporta mais ser cruel. GoT dedicou o mesmo respeito à atriz Gwendoline Christie, de 1,91 metro: como Brienne de Tarth, uma cavaleira sempre em busca de alguém a quem possa servir com honra, Gwendoline explorou com delicadeza as constrições que a aparência pode impor a uma pessoa — e também a libertação que se pode encontrar nela.
É aí que talvez esteja o talento maior da dupla de produtores: a maneira como aprofundaram seus personagens (ou boa parte deles) e deixaram que eles mesmos fossem se revelando para o público, cada um a seu tempo — do humanismo que move o intrigante Lorde Varys à frieza escondida em Arya; do coração largo de Tyrion ao espírito submisso de seu irmão Jaime; da bravura do covarde Samwell Tarly à fibra que Daenerys encontra em si. Tornar cada personagem único e inteiro é a primeira regra para quem almeja conquistar o espectador — e é a mais difícil de cumprir na íntegra. GoT conseguiu criar fileiras de personagens assim graças, também, ao seu equilíbrio entre veteranos e estreantes. 
UM PRATO FRIO - Arya Stark (Maisie Williams) mata o traidor Walder Frey (David Bradley): mocinha faminta de vingança (HBO/Divulgação)

GoT está longe de ser a primeira série em que a HBO lida com violência explícita, sexo gráfico, nudez frontal masculina, profanidade e tabus variados — para ficar em um único caso, a excelente Roma, exibida entre 2005 e 2007, tinha doses generosas de tudo isso. Mas foi, talvez, seu laboratório mais avançado: tratando de incesto (e com filhos nascidos dele), tornou autêntico o sentimento entre os gêmeos Cersei e Jaime Lannister (Lena Headey e Nikolaj Coster-Waldau); mostrando atos de barbaridade monstruosa, como a morte do príncipe Oberyn (Pedro Pascal), chocou sempre pela fragilidade com que o corpo derrota a arrogância; pondo em cena dúzias de homens e mulheres nus, nos bordéis de Porto Real, lembrou como pode ser degradante esse comércio para os que são explorados por ele.

Continue lendo, MATÉRIA COMPLETA, em VEJA,  edição nº 2630
Publicado em VEJA de 17 de abril de 2019, edição nº 2630