Investigações sobre chacinas no país não avançam
Policiais são suspeitos de assassinatos no Rio e no Pará, mas autoria de crimes ainda é desconhecida
Algumas
das maiores chacinas que aconteceram no país continuam cercadas de
mistério sobre as causas e, principalmente, em relação aos responsáveis pelos
crimes. Complexas pela quantidade de mortos, silêncio das testemunhas e
insuficiência de provas, os crimes tornaram-se ainda mais nebulosos em função
da suspeita de participação policial.
No
interior do Pará, 29 policiais civis e militares entraram na fazenda Santa
Lúcia para cumprir mandados de prisão decorrentes da investigação do
assassinato de um segurança do local. No entanto, 17 deles deixaram a
propriedade na condição de suspeitos pela morte de dez trabalhadores rurais. No
Rio de Janeiro, uma operação no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, terminou
com a morte de sete pessoas. Em Belém, 29 pessoas foram assassinadas no que foi
considerada a maior chacina da história da cidade. Em comum, os três casos
ocorridos em 2017 reúnem acusações contra policiais, suspeitos de envolvimento
nos assassinatos.
No caso
de São Gonçalo, que ocorreu em outubro passado, há incerteza a respeito da
autoria do crime: não se sabe se foi a polícia, o tráfico ou o Exército. [fica mais fácil destacar apenas a suspeita de ação policial. É sabido que o tráfico usa o recurso de mandar matar algumas pessoas, jogam a culpa no polícia e ganham duplamente : se livram de alguns desafetos e ao mesmo tempo inibe à ação da polícia que passa à condição de vilã.] Um dia
após a morte de um policial militar na comunidade do Brejal, no município, foi
executada uma operação com 15 agentes da Coordenadoria de Recursos Especiais
(Core), a tropa de elite da Polícia Civil, em conjunto com militares do
Exército no Complexo do Salgueiro. Sem a finalidade divulgada, a ação terminou
com sete mortos. Ocorria um baile funk no local naquela noite, embora os corpos
tenham sido encontrados a três quilômetros do evento. [dois pontos que estão esquecendo para responsabilizar a PM: - bailes funk sempre são ocorrências que estimulam conflitos com elevado número de mortos e fica fácil, sendo do interesse do tráfico, adaptar a situação para parecer uma chacina realizada por policiais;
- dificilmente agentes da CORE, Policia Civil, iriam realizar qualquer matança, especialmente para vingar a morte de um policial militar.]
— Não há
dúvidas de que houve um homicídio, mas esse caso foge às características
clássicas das chacinas pois houve apreensão de armas e drogas no local, o que
não é comum nessas ocorrências — explica Paulo Roberto Mello Cunha, promotor do
Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (Gaesp).
Moradores
da região acusaram os policiais de execução, enquanto a Polícia Civil afirma
que a tragédia é fruto do confronto entre traficantes. Três policiais civis, no
entanto, alegaram que os disparos foram efetuados pelos militares. O Ministério
Público do Rio (MP-RJ) abriu um inquérito para apurar o caso, mas a indefinição
da autoria atrasa ainda mais o processo, pois divide a investigação em duas:
integrantes das Forças Armadas que cometeram crimes durante missões de Garantia
da Lei e da Ordem (GLO), como é o caso dos militares que atuam no Rio, só podem
ser investigados pela Justiça Militar. — Estamos
em contato com os militares, mas o ideal seria que pudéssemos reunir as
investigações e tudo fosse feito pelo mesmo órgão e no mesmo contexto — disse o
promotor. [até por uma questão de um mínimo de respeito ao Ministério Pùblico Militar, o ilustre promotor do Gaesp deveria evitar comentários infundados.]
PERÍCIA
DESMENTE POLICIAIS
Apontada
a princípio como uma onda de assassinatos, a chacina que matou 29 pessoas entre
os dias 20 e 21 de janeiro em Belém permaneceu em aberto por quase nove meses.
Criminosos de rosto encoberto e atuação em áreas que não foram patrulhadas pela
polícia na ocasião, somados ao fato de as mortes se sucederem ao assassinato de
um policial militar, foram alguns dos indícios que sugeriram a participação de
policiais na tragédia. No entanto, foram necessários quase nove meses até que
as investigações chegassem aos acusados.
Por meio
de telefonemas interceptados pela Promotoria Militar, um grupo de agentes foi
flagrado comentando sobre a execução de diversos crimes na capital paraense.
Eles teriam acobertado a ação de outros criminosos mediante extorsão e
participado de furtos a residências. Seis policiais foram denunciados pelo
Ministério Público do Pará (MP-PA) e estão presos preventivamente. Por se
tratar de um caso que corre em sigilo na Justiça estadual, o MP-PA não quis se
pronunciar.
No outro
caso que aconteceu no Pará, apesar de os investigadores terem denunciado 17 dos
29 policiais acusados de envolvimento na chacina de Pau D’Arco, cidade a 50
quilômetros de Redenção, o mandante da ação que matou dez trabalhadores rurais
em 24 de maio ainda não foi localizado pela polícia. — A gente
sabia desde o início que os policiais tinham matado todo mundo. Mas até hoje a
polícia não encontrou quem deu a ordem a eles. Queremos que a justiça seja
feita e os responsáveis, encontrados — diz Ana Célia Pereira Oliveira de Souza,
viúva de Ronaldo Pereira de Souza, uma das vítimas da chacina.
A morte
de dez pessoas na região, conhecida por conflitos de terras, teve a versão
policial desmentida pela perícia e pela delação de dois policiais. A princípio,
os agentes que atuaram no local relataram terem sido recebidos com tiros pelos
posseiros e efetuado disparos em resposta. Os laudos indicavam ausência de
pólvora nas mãos das vítimas, que haviam sido baleadas a curta distância.
Em
delação ao Ministério Público, dois agentes relataram que a cena do crime foi
alterada para que parecesse que um confronto tivesse ocorrido ali. Dos 17
denunciados, 15 ficaram presos preventivamente entre setembro e dezembro, mas
foram liberados para responderem ao processo em liberdade. Leonardo
Jorge Lima Caldas, da 1º Promotoria de Justiça de Redenção, reconhece que a
notoriedade do caso acelerou o processo, mas teme que as investigações esfriem
por falta de estrutura na região. — Por
mais que o Ministério Público tenha requisitado e hoje esse inquérito esteja
com a Polícia Federal de Redenção, a estrutura é muito precária, e ele tramita
como se fosse mais um. A demora em analisá-lo pode travar as investigações —
observou.
Para as
famílias das vítimas, o drama é ainda maior pela ausência de indenizações por
parte do governo estadual: — Nunca
nos procuraram para nada. Apenas o promotor nos procurou para saber como era a
nossa rotina — conta Ana Célia, que alega enfrentar dificuldades para criar os
três filhos desde a morte do marido. [se percebe que os familiares das vítimas estão mais preocupados com grana, do que com as investigações.]
O estado do Pará, por meio de nota, afirmou que
as indenizações devem ser requeridas formalmente para que os valores sejam
fixados e que não recebeu, até o momento, “nenhum processo ou demanda neste
sentido."O Globo