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terça-feira, 2 de junho de 2020

O trunfo de Bolsonaro para 2022 - Gazeta do Povo

Mario Vitor Rodrigues

Após seguidas ameaças, há quem tema uma ruptura democrática. Há também, por outro lado, quem julgue cada vez mais improvável a permanência do presidente até o fim do mandato. Caso nenhuma dessas hipóteses vingue, tudo indica que Jair Bolsonaro poderá contar com um aliado ainda mais importante do que seus fiéis seguidores em 2022: a oposição.

Para constatá-lo, basta observar as últimas manifestações de figuras políticas que não parecem dispostas a transcender o discurso do inimigo comum. “No Brasil sempre tivemos uma boa relação com os tucanos, era uma relação civilizada e respeitosa. Agora o Bolsonaro com seus milicianos só sabe estimular o ódio. Esse clima está sendo cultivado desde junho de 2013”, escreveu Lula quarta-feira (27) passada no Twitter.

Entre 1995 e 2003, Fernando Henrique Cardoso enfrentou 17 pedidos de impeachment. Desses, 4 foram apresentados pelo PT. Não há nada de civilizado em aterrorizar governos e tachar alguém que lutou contra a ditadura de fascista. Tampouco é benéfico falar em herança maldita após a passagem de bastão civilizada de um governo que estabilizou a economia, sancionou a Lei de Responsabilidade Fiscal e iniciou os projetos de transferência direta de renda embrionários do Bolsa Família.

À época a expressão não existia, mas herança maldita deve ter sido o pecado original das fake news. Ignora-se nele a origem de um sentimento tão genuíno quanto compreensível de milhões de pessoas. Faz parecer que, lá pelas tantas, sem qualquer razão, brasileiros em massa simplesmente decidiram passar a detestar um político e um partido nos quais durante anos depositaram esperança. Arrogância típica de quem sempre torceu o braço dos que estiveram ao seu lado no espectro ideológico para impor o seu projeto de poder. Seria cômico se não fosse trágico que Ciro Gomes, Marina Silva e Fernando Henrique Cardoso sejam responsabilizados pelo advento do bolsonarismo. O mesmo vale para aqueles que se abstiveram de votar em 2018.

Lula representa o grande entrave na composição de um grupo difuso de democratas contra Jair Bolsonaro, mas ele não está só. O próprio Ciro e demais próceres da esquerda precisam aceitar que 2022 ainda não será o momento em que o pêndulo fará o movimento de volta. Muitos dos que votaram em Bolsonaro por ojeriza ao PT podem até estar  arrependidos, mas supor que dariam um cavalo de pau tão cedo é ingenuidade. Esses eleitores precisam de uma rota de fuga. E ela não estará à esquerda. Em artigo recente publicado no Estadão, Fernando Gabeira defendeu a necessidade de “uma frente democrática ampla, madura, sem conflitos de egos, sem estúpidas lutas pela hegemonia, tão comuns na esquerda”. [existe o necessário para formar essa frente? esquerda e democracia se autoexcluem.] Como de costume, foi na mosca. A ver se entenderam o recado.

 Mario Vitor Rodrigues - Vozes - Gazeta do Povo