Investigação do esquema de propinas chega às elétricas e se aproxima personagens muito próximos da presidente,
como o ministro Aloizio Mercadante, a antiga auxiliar Erenice Guerra e o diretor da Eletrobras, Valter Cardeal
Em julho de 2007, a então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, reuniu alguns ministros num comitê que tinha como missão fixar novas metas para o programa nuclear brasileiro. Aficionada às questões do setor elétrico, Dilma puxou para si o papel de coordenadora do grupo. O trabalho resultou num plano que previa, dentre tantas metas ambiciosas, a conclusão das obras da usina nuclear de Angra 3, paralisadas nos anos 80.
NA ANTE-SALA DO PLANALTO
Aloizio Mercadante, Erenice Guerra e Valter Cardeal (da esq. para dir.)
deverão estar entre os investigados no Eletrolão
No comando operacional da empreitada estava o presidente da
Eletronuclear, almirante Othon Pinheiro da Silva, que se tornou na
semana passada o principal alvo da 16ª fase da Operação Lava Jato.
Othon, que estava licenciado do cargo desde abril, quando surgiram os
primeiros indícios de irregularidades, foi preso pela Polícia Federal
sob acusação de receber R$ 4,5 milhões em propinas pagas por
empreiteiras integrantes do consórcio responsável pela obra. Embora o militar tenha surgido como a face mais visível do esquema, a PF
tem elementos que podem fazer com que as investigações atinja outras
personagens muito próximos da presidente Dilma. “É possível que a gente
chegue aos políticos”, disse o delegado Igor Romário de Paula.Aloizio Mercadante, Erenice Guerra e Valter Cardeal (da esq. para dir.)
deverão estar entre os investigados no Eletrolão
Chegar aos políticos é quase um eufemismo.
Ao mergulhar no setor elétrico, a PF vai bater na porta do Palácio do
Planalto. Não há um só projeto no setor elétrico que Dilma não tenha
acompanhado de perto. Se como presidente do Conselho da Petrobras a
presidente alega que não tinha informações completas sobre o que
acontecia na estatal, dificilmente poderá dizer que desconhecia os rolos
em Angra 3 ou na usina de Belo Monte, os dois maiores investimentos do
governo em geração de energia. Em ambos os casos, os investigadores já
têm indícios de envolvimento de gente de confiança da petista. Há
informações, por exemplo, de que boa parte dos contratos de equipamentos
da mega hidrelétrica que está sendo construída na bacia do rio Xingu
era antes negociada num escritório de advocacia – ou lobby – abrigado
num imponente edifício de linhas modernistas e fachada de concreto na
quadra 8 do Lago Sul, bairro nobre de Brasília.
O imóvel está situado a apenas uma quadra
do escritório de advocacia de Erenice Guerra. E não é mero acaso. Além
da ex-ministra de Dilma, segundo investigadores, também frequenta o
local o advogado Joaquim Guilherme Pessoa e o empresário Marco Antonio
Puig, ligado à empresa LWS envolvida numa investigação de fraudes em
contratos de informática nos Correios. Puig teria relação com o diretor
da Eletrobras Valter Cardeal, outro apadrinhado de Dilma.
O consórcio construtor de Belo Monte é
liderado pela Andrade Gutierrez em parceria com Odebrecht, Camargo
Correa, Queiroz Galvão e OAS, as mesmas do clube do bilhão, além de
outras cinco menores. A PF sabe que no mesmo local também eram
negociados projetos para captação de investimento de fundos de pensão e
acertos para a anulação de multas fiscais no Carf (Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais), que já é alvo de outra operação.
Erenice, dizem os investigadores, também atuou na comercialização de
energia. Ela chegou a se associar informalmente ao ex-ministro de Minas e
Energia Silas Rondeau e ao lobista Alexandre Paes dos Santos no
Instituto de Desenvolvimento de Estudos e Projetos Econômicos.
O caso da usina de Belo Monte, orçada em R$
30 bilhões, segundo um procurador da Lava Jato, se relaciona
diretamente com o de Angra 3. A força-tarefa obteve os primeiros
indícios de que o esquema do Petrolão se alastrara para o setor elétrico
quando apreendeu com o doleiro Alberto Youssef a planilha de 750 obras
federais. Mais recentemente, em delação premiada, o ex-presidente da
Camargo Corrêa Dalton Avancini revelou detalhes sobre o superfaturamento
das obras e pagamento de R$ 20 milhões em propinas a políticos, por
meio de empresas de fachada. Avancini citou como um dos beneficiários do
esquema o diretor da Eletronorte Adhemar Palocci, irmão do ex-ministro
Antonio Palocci, que já é investigado em outro procedimento da Lava Lato
e foi um dos coordenadores da campanha de Dilma em 2010 – além de
sinistro da Casa Civil. Adhemar era considerado intocável. Seu nome
surgiu em 2009 na Operação Castelo de Areia.
Avancini também envolveu o nome de Flávio
David Barra, presidente global da Andrade Gutierrez Energia, que era seu
interlocutor nas obras de Belo Monte. Barra foi preso com Othon na
semana passada. A PF cumpriu ainda 30 mandados de busca e apreensão na
sede da Eletronuclear e outros imóveis residenciais e comerciais em
Brasília, Rio de Janeiro, Niterói, São Paulo e Barueri. As prisões se
basearam em movimentações bancárias de empresas envolvidas no esquema e
no depoimento de Avancini, que revelou a existência de um acerto para
pagamento de propinas ao PMDB e a funcionários da Eletronuclear em
relação às obras de Angra 3. Ele contou detalhes de uma reunião feita em
agosto de 2014 e apontou Flávio Barra como “o representante da Andrade
Gutierrez que discutia valores a respeito da propina de Angra 3”,
segundo o procurador Athayde Ribeiro Costa.
Fonte: Revista IstoÉ
Foto: Regina Santos/Norte Energia