Aprendi de guri que os alunos mais dedicados aos estudos eram aqueles
que disputavam – disputavam mesmo – os primeiros lugares da turma. Eu
não estava em nenhuma competitiva e estressada metrópole capitalista.
Ninguém na turma sonhava com ser um figurão entre os tigres asiáticos
ou em Wall Street. Éramos apenas meninos e meninas dos anos 50, em
Santana do Livramento, no extremo sul do Brasil. Mas estudávamos muito e
disputávamos notas. Nota ruim forçava a busca de nota melhor na prova
seguinte, chamada “sabatina” (embora fosse mensal).
Aquela experiência escolar, vivida no antigo curso primário – hoje
ensino fundamental –, em escola pública, valeu-me para a vida.
Compreendi então, desde criança, que o progresso e o sucesso têm tudo a
ver com esforço e quanto maior ele for, maior tende a ser o resultado.
Foi o que me tornou adepto da valorização do mérito. A União Soviética, a
extinta URSS, exigiu muito empenho dos Estados Unidos para acompanhar
seus avanços tecnológicos na corrida armamentista e espacial. Por quê?
Porque havia muita coisa em jogo. O resto do país era um retrato do
fracasso comunista, mas havia na URSS um nível de excelência em torno
dessas atividades.
Cuba, não deixava por menos. Seus atletas costumam ser feras em
competições internacionais. Por quê? Porque na sociedade cubana, na Cuba
da libreta “provisória” de racionamento, que já conta 60 anos de
existência, os atletas de ponta têm acesso a alimentos que o restante da
população não consegue comprar. Nos países comunistas, o mérito
esportivo alivia os penares da existência. Ademais, a vitória é
instrumento de propaganda de regimes que sobrevivem à custa da
propaganda. Resumindo: em países sob regime totalitário de viés marxista
podem surgir áreas de excelência, mas isso só ocorre se há algo sendo
disputado.
*.*.*.*.*
Dirigente de um sindicato de servidores, em nota sobre o projeto de
Reforma Administrativa enviada pelo governo ao Congresso, declarou: “Precisamos
nos mobilizar contra essa proposta vergonhosa, que retira direitos dos
futuros servidores públicos, com avaliações duvidosas para obtenção de
estabilidade e aposta na meritocracia, prática antidemocrática e
perigosa para a administração pública”. [nem sempre, mas com uma frequência razoável servidores públicos fazem manifestações inteligentes; mas a desse dirigente sindical conseguiu ser um primor de estupidez - provavelmente, ingressou no serviço público cometendo alguma cota - por isso sua oposição ao mérito - e ao optar pela comodidade de ser um líder sindical, perdeu o senso do ridículo.]
Ou
seja, que tudo fique como está ainda que a sociedade permaneça
superonerada e mal atendida. A avaliação de desempenho, tão comum nas
empresas privadas, é habitualmente recusada no serviço público sob a
alegação de que grupos diferentes e indivíduos diferentes são
incomparáveis em suas circunstâncias, limitações e possibilidades.
Todos
deveriam recebem um bom salário e ponto final.
Confunde-se avaliação de
desempenho com comparação entre pessoas.
Não
preciso dizer em que ponta do time joga a autora da declaração.
Sua tese
tem tudo a ver com o pensamento que subtrai quanto pode de quem produz
muito e transfere para quem produz pouco até que ninguém produza mais
(não estou negando a necessidade de políticas sociais).
As consequências
teoricamente previsíveis são bem verificáveis na vida real. Mas a tese
tem penetração e acolhimento porque, apesar da profunda perversão que
produz, se reveste com o manto de suposta justiça, bordado nas cores da
benevolência. No fundo, é a tal absorção da ideia de justiça pela de
igualdade.
Portanto, quando se automatizam as promoções funcionais,
desvinculando-as do merecimento, quem resulta automatizada é a
mediocridade. No mundo de qualquer época, a mediocridade é parteira do
atraso. Queira Deus que o Congresso Nacional perceba que suas
responsabilidades têm prioridade sobre seus interesses eleitorais!
Publicado originalmente em Conservadores e Liberais, site de Puggina.org
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de
Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site
Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e
sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a
tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus
brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.