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sábado, 16 de junho de 2018

Um chamado à reação

O Brasil tem um compromisso consigo mesmo: tentar se acertar nos próximos seis meses. Antes da troca de guarda. A instabilidade política em virtude da eleição, a paralisia econômica alimentada por temores e expectativas negativas, além da apatia congressual que emperra a aprovação de reformas precisam ceder lugar a ação. Em nome do País, os agentes necessitam seguir adiante. Atuar, em suas respectivas áreas, para que o Brasil não perca o bonde da retomada. Todos precisam entender que esse é o caminho em prol do bem geral e de cada um que aqui vive. Esperar um novo governo, um novo parlamento, os futuros ocupantes do Executivo, os salvadores da pátria, os arrivistas vendedores de sonhos tem sido uma prática que faz a Nação perder um tempo precioso. A cada quatro anos se repete a sina de uma sociedade que pisa no freio no aguardo de orientações do futuro comando ou para se dedicar à torcida por vitórias em outro campo. 

Uma parada fatal. Como se pudéssemos nos dar ao luxo de perder um ano inteiro envolto em discussões de sucessão, na vibração por um bom desempenho na Copa e nas investigações da Lava Jato que seguem e seguirão seu curso independentemente de nos atermos a elas. Soluções para problemas estruturais como o desemprego, por exemplo, estão a exigir discussões e execução já. Sem delongas. Não há que se aguardar por passes de mágica do futuro ocupante do Planalto. Que razões levam empresas a engavetar projetos de expansão, de investimentos, de consolidação dos seus negócios, por exemplo? Quais motivos fazem deputados e senadores deixarem de lado os afazeres básicos, essenciais, do cargo que ocupam para mergulharem em um perrengue político que, para além das meras disputas partidárias por hegemonia nas urnas, castiga de morte o projeto de desenvolvimento nacional? Há de se ter grandeza nesse momento. Verdadeiros líderes tomam a frente das batalhas nos momentos mais difíceis, nas situações adversas. Encaram a urgência dos desafios como se cada minuto contasse contra. E é esse sentimento que ainda não foi despertado naqueles que pretensamente imaginam liderar ou aspiram tal posição. 

Anda escasso nessas paragens e no espírito dos desbravadores que lutam pelo poder de Brasília. Candidatos à presidência, postulantes às vagas do parlamento, futuros governadores estaduais e os atuais ocupantes de cada um desses respectivos postos deveriam se unir em torno da causa de recuperação do Brasil hoje. Agora! Porque ninguém pode mais esperar. A desesperança e o desânimo que tomam conta dos brasileiros em meio ao maior evento esportivo da humanidade é um sinal eloquente de como os cidadãos passam por uma espécie de depressão coletiva, um desalento geral e perigoso. Por um lado, estão focados na busca de saídas urgentes para as suas vidas. Por outro, enxergam baixas perspectivas de virada do quadro de crise. Não suportam os seguidos golpes de retrocesso. Estão apáticos. Uma pesquisa Datafolha, divulgada na semana passada, mostra que ao menos 72% dos brasileiros acreditam em piora do cenário econômico. Outros 53% não demonstraram qualquer interesse na Copa. [Importante: para se ganhar uma Copa é necessário que se tenha uma seleção de brasileiros e não um timinho de 'estrangeiros', alguns, ilustres desconhecidos no Brasil.]  que não podemos. Nunca se viu nada parecido. Jamais a autoestima nacional esteve tão no chão. 

Os escândalos seguidos do Mensalão e do Petrolão, que desbarataram uma extensa rede de larápios dos cofres públicos, decerto contribuíram para o estupor e frustração da maioria. Como seus comandantes foram capazes de tamanha ignomínia? O Rio de Janeiro vivendo no limite da intervenção militar e da violência sem controle; Brasília que passa os dias entregue às moscas com as plenárias do Congresso sem reunir o mínimo de quórum necessário para votações urgentes – e o bombardeio incessante ao Governo Federal, com denúncias e tentativas de deposição, às vésperas das eleições não colaboram em nada para a revisão desse estado de ânimo. E ao final e ao cabo fica a questão: para quê isso? [Temer, especialmente devido à ação de maus brasileiros, dos que em busca de vantagens pessoais, até mesmo de aparecerem, esqueceram os interesses maiores do Brasil (e tentam induzir o maior número possível de brasileiros a fazer o mesmo), não está sendo um  ótimo presidente - impressão que transmitiu no inicio do seu mandato - mas, precisamos ter presente que é ele que o Brasil tem para concluir este governo e substitui-lo será pior do que suportar sua presença e ajudar no que for possivel, ou pelo menos não atrapalhar.] Quem lucra com a desmotivação disseminada? Por que não rever atitudes e incutir esperança em dias melhores? É possível e factível a qualquer país se tomar de virtudes e de uma onda de reação, mesmo nos mais dramáticos momentos. A Alemanha e o Japão do pós-guerra, dizimados moral e estruturalmente, são casos clássicos de revitalização. Hoje nações desenvolvidas como a Suíça habitam o imaginário coletivo como modelo ideal de organização social onde as instituições funcionam, a justiça e a igualdade imperam em todos os campos e, principalmente, o povo vive feliz, levado por uma fórmula simples que pressupõe o bem-estar do próximo. Seria aconselhável tomar por empréstimo de vez em quando semelhante postura. E por que não já? 

Logo agora, na mais difícil das circunstâncias? Se cada um se convencer desse movimento proativo muito poderá ser conquistado. Nada de aguardar os desdobramentos de fatos futuros, de ficar a reboque de decisões das urnas, de acordos, conchavos e alianças por governabilidade mais adiante. Diria o poeta/compositor Geraldo Vandré, na música que arrastou multidões: “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Uma corrente positiva, uma torcida pela vitória em um campo muito mais decisivo para a qualidade de vida de cada um, é capaz de transformações inacreditáveis. De revoluções que fazem história. E o Brasil tem todas as condições de construí-la. Aqui e já. Um ponto de inflexão importante nesse processo é o fim do vale-tudo no plano das lideranças. Elas precisam assumir a responsabilidade de conduzir uma espécie de pacto pela reconstrução. 

Não há espaço para golpes baixos, mesquinharias ou falta de dever cívico nessas circunstâncias. Quem insiste na beligerância com o mero intuito de incitar o caos, o “quanto pior, melhor” perde o respeito. Não deve ser digno de comandar. Jamais será capaz de grandes realizações. Verdadeiros líderes, que mostrem grandeza de objetivos, podem ajudar a substituir o desânimo geral pela motivação, o sentimento do “não tem jeito” pelo “vamos conseguir”, “somos capazes” – não como mera promessa de campanha, fundamentalmente por meio das atitudes. O futuro mandatário também precisa trazer tais princípios no seu DNA. E assim contaminar os demais. Empreendedores, representantes de classe e chefes comunitários, líderes de quaisquer setores e níveis de influência possuem igual missão. O movimento de reativação da estima nacional começa em cada um e aos poucos vira coletivo. É necessário apenas se engajar na corrente, sem compromisso de exigir do outro o mesmo, mas acreditando que ele também o fará. Esse é o verdadeiro significado da expressão “a força de um povo”. E se crermos nela temos que fazê-la valer na prática. Você já pensou em contribuir com a sua parte hoje? Não olhe para o lado e espere que o outro comece. Dê a partida. Siga em frente. Reaja. Servirá de exemplo e outros virão atrás. É desse lampejo de ânimo que o Brasil precisa se alimentar. E por que você não pode ser o arauto dessa chama? Ao invés de reclamar, passe a agir.

Carlos José Marques, diretor editorial da Editora Três
 

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Tá na Lava-Jato? Tá fora

Se ministros envolvidos em tramoias não caírem fora, Temer terá que arranjar um jeito de se livrar da turma, e logo

Vamos imaginar a seguinte situação: você é ministro do governo Temer e sabe que está, digamos, envolvido nas tramoias da Lava-Jato e naquelas que levaram Eduardo Cunha à cadeia e possivelmente a uma delação premiada. O que fazer?  O dilema está colocado porque, falando em termos simples, quem meteu a mão no dinheiro ilegal sabe perfeitamente o que fez. A questão é: vão pegar ou não vão pegar?

Com a prisão de Cunha e a delação da Odebrecht, a probabilidade de ser apanhado aumentou, e muito. Você, sendo ministro, tem a prerrogativa do fórum especial, ou seja, vai para o Supremo Tribunal Federal. Os ministros do STF ficam de bronca quando se diz que é uma vantagem sair da jurisdição de Curitiba e ir para a suprema de Brasília.
Mas é uma vantagem. No mínimo, o STF demora mais para aceitar denúncia, abrir inquérito, processar, julgar, mandar para a cadeia. Além disso, o Supremo também não costuma decretar essas prisões preventivas que o juízes de primeira instância têm aplicado.

Por outro lado, pode-se dizer que demora, mas acaba sendo julgado. Tudo bem, mas o tempo ajuda aqui. Sabe como é: no turbilhão da Lava-Jato, com tanta gente mais importante sendo condenada e presa, pode haver alguma esperança de que se esqueçam de você. Ficando para o fim da fila já estaria bom, não é mesmo?  Então, caro ministro envolvido, o que fazer? Se agarrar na rapadura ou pedir demissão?  Se agarrando no cargo, o ministro cria um constrangimento enorme para o presidente Temer, seu governo e, claro, um obstáculo para o programa de reformas econômicas. O assunto corrupção/delação torna-se dominante, desmoraliza o governo, que vai passar o tempo todo se explicando.

Portanto, se quiser ajudar o presidente Temer, o ministro-que-se-sabe enrolado deveria renunciar. Limpa o caminho.  Aliás, todos os enrolados deveriam sair — e juntos, porque o primeiro que renunciar neste momento estará fazendo uma quase-confissão. Na verdade, mesmo saindo em bando, todos também estarão praticamente admitindo algum rolo, mas fazer o quê? Se não tem mais como virar o jogo. . . Mesmo porque, se os caras não saírem, o presidente Temer, para manter a capacidade de administrar, vai ter que demitir os denunciados e/ou enrolados e/ou apanhados.

Verdade que Temer desqualificou recentes denúncias envolvendo seu pessoal mais próximo. São apenas alegações, disse. Pois é, mas essas alegações se aproximam perigosamente da verdade. Em países como Japão e Alemanha, não tem nem conversa. Em situações como essa, aliás, em casos bem menos graves, a autoridade pede demissão, se desculpa e vai cuidar de sua defesa.  Aqui tem sido diferente — o sujeito nega até a última evidência. O problema é que essa evidência fica cada vez mais luminosa.
A regra de cair fora para não atrapalhar vale não apenas para ministros, mas para as demais autoridades, seja em que nível estiverem. Se não caírem fora, Temer terá que arranjar um jeito de se livrar da turma, e logo. Vejam, o ambiente econômico está claramente melhorando: inflação em queda sustentada, juros baixos no mundo todo, confiança em recuperação. Até a recessão, neste momento, é uma ajuda: com a atividade tão baixa, o Banco Central tem mais um poderoso argumento para uma “agressiva” queda dos juros. Já há especialistas prevendo que a taxa básica chegue ao final de 2017 na casa dos 9%.

Mas é parte essencial desse cenário o ajuste das contas públicas e as reformas que vão iniciar o longo trabalho de reconstrução da economia nacional. Ora, tudo isso depende do Congresso e, pois, da capacidade política do governo Temer de conduzir a votação das reformas. Como poderá fazer isso um governo envolvido em Lava-Jato, Cunha, Odebrecht, delações sem fim?  Do mesmo modo, como o Congresso poderá votar essa pauta tão importante com tantos membros já apanhados e tantos outros por apanhar nas prováveis delações de Cunha e da Odebrtecht?

Tudo considerado, ficamos assim: ou se faz uma limpeza geral ou o governo e as reformas não andam. Difícil? Ok, mas quem for comandar as reformas não pode estar envolvido na Lava-Jato.  E já imagino a pergunta do leitor: e se o próprio Temer estiver envolvido? Pois a história vale para ele também: será preciso arrumar um outro presidente, um outro governo. Nesse caso, o último serviço útil de Temer seria o de ajudar nessa transição.


Fonte: O Globo - Carlos Alberto Sardenberg, jornalista