Por que as pessoas não querem se endividar nem para investir nem para consumir? Porque não sabem como será o amanhã
Por que a
presidente Dilma não foi a Davos neste ano? Uma boa resposta: para não
criar atrito com os movimentos sociais, os sindicatos e a esquerda em
geral, que estão em Porto Alegre celebrando o Fórum Social.
Mas há
outra explicação: Dilma estaria muito desconfortável nos Alpes suíços, e
não por causa do frio. Ocorre que a presidente fez um longo discurso em
janeiro de 2014, lá mesmo, dando lições de como sair da crise e
garantindo que seu governo continuaria intransigente no controle da
inflação e no equilíbrio das contas públicas, sem descuidar do incentivo
ao crescimento.
Hoje teria que gastar todo o seu tempo tentando
explicar como as coisas podem ter dado tão errado. A economia
brasileira, que já não vinha bem, entrou na rota do desastre justamente
naquele ano de 2014. Dilma mudou três vezes o seu discurso. A
ortodoxia de Davos foi logo abandonada. Na medida em que a campanha
avançava, a presidente fazia o diabo para ganhar e mudou para a
plataforma Porto Alegre. Um assessor da candidata Marina comentou, lá
pelas tantas, que o estado deplorável das contas públicas exigia um
choque fiscal.
Dilma definiu: choque fiscal é cortar tudo para pagar juros aos bancos. Banco Central independente? Isso é pauta dos bancos, cravou a presidente. Logo, nada de ajuste, nem de elevar os juros, já que essas duas políticas seriam pró-ricos. A
terceira mudança, uma volta a Davos, se deu após a vitória. A
presidente convocou um ortodoxo para a Fazenda, Joaquim Levy, que
começou a fazer a... “pauta dos bancos”.
Mas como Dilma é uma
“esquerdista com mais conteúdo ideológico”, como disse Lula, ontem, a
presidente embarcou no ajuste contrariada. Acabou que o próprio governo
sabotou essa política econômica, a tal ponto que Levy não teve
alternativa senão pegar o boné. Agora, também como disse Lula,
Dilma precisa apresentar rapidamente a pauta do crescimento. E, de fato,
a presidente está falando em turbinar o crédito, por exemplo, via
bancos públicos.
Nessa confusão, nenhum caminho deu certo. A tal
política de estímulo ao crescimento terminou em inflação acima dos 10% e
uma recessão de 4% — dois recordes, duas realizações efetivamente
inéditas. E isso com os juros na Lua. O ajuste a meia boca e logo
interrompido deixou um... aumento de impostos. Aliás, outro dia a
presidente disse que precisava de mais impostos porque, com a atividade
econômica muito baixa, cai a arrecadação de tributos. Ora, é o
contrário, não é mesmo? Se as empresas já enfrentam queda de vendas,
tendo que cortar gastos e empregos — aumentar a carga tributária pode
ser o tiro fatal.
Aquela lógica só funciona para um governo que
não quer cortar os gastos nem fazer qualquer reforma. Só tomando mais
dinheiro do contribuinte conseguiria equilibrar as contas. Dá-lhe CPMF. Mas esse mesmo governo promete dar em troca o alívio do crédito. Não vai dar certo, de novo. Não
é que esteja faltando crédito. As empresas e as pessoas é que não
querem tomar dinheiro emprestado. Como notou o presidente do Bradesco,
Luiz Carlos Trabuco, certamente fonte autorizada e também amigo do
governo, a demanda por crédito hoje “é quase inexistente”.
E por
que as pessoas não querem se endividar nem para investir, nem para
consumir? Simples. Porque não sabem como será o dia de amanhã. Mas sabem
que do jeito que está, a coisa vai mal. Vale qual política
econômica? A do aumento do gasto público, em suas diversas modalidades?
Essa, o pessoal já sabe, terminou em completo desastre.
A outra,
tipo Davos, mal andou e já foi abandonada. Ok, volta-se a Porto Alegre.
Qual a chance de dar certo algo que já deu muito errado? Coloque em cima disso o risco político e se entende por que a previsão para este ano é de outra recessão.
LULA E OS JORNALISTAS
O
ex-presidente disse ontem que vai processar “todo mundo”. No caso,
trata-se dos jornalistas que, em sua avaliação, publicam mentiras sobre
ele, Lula, sua família, seus amigos, seu partido. [Lula, não processa por saber que ao processar jornalistas, blogueiros e 'todo mundo', vai possibilitar aos processados o direito de se defender - publicamente e com audiência maciça.
Os processados vão ter audiência na apresentação de suas defesas que vai amplificar e consolidar todas as acusações que fazem contra Lula e com apresentação de provas, indícios, pistas, detalhes que não são mostrados nas acusações.
Os questionamentos que a população faz e que só complicam Lula e familiares serão detalhados, explicados, provados.
Ótimo para o Brasil, para as pessoas de bem.
Processe. Tem milhares aguardando a oportunidade de ao se defenderem, apresentar provas, consolidando as acusações - e divulgando - tudo que você fez de errado, de criminoso. Você e familiares.
Uma oportunidade preciosa é que o teu pupilo, Luís Cláudio, vai ter que provar a motivação de sua empresa - sem funcionários e criada para marketing esportivo - receber milhões da indústria automobilística para fazer lobby em defesa dos interesses da mesma.
Ele também vai ter dificuldade para explicar como conseguiu ser tão cara de pau e apresentar como produto da milionária consultoria, material colhido na internet.
Isso é uma pequena amostra. ]
Tem esse direito.
A
liberdade não exclui a responsabilidade. O jornalista pode publicar o
que quiser, mas se veicular calúnia, injúria ou difamação, o ofendido
tem todo o direito de ir aos tribunais.
Míriam Leitão e eu
processamos — e já obtivemos uma primeira vitória — o funcionário do
Palácio do Planalto que alterou nossas biografias na Wikipedia,
incluindo trechos ofensivos e mentirosos.
O problema é que Lula
quer processar “todo mundo” porque acha que tudo que sai desfavorável a
ele, como as denúncias da Lava-Jato, é mentira. E se fosse assim, ele
devia começar processando o procurador Deltan Dallagnol e o juiz Sérgio
Moro, assim como todos os delatores.
Os jornalistas sérios só estão contando o que ouvem aqui e ali.
Fonte: Carlos Alberto Sardenberg, jornalista - O Globo