No Supremo há 273 inquéritos contra políticos, por corrupção. Como Lula e Collor, naufragaram nas promessas que corromperam. A Lava-Jato expõe o retrato desse fracasso de gerações
De novo, Collor
e Lula são candidatos à Presidência. Fernando Affonso, 68 anos, confirmou no
fim de semana em Arapiraca (AL). Luiz Inácio, 72 anos, será reafirmado pelo
Partido dos Trabalhadores, sexta-feira em Porto Alegre. [retificação: Fernando Affonso Collor de Melo, senador da República, em pleno gozo de seus direitos políticos é candidato ao cargo de presidente da República;
quanto a Luiz Inácio Lula da Silva, réu em seis processos penais, condenado em um deles a pouco mais de nove anos de cadeia, vitima frequente de delírios - causado por sua dependência química ao álcool - imagina ter condições de ser candidato a presidente da República.
Além de sua condição de condenado impedir tal ato - a Lei da Ficha Limpa impede que criminosos condenados em segunda instância sejam candidatos e Lula amanhã terá sua pena confirmada e retificada - por majoração - caso Lula fosse candidato seria fragorosamente derrotado, não ficando sequer entre os cinco primeiros colocados.]
Eram jovens promessas
na política quando disputaram, 29 janeiros atrás.
Collor
construíra uma história de êxito na oligarquia de Alagoas — um dos estados mais
pobres, governado por seu pai 35 anos antes, no rodízio entre senhores de
engenho e “coronéis”. Trocou o governo estadual pela aventura presidencial e
entrou na campanha com um caixa de US$ 12 milhões, coletado entre usineiros de
açúcar e álcool, que beneficiara com uma década de isenções fiscais.
Lula era
a antítese. Exaltava a biografia na moldura épica do migrante pernambucano que
chegou ao Sul e ascendeu à elite urbana paulista, depois de se arriscar na
liderança de greves em desafio à ditadura, empresas e à burocracia sindical
cevada na tesouraria governamental desde a Era Vargas. Foi o segundo operário e
líder sindical a disputar votos pela Presidência, na trilha aberta pelo
cortador de mármore carioca Minervino de Oliveira, vereador, ativista negro e
comunista no Rio de 1930.
Era a
primeira eleição presidencial direta depois de 21 anos de regime militar. Com
exuberância nos insultos, Collor e Lula conseguiram ocultar dos eleitores as
fragilidades de suas propostas para um país que ingressava na democracia sob
grave crise econômica (aluguéis de imóveis aumentavam 866% ao ano). Ofendiam-se
diariamente, na TV e no rádio. Collor caluniava Lula, acusando-o de planejar
“luta armada”, “banho de sangue” e “guerra civil”, sob “inspiração de Hitler e
Khomeini”. Lula injuriava Collor, xingando-o de “imbecil” nascido em “berço de
ouro” de uma família que “mata trabalhador rural”.
Collor
venceu, enquanto ruía o comunismo do Muro de Berlim. Renunciou antes de ser
deposto por corrupção, aprisionado na moenda política organizada por Lula e
pelo PT. Passados 17 anos, em 2009, desembarcaram do avião presidencial para se
abraçar nas ruas de Palmeira dos Índios (AL): “Quero fazer justiça ao Collor” ,
disse Lula. Comparou-o a Juscelino Kubitschek, cujo governo deflagrou a
expansão da indústria de metalurgia na periferia paulistana — onde surgiu o
sindicalista Lula.
Collor
foi absolvido pelo Supremo em 2014, por falta de provas. Amanhã é a vez de Lula
num tribunal, em súplica contra a condenação a nove anos e seis meses de prisão
por corrupção. Ainda tem outros cinco processos. Dos
quatro presidentes que o Brasil escolheu nas urnas desde a redemocratização,
[números que confirmam o acerto do Pelé quando disse: 'o povo brasileiro não sabe votar.'] dois acabaram destituídos (Collor e Dilma), um está no banco dos réus (Lula) e
o atual (Temer) precisou vencer três votações seguidas (no TSE e na Câmara)
para continuar no cargo e sustar seus processos por corrupção até o fim do
mandato, em dezembro. [apenas um foi destituído, Dilma, a escarrada; Collor renunciou diante do elevado risco de ser impedido.]
No Supremo
estão pendentes 273 inquéritos contra políticos, por corrupção. Como Lula e
Collor, todos ascenderam no ocaso da ditadura, dominaram o poder sob a
Constituição de 1988, mas naufragaram nas vagas promessas aos eleitores sobre
um país com horizonte bonito e tranquilo para as utopias políticas que eles
mesmos corromperam.
A
Lava-Jato está expondo o retrato desse fracasso de gerações.
José Casado, jornalista - O Globo