Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Largo São Francisco. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Largo São Francisco. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 19 de novembro de 2019

O quarto poder e a democracia - Valor Econômico

Robinson Borges

Para ser democracia, temos de ser plurais, o que só se dá, de fato, com liberdade de expressão e uma imprensa independente, que, mesmo imperfeita, não disputa poder, defende o presidente do Supremo

Depois de dar o seu voto decisivo e promover uma reviravolta no entendimento que permitia a execução da pena de prisão para condenados em segunda instância, Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), foi passar o fim de semana na calma Ilhabela, no litoral de São Paulo. Descontraído, vestindo calça de abrigo e camiseta, ele reuniu-se com um grupo de intelectuais na casa de Sonia e Tércio Sampaio Ferraz, um dos grandes mestres do Largo São Francisco, para discutir o quarto poder e a democracia.
 

 O Governo Militar - 1964/1985 - um regime forte, classificado erroneamente como ditadura militar,no qual o Brasil atingiu níveis de desenvolvimento excelentes.

E os anos de bonança, ocorreram sob a vigência do AI - 5 - Ato Institucional nº 5





Apesar do horizonte idílico, o tom às vezes era grave. “Não existe democracia sem imprensa livre. Não existe democracia sem liberdade de expressão”, disse Toffoli. “Para ser democracia, nós temos de ser plurais. Para sermos plurais, nós temos três funções de poder, mas é necessário que a sociedade tenha uma voz. A sociedade tem sua voz via imprensa.”Os encontros promovidos pelos Sampaio Ferraz são conhecidos como seminários da Feiticeira, em homenagem à praia onde o casal tem casa. Entre os convidados, a preocupação era sobre a extensão dos efeitos colaterais das novas mídias sobre a democracia.



O ambiente se transforma radicalmente com as plataformas digitais, as milícias virtuais e a proliferação de notícias falsas, concluíram. Toffoli, que abriu inquérito para apurar notícias fraudulentas que atingem o STF e seus familiares, afirmou que as “fake news” têm um propósito: “Fazer com que ninguém acredite em mais nada, porque alguém vai substituir esse nada”. Num país em que o primeiro imperador abdicou do trono, o segundo foi deposto e o primeiro presidente da República renunciou, há frequentemente uma desconfiança sobre a estabilidade dos governantes no cargo, afirmou Toffoli.



Duro com o Ministério Público (MP), o presidente do Supremo criticou a associação que, segundo ele, alguns meios fazem com esse braço do Estado em busca de informações para constituir a legitimidade da imprensa, que se daria na base do dia a dia. Hoje a mídia e o MP, seu “aliado preferencial”, seriam um “antipoder”, um conceito citado por Sampaio Ferraz. Na noite anterior, o anfitrião havia dito que o papel da imprensa de assegurar o bom funcionamento da representatividade como contrapoder e metapoder, nas sociedades democráticas, está sendo afetado: a mídia estaria atuando como antipoder, muitas vezes comprometendo a capacidade dos Poderes de agir.



Para Toffoli, as mídias sociais alteraram a dinâmica da informação radicalmente. Sua tese é a de que a imprensa, que disputava sua legitimidade diária com a política e seus representantes - com seu poder legitimado a cada quatro ou oito anos nas urnas -, tem uma nova concorrência. São os eleitores que entram na disputa o tempo todo, via mídias sociais, com os três Poderes. “Esse quarto poder está na mesma situação que os outros três Poderes, que é a sua crise de representatividade”, afirmou.



As redes sociais são fundamentais para compreender a política hoje, disse o presidente da corte. Jair Bolsonaro chegou à Presidência por ter captado o fenômeno antes. Além dele, outros foram bem-sucedidos apenas usando as mídias sociais e gastando pouco. Com isso, houve grande renovação no Congresso. “Só seis senadores se reelegeram”, afirmou Toffoli. Enquanto debatia em Ilhabela, ocorriam protestos em São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre, Brasília e Recife contra a decisão do STF sobre segunda instância, que beneficiou o ex-presidente Lula. Mas, para Toffoli, o tempo do Judiciário não é o da disputa política. “O Judiciário não se legitima no jornal, no Twitter”, disse ele. “Não precisa entrar nesse jogo de disputa de legitimidade. Tem o tempo a seu favor.”



Sampaio Ferraz ponderou que o Poder Judiciário não é eleito, tem outro tempo, como disse Toffoli, que não é o da política ou da imprensa, mas deveria dar estabilidade a uma forma de governo que tudo muda. “Ele não pode mudar na mesma velocidade”, disse o professor titular da USP. Depois do almoço, Joaquim Falcão, professor da Faculdade de Direito da FGV-Rio e membro da ABL, discordou da leitura de Sampaio Ferraz sobre a imprensa como antipoder. Disse que é missão da mídia “atrapalhar o governo”, sim, e tornar “o oculto público”. Para ele, mudam-se as tecnologias, mas essa é uma resposta consolidada na democracia. Destacou que o quarto poder não é contra poderes institucionais.



“O governo Trump também usa o Twitter para atrapalhar a sociedade.” Essa é a grande novidade: o uso intensivo das mídias sociais pelos governos constituídos. “Às vezes bem usado, às vezes mal usado. A democracia tem que ter um padrão do que é mal usado.” O questionamento feito por Eugênio Bucci, professor da ECA-USP, é se a democracia resistirá a esse novo ambiente. Para ele, os grandes conglomerados de tecnologia são as empresas com maior valor de mercado e que têm a meta de “negociar dados dos que se sentem usuários”.



Definiu imprensa como o relato factual tornado público por redações profissionais independentes. O que ocorre em outras plataformas digitais, afirmou, não se encaixa nesse conceito. Com a crise de representatividade do quarto poder, sua preocupação é quem cala a imprensa. Na China, por exemplo, já há internet controlada pelo Estado. “Sabemos que a China dissolveu a tensão entre Estado e mercado. Essa tensão sempre oxigenou a democracia.” A China está em vias de provar que a democracia é desnecessária para o desenvolvimento econômico, disse Bucci.



A crise do quarto poder, em sua perspectiva, é a da democracia. Como na China, a Rússia de Putin tem “falsos jornais”, com aspectos de jornal, com redações, mas que não são independentes. “Não estamos perdendo a imprensa. Estamos perdendo certas condições para manutenção da democracia.” No encontro da Feiticeira passaram pessoas que ocuparam postos em governos de várias colorações e que manifestaram seus pontos de vista divergentes longe da polarização e em clima de apreço pelo debate de ideias.



Como disse Toffoli, uma demonstração de que, para ser democracia, temos de ser plurais. Isso só se dá, de fato, com liberdade de expressão e uma imprensa independente, que, mesmo imperfeita, não disputa poder. Ocupa seu espaço com informações confiáveis e opiniões qualificadas, uma missão fundamental sempre, ainda mais quando o questionamento e o contraditório são vistos, por alguns, como ameaças.

Robinson Borges - Valor Econômico


quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Dilma, teu inimigo, o pior dos muitos que você tem é o Lula. Pior que a soma de Judas Iscariotes, Calabar e Joaquim Silvério. Ou você destrói Lula ou ele acaba contigo

A esquerda palaciana


Aécio Neves declarou, há pouco, que Levy enfrentará mais dificuldades com o PT que com a oposição


“Vamos fazer a disputa dentro do governo.” O objetivo, definido por Raimundo Bonfim, da Central de Movimentos Populares (CMP), é uma sentença opaca para os “de fora”, mas uma senha cristalina para osde dentro”. A “frente de esquerda” articulada duas semanas atrás numa reunião no Largo São Francisco, em São Paulo, é o veículo para a soldagem de partidos, centrais sindicais e movimentos sociais ao governo de Dilma Rousseff. É, ainda, de um modo menos direto, uma ferramenta da candidatura presidencial de Lula da Silva em 2018. 

O conclave contou com representantes do PT e do PCdoB, partidos governistas, mas também do PSOL e do PSTU. No Largo São Francisco, os dois partidos aceitaram a condição de sublegendas informais do PT. Lá estava a CUT, que obedece ao comando lulista, mas também a Intersindical, um pequeno aparelho do PSTU. A presença do MST, da Via Campesina e da Consulta Popular, três nomes para a mesma substância, inscreve-se no campo do óbvio. Mais relevante foi a participação do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e do Levante Popular da Juventude, que emergiram com ambições de autonomia em relação ao lulopetismo. 

A Arca de Noé da esquerda adotou uma agenda de manifestações cortada na alfaiataria do PT, cujos destaques são a reivindicação de uma Constituinte exclusiva para a reforma política e a “defesa da Petrobras”, uma bandeira que deve ser traduzida como a proteção das altas autoridades do governo diante das investigações da Lava-Jato. Curiosamente, enquanto acusam Dilma de rendição às propostas de política econômica de Aécio Neves, as correntes reunidas no Largo São Francisco desenharam o esboço de um Partido de Esquerda do Planalto. 

Duas mãos moveram o berço. A mão visível, de Guilherme Boulos, do MTST, funcionou como álibi para a adesão das correntes que pescam em águas situadas à esquerda do PT. A mão invisível, de Lula, apontou o rumo político da articulação, ancorando-a num porto encravado em sua esfera de influência. O espantalho convocado como pretexto para a adesão geral são as manifestações pela “volta dos militares”, que atiçam apenas o interesse de um setor ridiculamente marginal da sociedade. O jogo da verossimilhança solicitou a marcação de atos públicos pela cassação de Jair Bolsonaro, um oportuno inimigo do peito, e de repúdio ao golpe militar de 1964, que completa redondos 51 anos.

O Brasil não é para principiantes. Em tese, o “giro ortodoxo” do governo Dilma, personificado em Joaquim Levy, provocaria a configuração de uma oposição pela esquerda. Contudo, desde a ascensão do lulopetismo ao poder, a esquerda tornou-se caudatária do Palácio. A santa indignação dos “amigos do povo” contra a nomeação de Levy não se desenvolve na forma de uma ruptura política com o governo, mas em pedidos explícitos de compensações. Como esclareceu Lindbergh Farias, um petista que nunca viu motivos para camuflar o oportunismo, “fazer a disputa dentro do governo” significa emplacar “companheiros” em postos relevantes no aparelho de Estado — ou, no caso dos movimentos sociais, obter financiamentos da administração pública.

Kátia Abreu, Gilberto Kassab e Guilherme Afif são novas demonstrações da tese tantas vezes comprovada de que as convicções doutrinárias de nossos liberais conservadores não resistem à oferta de um feudo no condomínio do poder. Na era do lulopetismo, a constatação deve ser estendida a quase toda a esquerda. O segundo mandato de Dilma, iniciado sob os signos do fracasso e da crise, descortina a farsa em toda a sua amplitude: as lideranças reunidas no Largo São Francisco cumprirão dupla jornada, revezando-se entre manifestações encomendadas e conchavos de gabinete com emissários de Lula.

A “frente de esquerda” certamente atende aos interesses de seus participantes, mas, sobretudo, aos de Lula. O ex-presidente, cuja candidatura a um terceiro mandato surgiu ainda durante a campanha reeleitoral de Dilma, planeja jogar em dois times. Em princípio, alinha-se com o governo do qual é fiador. Nas semanas difíceis do segundo turno, diante do risco real de derrota, desdobrou-se em conversas com o alto empresariado para oferecer garantias de um retorno à racionalidade econômica. Por outro lado, desde a proclamação do resultado, manobra para desvincular a sua imagem dos efeitos da reorientação da política econômica. Na hipótese provável de erosão acelerada da popularidade do governo, Lula calibrará seu discurso no registro da “crítica pela esquerda”.

Aécio Neves declarou, há pouco, que Levy enfrentará mais dificuldades com o PT que com a oposição. O PSDB, sugere a declaração, estaria pronto a respaldar as “medidas impopulares” que derivam, em linha direta, de tantos anos de uma irracionalidade econômica fundada no cálculo político. Do ponto de vista de Lula, esse é o cenário ideal para a construção de uma candidatura aureolada pela promessa de retorno aos “bons tempos” de crescimento da renda e do consumo. O ministro da Fazenda faria o “trabalho sujo” do ajuste fiscal, com o apoio tácito da oposição e sob o bombardeio retórico da “frente de esquerda”. Na sequência, durante a etapa derradeira do governo agonizante de Dilma, Lula ergueria a bandeira dos interesses do “povo”, culpando a “elite” pelos sofrimentos impostos por um “banqueiro”. O longo ato de prestidigitação precisa apenas da colaboração de uma oposição incapaz de fazer política. 

Os “amigos do povo” coligados na “frente de esquerda” conhecem perfeitamente a regra do jogo. Todos eles, da esquerda do PT ao PSOL, passando pela CUT e pelo MTST, sabem que operam como marionetes no teatro lulista — e que seus gritos indignados contra um golpe militar tão antigo ou um Bolsonaro tão insignificante são gestos automáticos num espetáculo farsesco. Mas isso já não importa: eles se acostumaram com a subserviência, o preço justo que pagam pela sobrevivência.

Por: Demétrio Magnoli é sociólogo - O Globo