Trocar o chefe da Polícia Federal em seguida ao relatório que aponta
indícios vigorosos de que o presidente da República cometeu crime de
corrupção seria uma atitude acintosa de retaliação a uma instituição
que, embora subordinada ao Ministério da Justiça, tem sua autonomia
funcional garantida pela Constituição.
É claro que o novo ministro da Justiça, Torquato Jardim, tem todo o
direito de nomear seus subordinados, e seria impensável que a Polícia
Federal fosse intocável como o FBI de Edgard Hoover nos Estados Unidos, o
que entrou para a história como exemplo de politicagem de baixo
escalão.
Hoover espionava todos os presidentes e os chantageava para
permanecer no cargo. É claro que o presidente da República, tanto lá
quanto cá, tem o direito de trocar os que dirigem suas agências de
inteligência. Mas assim como Trump arranjou problemas por demitir James
Comey, então diretor do FBI, também Temer terá problemas com a desejada
demissão de Leandro Daiello.
Tudo devido ao momento em que as ações foram tomadas. Nos Estados
Unidos, Trump tentou paralisar investigações sobre a influência da
Rússia nas eleições americanas que o levaram à presidência. A crise só
aumentou, e uma investigação independente está sendo feita para saber
até que ponto o presidente dos Estados Unidos tentou obstruir a Justiça,
o que, se confirmado, pode leva-lo ao impeachment.
Aqui o nosso presidente já está sendo acusado de obstrução da
Justiça, e o pedido de processo contra ele pela Procuradoria-Geral da
República chegará ao Supremo Tribunal Federal na semana que se inicia. O
encontro do ministro da Justiça com o chefe da Polícia Federal no exato
momento em que foi anunciado que o inquérito sobre o presidente da
República foi concluído com a acusação de que houve crime de corrupção
passiva, e que a perícia no áudio da gravação de Joesley Batista mostra
que não houve nenhum tipo de montagem ou manipulação, é indicativo de
que está havendo uma movimentação do Palácio do Planalto para tentar
controlar as ações da Polícia Federal.
Se confirmada a interferência na Polícia Federal, ainda mais da
maneira que está parecendo, mais um ingrediente altamente explosivo será
acrescentado a essa receita de crise política. O ministro Torquato
Jardim foi nomeado em um fim de semana, justamente para que o ministério
da Justiça tivesse um maior controle sobre a Polícia Federal. Agora, em outro fim de semana, o novo ministro inicia o movimento,
mas tem que recuar da decisão, que parece já tomada, de trocar o chefe
da Polícia Federal. Informalmente, em uma reunião na véspera com os
representantes sindicais da categoria, ele havia dito que trocar a
direção da Polícia Federal está em seus planos.
O governo Temer é acusado, sem que se possa confirmar definitivamente
até o momento, de ter reduzido as verbas para a Polícia federal, no que
seria um primeiro passo para inviabilizar sua atuação. Na reunião com
os líderes sindicais, o ministro Torquato Jardim anunciou também que vai
transferir os agentes que se dedicam à parte administrativa, como
passaportes e controle de estrangeiros, para outros setores do
ministério, reduzindo a parte operacional da Polícia Federal, que
deixaria de poder usar esses agentes em casos de necessidade. Além do
mais, alegam os sindicalistas que esses agentes tratam de informações
confidenciais que são úteis a investigações.
Os principais articuladores da mudança na direção da Polícia Federal
seriam o ministro Eliseu Padilha, chefe da Casa Civil, e o general
Sérgio Etchegoyen, chefe do Gabinete de Segurança Institucional da
Presidência da República, cujo candidato seria o delegado Rogério
Galloro, o segundo na hierarquia da Polícia Federal, um policial “de
perfil mais político".
Tudo indica que o governo não se sente forte o suficiente para dar
esse passo ousado de tentar controlar a Polícia Federal. Mas os planos
são esses.
Fonte: Merval Pereira - O Globo
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domingo, 25 de junho de 2017
Plano abortado
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