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sábado, 14 de novembro de 2015

Ainda faltam explicações de Luis Claudio, filho de Lula


Em depoimento, filho de Lula não consegue explicar como ganhou R$ 2,5 milhões de consultor


À Polícia Federal, Luís Cláudio reconhece falta de experiência e empresário admite que cifras pagas eram “absurdas” 

Luís Cláudio da Silva é o filho caçula do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele tem 30 anos e é formado em educação física. Depois de trabalhar para times de futebol em São Paulo, Luís Cláudio resolveu se aventurar no mundo do marketing esportivo. Para isso, abriu uma empresa, a LFT, que não tem nenhum funcionário além dele. Logo, começou a prosperar. O primeiro contrato foi com o Corinthians, o time do coração do pai – que, na época, trabalhou abertamente para que a construtora Odebrecht viabilizasse um estádio para o clube, o Itaquerão. Luís Cláudio assinou um contrato de R$ 300 mil por ano com o time paulista, que previa a criação de campanhas de marketing para desenvolver o esporte amador e atividades lúdicas para crianças.


Corinthians pagou pelo menos R$ 400 mil a Luís Cláudio, filho de Lula, desde 2010
Depois de estrear no mundo empresarial no Corinthians, Luís Cláudio ganhou, entre 2014 e 2015, R$ 2.552.400 do escritório de consultoria de Mauro Marcondes, Marcondes & Mautoni, cuja especialidade era representar montadoras de carro. Luís Cláudio prestaria à consultoria de Marcondes consultoria técnica e assessoramento empresarial de marketing esportivo. E foi aí que começaram os problemas em sua vida. Luís Cláudio agora é um dos investigados pela Operação Zelotes, da Polícia Federal.

Seu nome surgiu após a PF começar a investigar Marcondes. Em 1o de outubro, ao noticiar a investigação, o jornal O Estado de S. Paulo publicou que Marcondes era suspeito de “comprar” medidas provisórias editadas entre 2009 e 2013 para favorecer montadoras, por meio de incentivos fiscais. Em 26 de outubro Marcondes foi preso. No dia 4 de novembro, Luís Cláudio foi convocado à superintendência da Polícia Federal, em Brasília. 

ÉPOCA obteve o depoimento com exclusividade. Obteve também o depoimento dado por Marcondes quando já estava preso no Complexo da Papuda, em Brasília. Os dois depoimentos sugerem que ainda há muito a ser esclarecido sobre o contrato de Luís Cláudio com a empresa de consultoria de Mauro Marcondes. “É como se um não soubesse por que pagou e outro não soubesse por que recebeu”, disse uma pessoa próxima à investigação.


Luís Cláudio disse aos investigadores que a empresa teve somente dois clientes até hoje: justamente o Corinthians e a consultoria de Marcondes, a Marcondes & Mautoni. No depoimento, ele tem dificuldades para explicar o que é consultoria técnica e assessoramento empresarial de marketing esportivo e para dizer quais suas qualificações para prestar esse serviço – que, aliás, afirma que realizou sozinho. Consta na declaração: “Que os projetos contratados pela Marcondes e Mautoni foram executados diretamente pelo declarante, que a formação do declarante é a graduação em educação física, não possuindo nenhuma especialização acadêmica em marketing esportivo” (leia trechos dos dois depoimentos ao longo desta reportagem). Em outro momento do depoimento, a PF pergunta sobre um dos projetos, calculado em R$ 1 milhão. O filho de Lula admite que nunca tinha feito aquele serviço antes. “Que nunca tinha realizado estudo ou projeto contendo o mesmo objeto dessa minuta deste contrato”, diz o depoimento. Para fazer algo que nunca tinha feito antes, Luís Cláudio recebeu R$ 1 milhão.
No total, Luís Cláudio e Marcondes acertaram seis serviços, entre junho e julho do ano passado, embora Luís Cláudio tenha afirmado que não executou todos. Os contratos, obtidos por ÉPOCA, têm de tudo um pouco: trabalhos relativos à Copa do Mundo, violência nos estádios e até um genérico “elaboração de análise de marketing esportivo como fator de motivação e integração nas empresas com exposição de casos e oportunidades”.

No depoimento, a PF tentava esclarecer uma pergunta simples: como se chegou ao valor milionário da consultoria? A memória de Luís Cláudio, contudo, falhava. “Não se recorda, neste momento, o valor desse projeto”, diz o depoimento. De acordo com Luís Cláudio, o valor milionário foi calculado a partir das horas trabalhadas. E quanto Luís Cláudio teve de trabalhar nos projetos contratados? Diz o documento: “Que utiliza como parâmetro a quantidade de horas trabalhadas para a fixação dos valores cobrados aos seus clientes nos projetos que executa, que não sabe mensurar, neste momento, o valor cobrado pela sua hora de trabalhar”. Mas quantas horas Luís Cláudio teve de trabalhar? De novo, ele não soube responder. Luís Cláudio tampouco sabe responder sobre o negócio. Qual a margem de lucro? E quanto custou para executar o projeto? “Que, neste momento, não tem noção de quanto foi o custo de execução desse projeto; que também não sabe, neste momento, declinar a margem de lucro obtida nesse contrato”, diz o documento.


A Polícia Federal fez uma mesma pergunta para Luís Cláudio, contratado, e Marcondes, contratante. Por que o escritório de advocacia escolheu a empresa LFT? “Que Mauro Marcondes nunca explicou ao declarante por que optou por contratá-lo; que não sabe dizer se o Mauro Marcondes realizou alguma pesquisa de mercado antes de contratar o declarante”, diz o depoimento. Marcondes, por sua vez, preferiu o silêncio.  No depoimento, a PF pediu que Luís Cláudio apresentasse os documentos que comprovassem os serviços prestados. Dias antes, a busca e apreensão no escritório da LFT tinha sido infrutífera. Os vizinhos relataram aos policiais que o escritório parecia que estava de mudança, em razão da intensa retirada de documentos.

Em seu depoimento, Luís Cláudio não apresentou relatórios que comprovassem os serviços prestados. À Polícia Federal, ele disse que, sim, produziu relatórios e que ficou com cópias, mas que havia entregue a advogados após a reportagem de O Estado de S. Paulo, para uma “confirmação jurídica”  – seja lá o que isso significa. O escolhido para guardar os documentos foi Roberto Teixeira, advogado do pai, Luiz Inácio Lula da Silva. Por que Luís Cláudio não levou à PF? “Além de não conhecer a legislação, não sabia da investigação em curso envolvendo o nome do declarante e também (disse que) é habitual os ataques à sua família por parte da imprensa.” Os documentos só foram entregues à PF após um mês da reportagem e da análise do escritório de Roberto Teixeira.

De acordo com Marcondes, “a contratação da LFT Marketing Esportivo refere-se à realização de estudo para um projeto de implantação de um centro de exposição numa cidade do interior de São Paulo”. Nada a ver com marketing esportivo. Marcondes, contudo, recusou-se a dar detalhes sobre o tal centro de convenções. O consultor, aliás, sempre optava pelo silêncio quando a PF o questionava sobre os serviços contratados com Luís Cláudio. Não explica, por exemplo, como escolheu a empresa do filho de Lula. Marcondes, contudo, admite que sabia que o valor pago era “absurdo”. De acordo com o depoimento, ele disse que fez uma “pesquisa superficial” para saber dos preços. Quem fez a pesquisa foi um estagiário da empresa de Mauro. “Ele constatou que eram absurdos”, disse Marcondes no depoimento. Isso, contudo, não o impediu de pagar cerca de R$ 2,5 milhões a Luís Cláudio, que trabalhava sozinho e nunca tinha prestado aquele tipo de serviço antes. Essa equação financeira está sendo investigada pela PF.



Marcondes também falou à PF sobre suas andanças no Palácio do Planalto, onde diz ter estado por “diversas vezes” durante o governo Lula, em razão de ser vice-presidente da Anfavea, a associação das montadoras. Ele citou nominalmente encontros com Gilberto Carvalho, para entregar estudos de interesse das montadoras. Gilberto também é alvo da Operação Zelotes. Marcondes afirma que “nas reuniões com Gilberto Carvalho não foram tratados assuntos referentes a edição de medidas provisórias para a prorrogação de benefícios fiscais”. Ele citou ainda que “a entrega dos documentos (a Gilberto Carvalho) ocorreu antes da edição da Medida Provisória 412/2009” – que prorroga incentivos fiscais para a compra de máquinas e equipamentos de uso na movimentação de cargas nos portos brasileiros.

Procurado por ÉPOCA, o advogado de Luís Cláudio, Cristiano Zanin Martins, disse: “Luís Cláudio Lula da Silva, profissional da área privada, já prestou às autoridades todos os esclarecimentos que lhe foram solicitados”. A assessoria do Corinthians disse que não poderia confirmar hoje qualquer função que Luís Cláudio tenha exercido no clube por meio da LFT, por não dispor dessas informações de bate-pronto. Contatado por ÉPOCA, o advogado de Mauro Marcondes não respondeu até o fechamento da reportagem.


Fonte: Revista Época