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domingo, 6 de março de 2016

Operação Lava-Alma

Sexta-feira, meio-dia. Animado por aguerridos defensores, rapidamente arregimentados pelos “movimentos sociais”, o ex-presidente Lula termina o seu depoimento no anexo da Polícia Federal do aeroporto de Congonhas e, em vez de voltar para casa, segue para a sede do PT. Convoca a imprensa para, mais tarde, disparar um discurso inflamado contra a Justiça, personificada no juiz Sérgio Moro, a mídia e as forças conservadoras que querem acabar com tudo que ele – e só ele – fez para o Brasil.

Sexta-feira, quase seis da tarde. O bater de panelas espontâneo, surgido do nada, anuncia que a presidente Dilma Rousseff estava falando na televisão. E pouco importava o que ela dizia. Ninguém queria saber. Depois de tanto mentir, em especial na campanha pela reeleição, quando prometeu fazer o diabo – e cumpriu -, Dilma não vale um tostão furado. Sua credibilidade é inferior a uma nota de três reais.

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Lula fungou, esbravejou e quase chorou por perto de meia hora. Tudo de acordo com o figurino. Nada explicou, até porque não era esse o objetivo dele. Esbanjou do direito de dizer asneiras, fez piada com coisas sérias. E não respondeu a uma só pergunta. Dilma falou por mais de 10 minutos. Tal como Lula, cercou-se de apoiadores para aplaudir seu monólogo. E não respondeu a uma só pergunta.

Próximos e distantes, estranhamente diferentes e parecidos, Lula e Dilma passaram a encarnar, cada um à sua maneira, tudo aquilo que o país repudia.  Ambos traíram a confiança que reiteradamente lhes foi depositada. Mentiram, enganaram. Possuíram o Estado como se deles fosse. São responsáveis ou coniventes com a corrupção. E, se um ou outro não se locupletou, deixaram que o dinheiro público escorresse como mel em beiços de companheiros.

Aos fatos, nenhum dos dois dão ouvidos. Dilma finge que preside o país. O mesmo que ela deixou ir à bancarrota por suas políticas erradas e erráticas, por arrogância, prepotência e birra. Lula continua arrotando que foi quem mais fez para os pobres, gerando crescimento e empregos, sem levar em conta que sua pregação está sendo ouvida não apenas por fãs, mas por quase 10 milhões de desempregados. Dilma e Lula falam de respeito, de postura republicana e de Estado de Direito, mas os dois desdizem o que querem fazer os tolos acreditar. Dilma insiste em mentir e Lula, mais agudo, há tempos não se preocupa se a fala de hoje contradiz a de ontem. Empreiteiros, hoje amigos do peito que prestam favores, eram vilões a serem combatidos. Políticos agora parceiros, do naipe de Fernando Collor de Mello, Paulo Maluf e Renan Calheiros, eram o mal em si. O poder econômico, materialização da ganância e da exploração dos pobres, tornou-se o principal aliado. É dele que emanam os milhões que sustentam o PT e o poder, o Instituto Lula, as palestras, os filhos e o que mais a Lava-Jato encontrar.

Ainda assim, Lula berra. Diz que foi sequestrado pela Polícia Federal, que se sentiu aprisionado. Elogia a educação dos agentes que o buscaram em sua casa, mas volta a espumar ao exigir respeito. Teve e merece tê-lo, assim como qualquer um.  Mas Lula quer muito mais. Quer regalias. Sua história seria “suficiente para não ser tratado como pessoa comum”, prerrogativa que Lula, quando presidente, ofereceu ao ex José Sarney, enrolado em diversas ilicitudes. Cabe lembrar que Lula acarinhou o então senador 22 anos depois de garantir à nação que Sarney era “impostor” e “ladrão”.

Nada de novo. Lula sempre foi, é e será assim mesmo. Age só de acordo com sua conveniência pessoal. Distribui perdão e culpa ao valete que o serve no momento. Usa, abusa e descarta.  Sexta-feira, oito e meia da noite. Sem a baixaria da guerra de torcidas organizadas que, estimuladas pela eterna pregação petista do “nós x eles”, durante o dia encenaram mais um espetáculo de intolerância de uns e burrice de muitos, aplausos e buzinas se fizeram ouvir em diversas capitais em apoio à Lava-Jato.

Prova inequívoca de que não adianta tergiversar. A Lava-Jato chegou à Lava-Lula, Lava-Dilma, Lava-PT, Lava-Aliados. E, ainda que as pessoas que insistem em não se enquadrar entre as comuns tentem, não há caminho de volta que impeça o país de lavar a sua alma.

Por: Mary Zaidan jornalista. E-mail: zaidanmary@gmail.com Twitter: @maryzaidan

 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Marisa Letícia, a fábula

Protagonista de absurdos dos canteiros em formato de estrela que mandou plantar nos jardins do Palácio da Alvorada e da Granja do Torto à requisição e obtenção de cidadania italiana para ela e a prole no segundo ano do primeiro mandato presidencial de seu marido , Marisa Letícia Lula da Silva volta à cena. E em grande estilo. Seria dela a opção de compra do tríplex frente ao mar no Guarujá, alvo de investigações do Ministério Público de São Paulo e da Lava Jato. O mesmo imóvel que já foi, era e nunca foi de Lula.



Idealizado pela Bancoop, cooperativa criada em 1996 pelos petistas ilustres Ricardo Berzoini, hoje ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, e João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, condenado a 15 anos e quatro meses pelo juiz Sérgio Moro, o tríplex apareceu na declaração do candidato Lula, em 2006, com um valor irrisório de R$ 47,6 mil. Referia-se a uma parcela do financiamento do Edifício Solaris, então na planta, em que outros petistas, incluindo Vaccari, tinham comprado apartamentos.

Até aí, o anormal era apenas o fato de a Bancoop lançar um empreendimento de alto luxo depois de já ter dado cano na praça, usurpando a poupança e os sonhos de mais de três mil cooperados. Algo que Lula, como sempre, alegará que não sabia.  A estapafúrdia história do tríplex não para aí. Em 2010, a assessoria de Lula garantiu que o apartamento pertencia ao ex. Quatro anos depois, o Globo publicou reportagem sobre o Solaris apontando que o prédio tinha sido concluído enquanto os mutuários da Bancoop continuavam a chupar dedos. E que a unidade de Lula e sua mulher tinha recebido tratamento de alto luxo da OAS, empreiteira que assumiu o empreendimento: elevador interno, substituição de pisos e da piscina. Tudo supervisionado e aprovado por Marisa Letícia.

De repente, com as investigações esquentando, o frente ao mar do casal (ou de Lula, conforme declaração anterior) virou um negócio exclusivo de Marisa Letícia. Do qual, no papel de The good wife, ela desistiu. Sabe-se hoje que as idas da ex-primeira-dama ao Solaris causavam frisson. Flores eram colocadas nas áreas comuns, todos ficavam sabendo quando ela chegava. Sabe-se ainda que o presidente da OAS, Leo Pinheiro, condenado pela Lava Jato a 15 anos de reclusão, esteve lá com ela em pelo menos uma das visitas.

E aqui vale a questão: o que faria o dono de uma das maiores empreiteiras do país acompanhar Marisa Letícia na vistoria de uma simples reforma de um apartamento se o imóvel não fosse do ex-primeiro-casal? Mas há muitas outras perguntas sem respostas. Em um artigo didático, o jornalista Josias de Souza mostra a ausência absoluta de nexo nas explicações de Lula. Argumentos que não explicam, confundem.

Confundir. Talvez seja essa a ideia ou a única saída imaginada por Lula. Sem conseguir dizer quanto pagou além dos R$ 47,6 mil declarados em 2006 ou apresentar recibos da desistência, com data e valores de reembolso exigidos, tudo que o Instituto Lula fala beira papo para engambelar otário. Nem mesmo a cota nominal para demonstrar que a opção de compra do apartamento foi mesmo de Marisa veio a público. São documentos simples, claros, objetivos. Mostrá-los livraria o Instituto Lula e o próprio ex de torturar os fatos.

Sem isso, resta a Lula, ao PT e aos militantes mais aguerridos atribuir tudo à perseguição histórica ao ex. Tudo tríplex reformado pela OAS, sítio recauchutado pela Odebrecht, filho que recebe R$ 2,5 milhões por consultoria via Google, os “não sabia” do Mensalão, do escândalo da Petrobras e tantos outros não passa de uma conspiração para “derreter Lula” e “destruir o PT”, como clama o presidente da sigla, Rui Falcão, no Facebook.

O conto do tríplex ainda vai longe. Mas de cara já se sabe: tem orelha de lobo, focinho de lobo, boca e dentes de lobo. Ninguém vai acreditar que é a vovozinha.

 Por: Mary Zaidan - Publicado em O Globo