Carlos Alberto Sardenberg
Chamou a atenção o forte aplauso da plateia quando o presidente Bolsonaro disse que o “tal de Queiroga” estava preparando um parecer para dispensar o uso da máscara para vacinados e pessoas que já tiveram a Covid.
O aplauso denunciou o que o presidente e sua turma pensam da máscara: um símbolo de fraqueza, frouxidão e de oposição ao seu governo. Por pouco Bolsonaro não atirou no chão a máscara que não usava. Radicalizou de novo. Ciência deixada de lado – o que não é novidade – a situação se encaminha para um conflito social e nas ruas: bolsonaristas não usam máscara; quem usar, pois, é inimigo.
Tudo errado. Inclusive a primeira declaração da Apsen, feita na quinta-feira, quando a história foi divulgada na CPI. Em nota, a empresa jurou que não tinha nada a ver com o presidente, que atuava no mercado e tal. Já contei aqui aquele ensinamento da psicanálise. Quando uma pessoa, sem ser perguntada, nega veementemente ter feito algo, pode cravar: é falso. Mais ainda: o presidente está em campanha direto. Aliás, parece que não gosta muito de trabalhar, não parece? Viaja toda hora. Está inaugurando até bica de água, como se diz na velha política.
Verdade que às vezes dá azar: sem ter nada a fazer ali, resolveu
entrar em um avião da Azul que estava estacionado no aeroporto de
Vitória. Pretendia apenas cumprimentar os passageiros. Tomou vaia. A questão é: quem vai colocar o guizo no gato? [houve um barulho geral, mistura de aplausos,uns poucos apupos e e uma voz esganiçada, de uma sem noção, gritando fora Bolsonaro - óbvio que a mídia militante, sempre inimiga do Brasil, do povo brasileiro e do nosso presidente, legendou apenas os gritos daquela sem noção.]
Como o presidente aparelhou órgãos policiais e de investigação – estão sendo processados os investigadores – sobra a CPI. E esta vai bem. Na semana que se encerra, a Comissão passou dos depoimentos mediáticos – mas com alguns bem reveladores – para a fase de análise dos documentos sigilosos, já devidamente vazados. Também determinou a quebra do sigilo telefônico e telemático de diversas autoridades, membros e ex-membros do governo Bolsonaro. Por essa via, se verá como foram tomadas as decisões de atrasar a compra das vacinas, de inventar o tratamento precoce, de tentar a imunidade de rebanho. Terá sido um programa organizado?
Isso vai para o relatório final e daí para as autoridades que podem agir, legalmente, bem entendido, contra o presidente. O clima político vai esquentar. A recuperação desigual da economia pode amortecer alguma coisa, mas não tudo isso que vai aparecendo.
A ver.
Carlos Alberto Sardenberg, jornalista
Coluna publicada em O Globo - Economia 12 de junho de 2021