Indicação de Petra Costa e seu filme à estatueta de documentário leva o drama nacional aos holofotes em Hollywood — e pela óptica peculiar e irreal do PT
Ela enlouquecia os políticos e até sua equipe com determinações como gravar na íntegra as sessões do impeachment. Petra contava com a simpatia explícita dos petistas e montou seu QG nos gabinetes dos então senadores Lindbergh Farias (RJ) e Gleisi Hoffmann (PR). Mas, no outro lado da Praça dos Três Poderes, teve de suar para convencer Dilma, personagem principal da opereta, a abrir-lhe as portas do Palácio da Alvorada. É uma ironia que Dilma, ao menos de início, tenha sido refratária ao filme. Na segunda-feira 13, quando Democracia em Vertigem foi indicado ao Oscar de documentário, a polarização brasileira ganhou os holofotes mundiais — e é com sua narrativa favorável à ex-presidente que o país irá ao prêmio máximo do cinema, em 9 de fevereiro.
Lançado em 190 países em junho passado, Democracia em Vertigem provocou de imediato reações extremadas por aqui. Os apoiadores de Lula e de Dilma sentiram-se de alma lavada: o filme é o lamento de uma mulher que viu os sonhos políticos de sua geração (ela hoje tem 36 anos) desabar com a derrocada do PT. [esqueceram que quanto mais o pt = perda total = afunda, mais o BRASIL CONSERVADOR, CRISTÃO, SOBERANO e fundado na ORDEM e PROGRESSO, cresce, se agiganta e se torna a PÁTRIA AMADA de um POVO FELIZ.]
O enredo corrobora a versão, tão alardeada pelo partido, de que o impeachment “foi golpe”. No lado oposto ficaram aqueles que enxergaram no impeachment a libertação do país da corrupção sistêmica dos doze anos do PT, exposta pela Operação Lava-Jato. Para essa massa de brasileiros, Democracia em Vertigem é um exercício vitimista apoiado numa visão convenientemente ilusória dos fatos.
A rinha manteve-se circunscrita às redes sociais até a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood dar a Democracia em Vertigem a chance de vender seu peixe em palco privilegiado. De O Quatrilho (1995) a Cidade de Deus (2002), o Brasil enfileirou indicações ao Oscar de filme estrangeiro e até das categorias principais. Na seara dos documentários, o país havia figurado como parceiro menor em coproduções transnacionais como Raoni (1978). Um documentário de produção genuinamente nacional no Oscar é a primeira vez — com o adendo de que Petra poderá ser a primeira mulher latino-americana a levar a estatueta.
Entre as inúmeras imprecisões, há ao menos um caso de adulteração deliberada da história. Quando Petra se refere à execução de dois militantes comunistas pela ditadura, em 1976, surge em cena a foto dos cadáveres no chão. Na imagem original, havia armas ao lado dos dois mortos — no filme, elas sumiram. Quando o detalhe veio à luz, a documentarista assumiu que apagou as armas, sob a justificativa de que a Comissão da Verdade mostrou que elas foram plantadas na cena pela polícia. É justo indignar-se com as artimanhas da repressão nos anos de chumbo, mas usar a manipulação como recurso contra a manipulação é um evidente despropósito. “Nesse episódio, e Petra é a primeira a reconhecer, ela cometeu um erro. Foi decisão que tomou precipitadamente, sem avaliar as consequências”, diz Eduardo Escorel, cineasta que prestou consultoria à produção.
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ANTES… – Foto original dos militantes mortos nos anos 70 [a fraude é confirmada pela chamada cineasta, quando na realidade é uma fraudadora confessa.]
…E DEPOIS – No documentário: para “corrigir” a história, a diretora apagou as armas, sem informar o espectador //Reprodução
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Publicado em VEJA, edição nº 2670, de 22 de janeiro de 2020
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