Doria, com ida a Miami, e Covas, com alta salarial, não atentam para simbolismo
Descaso
e soberba uniram os tucanos João Doria, governador de São Paulo, e Bruno Covas,
prefeito da capital paulista, em erros políticos cometidos nos últimos dias. Doria
frustrou expectativas que ele próprio criara ao adiar a divulgação de dados
relativos à eficácia da Coronavac, o imunizante contra a Covid-19 produzido em
parceira com a chinesa Sinovac. Descobriu-se, ademais, que o governador havia viajado
a Miami, com a mulher, para alguns dias de lazer. [na Flórida não usou máscara, sendo que sua ilustre esposa tentou justificar dizendo ser ele um asmático.]
Na mesma semana de Natal, Covas deu-se de presente um reajuste salarial de 46,8%, ao sancionar texto aprovado pela Câmara Municipal que beneficia ainda o vice-prefeito e os secretários municipais, além de elevar o teto para os vencimentos do funcionalismo.
É o governador quem tem mais a perder, sem dúvida, com a desatenção arrogante ao impacto simbólico de seus atos. Afinal, no afã de se fortalecer como postulante ao Planalto em 2022, ele busca se diferenciar do padrão de irresponsabilidade, despreparo e ausência de empatia de Jair Bolsonaro.
Ganhou valiosa oportunidade de assumir o papel de protagonista e equiparar-se aos governantes internacionais que agiram com presteza para dar início à vacinação —e também a chance de desfazer as impressões de oportunismo e individualismo que deixou em sua ainda curta trajetória na vida pública. O empresário que abraçou a política já havia se desgastado ao abandonar o mandato de prefeito para concorrer ao governo do estado. Na campanha, em que pese a vitória, acumulou desconfianças sobre a retidão de suas convicções ao associar-se à maré bolsonarista.
A viagem desastrada a Miami foi devidamente explorada por Bolsonaro e repudiada até mesmo por correligionários. Na tentativa de minimizar os danos, o tucano divulgou um vídeo com um pedido pouco convincente de desculpas.
Sucessor
de Doria no governo municipal, Covas tem decerto ambições menores —o que não
autoriza a ligeireza com que tratou do próprio contracheque num cenário de
pandemia, desemprego elevado e contas públicas em frangalhos.
Em outro momento poderiam soar razoáveis argumentos como a defasagem salarial acumulada desde 2012 e o reajuste ter sido inferior à inflação acumulada. Agora, a medida reduz a credibilidade de um prefeito que precisa pedir sacrifícios à população. Elitismo e imodéstia são defeitos desde muito apontados pelos críticos do PSDB, nem sempre justamente. Desta vez, de fato, nomes que encabeçam a renovação do partido não se ajudaram. [destaque-se que além de viajar a lazer enquanto seus governados são confinados por determinação sua, Doria se associou ao prefeito Bruno Covas - que se autoconcedeu reajuste salarial, em tempos de pandemia - para retirar dos idosos gratuidade de passagens em transporte coletivo municipal e intermunicipal.
Enquanto o presidente Bolsonaro tenta romper a manifesta má vontade do Congresso, ainda sob Alcolumbre e Maia, e conseguir algum tipo de ajuda para milhões de brasileiros necessitados, o João Doria e Bruno Covas retiram dos idosos, faixa de 60 a 65 anos de idade, beneficios que recebem (recebiam) desde 2013.]
Opinião - Folha de S. Paulo