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quarta-feira, 9 de agosto de 2023

MST, 8 de janeiro e ONGs - Uma sequência de depoimentos explosivos em CPIs - Alexandre Garcia

Gazeta do Povo - VOZES

Há uma grande expectativa para esta quarta-feira, na CPI do MST, com o depoimento do ministro-chefe da Casa Civil do presidente Lula, Rui Costa. Ele será questionado sobre o tempo em que foi governador da Bahia e os acontecimentos no sul do estado, que foi e ainda é uma região conflagrada, com invasão, violência, expulsões e violação do direito de propriedade. 
A queixa é a de que o governo da Bahia não agia, tanto que o presidente da República tentou mandar tropas da Força Nacional para proteger as pessoas naquela área. Vai ser interessante.
 
Quem brilhou na CPI das ONGs nesta terça foi o jornalista mexicano Lorenzo Carrasco, que veio pra cá como correspondente nos anos 1980, aqui ficou e se tornou grande estudioso das milhares de ONGs que pululam na Amazônia. Ele descobriu que elas não estão lá para levar benefícios sociais para as amazônidas, e denunciou isso num livro chamado Máfia Verde
Finalmente há uma CPI no Senado que está tratando disso. 
A CPI deveria ter saído muito antes, porque era a primeira da fila quando surgiu a pandemia, mas acabou deixada de lado para fazerem aquela CPI do circo.
 
Outra grande expectativa era o depoimento de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, que durante os acontecimentos de 8 de janeiro era secretário de Segurança Pública do Distrito Federal. 
Ele foi autorizado a ficar calado pelo ministro Alexandre de Moraes, mas achou que não se incriminaria e botou a boca no mundo
 Mostrou que havia um protocolo de ação integrada, que estava tão perfeito que ele pensou que podia tirar férias e foi para a Flórida. 
Disse que achou tudo muito estranho quando vieram os avisos de invasões, pois havia uma disponibilidade de 800 militares, tanto da Força Nacional quanto da guarda presidencial, para proteger as sedes dos três poderes, mas foram acionados só 30 para o Palácio do Planalto. Torres não acusou ninguém, mas vai ser confrontado com um delegado da Polícia Rodoviária Federal
O ex-ministro disse que a Polícia Rodoviária Federal, no Nordeste, não agiu para evitar que eleitores de Lula fossem às urnas, mas aprendeu dinheiro de compra de voto, dinheiro vivo.

Por fim, sigo estranhando essa dificuldade toda de fornecer as imagens do Ministério da Justiça. As imagens estão disponíveis, o ministro Alexandre de Moraes disse que podiam entregar, e até agora nada.

Onde estão as imagens do aeroporto de Roma?
Falando em imagens, não custa lembrar que as imagens do aeroporto de Roma ainda não vieram
Há uma abundância de câmeras no aeroporto de Roma, porque ele é muito importante nas rotas para o norte da África e para o Oriente Médio. Mas a Itália só fornecerá as imagens se forem de um crime comum e não perseguição política. 
E o Brasil já provou que é caso de perseguição política, porque entraram na residência do casal, com busca e apreensão, para tirar telefone, computador, para fazer pesca probatória, quando no máximo houve uma injúria
- até mesmo vias de fato, que é contravenção penal, não justificava tudo aquilo. A Itália percebeu e tem de fazer jus ao fato de ser o berço do Direito romano.
 
Lewandowski, quem diria, agora reclama de insegurança jurídica
O ex-ministro Ricardo Lewandowski, agora na J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, disse que decisões diferentes do Supremo, principalmente na área tributária, causam insegurança jurídica. 
É claro que causam; espantam investidores, tanto nacionais quanto estrangeiros. 
Mas Lewandowski se esqueceu de falar da insegurança política e institucional criada no dia em que ele, como presidente do Supremo, presidiu o julgamento de Dilma no Senado e ignoraram o parágrafo único do artigo 52 da Constituição, condenando a presidente e deixando-a elegível, ao contrário do que mandava a Carta Magna
Isso foi o início de uma série de decisões que geraram insegurança política e institucional do Brasil.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 


domingo, 30 de julho de 2023

O histórico de abusos de corpos negros - O Globo

Dorrit Harazim

Igreja onde Emmett Till foi velado Scott Olson/Getty Images/AFP
 
Na terça-feira, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou a criação de um Monumento Nacional em memória do menino negro Emmett Till e de sua mãe, Mamie Till-Mobley. Na verdade, serão três os monumentos que evocarão o assassinato de Emmett, com requintes de selvageria, por supremacistas brancos nos idos de 1955. 
O primeiro será erguido na igreja de Chicago onde o garoto fora velado; o segundo, na ravina do Rio Tallahatchie, no Mississippi, onde encontraram seu corpo brutalizado; e um terceiro, certamente o mais significativo, na entrada do tribunal onde os matadores confessos, dois irmãos graúdos, foram rapidamente absolvidos por um júri branco.

À época, a mãe-coragem de Emmett obrigara o país a encarar o que restara do filho: uma massa disforme e desumanizada exposta em caixão aberto, sem retoques. Como já relatado neste espaço, a atrocidade serviu de catalisador para o Movimento pelos Direitos Civis que galvanizaria o país na década seguinte.

Passaram-se quase 70 anos. Desde então, 12 presidentes ocuparam a Casa Branca. Ainda assim, Biden achou necessário explicar ao país o motivo de um memorial nacional para os dois corpos negros.— Vivemos tempos em que se tenta banir livros, enterrar a História — disse o presidente. — Por isso queremos deixar bem claro e cristalino: embora a treva e o negacionismo possam esconder muita coisa, não conseguem apagar nada. Não devemos aprender somente aquilo que queremos saber. Devemos poder aprender o que é preciso saber.

Reparações históricas e desculpas oficiais costumam vir na rabeira da própria História. E com frequência nada reparam. Ainda assim, acabam compondo um retrato das feridas de cada nação. No caso atual, a iniciativa de Biden não deve ser descartada como mero artifício eleitoreiro visando ao pleito de 2024. Há também uma real preocupação com um surto de apagamento histórico em curso na América profunda e retrógrada. Quando governadores extremados como Ron DeSantis, da Flórida, ou Greg Abbott, do Texas, ordenam escolas e bibliotecas públicas a varrer das estantes clássicos da literatura negra e LGBTQIA+, um monumento nacional à coragem de Mamie Till chega em boa hora.[o que mais evidencia o caráter eleitoreiro da iniciativa do democrata cujo governo prima pela INcompetência e desacertos.]

Para a população negra dos Estados Unidos, existe uma ferida coletiva que nenhuma reparação ainda conseguiu cicatrizar. Ela tem nome extenso: Estudo Tuskegee de Sífilis Não Tratada no Homem Negro. Trata-se do mais longo experimento não terapêutico em seres humanos da História da medicina. Ele durou de 1932 até 1972 e teve como propósito estudar os efeitos da sífilis em corpos negros. 
Por meio de concorridos convites divulgados em igrejas e plantações de algodão, o Instituto de Saúde Pública da época selecionou 600 homens, todos filhos ou netos de escravizados. 
A grande maioria nunca tinha se consultado com médico. 
No grupo, 399 estavam contaminados pela doença, e 201 eram sadios. Aos contaminados foi informado apenas serem portadores de “sangue ruim”. Como o estudo visava à observação da doença até o “ponto final” — a autópsia —, os doentes foram ficando cegos, dementes e morreram sem conhecer a penicilina, que a partir dos anos 1940 se tornou o tratamento de referência para sifilíticos. 
A família dos que morriam recebia US$ 50 para cobrir o enterro. 
A pesquisa só foi interrompida em 1972, quando o jornalismo da Associated Press revelou a história, levando o governo americano a pagar US$ 10 milhões em acordo coletivo com os sobreviventes.

Oito deles, já quase nonagenários, estavam no Salão Leste da Casa Branca em maio de 1997 quando o então presidente Bill Clinton pediu desculpas públicas pelo horror cometido. Em discurso marcante, falou em nome do povo americano: — O que foi feito não pode ser desfeito. Mas podemos acabar com o silêncio, parar de desviar do assunto. Podemos olhá-los de frente para finalmente dizer que o que o governo dos Estados Unidos fez foi uma ignomínia, e eu peço desculpas.

Ainda assim, passado menos de um ano, nova barbárie experimental veio à luz, desta vez com cem meninos negros e hispânicos de Nova York arrebanhados por três instituições de renome científico. 
Todos eram irmãos caçulas de delinquentes juvenis e tinham idade entre 6 e 11 anos. 
O estudo pretendia demonstrar a correlação entre determinados marcadores biológicos e o comportamento violento em humanos. Para isso, aplicaram nas crianças injeções intravenosas de fenfluramina, substância posteriormente associada a danos à válvula mitral. Às mães que os levavam ao local do experimento foi oferecida uma recompensada de US$ 125 .

Tudo isso e muito mais faz parte do pesado histórico de abuso de corpos negros, até mesmo em nome da ciência. Não espanta, portanto, a rejeição quase atávica à obrigatoriedade de vacinação contra a Covid-19 manifestada pela população negra em tempos recentes. A retirada de circulação ou dificuldade de acesso a livros que narram essas vivências deveriam ser impensáveis em 2023. É sinal de uma sociedade adoecida pelo medo de livros.

Dorrit Harazim, colunista - O Globo


segunda-feira, 24 de julho de 2023

Expulsão partidária de suspeito de hostilizar Moraes foi precipitada - Alexandre Garcia

Vozes - Gazeta do Povo 

Política 

Próximo dia 25 é dia do caminhoneiro e também dia do colono. Em Santa Cruz do Sul (Rio Grande do Sul) eu assisti, no domingo, a um desfile que durou mais de duas horas, com uma quantidade gigantesca de caminhões, demonstrando o poder do motorista de caminhão. 
Por que foi no domingo? 
Porque durante a semana os motoristas vão estar na estrada. 
Eles não têm tempo de parar para comemorar. 
Aproveitaram o domingo para isso. A grande função desses homens e mulheres é, na cabine dos caminhões, transportar a maior parte da riqueza do país. Fica aqui o meu abraço.
É dia também do colono, do imigrante. A primeira leva de alemães chegou aqui em 1825. 
Depois vieram os italianos. Depois, os poloneses, os japoneses. 

Essa é a mescla maravilhosa que formou este país. Vivemos agora uma época em que querem nos separar por cor da pele, por etnia, por sei lá o quê... Tem outra também. O presidente Lula falou em Cabo Verde, agradecendo a produção no Brasil por 350 anos de escravidão. A frase saiu muito, muito estranha.

Mas nós somos uma mescla de tudo. Do indígena que aqui estava quando Cabral chegou, do europeu, do africano, do asiático.  
Uma mescla do mundo. É um país que tem uma raça transgênica e ainda cai na conversa de gente que diz que não pode plantar transgênico. Quando nós somos a prova de que dá certo a mistura.
 
Educação norte-americana ensina valores fundamentais
Eu falava ontem com um brasileiro que mora na Flórida (Estados Unidos) e está muito feliz seus filhos estarem nas escolas de lá. Ele fala: "a diferença é que meus filhos estão aprendendo para a vida; estão aprendendo disciplina, organização, cumprimento de leis, respeito aos compromissos, aos horários".  
A gente aqui é meio bagunçado. Os Estados Unidos tem praticamente a mesma idade do Brasil e é a primeira potência do mundo.
 
Uma expulsão precipitada
Antes mesmo de qualquer julgamento, de qualquer prova, de qualquer coisa mais forte, o PSD já expulsou o Roberto Mantovani Filho, que está envolvido na acusação de ter xingado o ministro Alexandre de Moraes
Exatamente o mesmo ministro que, lá no plenário do Supremo Tribunal Federal, disse para todo mundo ouvir que quem não quiser ser satirizado, ser criticado, que não entre na vida pública. 
Mantovani entrou no partido em 2016. Em 2004 ele foi candidato a prefeito apoiado por Lula, porque tinha como vice um candidato do PT.

O advogado de Mantovani me disse que entregou à Polícia Federal um vídeo de 10 segundos muito importante daquele episódio. [e os vídeos das câmeras do aeroporto de Roma o que mostram sobre o bate-boca?]

A volta do toma-lá-dá-cá
O presidente Lula esta negociando sete ministérios e quatro estatais com o Progressista, o União Brasil e o Republicanos. 
Virou notícia porque nos quatro anos anteriores a gente não ouvia falar disso, de negociação para entregar ministérios para partido político.

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


terça-feira, 4 de julho de 2023

Pastor que sugeriu morte de gays abre nova guerra entre direita e esquerda

Flávio Dino, Gleisi Hoffmann e Fabiano Contarato pedem punição de André Valadão por fala em culto; 

Flávio Bolsonaro e Feliciano veem perseguição religiosa

A polêmica – para dizer o mínimo – fala do pastor André Valadão, da Igreja Batista da Lagoinha, durante um culto em Orlando (EUA), na qual sugere a morte de pessoas LGBT+, detonou uma nova guerra entre direita e esquerda na política brasileira. [Opinião de um leigo  no juridiquês, e católico
- o fato ocorreu na Flórida, EUA, e certamente pelas leis locais não é crime; ao que sabemos quando é solicitada àquele país a extradição de um brasileiro ela só é concedida pelos norte-americanos se o fato pelo qual o brasileiro foi condenado,  seja considerado, pelas leis de lá, crime. Caso contrário sem extradição. Por analogia, não tem sentido o Brasil condenar alguém por ter praticado,  em solo estrangeiro, um ato que pelas leis locais NÃO É CRIME; e, 
- salvo engano nosso, no Brasil, quando certos comentários são  proferidos no interior de uma igreja durante cerimônia religiosa não constituem crime.]

Durante a pregação religiosa no domingo, 2, Valadão falou sobre “recomeçar do zero” a sociedade em relação às pessoas LGBT+. “Aí Deus fala ‘se eu pudesse, matava tudo e começava tudo de novo, mas já prometi para mim mesmo que não posso, então agora está com vocês'”, declarou o pastor na cerimônia transmitida pelas redes sociais.

Vários parlamentares de esquerda foram à tribuna do Congresso e ao Ministério Público Federal denunciar o líder religioso. “Por tudo que sou, pelo que acredito, pela minha família e por tudo que espero para a sociedade, não posso me calar diante do crime praticado por André Valadão. Vamos representar criminalmente para que ele responda por manipular a fé e incitar a violência”, diz o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato, que é gay. Na representação que fez ao MPF, ele pede a prisão de Valadão. “Pastor bolsonarista Andre Valadão tem que ser punido por incitar o ódio e ataques contra a comunidade LGBTQIA+. Não dá pra normalizar esse absurdo. Mentiu sobre Lula fechar igrejas nas eleições e continua praticando crimes. Não pode usar o nome de Deus para pregar a violência”, postou a deputada Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT [agora uma a toa, ops... atéia, quer dar palpites em assuntos de religião? Finge esquecer que o comunismo é  intimamente ligado ao demônio.].

“O suposto cristão que propaga ódio contra pessoas, por vil preconceito, tem no mínimo dois problemas.  Primeiro, com Jesus Cristo, que pregou amor, respeito, não violência contra pessoas. ‘Amar ao próximo como a si mesmo’, disse Jesus. Segundo, com as leis, e responderá por isso”, anunciou o ministro da Justiça, Flávio Dino.

Outros parlamentares, como a deputada Erika Hilton, primeira mulher trans eleita para a Câmara dos Deputados, também foram ao MPF denunciar o pastor.

Defesa
Do outro lado do espectro ideológico veio a defesa de Valadão. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), disse nesta terça-feira, 4, que o que está acontecendo é perseguição religiosa. 
 “Aos que estavam duvidando… a perseguição chegou dentro das igrejas, é o início do fim do resto que ainda tínhamos de liberdade religiosa”, disse, ecoando uma pregação que a direita fazia na campanha contra Lula.

O pastor e deputado Marco Feliciano (PL-SP) foi à tribuna da Câmara para dizer que Valadão é “um homem íntegro, um homem de família”, que “tem sido atacado covardemente pela extrema imprensa, que insiste em distorcer as falas, separam palavras” para “destruir a imagem e a reputação das pessoas”.

Criticou deputados de esquerda que atacaram Valadão, inclusive o pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), a quem chamou de “canalha”. Tentou, ainda, mostrar que Valadão citava um trecho bíblico relativo ao dilúvio e atacour qualquer outro tipo de união que não seja entre homem e mulher. “Não tem como as pessoas transigirem nesses assuntos”. E mandou um aviso a quem quer enquadrar Valadão. “Não se pode meter em assuntos de igreja”, disse.

Na segunda-feira, André Valadão, que está em Orlando, na Flórida, gravou um vídeo reagindo à polêmica e também disse ter sido mal interpretado. “Nunca será sobre matar pessoas, Deus nos livre deste terrível pecado”, declarou o pastor em vídeo publicado nas redes sociais, em que também se diz vítima de censura e “constrangimento”.

Blog Maquiavel - Revista VEJA


quarta-feira, 14 de junho de 2023

Por que as consultorias em diversidade estão tomando conta das empresas - Gazeta do Povo

Ideias - Omar Godoy
 
Militância corporativa
 
 
Críticos afirmam que os programa de DEI não funcionam na prática e podem estimular um pensamento homogêneo e conflitos internos nas empresas e instituições.| Foto: Bigstock
 
Todos os anos, o Big Brother Brasil ajuda a popularizar carreiras que até então não eram tão conhecidas do grande público
Foi assim com os DJs, sushimen, influencers, lutadores de MMA, designers de unhas, hipnólogos, instrutores de crossfit, drag queens, etc. Em 2023, a participante de Osasco (SP) Sarah Aline trouxe à tona uma atividade em franco crescimento no país: ela é analista de diversidade.

O nome parece retirado de um esquete de humor, mas a possibilidade de ingressar na nova profissão vem atraindo um número cada vez maior de psicólogos, educadores jornalistas, publicitários e toda a sorte de ativistas e militantes. Só no LinkedIn, rede social de buscas por empregos, são mais de seis mil vagas abertas na área – que, em resumo, consiste em incluir e promover grupos minorizados e sub-representados nas organizações.

Nos Estados Unidos, no entanto, a chamada indústria de DEI (diversidade, equidade e inclusão) passa por um momento de reavaliação e desconfiança. Inclusive por parte dos próprios especialistas desse mercado, que movimenta mais de U$ 8 bilhões por ano, segundo a consultoria McKinsey. Para os críticos, a maioria dos programas de DEI são apenas performáticos e não funcionam na prática. E o pior: podem estimular um pensamento homogêneo e conflitos internos nas empresas e instituições.

Autora de livros como ‘DEI Deconstructed’ e ‘Reconscruting DEI’, a analista e estrategista Lily Zheng se tornou uma das principais vozes dissonantes emergidas das entranhas do setor. Em entrevistas e artigos divulgados na imprensa e nos meios acadêmicos norte-americanos, ela destaca o rápido crescimento da área nos últimos três anos (impulsionado por acontecimentos como a pandemia e a comoção em torno do assassinato de George Floyd) e garante que as consultorias criam um impacto momentâneo, mas não trazem resultados a longo prazo.

Para a autora, organizações públicas e privadas, incluindo universidades, estão gastando rios de dinheiro sem definir metas claras, planos estratégicos e ferramentas para medir o sucesso dos programas de DEI – implantados de forma arbitrária e oferecidos por empresas que prestam serviços praticamente idênticos. Zheng ainda faz alertas com relação a alguns efeitos colaterais causados por consultorias e treinamentos desenvolvidos de forma apressada e com poucos critérios. Um deles dá conta da reação negativa e da falta de envolvimento por parte de funcionários pertencentes aos grupos ditos privilegiados. “Mesmo entre os líderes brancos que se preocupam com o trabalho de DEI, há uma parcela de 70% que simplesmente não participam dos processos porque sentem que os consultores não os querem por perto. E sabemos que atribuir culpa e vergonha às pessoas não funciona”, explica a analista em um ensaio publicado no site da Harvard Business Review.

Também chama a atenção o caso da pedagoga e professora negra Tabia Lee. Contratada para ser a diretora de Equidade, Justiça Social e Educação Multicultural da faculdade comunitária De Anza, na Califórnia, ela foi desligada pouco tempo depois de assumir a função, por questionar a “ortodoxia antirracista” adotada pela instituição. “Fui demitida por fazer perguntas”, alega Lee, chamada (pasmem!) de “supremacista branca” por colegas de um grupo organizado de docentes assumidamente socialistas.

A pedagoga relata que seu calvário de cancelamento começou com a recusa a usar termos de gênero neutro em documentos e nas conversas cotidianas. Em outro desentendimento interno, ela contestou a grafia da palavra “negro” sempre com a primeira letra maiúscula – enquanto “branco” aparecia só com minúsculas. O estopim aconteceu quando Lee não reconheceu o espaço do campus como terra indígena pertencente a uma tribo da região.

Diante de controvérsias como esta, governadores de estados como Flórida, Ohio e Texas iniciaram um processo de interrupção de investimentos em programas de DEI nas universidades públicas. Muitos dos cortes são justificados a partir de estudos realizados por ONGs voltadas para a defesa da liberdade de expressão – uma pesquisa recente da entidade FIRE, por exemplo, mostra que mais de 80% dos alunos admitem se autocensurar em sala de aula com medo de serem prejudicados por professores com posicionamentos radicais de extrema esquerda.

Ou seja: a reação à cultura do DEI nos Estados Unidos vai além das críticas à falta de foco das organizações e dos bilhões desperdiçados em ações de utilidade duvidosa. A preocupação, agora, é que programas aparentemente inofensivos estejam servindo como porta da entrada para a introdução de ideologias radicais até nas companhias mais tradicionais do país.

Vide o caso recente da Chick-fil-A, cadeia de lanchonetes fundada em 1946 no estado da Georgia. Com cerca de 2, 5 mil unidades, a marca ficou conhecida não apenas por seus sanduíches de frango produzidos à moda antiga e pela capacidade de se espalhar por todas as regiões dos EUA. Sua imagem junto ao público sempre foi associada às convicções cristãs do fundador da rede, Samuel Truett Cathy, morto em 2014. Ligado à igreja batista, ele instituiu o fechamento das lojas aos domingos e doava recursos para entidades defensoras do casamento entre homens e mulheres, entre outras iniciativas coerentes com suas crenças.

Mas os valores de Cathy tendem a ser esquecidos rapidamente. No final de maio, a companhia anunciou a criação de uma “vice-presidência de diversidade, equidade e inclusão” – algo impensável nos tempos do velho Samuel e uma prova de que as empresas estão sendo fortemente pressionadas a se alinhar com o ideário esquerdista.

Uma imposição que já chegou na Aeronáutica (que atualmente conta com quatro consultores de diversidade remunerados com salários milionários) e até na área da saúde (o Colégio Americano de Cirurgiões contratou a peso de ouro um guru de DEI para ensinar os médicos a “combater o racismo nas cirurgias”).

Mercado aquecido no Brasil 

Sempre atrasado no que se refere aos modismos corporativos, o Brasil ainda está entrando na onda dos treinamentos e consultorias de DEI. “Já superamos a fase em que as empresas viam a inclusão como algo filantrópico, assistencialista. Muitas lideranças agora entendem que uma equipe formada por pessoas diversas, com backgrounds diferentes, pode oferecer soluções mais criativas para o desenvolvimento dos negócios”, diz Tiago Alves Pereira, consultor de Diversidade e Inclusão do Instituto de Identidades do Brasil (ID_BR).

Mas Pereira reconhece que, por enquanto, a maioria das companhias busca implantar esse tipo de programa para lidar com alguma crise de imagem junto ao público (especialmente por conta de denúncias em redes sociais) ou processo na Justiça. Há, ainda, empresas interessadas em abrir seu capital na bolsa de valores – e, para estarem aptas a receber investimentos, devem seguir regras voltadas para o aumento da diversidade de gênero e da representatividade de grupos minorizados em seus times.

Uma das fundadoras da Diversifica, um “escritório de projetos em diversidade, equidade e inclusão” com sede em Belo Horizonte, Samara Barbosa reconhece que o setor ainda enfrenta problemas como a falta de métricas para avaliar resultados. Também admite que há poucos profissionais no mercado devidamente especializados. “Nossa equipe é formada por pessoas que, de alguma forma, vieram do ativismo social. Mas nossa regra é: não dá para militar dentro das empresas”, garante.

Com um histórico de clientes que inclui mais de 40 organizações de todo o país, a Diversifica e seus analistas atuam em várias frentes de trabalho – de processos seletivos à mentoria de lideranças, passando por media training (preparação de executivos para atuar como porta-vozes), mapeamentos, integração de novos colaboradores, planejamentos estratégicos e até atividades de “cliente oculto” (técnica em que profissionais treinados se passam por pessoas comuns e testam a qualidade do atendimento de empresas e instituições).

A gigante de tecnologia Intel contratou a Diversifica há cerca de dois anos, após analisar propostas de outras dez consultorias (uma prova de que o mercado está realmente aquecido por aqui). Segundo Carolina Prado, gerente de comunicação da companhia para a América Latina e coordenadora de um comitê interno de DEI, a diversidade é um dos valores da multinacional, cuja estrutura organizacional global inclui uma diretoria independente criada exclusivamente para tratar das questões relacionadas ao tema.

Questionada sobre a eficácia dos programas junto aos 100 funcionários da Intel no Brasil, Carolina acredita que um dos caminhos para o sucesso é fazer que os colaboradores egressos de grupos privilegiados também “se sintam pertencidos”. E cita outra ex-BBB negra e militante, Lumena Aleluia, como exemplo a não ser seguido. “Gosto da Lumena, mas ela usava uma linguagem muito específica”, diz – fazendo, sem perceber, um contraponto entre sua agressividade no estilo “dedo na cara” e o tom apaziguador que marcou a participação de Sarah Aline no reality show.

Omar Godoy - Gazeta do Povo - Ideias

 

segunda-feira, 24 de abril de 2023

Disney - Rato encurralado - Gazeta do Povo

Vozes - Flavio Quintela

Magic Kingdom, um dos parques da Disney em Orlando, na Flórida.| Foto: stinne24/Pixabay

Pouco mais de um ano atrás, no dia 28 de março de 2022, o governador da Flórida, Ron DeSantis, assinou a lei que seus detratores chamariam de “Don’t Say Gay” (“não diga ‘gay’”, em tradução livre), cujo nome real é apenas “Lei dos Direitos dos Pais na Educação”. 
A legislação proibiu a instrução em sala de aula sobre orientação sexual e identidade de gênero desde o jardim de infância até a terceira série. 
Além disso, exigiu que qualquer material relacionado a tais temas seja adequado à idade dos alunos de outras séries.

Na época, diante de toda a polêmica criada pela imprensa de esquerda, que deturpou por completo o texto da lei, o então CEO da Disney, Bob Chapek, disse aos trabalhadores da gigante do entretenimento que a empresa não assumiria uma posição pública sobre a legislação, de forma a permanecer fora do campo da ação política. Os funcionários da Disney protestaram e Chapek cedeu rapidamente, declarando que a empresa lutaria para que a lei fosse rescindida.

Por décadas, a Disney teve motivos para ser o “lugar mais feliz da Terra”. O governo da Flórida sempre apoiou a empresa, dando-lhe um status único no controle de sua própria governança. Quando escolheu Orlando para estabelecer seu complexo turístico, a Disney foi agraciada com a criação de um distrito chamado Reedy Creek Improvement, uma entidade jurídica que estabelece regras de uso e zoneamento de todo o território ocupado pela empresa. 
Enquanto outras corporações precisam se estabelecer nos condados do estado, estando sujeitas aos regramentos estabelecidos por autoridades eleitas como qualquer outro agente político, a Disney controlou desde o início o conselho administrativo de seu distrito, podendo estabelecer seus próprios padrões de construção, conceder suas próprias licenças de construção e determinar o escopo dos serviços, códigos de construção, coleta de lixo e outras questões de infraestrutura. 
Fora o Vaticano, não se tem notícia de outra organização não governamental com poderes desse nível.

    A Disney tornou-se o símbolo do aumento do ativismo corporativo. A empresa é um bastião do movimento woke. Ainda que esteja longe de quebrar, ela está enfrentando boicotes sem precedentes de seus parques e filmes

A Disney poderia continuar se beneficiando dessa vantagem única por muitas décadas mais. Em vez disso, optou por agir politicamente contra o governo eleito da Flórida, achando que não haveria consequências graves. Em resposta à promessa de Chapek de lutar pela rescisão da lei, o governador Ron DeSantis articulou uma resposta contundente com o Legislativo estadual, extinguindo o distrito Reedy Creek Improvement e criando um novo distrito para governar toda a área de propriedade da empresa e um novo conselho administrativo em que a turma do Mickey não possui nenhuma influência ou capacidade de decisão.

Diante desse revés, a empresa poderia ter tentado encontrar um meio-termo. Em vez disso, fez algo ainda mais imprudente: nos últimos dias do conselho dominado pela Disney, os membros votaram pela transferência de poderes para a empresa. Algo do tipo “já que nao haverá mais um distrito em que somos a autoridade, nós estamos inventando uma resolução em que nossa empresa fica imune ao controle de qualquer outro conselho daqui para a frente”. Em outras palavras, uma verdadeira declaração de guerra ao governo estadual.

E qual foi o resultado? Na semana que passou, surgiram rumores de que os integrantes do novo conselho, cujo “mandato” está prestes a iniciar, reverterão essa decisão com base em uma lei estadual que requer um mínimo de sete dias de aviso para consulta pública quando uma mudança desse montante é proposta.   
Além disso, parece que o novo conselho pretende impor uma miríade de fiscalizações sobre a Disney, desde as condições de funcionamento de itens como o monotrilho e os brinquedos do parque, até o salário de bombeiros e paramédicos que, ao que parece, são pagos abaixo do piso pela Disney. Resumindo bem facilmente, o novo conselho não deixará pedra sobre pedra.

A Disney tornou-se o símbolo do aumento do ativismo corporativo. A empresa é um bastião do movimento woke. Ainda que esteja longe de quebrar, ela está enfrentando boicotes sem precedentes de seus parques e filmes, incluindo filmes infantis controversos com personagens e relacionamentos do mesmo sexo. Em dois desses filmes, a Disney perdeu mais de um quarto de bilhão de dólares. Mas ela não está sozinha. Nos últimos dias, Bud Light e Nike enfrentaram reações e boicotes depois de alinhar suas marcas com o influenciador transgênero Dylan Mulvaney. No caso da Anheuser-Busch, controladora da Bud Light, o impacto imediato foi a perda de US$ 6 bilhões em valor de mercado. Essas empresas se juntam a uma longa lista de corporações que abraçam causas políticas e sociais a despeito da oposição significativa de seus consumidores.

No caso da Disney, se os rumores se confirmarem e o novo conselho prosseguir com seu plano, a empresa terá de fazer uma escolha. Ela pode abandonar a briga e buscar um acordo com o Estado. Caso opte por continuar a briga, o litígio manteria a Disney no noticiário de forma negativa e polarizadora. Também exporia suas operações à descoberta e escrutínio público. Além disso, diante da imensidão de quatro parques temáticos, dois parques aquáticos, 25 hotéis e cerca de 80 mil funcionários, o estado da Flórida tem uma série de áreas onde seu poder regulatório pode custar muito caro à Disney. Basta que o novo conselho aja para forçar inspeções de monotrilhos e elevadores, fazer cumprir as normas ambientais e aumentar os salários dos socorristas. Só isso já seria suficiente para causar um tremendo prejuízo. E se a Disney lutar publicamente contra qualquer uma dessas ações, terá de fazê-lo com base no argumento de que merece ser tratada com desigualdade de condições em relação a outras empresas, uma posição que tem um apelo muito mais negativo que positivo.

Mickey está num beco sem saída. Aguardemos as cenas do próximo capítulo.


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Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Flavio Quintela,
colunista - Gazeta do Povo - VOZES



segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

O MOURÃO FROUXO DE HOJE “VERSUS”O MOURÃO “MACHO”DE 64 - Sérgio Alves de Oliveira

Começou “enganando” muito bem o General Hamilton Mourão, que acaba de encerrar o  seu mandato como Vice-Presidente da República de Jair Bolsonaro, quando estava à frente do Comando Militar do Sul,em 16 de setembro de 2015, oportunidade em que  proferiu palestra em formatura do CPOR- Porto Alegre, propondo “despertar patriótico”, e fazendo declarações verdadeiras impactantes que causaram  um verdadeiro reboliço  nas “hostes” esquerdistas, ocasionando que  por interferência do então senador Aloysio Nunes, um ex-terrorista que servira de motorista de  Carlos Marighella, a “vingança” da esquerda acabou chegando e Mourão foi exonerado do seu comando, transferido para um cargo burocrático do Exército, em Brasilia.

Esse falso “cartaz” que acompanhou de perto o General Mourão durante o seu afastamento “político” do Comando Militar do Sul, certamente foi decisivo para que ele fosse escolhido para compor a chapa que disputaria as eleições presidenciais de outubro de 2018, que seria encabeçada pelo “capitão”Jair Bolsonaro, onde o general  concorreria a “vice”.

Essa “chapa” prosperou e venceu a eleição, derrotando a esquerda e o seu candidato Fernando Haddad, em segundo turno, principalmente em virtude do desgaste oriundo da  onda de corrupção que se abalara sobre os governos do PT,de 2003 a 2016,ou seja,de “rejeição” ao PT.

Mas a chapa vencedora das eleições de 2018 jamais teve a harmonia que seria desejável durante os 4 anos de governo. Além dessa dissintonia,o governo foi profundamente abalado por diversos fatores concomitantes. Enfrentou os terríveis efeitos econômicos da pandemia do novo coronavírus, a guerra provocada pela invasão da Rússia à Ucrânia, e fundamentalmente pela sabotagem e boicote provocados no governo pelo Congresso Nacional e pela “dupla” de ataque  do STF e TSE, provocando uma (quase) ingovernabilidade do pais.

A estratégia da esquerda acabou dando certo. “Deram um jeito” para derrotar Bolsonaro nas eleições de outubro de 2022,  por uma diferença “suspeita”na “totalização” dos votos de apenas 0.9%. Mas não se sabe ao certo se essa ”derrota” correspondeu, ou não, à vontade dos eleitores, ou teria sido alguma “manobra” diferente, devido às inúmeras interrogações que jamais foram esclarecidas.

“Atropelando” para que a posse de Lula se desse logo e sem problemas,todas as interrogações sobre a lisura dessas eleições ficaram a “ver navios”.

Mas Bolsonaro tinha todos os meios, inclusive expressamente previstos na Constituição, de reverter essa “safadeza” das eleições de 2022. Mas não o fez. Dois dias antes da posse de Lula, marcada para 1º de janeiro, pegou a avião presidencial e voou direto para Orlando, Flórida,tendo assumido a Presidência, na sua ausência, até a posse do novo Presidente eleito (???),o “vice” Hamilton Mourão.

Mas Mourão acabou dando uma “pegadinha” no povo brasileiro. Abaixo de “insinuações”que ocasionaram muito mistério e “suspense”, ordenou repentinamente a convocação da rede nacional de comunicações (rádio e TV), para as 20 horas do dia 31.12.22. 
Só disse “abobrinhas”, menosprezando a multidão de manifestantes acampada na frente do QG do Exército de Brasilia, que questionava as eleições, ignorando  totalmente o Presidente Bolsonaro, e se limitando a enviar um “Feliz Ano Novo 23” ,ao povo brasileiro. 
Tudo isso em “rede nacional”. Rede nacional do “deboche”. Pode? Mourão tinha tudo na mão para fazer o que o “fujão” Bolsonaro poderia ter feito, mas não fez,preferindo usufruir o  sol da Flórida, inclusive a caneta “bic” à disposição
Portanto Mourão tinha a “faca e o queijo” na mão. E também não usou.

Voltando um pouco no tempo, em 1964 tinha “outro” General Mourão comandando uma unidade do Exército,em Juiz de Fora/MG. Tratava-se da 4ª Região Militar/Divisão de Infantaria (4 RM/DI).

Contando exclusivamente  com o apoio do General Carlos Luis Guedes, da mesma unidade,  e do Governador mineiro Magalhães Pinto,no “peito e na raça", o General Olimpio Mourão Filho desencadeou a “Operação Popeye”,colocando as tropas na rua,na madrugada do dia 31 de março de 1964, finalizando  com a deposição do Governo João Goulart,e a instalação do Regime Militar que durou até 1985. 
“Rebelde” como era,o General Olimpio Mourão acabou não participando do Governo Militar que começava  com o Presidente Castelo Branco. Foi “escanteado”e “acomodado” no Superior Tribunal Militar-STM, que presidiu de 1967 a 1969.

Mas o “peso” da ameaça comunista que desencadeou o movimento cívico-militar de 1964 não chegava nem “aos pés” do comunismo já praticamente instalado no Brasil durante a gestão de Bolsonaro, só faltando a “formalização”, vendo-se o governo totalmente impotente para  travar o avanço comunista, incentivado pelo Congresso Nacional, pelo STF, e pelo TSE.

A “moral” de toda essa comparação  é só uma: o General Mourão de 64 não tinha os meios necessários, mas acabou impedindo o avanço do comunismo no Brasil, ao passo que o “novo” General Mourão,Vice-Presidente da República, de 2019 a 2022, tinha todos os meios à disposição, inclusive o Comando Supremo das Forças Armadas, no momento da “rede nacional”, e absolutamente nada fez. 

Poder-se-ia concluir que “não se faz mais generais como antigamente”?

Sérgio Alves de Oliveira - Advogado e Sociólogo

 

Chegou a hora de dizer adeus a Bolsonaro. E fazer a oposição dura que Lula e o PT merecem - Gazeta do Povo

Vozes - Paulo Polzonoff Jr

"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.

Virando a página

 Chegou a hora de dizer já vai?, tá cedo ainda, toma mais um cafezinho, Deus que ajude, desculpe qualquer coisa, etc.-  Foto: Reprodução/ Twitter

Passei quatro anos defendendo pateticamente o caráter humano (e, portanto, falho) do agora ex-presidente Jair Bolsonaro. Aos que me diziam que ele era um monstro fascista e genocida, respondia que não, que era apenas um homem tentando fazer o seu melhor – e, aqui e ali, fracassando miseravelmente, como todos nós. Aos que me diziam que ele era o mito, o líder perfeito, o Presidentaço, respondia que não. Que era apenas um homem tentando fazer o seu melhor. E, aqui e ali, fracassando miseravelmente. Como todos nós.

Nesse tempo, não foram poucas as vezes em que tentei me colocar no lugar de Bolsonaro. Para tentar – tentar! – entender o que o levou a agir assim ou assado. Dessas muitas reflexões, concluí que (i) nem todo mundo é talhado para a vida pública e eu definitivamente não sou; (ii) se me dessem o poder ilusório da caneta presidencial, é bem possível que eu agisse como um tirano pior do que Alexandre de Moraes; e (iii) nossos melhores e maiores feitos serão sempre rejeitados ou diminuídos por quem de antemão nos odeia.

Mas confesso que os últimos sessenta dias abalaram essa minha semiconvicção de que Jair Bolsonaro é apenas um homem simples que, por vias tortas, ocupou o cargo máximo dessa confusão a que damos o nome de Brasil. Primeiro o silêncio pós-eleições, depois as fotos enigmáticas e a manutenção de um clima revolucionário, culminando com a ausência de um pronunciamento digno no Natal e, mais recentemente, o desprezo pelos “aquartelados capslock” e a viagem para Miami. Tudo isso me levou a crer que, embora aparentemente honesto e bem-intencionado, Bolsonaro foi um homem pequeno. Ou ao menos menor do que eu supunha.

Não pequeno em relação a Lula (que é minúsculo). Quem pressupõe em minhas palavras comparação com o ex-presidiário talvez o tenha como um referencial – o que não é o meu caso. Aliás, se neste texto constato tardiamente que Bolsonaro não esteve à altura da empreitada a que se propôs quando se candidatou à Presidência, isso diz mais sobre minhas (nossas?) expectativas do que sobre quem vestiu e vestirá a faixa.

Quando reconheço algo constrangido que Bolsonaro se revelou pequeno, estou pensando em tudo o que ele poderia ter sido se tivesse usado os poderes mundanos e constitucionais do seu cargo para promover as virtudes que estão ao alcance de todo mundo: prudência, justiça, temperança e coragem. Se tivesse almejado a excelência. Se bem que aqui cabe uma crítica rápida à tão endeusada democracia, que tende a favorecer líderes que exalam soberba e todos os vícios dela derivados.

Tudo ficará mais claro quando os ânimos se acalmarem e for chegada a hora (não agora) de avaliarmos os erros e acertos de Jair Bolsonaro à frente do Executivo. Livres da paixão política – essa sanguessuga do espírito talvez consigamos avaliar melhor tanto a evidente má vontade da imprensa quanto os muitos movimentos equivocados no tal do xadrez 4D.  Gosto de pensar que, com o devido distanciamento temporal, seremos capazes de, um dia, dar a Bolsonaro a dimensão pessoal e institucional que ele merece
E que não é nem a de um anão e nem a de um gigante.

Chegou a hora, porém, de dar adeus a Jair Bolsonaro. Que a esta altura (enquanto espumamos de raiva por vermos um ex-presidiário subir a rampa e enquanto você vocifera contra o autor deste texto) deve estar curtindo a privilegiada aposentadoria na Flórida. Chegou a hora de dizer já vai?, tá cedo ainda, toma mais um cafezinho, Deus que ajude, desculpe qualquer coisa, etc. Chegou a hora de dizer tchau, Bolsonaro.

Uma despedida rápida e discreta. Sem lágrimas nem acenos com o lencinho para o trem que desaparece na curva à esquerda. Afinal, a partir de amanhã um novo futuro político começa de fato. Um futuro nada auspicioso. Por isso, e também por causa de Jair Bolsonaro, agora nos caberá fazer oposição a Lula e a tudo o que ele e o PT representam. Pela terceira (e, espero, última) vez.

Paulo Polzonoff Jr. é jornalista, tradutor e escritor. - Gazeta do Povo - VOZES


segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Urna eletrônica - Ainda bem que o TSE é perfeito - Gazeta do Povo

Vozes - Flavio Quintela

Deixemos de lado o tema “fraude eleitoral e concentremo-nos nas urnas eletrônicas usadas pelo Brasil
Sim, as mesmas que o TSE classifica como seguras e invioláveis, que formam a base de um sistema que a grande imprensa teima em chamar de “exemplo para o mundo”, ainda que não haja um país sequer desse mundo que tenha pedido ao Brasil que compartilhasse de tamanha perfeição. [as grandes democracias ignoram as urnas eletrônicas e,pior ainda, também não dispõem, sequer conhecem, Justiça Eleitoral. Será que,  as grandes democracias estão erradas?]
Essas urnas, as perfeitas, são tão ruins quanto tudo o que o Brasil produz na esfera estatal.



Urna eletrônica modelo 2020 utilizada pelo TSE nas eleições.| Foto: Divulgação / TSE

O fato é que, uma vez digitado o número do candidato naquela maquininha, o eleitor não tem como verificar se o seu voto foi contado da maneira correta
Não há meios para tal conferência. 
Não há comprovante impresso, não há voto que tenha sido lido por uma máquina, não há possibilidade de recontagem, só há um sinal eletrônico cuja integridade está baseada única e simplesmente na “palavra de honra” do TSE.[conheçam um pouco sobre a "segurança" das urnas eletrônicas brasileiras - inclusive com alguns nomes de vítimas e autores das falcatruas.]
 
Muito se tem escrito sobre a rapidez com que a apuração ocorre no Brasil. Os que defendem o nosso sistema usam a rapidez como argumento positivo. “Olhe para nós, mundo, e veja como somos rápidos na conclusão de nossas eleições. Morram de inveja”. 
Já os críticos afirmam que em nenhum lugar desenvolvido do mundo a apuração é tão rápida quanto no Brasil. Eu digo apenas uma coisa: olhemos para a Flórida. A Flórida não tem um sistema de urnas como o do Brasil, sem possibilidades de auditoria, mas mesmo assim apura seus votos rapidamente 

Embora seja o terceiro estado com mais eleitores do país, a Flórida apurou os votos das eleições deste ano em tempo recorde, muito à frente dos outros grandes estados norte-americanos e também de estados menores, com apenas uma fração dos votos a serem contados. E a Flórida não tem um sistema de urnas como o do Brasil, sem possibilidades de auditoria.

O eleitor floridiano vota com calma, em sua casa, se assim quiser. Ele retira a cédula e vota com calma para cada um dos muitos cargos que estão em disputa.  
Governador, deputado estadual, senador estadual, deputado federal, senador federal, comissário de Agricultura, membro do Conselho Escolar, promotor público, xerife etc. 
A cédula é enorme, leva um bom tempo para preencher. E o voto é facultativo, é claro. E é esse voto no papel que inicia o processo eleitoral. Obviamente, não foi contando votos no papel que a Flórida conseguiu a façanha de ser um dos primeiros estados a entregar os números finais. O que a Flórida fez foi organizar seu sistema eleitoral para, ao mesmo tempo, prevenir fraudes e apurar com rapidez e lisura. [e aceitando não só a Flórida, mas em todo os 'States", criticas ao sistema - procedimento normal nas democracias; são poucos os países, além do Brasil,  em que criticar o sistema eleitoral, é crime.]

Mas qual foi a grande sacada da Flórida? Muito fácil. Basta escanear as cédulas e você tem o melhor dos dois mundos: contagem rápida e material de verificação.

No Brasil, pelo fato de o TSE ser tão enfático em relação à inviolabilidade das urnas, não temos nenhum caminho técnico para auditar os votos. Somos obrigados a confiar de olhos vendados. 
O pedido do PL nem sequer abordou esse aspecto das urnas. 
O que eles fizeram ali foi se basear em apenas uma categoria de classificação das urnas e pedir que, devido à unicidade do parâmetro de identificação das máquinas – sem código único de identificação, urnas diversas foram agrupadas sob o mesmo valor de identidade e, portanto, não podem ser consideradas como auditáveis sob nenhuma circunstância –, essas urnas sejam desconsideradas na composição do resultado final.

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Para que serve uma suprema corte?


Felizmente, o Brasil tem o TSE (aviso: isso foi uma ironia). O governo brasileiro é um exemplo de má gestão em quase tudo o que faz, mas o TSE é perfeito. 
E o chefe do TSE é o mais perfeito dos homens perfeitos. 
E, já que ele é tão perfeito, não faz sentido limitar suas decisões a assuntos eleitorais. Melhor mesmo que ele decida sobre tudo. Precisamos cassar o passaporte de um jornalista? 
O nosso homem perfeito emitirá a ordem. 
Alguém ousou questionar o sistema eleitoral perfeito? 
O nosso homem perfeito indeferirá o questionamento e tascará uma multa de deboche na entidade que intentou tamanho ataque à democracia brasileira.
 
Parece ironia – e é –, mas é assim que a maior parte da imprensa brasileira tem tratado Alexandre de Moraes. 
Referem-se a ele como um herói, como a força a defender nossa frágil democracia contra inimigos terríveis.
 Ignoram tudo de ruim que esse homem já fez ao país só porque os alvos de sua ira são inimigos políticos da beautiful people midiática brasileira. “Ignorantes”, gritam, “golpistas!”. Na cabeça dos iluminados, esse povo merece ser surrado pelo chicote alexandrino, com seu alcance quase infinito.
 
Como já me expressei em minha conta de Twitter, não consigo ver outra explicação para esse tipo de comportamento que não seja a total falta de inteligência dessa gente, ou a total falta de caráter. Ou os dois. 
Afinal, só alguém muito embotado para não enxergar o perigo que é entregar essa quantidade enorme de poder nas mãos de apenas um homem. Ou alguém muito sem princípios, sem moral e sem caráter, que concorde com os arroubos ditatoriais do Judiciário brasileiro somente porque, nesse momento, eles estejam voltados a inimigos de ocasião.

A história cobrará um preço alto. Essas pessoas serão desmoralizadas e cuspidas pelo rei calvo como um caroço de fruta. Será tarde demais. Não terá sobrado ninguém para lutar por elas.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos

Flavio Quintela, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

sábado, 27 de agosto de 2022

Acredite na velha imprensa, se puder - Ana Paula Henkel

Revista Oeste

Numa série de sabatinas com presidenciáveis, o Jornal Nacional exibiu um “chá das cinco” entre compadres com o ex-presidiário Lula e os apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos

Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Reprodução
Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Reprodução

Há algum tempo tem sido difícil explicar o Brasil para família e amigos na América. Bem, na verdade, tem sido difícil explicar o Brasil até para brasileiros. Os acontecimentos desta última semana, então, transformaram a tarefa em algo impossível. Um ministro da mais alta corte do país, membro do tribunal que deveria salvaguardar a Constituição e aplicar as leis de forma responsável e justa decidiu — mais uma vez — rasgar mais páginas da nossa Carta Magna e ignorar por completo o ordenamento jurídico da República.

Em mais um impulso narcisista e totalmente inconstitucional, Alexandre de Moraes determinou o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra um grupo de empresários que apoia o presidente Jair Bolsonaro e que teria defendido um golpe de Estado em caso de vitória de Lula nas eleições.  
A conversa, que poderia ter acontecido numa mesa de bar, aconteceu em mensagens trocadas privadamente em um grupo de WhatsApp. Bem, o capítulo “Alexandre de Moraes” já não é nem mais um mero “capítulo” no imenso livro “Tente Explicar o Brasil” que seria impossível de ser publicado por qualquer membro da Academia Brasileira de Letras. O arrogante e destemperado ministro se tornou uma série inteira à parte.

A semana do “Tente Explicar o Brasil” também trouxe a sequência do caminho — agora livre — de um político corrupto, condenado em três tribunais com “sobra de provas” e preso. O queridinho do STF agora está, oficialmente, em campanha presidencial. Numa série de sabatinas com presidenciáveis, o Jornal Nacional, da Rede Globo, exibiu na quinta-feira um “chá das cinco” entre compadres com o ex-presidiário Luiz Inácio da Silva e os apresentadores [ou interrogadores.] William Bonner e Renata Vasconcellos. O Brasil, estupefato diante de tantas bobagens e mentiras ditas por um ladrão de dinheiro público, teve de ouvir que o “agronegócio é fascista e direitista” e que um movimento que propaga terrorismo doméstico, o MST, defendido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, “está fazendo uma coisa extraordinária: está cuidando de produzir”

Dê uma chegadinha ali às ferramentas de busca e digite “MST/invasão/animais” e veja com os seus próprios olhos a barbárie que esses terroristas promovem em fazendas e laboratórios pelo Brasil. (Aviso: CENAS FORTES!)

A cereja do bolo do happy hourde Lulinha, Billy Bonner e Rê talvez tenha passado despercebida, já que a pérola foi dita logo no começo da rodada. A conversa de bar foi aberta por Bonner, que, ao tentar questionar, cheio de dedos, sobre os escândalos de corrupção dos governos petistas e mencionar o histórico do ex-enjaulado com a Justiça brasileira, finalizou o comentário dizendo: “O senhor não deve nada à Justiça”.

“O senhor não deve nada à Justiça.”

Repitam comigo, amigos: O – senhor – não – deve – nada – à – Justiça.

É de embrulhar o estômago.

Distopia orwelliana
Mas, calma, temos de voltar a fita. Nesta semana, iniciando a série de sabatinas do Jornal Nacional, também tivemos, de maneira bem diferente, o encontro dos apresentadores do Jornal Nacional com Jair Bolsonaro. Apesar do nosso papel e dever como jornalistas de assistir ao que muitos brasileiros preferem não ver — ainda mais se tratando de Rede Globo —, a análise do que podemos chamar de inquisição do atual presidente e do bate-papo com o ex-presidiário deve ser feita como um dever cívico por cada um de nós. Faço um convite a todos, que percam alguns minutos do dia (recomendo um antiácido antes) e testemunhem diante de seus próprios olhos o que poderia ter saído, tranquilamente, das páginas de uma distopia orwelliana.
 
Entre caras, bocas, risinhos sarcásticos e verdadeiros editoriais dos apresentadores daquele que já foi considerado o programa de notícias mais relevante do país, Renata Vasconcellos usou as seguintes palavras para questionar o atual presidente sobre algo na pandemia: “(…) Medidas socioeconômicas importantíssimas, elas foram adotadas (…) para sustentar o ‘fica em casa’ no pico da pandemia — ‘fica em casa, se puder’”. Com dedinho levantado e ênfase no “se puder.”

“Fica em casa, se puder.”

Fica – em – casa – se – puder. Amigos, amigos…

No mundo da Oceania de 1984, não há mais um senso de devido processo legal, investigação, respeito ao sistema acusatório e muito menos uma presunção de inocência até que se prove a culpa

Ou eu dormi durante dois anos e só acordei agora, ou nunca ouvi esse “se puder”. Para todos os efeitos de justiça com a Renata e seu (err) jornalismo, fiz uma boa busca na internet e não encontrei nenhum registro da expressão “fica em casa, se puder”. Encontrei dezenas e dezenas de artistas, celebridades, jornalistas inclusive a D. Renata Vasconcellos! — bradando o famigerado “Fique em casa!”, “Fique em casa!”, “Fique em casa”… quase que em um transe coletivo.

Um vídeo que viralizou durante o FIQUE EM CASA, sem o SE PUDER, Dona Renata, foi mostrado no programa Profissão Repórter, da emissora em que a senhora trabalha. 

Enquanto jornalistas podiam trabalhar acompanhando a fiscalização de prefeituras que mandavam seus agentes da Gestapo fecharem comércios e multarem quem estivesse aberto, comerciantes entravam em desespero enquanto jornazistas de várias emissoras apontavam o dedo para aqueles que ousassem, por pura necessidade, trabalhar para sustentar a família. Quando as viaturas chegavam, os repórteres que alimentavam os noticiários apresentados por jornalistas que liam os TelePrompTers com caras, bocas e expressões no melhor estilo “que horror, você saiu de casa para trabalhar!” ainda tinham a desfaçatez de culpar comerciantes, lojistas, barraqueiros, vigias… Pais de família que simplesmente “não podiam” ficar em casa imploravam para não serem multados ou presos. Nos mesmos noticiários, famílias sem ter o que comer e crianças há meses sem ir à escola eram mostradas.

Para não dar o braço a torcer para o que o presidente Jair Bolsonaro no Brasil e Donald Trump, nos EUA, alertavam de que não seria prudente trancar tudo e a economia “a gente vê depois”, Renata Vasconcellos decidiu acrescentar um “se puder” em uma frase que — nem de longe — implicava algum tipo de escolha ou opção para cidadãos do Brasil e do mundo. 
Quem não se lembra de outra colega de Renata e Bonner, a apresentadora Maju Coutinho, que, depois de dizer uma das maiores mentiras da pandemia, a de que os especialistas eram unânimes em forçar o lockdown, proferiu naturalmente, mostrando uma insensibilidade inacreditável diante de tanto sofrimento, o famoso o clichêo choro é livre”
Enquanto os mais necessitados, os mais pobres e vulneráveis iam sendo afetados de maneira cruel a cada dia de trancamento forçado, com direito a truculência policial encampada por governadores tiranos, Dona Maju, Dona Renata e toda uma turba de jacobinos globais continuavam trabalhando de estúdios com ar refrigerado ou em home offices enquanto postavam em suas redes sociais “Fique em casa”. Muitos ainda acrescentaram ao mantra “a economia a gente vê depois”.

As imagens de pânico, lágrimas e desespero por não poder trabalhar e trazer comida para casa estão espalhadas por toda a internet. Postei em meu Instagram, logo após o “se puder” global, um vídeo curto, de quatro minutos apenas, com algumas cenas para refrescar a memória da Dona Renata Vasconcellos. 
Gôndolas de supermercados foram bloqueadas, o Estado policialesco decidiu por todos muitos o que eram “itens necessários” que podiam ser comprados. A prefeitura de São Paulo soldou portas de lojas para impedir sua abertura. Trabalhadores ambulantes com carrocinhas de pipoca ou barraquinhas de frutas tiveram seus carrinhos virados por policiais, espalhando tudo no chão. Enquanto ônibus, metrôs e trens permaneciam lotados nas grandes cidades, uma mulher foi espancada e outra algemada nas praias desertas do Rio de Janeiro. Em Araraquara, interior de São Paulo, outra mulher que corria em um parque também deserto da cidade foi abordada pela polícia, recebeu voz de prisão, foi imobilizada por quatro homens e algemada. 
Um deles repetia com calma enquanto ela gritava que não conseguia respirar porque alguém estava lhe aplicando um “mata-leão”: “Não resista. Fique calma e não resista”. SE PUDER, claro.

Nesta semana, nos Estados Unidos, Anthony Fauci, o nome da pandemia na América, o deus da velha imprensa ianque, anunciou sua aposentadoria da vida pública após sua liderança na pandemia permanecer sob forte escrutínio e cheia de controvérsias. Quando o vírus chinês atingiu os Estados Unidos, Dr. Fauci rapidamente se tornou um nome familiar e seu rosto estava em todos os canais de TV 24 horas por dia, sete dias na semana. 
Suas recomendações foram tratadas como evangelho por muitos. Mas, à medida que os efeitos de longo prazo de políticas como máscaras, vacinação experimental compulsória e os efeitos do lockdown vinham à tona, os críticos e a população em geral se encheram de perguntas, e o santo Fauci não gostou de ser questionado. Coisa de ministro de corte suprema tupiniquim.

Na terça-feira dia 23, Fauci foi entrevistado por Neil Cavuto na Fox News, e o âncora da emissora fez perguntas incômodas àquele que é acusado pelos republicanos de ter colaborado com a disseminação do vírus chinês por financiar pesquisas de ganhos de função no laboratório de Wuhan. Na China. Cavuto perguntou: “Olhando para trás em algumas dessas decisões, incluindo a gravidade da própria epidemia, mas fechando praticamente toda a economia norte-americana, você se arrepende particularmente desse passo?”. Fauci, assim como Renata Vasconcellos e William Bonner, diz, como quem está numa realidade paralela — ou alguém que simplesmente quer reescrever a história — que “é preciso deixar bem claro para os telespectadores, para que eles entendam que eu (Fauci) não fechei nada e que não acredito que os lockdowns causaram danos irreparáveis a qualquer pessoa. Se voltarmos, basta ver que queríamos apenas achatar a curva naqueles 15 dias.”

Cavuto, um experiente e intelectualmente honesto jornalista, interrompe aquele que causou graves danos a futuras gerações e dispara: “Mas o senhor não acha que tudo foi longe demais? Quaisquer que tenham sido suas intenções iniciais, o senhor não acredita que tudo passou dos limites, especialmente para as crianças, que não puderam ir para as escolas, e que isso poderá trazer um dano permanente?”. O que o personagem favorito de veículos como o The New York Time e Washington Post disse? “Não acho que haverá dano permanente. Não acredito que prejudicamos alguém, e acho que, se você voltar e puxar coisas sobre mim, eu também fui uma das pessoas que disseram que tínhamos de fazer tudo o que podíamos para trazer as crianças de volta à escola. Sempre disse que era muito importante protegermos as crianças dos efeitos colaterais de mantê-las fora da escola.”

Lendo tudo isso, seu sangue ferve como o meu? O que essa gente, William, Renata, Fauci, pensa que somos? Idiotas? Burros? Que temos amnésia?

Há mais de um ano, em agosto de 2021, escrevi aqui em Oeste um artigo com o título “Ciência, ciência, silêncio”. Naquele momento, a pandemia havia sido controlada nos Estados Unidos, país que já havia vacinado mais de 165 milhões de pessoas. 
Alguns Estados com administrações republicanas, como a Flórida, por exemplo, nem sequer fecharam completamente suas escolas — mesmo em 2020 —, e os números de contágio e mortes não foram superiores aos de Estados que trancaram tudo por mais de um ano, como a Califórnia. Ali, já deveríamos estar voltando à vida normal, o próprio Fauci prometeu que seria um pouco de lockdown, achatar a curva, máscaras por um tempo e estaríamos de volta. Havia, desde outubro de 2020, um manifesto elaborado por especialistas de Harvard, Oxford e Stanford — a Declaração de Barrington — que já revelava que lockdowns totais seriam nefastos não apenas para a economia, mas para as pessoas, sua saúde física e mental; e que o correto seria segregar os mais velhos, doentes e com comorbidades. 
Mesmo com mais da metade da população vacinada, no Brasil e nos EUA, eles continuaram exigindo mais máscaras, mais trancamentos, mais ensino remoto, mais estabelecimentos, escolas, parques, bares… fechados.

“Fique em casa, seu fascista!”
Um estudo recente do Brookings Institute mostrou que as diferenças nas pontuações dos testes entre os alunos das escolas primárias de baixa e alta pobreza cresceram 20% em matemática e 15% em leitura durante as paralisações da pandemia. Muitas crianças no Brasil foram trancadas em casa com seus abusadores, sem alimentação nem ensino básico. Desde os lockdowns, o CDC documentou um aumento de 51% nas tentativas de suicídio entre adolescentes. De acordo com a UCLA, a taxa de mortes por overdose de adolescentes quase dobrou. Há outras dezenas de pesquisas do mesmo gênero espalhadas pelo mundo. Toda a tirania do “Fique em casa, seu fascista!” está amplamente documentada para que figuras como o trio Bonner, Vasconcellos e Fauci jamais tenha a possibilidade de tentar editar o que fizeram, o que falaram, o que apoiaram e o monstro que alimentaram que devorou os mais vulneráveis. As cidades pareciam cidades fantasmas. Jamais esquecerei a entrevista que o prefeito de Aparecida concedeu ao programa Os Pingos nos Is. Com lágrimas nos olhos, Luiz Carlos Siqueira pedia doações de alimentos, agradecia a ajuda do governo federal e relatava que não conseguia retorno da gestão do governador de São Paulo e que a população estava faminta, sem dinheiro, sem trabalho e sem esperanças com o lockdown imposto pelo governador João Doria.

Distorções e mentiras são estratégias protagonistas no famoso 1984, romance de George Orwell. As palavras de Orwell, publicadas em 1949, aumentaram em popularidade nos últimos anos não apenas porque as sociedades modernas estão se tornando cada vez mais parecidas com o que foi descrito na obra fictícia do autor, seja na vigilância em massa seja na guerra cultural perpétua. O romance de Orwell é presciente de várias maneiras, e o livro costura os sintomas da atual sociedade com um tipo de totalitarismo — pregado de forma sistemática por Alexandre de Moraes. Chega a ser assustador ler sobre o Ministério da Verdade da distopia de Orwell, escrita há mais de 70 anos, como se ela profetizasse os atuais tempos. No mundo da Oceania de 1984, não há mais um senso de devido processo legal, investigação, respeito ao sistema acusatório e muito menos uma presunção de inocência até que se prove a culpa. Em vez disso, a ideologia arregimentada — a supremacia do poder do Estado para controlar todos os aspectos da vida de alguém para impor uma ideia fossilizada de qualidade obrigatória — distorce tudo, desde o uso da linguagem até a vida privada.

É também do mundo irreal criado por Orwell que personagens da vida real tiram as distorções e as falácias de quem errou feio e agora tenta editar a história. No livro, mais atual do que nunca, a passagem seguinte chega a ser assustadoramente similar com a atualidade: “Todos os registros foram destruídos ou falsificados, todos os livros reescritos, todos os quadros foram repintados, todas as estátuas e prédios de rua foram renomeados, todas as datas foram alteradas. E o processo continua dia a dia e minuto a minuto. A história parou. Nada existe a não ser um presente sem fim no qual o Partido tem sempre razão. Quem controla o passado controla o futuro; quem controla o presente controla o passado”.

A diferença entre a Oceania, o Brasil ou os Estados Unidos é que agora temos uma coisinha incômoda que Orwell não imaginou. A internet. Para aqueles que tentam — e tentarão, sempre —, seja em debates seja no noticiário, reescrever a história, será um pouco mais complicado realizar essas edições.

Para William Bonner: Lula não está limpo e não está em dia com a justiça. Ele não passa de um descondenado por manobras ativistas, mas jamais foi inocentado. Para Renata Vasconcellos: nunca houve “SE PUDER”, Renata. Nunca. E vocês não reescreverão a história.

Leia também “Temporada de caça às bruxas”

 

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste