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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

A DITADURA DO ÓBVIO



A vantagem da mudança seria o descarte da incompetência, má gestão e corrupção."
General Antonio Mourão (na ativa), ao comentar a possibilidade de impeachment de Dilma Rousseff

"Ganhamos a eleição com um discurso e depois das eleições fizemos aquilo que a gente dizia que não ia fazer."
Luiz Inácio Lula da Silva
Waldo Luís Viana*

Temos que convir: está tudo aí, na cara do povo brasileiro, de maneira escarada e escarrada. Vemos a corrupção das propinas, a luta insana da aristocracia que tem cabeça no século 19, enquanto a sociedade vive a globalização dos celulares, computadores, tablets e andróides.

É óbvio que querem se manter no poder, utilizando o voto obrigatório (um dever, jamais um direito) e o foro privilegiado (afinal há cidadãos “melhores” que outros). Nesse sentido, Lula acertou, quando disse um dia sobre José Sarney: “obviamente ele não é uma pessoa comum”. 

Pessoas comuns estão, em verdade, à disposição da polícia e do Judiciário, naquele velho princípio dos quatro pês: “prendemos pretos, pobres e prostitutas”. Por isso, muito cuidado com os esfomeados, furtadores de latas de goiabada nos supermercados. É óbvio que serão apanhados pela gola e conduzidos à cadeia. Os ricos, porém, estes têm advogados caros para encontrar brechas nas leis e através de chicanas e de infindáveis recursos protelar a prestação de contas em relação às leis.

Nossos políticos federais que as fazem, cerca de seiscentos, que custam cada um dois milhões de reais por ano, querem que tudo permaneça como está, ou seja, não são pessoas comuns e obedecem àquele velho princípio eleitoral: roubar pra se eleger e se eleger para roubar. É claro que existem honrosas exceções, mas infelizmente existe a regra. Não é o melhor dos mundos?

É óbvio que o PT, que chegou ao poder com promessas éticas e de salvação do país, transformou-se numa máquina de corrupção jamais vista, inclusive ameaçando os que não concordam com o castigo de exércitos alternativos, movimentos sociais e ONGs de discutível procedência.  Vemos tudo transcorrer embaixo de nosso nariz e não conseguimos fazer nada, demonstrando aquele espírito típico do vestíbulo do inferno de Dante: “deixai aqui toda a esperança”.

Nossa aristocracia não quer largar o osso e manterá tudo como está, o que se comprova com os resultados hilariantes da CPI da Petrobras. É óbvio que eles não querem condenar qualquer político e o baixo clero no Congresso irá assegurar o futuro auspicioso do presidente da Câmara. Afinal, ele interpreta exatamente o espírito da maioria dos deputados e sua sanha por cargos e sinecuras. Além do que pode barganhar sua sobrevivência, porque porta sem timidez a caneta do impeachment.

Nada de planos estratégicos para o futuro do país, que isso não interessa. Nada de desinchar o Estado, que deve ser pesadão, caríssimo e ineficiente, enquanto o caos permanece na saúde, educação e segurança.  É óbvio que utilizaram o BNDES para financiar projetos no exterior, à revelia do povo brasileiro e do próprio Congresso. Mas nada disso importa, porque não haverá qualquer retaliação e os poucos protestos de alguns cairão no vazio.

Na verdade, o país ainda não saiu do regime das capitanias hereditárias, em que fatias de poder são distribuídas sem qualquer pudor entre as mesmas caras carimbadas, que sempre dizem que não têm dinheiro secreto no exterior. E todo mundo sabe quem são e eles caminham livres, sorridentes e sem medo, porque nosso Judiciário não passa de um puxadinho mal ajambrado de tais poderes ocultos.

Mas hora direis: e as operações da Polícia Federal e do Ministério Público? Sim, são pobres esperanças do povo brasileiro que está no fundo do poço. Existem realmente alguns quixotes audazes, procurando deter a sangria da corrupção generalizada, dos golpes continuados de um partido para se manter no poder a qualquer preço (“faremos o diabo pra reeleger a Dilma” – lembram-se) e da gulodice continuada de outro partido aliado, que se cala convenientemente em troca de ministérios e de abonos colonizadores no segundo escalão federal.

Podemos nos orgulhar de assistirmos à descoberta de que somos uma nação que pratica os maiores atos de corrupção da história humana, desde os tempos da Suméria e Babilônia. Ninguém ousou a tanto em nenhum lugar, só no Brasil, porque aqui tudo é permitido. É óbvio que aqui também existe o braço da Justiça, mas existem cidadãos mais iguais que outros e eles conseguem protelar as penas, com intermináveis recursos que arquivam processos ou os tornam preclusos com o tempo. Esse é o tal “foro privilegiado” na prática...

É óbvio que a aristocracia argumenta que as eleições são caras e que, para manter o poder, precisa recorrer a financiamentos escusos e fraudulentos, extraídos a fórceps de empreiteiras e estatais. E haverá alguém que acredite que não será mais assim? Óbvio que não...  Somos escravos, nós, o povo em geral, das obviedades e das pizzas. Pão (talvez a falta dele), circo, futebol, novelas e Big Brothers. A maioria nem quer saber de política e se o voto não fosse obrigatório ausentar-se-ia de qualquer pronunciamento. A maioria, no fundo, está exausta e completamente descrente.

É óbvio que se percebe uma insana luta pelo tal ajuste fiscal, mas sabemos que isso não irá resolver o desespero do povo endividado pelos juros mais escorchantes do mundo. E sabemos que isso não vai mudar, apenas surgirão paliativos, obviamente em anos eleitorais.  Sendo assim, navegando entre rombos e dívidas, o país vai entrando em colapso e o povo, assustado e desiludido, sente-se realmente adentrando o inferno de Dante, deixando para trás toda esperança. Afinal, somos um povo vivendo no século 21 dirigido por uma aristocracia cuja cabeça continua no século 19 e com saudades eternas do tempo em que éramos apenas colônia de Portugal e da Inglaterra.

E tal aristocracia, inclusive, está agastada com alguns gatos pingados que a desafia, prometendo punição aos criminosos obviamente descobertos, e tenta por todos os poros deter essa onda de delações premiadas, contrárias a seus planos de permanência. Que ousadia contrariar o velho poder que se propõe ser eterno?

Sobra apenas para nós o gosto amargo de ver esse embate distante, entre aristocracia e povo, uma luta surda e intestina que obviamente não fomos convidados a participar. Resta-nos esperar, ansiosos, a próxima atração...

Por: *Waldo Luís Viana é escritor, economista, poeta e não pertence à aristocracia que nos sufoca...
Teresópolis, 30 de outubro de 2015.

Fonte: A Verdade Sufocada