Ex-ministro dos governos Lula e Dilma já prestou depoimentos; acordo ainda não foi homologado pela Justiça
Preso
desde setembro de 2016, o ex-ministro Antonio Palocci assinou acordo de
delação premiada com a Polícia Federal. Fontes vinculadas ao caso
confirmaram ao GLOBO que a colaboração avançou com rapidez nos últimos dias. Em
sigilo, além de terem fixado as bases dos benefícios que serão concedidos a
Palocci, os investigadores inclusive já teriam concluído a fase de depoimentos.
A colaboração de Palocci, no entanto, ainda não foi homologada pela Justiça.
Fundador
do PT, ex-prefeito de Ribeirão Preto, ex-ministro da Fazenda do governo Lula e
ex-chefe da Casa Civil de Dilma Rousseff, Palocci participou das decisões mais
importantes do partido nas últimas duas décadas. Ele foi condenado pelo juiz
Sergio Moro, que comanda os processos da Operação Lava-Jato em Curitiba, a 12
anos, dois meses e 20 dias de prisão pelos crimes de corrupção passiva e
lavagem de dinheiro. Era, até o início das investigações em Curitiba, um dos
políticos mais influentes do PT.
SEM
ACORDO COM MPF
As
revelações do ex-ministro devem dar um novo impulso à Lava-Jato. As informações
e os documentos fornecidos por ele seriam suficientes para abertura de novos
inquéritos, operações e até mesmo prisões, segundo revelou ao GLOBO uma fonte
que conhece o caso de perto.
Palocci
fez acordo com a Polícia Federal depois de tentar, sem sucesso, negociar uma
colaboração com os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato. Embora tenha
anexos ainda não conhecidos, que tratam de sua relação pessoal com o universo
político, das negociatas com empresários e do lobby desempenhado por ele
no governo em favor de empresários, a delação do ex-petista segue um roteiro
conhecido.
LULA NO
ALVO
Além de
detalhar nos depoimentos os casos de corrupção dos quais participou ou teve
conhecimento, o ex-ministro terá de apresentar provas do que diz. Se mentir ou
quebrar algumas das cláusulas firmadas, poderá perder os benefícios negociados.
As vantagens oferecidas a Palocci em troca de suas revelações ainda estão sendo
mantidas em sigilo pelas partes. Na semana passada, o ministro teve um pedido
de liberdade negado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou
temerário liberá-lo da prisão no atual estágio das investigações. No papel de
colaborador, no entanto, a situação do ministro poderá ser revista pela
Justiça.
Em
depoimento ao juiz Sergio Moro, em setembro de 2017, Palocci antecipou alguns
episódios simbólicos de sua relação com Lula. O ex-presidente, aliás, seria um
dos políticos mais citados por Palocci. Ao falar das relações do ex-presidente
com a Odebrecht, por exemplo, Palocci afirmou que Lula havia firmado um “pacto de
sangue” com o empresário Emílio Odebrecht nos últimos meses de 2010,
em uma conversa sigilosa no Palácio do Planalto.
Nesse
período, o ex-ministro era o encarregado de mediar a relação entre o PT, o
governo e a cúpula da empreiteira, como revelaram os ex-executivos da Odebrecht
em delação. Palocci operava a famosa “conta Amigo”, aberta no sistema de
propinas da construtora para bancar despesas pessoais, favores e projetos de
interesse do ex-presidente Lula.
— Ele
(Emílio) procurou o presidente Lula nos últimos dias do seu mandato e levou um
pacote de propinas que envolvia esse terreno do instituto, já comprado.
Apresentou o sítio para uso da família do presidente Lula, que ele já estava
fazendo a reforma, em fase final. Também disse que ele tinha à disposição para
o próximo período, para fazer as atividades políticas dele, R$ 300 milhões —
disse Palocci.
Dessa
conta também teriam saído recursos para remunerar palestras do ex-presidente
Lula e doações ao instituto que leva o seu nome. O ex-ministro admite ainda os
repasses via caixa dois de empresas para as campanhas de Lula e Dilma. Afirma
que a relação dos empresários com o governo era “bastante movida” a vantagens
concedidas a empresas no governo mediante o consequente pagamento de propinas e
repasses de caixa dois ao partido. Ao falar do esquema do PT com empreiteiras
que pagavam propina em troca de influência no governo, Palocci disse que as
vantagens não se destinavam a retribuir benesses específicas obtidas em um ou
outro contrato público. Tratava-se de manter uma relação amigável e constante
com os mandatários para estar
sempre em posição privilegiada em concorrências públicas.
A PARTE
DE DILMA
Ao falar
da ex-presidente Dilma Rousseff, o ex-ministro disse que ela não apenas sabia
do esquema corrupto entre PT e as empreiteiras, como teria sido beneficiária e
mantenedora dos arranjos. Palocci deu exemplos de situações em que tais temas
foram tratados na presença de Dilma ou dependeram de sua chancela. Em meados de
2010, segundo Palocci, ele participou de uma reunião com Lula, Dilma e o então
presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli na biblioteca do Palácio da
Alvorada. O assunto era os contratos de exploração do pré-sal. Lula, segundo o
ex-ministro, teria falado abertamente do propósito de usar os projetos da
estatal para financiar a campanha “dessa companheira aqui (Dilma), que eu quero
ver eleita presidente do Brasil”, teria dito Lula, nas palavras de Palocci.
As
negociações sigilosas do ex-ministro com a Polícia Federal foram reveladas pelo
GLOBO no dia 14 de abril. Nas tratativas, o ex-ministro melhorou a proposta de
delação. Ele teria fornecido mais detalhes e indícios dos crimes dos quais
participou ou teve conhecimento. Para um experiente investigador, Palocci é um
dos poucos condenados da Lava-Jato que têm informações importantes para debelar
estruturas criminosas ainda fora do alcance da polícia.
— Ele
ainda é um dos poucos que têm bala na agulha — disse ao GLOBO uma fonte que
acompanha o caso de perto.
O Globo