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quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Centrão no governo - O infeliz xadrez de Lula - Gazeta do Povo

Vozes - Alexandre Garcia

Fufuca, Lula, Costa Filho e França em foto após a cerimônia de posse dos novos ministros.| Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

Na quarta-feira, Lula preferiu fazer a posse de seus novos ministros de uma maneira bem discreta, uma reunião fechada no gabinete dele, sem convidados. Tudo para não ficar muito clara a ausência de Ana Moser, que deveria entregar o Ministério dos Esportes para o deputado federal André Fufuca (PP). Ela e o PT estão em desacordo. A primeira-dama Janja da Silva também não concorda, e já se manifestou publicamente sobre esse assunto.

A foto da posse mostra Lula, Fufuca e o novo ministro de Portos e Aeroportos, o deputado federal Silvio Costa Filho (Republicanos), com o polegar para cima. Já Márcio França (PSB) – realocado do comando de Portos e Aeroportos para o recém-criado Ministério do Empreendedorismo e da Microempresa – aparece com a cara de desagrado e com as duas mãos para trás. Assim devem estar o Partido Socialista Brasileiro e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). Só que eles não vêm a público para manifestar isso.
 
Está sendo muito infeliz o xadrez de Lula nessa entrega ao Centrão. 
O Republicanos recebe o Ministério de Portos e Aeroportos, mas diz que não está recebendo, que isso não significa que o partido vai aderir ao governo, que é uma questão pessoal do ministro Silvio Costa Filho – que por sua vez vai ter de prestar contas também aos seus eleitores, que foram enganados
O mesmo vale para Fufuca. Deixaram os seus eleitores na mão. 
Os eleitores os elegeram não para serem empregados de Lula, mas empregados dos eleitores do Maranhão e de Pernambuco.

E o PP também não está satisfeito porque quer todas as apostas esportivas no Ministério dos Esportes, quer a presidência da Caixa – e parece que Lula vai dar – e quer também a Diretoria de Habitação da Caixa Econômica, que o PT não quer soltar. 

Eu pergunto aos que elegeram Lula: votaram também no Centrão? Porque fica bem estranho isso.

TSE mantém cassação de Dallagnol
No Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já está formada maioria, com quatro votos em sete, para não aceitar o recurso de Deltan Dallagnol, mantendo a cassação do deputado federal mais votado do estado do Paraná. Houve uma época em que os tribunais respeitavam a força do povo, a força do eleitor. O mais votado dificilmente seria banido. O relator, ministro Benedito Gonçalves, votou contra Dallagnol, assim como Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Ramos Tavares. A denúncia foi feita pelo PT, PCdoB e PV.
 
Brasil terá insegurança jurídica internacional?
No Ministério da Justiça, o ministro Flávio Dino aderiu a uma tese de Lula, de que o Tribunal Penal Internacional está estranho por não ter a adesão de Rússia, China e Estados Unidos. Então, o ministro disse que o Brasil tem de avaliar se cai fora do Tribunal de Haia. 
Isso significaria rasgar o Tratado de Roma, que o Brasil assinou, que foi confirmado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, depois de aprovado pelo Senado Federal. 
Então o Brasil, que já tem insegurança jurídica interna, vai ter também insegurança jurídica internacional.
 
Colaboração não é delação premiada
Finalmente eu me esclareci diante do noticiário que só fala em “delação premiada” do Mauro Cid. Eu sabia que não era isso. 
Não encontrei em lugar nenhum. 
Avisei a quem me segue que não tem isso. Era impossível, porque um sujeito com essa formação ética de família e passagem pela Academia Militar das Agulhas Negras não teria como fazer isso
Agora está esclarecido que se trata da colaboração prevista na Lei 12.850/2013. 
Significa que a pessoa abre mão de seu direito de ficar calado para não se incriminar e conta tudo. 
Não é aquele acordo em que a pessoa se obriga a incriminar alguém, a incriminar outros.
 
Isso não tem nada a ver com outra questão que o pessoal está chamando de “lavagem de provas”. Sabem como funciona? Aparece um indício, mas não há como buscar a prova atrás daquele indício. 
Então quebram sigilo bancário, sigilo fiscal, sigilo telefônico por algum outro pretexto, desenterram caso antigo e vão procurar. 
Assim como tem a lavagem de dinheiro – em que se tenta tornar legal o dinheiro ilícito –, tem também a lavagem de provas.
 
Desembargador aposentado rouba a cena no STF
O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes pediu 15 anos e meio de regime fechado para o primeiro réu julgado pelo STF por suposto envolvimento nos atos de 8 de janeiro. 
Aécio Lúcio Lopes Costa Pereira teria sido fotografado no plenário do Senado no dia 8. 
Dizem que ele quebrou espelhos, computadores, obras de arte etc. 
Segundo ele, não era uma tentativa de golpe, mas uma manifestação de protesto. Ainda lembrou que o réu não pôde comparecer a seu próprio julgamento porque está no presídio da Papuda.
 
Depois, Coelho disse que, um dia antes, tentaram intimidá-lo, com o Conselho Nacional de Justiça dizendo que ele vai ser investigado. Disse que não tem mais idade, que não tem mais tempo a perder para o medo. Não tem mais tempo de ter medo de nada. 
E, por fim, ele se dirigiu aos ministros do Supremo dizendo que à frente dele estavam as pessoas mais odiadas desse país. 
Alexandre de Moraes ainda falou depois, chamou de “extremistas” os que não gostam do STF e disse que são a minoria da população.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 


segunda-feira, 21 de agosto de 2023

Juiz condena Delgatti a 20 anos de prisão por crimes na Operação Spoofing

Outros cinco investigados por invasões a contas de Telegram de autoridades foram condenados pelo juiz Ricardo Leite

O juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, condenou nesta segunda o hacker Walter Delgatti e mais seis investigados na Operação Spoofing, deflagrada em 2019 para investigar as invasões de contas do Telegram que resultaram na Vaza-Jato.

Delgatti foi condenado a 20 anos, 1 meses e 736 dias-multa por diferentes crimes. 
 Os outros condenados são: Gustavo Henrique Elias Santos (13 anos e 9 meses de reclusão e 520 dias-multa), Thiago Eliezer Martins Santos (18 anos e 11 meses de reclusão e 547 dias-multa), Suelen Priscila De Oliveira (6 anos de reclusão e 20 dias-multa), Danilo Cristiano Marques (10 anos e 5 meses de reclusão e 100 dias-multa).

Luiz Henrique Molição também foi condenado pelo juiz, mas recebeu perdão judicial em função da delação premiada que fechou com a Justiça.

Delgatti foi condenado por crime de organização criminosa, lavagem e ocultação de bens, direitos e valores, por invadir dispositivo informático de uso alheio com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do usuário do dispositivo ou de instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita. Também foi condenado por crime de realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial.

[destacamos que o criminoso Delgatti,  condenado a mais de 20 anos de prisão é a principal testemunha contra o presidente Bolsonaro,   no caso das 'urnas eletrônicas' , e goza de grande credibilidade junto a conhecida rede de TV, que se destacou por um dos seus jornalistas ter emitido durante um debate entre candidatos a presidência da República , um veredito inocentando o atual presidente da República - veredito inédito, visto que nem o STF inocentou o petista.]

A investigação foi iniciada para apurar possível clonagem do então ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, bem como identificar os autores da possível invasão realizada na conta do aplicativo de comunicação Telegram de seu terminal móvel. Já no início das investigações, a Polícia Federal verificou outras invasões de terminais celulares de diversas autoridades públicas, já narradas na peça acusatória. A materialidade do artigo 154-A do Código Penal está plenamente consubstanciada em diversos laudos produzidos pela polícia federal, sendo estabelecida uma sequência lógica dos trabalhos investigativos até se chegar a identificação dos denunciados, conforme será exposto”, registra o juiz na sentença.

Em laudos iniciais, os peritos apontaram que, por meio de duas contas abertas na empresa de telefonia de voz sobre IP que serviu de plataforma para os ataques, foram realizadas 5.616 ligações em que o número de origem era igual o número de destino, característica principal dos ataques, indicando que ao menos 976 números de vítimas diferentes teriam sido visados pelo grupo”, segue o juiz.

“Posteriormente foram identificadas outras contas na empresa BRVOZ que também foram utilizadas pelo grupo criminoso, concluindo-se que o número de alvos dos ataques chegou a mais de 3.000 pessoas”, diz Leite.

Radar - Coluna na Revista VEJA

sábado, 19 de novembro de 2022

Não é empréstimo, é carona. Sério? - Carlos Alberto Sardenberg

Qual a diferença entre tomar um jatinho de empréstimo ou pegar uma carona nesse avião? Nenhuma, claro. 
O fato é que Lula, presidente eleito, viajou de graça no jato de um empresário, José Seripieri Junior, que ganha dinheiro no ramo de corretagem de planos de saúde, setor fortemente regulamentado. 
Erro mais evidente, impossível: o presidente ganhou um favor de um empresário cujos negócios dependem do governo, para o bem ou para o mal.

Acrescente-se que o empresário fez fortuna durante governos petistas; financiou campanhas de Lula; emprestou ou “apenas” hospedou o presidente, como diria Geraldo Alckmin, em casa de veraneio em Angra; foi apanhado numa das operações Lava Jato; fez delação premiada e pagou multa de R$ 200 milhões.

Não há ressalva possível. Trata-se de equívoco ético e político. Levanta suspeitas. O caso da PEC da transição – que libera gastos de até R$ 200 bilhões fora do teto – guarda algumas semelhanças na narrativa. 

OK, mas continuam sendo R$ 200 bilhões fora do orçamento e sem fonte de financiamento. É irregular, mesmo que seja aprovada a PEC que permite isso. [confiamos que a PEC do PRECIPÍCIO não será aprovada; mais uma vez os mais pobres serão os mais prejudicados = mas, foi o voto errado deles, que substituiu o Auxílio Brasil de R$600,00, pelo novo/velho Bolsa - Família de R$ 400,00.]

Tudo somado e subtraído, aqueles 200 bilhões formam déficit primário na veia, a ser coberto com dívida a juros altos. Como o orçamento dentro do teto já tem déficit, a consequência é óbvia: irresponsabilidade fiscal.Diz Lula: mas é responsabilidade social

Tenta criar assim uma oposição entre políticas sociais para os pobres e controle das contas públicas. Já dissemos e vai de novo: no seu primeiro governo, Lula fez superávit no orçamento e lançou políticas sociais. Podemos pegar também exemplos de fora. Os países europeus são os mais adiantados na aplicação do estado bem-estar. E são também extremamente zelosos na estabilidade fiscal e monetária.

 Qual a consequência da irresponsabilidade fiscal?  Quando o governo é devedor contumaz, isso enfraquece a moeda no caso o real se desvaloriza em relação ao dólar e outras moedas. Quem vive em reais fica mais pobre, simples assim.

Moeda fraca gera inflação – e de novo pune os mais pobres.

Dívida pública crescente leva à alta de juros – o investidor pede mais caro para comprar títulos do governo. Os juros elevados pagos pelo governo se espalham por toda a economia. 
Claro, se eu posso ganhar 14% ao ano emprestando para o governo, por que emprestaria por menos a um empresário ou consumidor? 
Ou seja, investir ou consumir fica mais caro. 
Trata-se de desestímulo à atividade econômica – ou seja, à geração de emprego e renda.
 
Finalmente, as empresas locais perdem valor, estejam ou não listadas na bolsa de valores. Juros altos e incertezas fiscais reduzem o capital disponível para investimentos. 
O ambiente de negócios torna-se desfavorável, algo especialmente ruim num país em que o sistema tributário parece ter sido montado para infernizar a vida das empresas e das pessoas.

Tudo isso acontece e já aconteceu, a partir do Lula2 e de Dilma. Como é possível que não tenham aprendido que irresponsabilidade fiscal com pedaladas e contabilidade criativa levam a recessão e inflação?

         Lembra a sacada de Talleyrand, comentando os erros repetidos dos Bourbon: não aprenderam nada e, pior, não esqueceram nada. [de tudo se conclui de forma inequívoca que rejeitar a PEC do PRECIPÍCIO não é vingança e sim tornar menos dificil a sobrevivência dos mais pobres.]

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista

Coluna publicada em O Globo


segunda-feira, 18 de julho de 2022

Não pode falar da delação de Marcos Valério? - Gazeta do Povo

Rodrigo Constantino

Se a postura continuar essa, a "piada" das redes sociais passará a ganhar contornos de pura verdade: o Supremo pretende lançar candidato próprio ou vai apoiar Lula mesmo?

O ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Alexandre de Moraes acatou liminar do Partido dos Trabalhadores (PT) na noite desse domingo (17) e exigiu a retirada de supostos conteúdos falsos contra a legenda e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Moraes apontou que os conteúdos se baseiam em três temas principais: 
ligação do PT com a organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC); 
- falas de Lula igualando pobres ao papel higiênico;  e, 
- a relação do PT com o nazismo e o fascismo.

"O sensacionalismo e a insensata disseminação de conteúdo inverídico com tamanha magnitude pode vir a comprometer a lisura do processo eleitoral, ferindo valores, princípios e garantias constitucionalmente asseguradas, notadamente a liberdade do voto e o exercício da cidadania", pontuou o ministro na decisão.

A liminar de Moraes cita 16 pessoas, entre elas os deputados federais Otoni de Paula (MDB-RJ), Carla Zambelli (PL-SP) e Helio Lopes (PL-RJ), além do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). A pena diária pela manutenção desses conteúdos é de R$ 10 mil, enquanto novas postagens ou conteúdos irão render multas de R$ 15 mil.[o deputado Daniel Silveira continua sendo multado diariamente? ou o STF resolveu cumprir o decreto do presidente Bolsonaro?]

Leandro Ruschel comentou a decisão: "A denúncia sobre ligação entre PT e PCC foi feita por Marcos Valério, em delação premiada homologada pelo próprio Supremo. A gravidade da decisão: o ministro que assumirá presidência do TSE antes das eleições acabou de censurar mensagens que criticam o PT, com base em delação premiada homologada pelo próprio Supremo
É só uma pequena amostra do que está por vir. O Brasil JÁ É UMA DITADURA. Ainda mais sério: parlamentares que contam com imunidade constitucional, com liberdade de expressão ainda menos restrita, estão sendo censurados por fazer críticas ao PT. 
Você já viu uma ÚNICA mensagem de um parlamentar petista ser censurado por criticar o presidente?  
Se não houver liberdade de expressão na campanha eleitoral, nem adianta discutir a confiabilidade das urnas. 
Se um lado tem liberdade de expressão irrestrita, e o outro lado é sistematicamente censurado e perseguido pela própria justiça, já sabemos qual será o resultado".

A economista Renata Barreto perguntou: "Alexandre de Moraes determinou que sites, influenciadores e políticos APAGUEM posts e vídeos onde dizem que existe ligação do PT com o PCC e de Lula com a morte de Celso Daniel. Ele já descartou que seja verdade, houve investigação?"

Ainda faltam mais de dois meses para as eleições
O que mais o ministro tucano vai inventar? 
Qual será o grau de arbítrio para tentar manipular o debate e impedir um lado de se manifestar? 
Até onde o STF está disposto a ir para proteger Lula e perseguir Bolsonaro? 
Se a postura continuar essa, a "piada" das redes sociais passará a ganhar contornos de pura verdade: o Supremo pretende lançar candidato próprio ou vai apoiar Lula mesmo?

Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

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terça-feira, 5 de julho de 2022

Ex-operador do mensalão - A delação de Marcos Valério que liga o PT ao PCC - Gazeta do Povo

Vozes - Thaméa Danelon

Um olhar sobre a corrupção

 Recentemente foi divulgado na imprensa trechos da delação premiada realizada por Marcos Valério com a Polícia Federal, onde o ex-operador do Mensalão relata a existência de uma suposta relação entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Primeiro Comando da Capital (PCC).

Marcos Valério| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo/Arquivo

De acordo com o delator, o empresário do ramo de transportes Ronan Maria Pinto teria chantageado o ex-presidente Lula para que não fosse revelado um esquema de arrecadação ilegal de valores provenientes de empresas de ônibus, de transportes irregulares e de bingos, sendo certo que esses valores seriam destinados ao financiamento do PT e de políticos ligados a ele.

Ainda segundo a delação, esses recursos seriam destinados ao PT como forma de lavagem de dinheiro do PCC. O esquema teria sido descoberto por Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André, assassinado em 2002. Essa delação foi homologada pelo ex-ministro do STF Celso de Melo, e na semana passada trechos dela foram trazidos ao público. É possível considerar que há grande possibilidade de que todos esses fatos serem verídicos, pois uma delação somente será realizada caso haja evidências robustas das acusações trazidas

No que se refere ao instituto jurídico colaboração premiada conhecida popularmente como delação – é importante deixar bem claro que esse acordo entre o réu e o Ministério Público ou com a polícia, somente será realizado caso sejam fornecidas provas pelo criminoso. Assim, não é suficiente a mera palavra do delator, pois além de relatar todos os crimes que ele praticou, e indicar os terceiros envolvidos no ilícito, caberá a ele apresentar provas de suas alegações.

Em se tratando de crimes de corrupção, caso o delator diga que foi o responsável pelo pagamento de propina a determinado político, caberá a ele, por exemplo, fornecer aos investigadores as conversas de e-mail que trataram do pagamento; a indicação dos funcionários do político envolvidos nas tratativas; e indicar o local em que o pagamento da propina foi realizado. Caso tenha sido entregue em um hotel – prática comum apurada pela operação Lava Jato – é necessário demonstrar a realização da reserva do quarto do hotel; fornecer o ticket do estacionamento onde o carro do responsável pelo pagamento foi estacionado no dia da entrega, dentre outros. Ocorrendo o pagamento da propina através de contas no exterior – como as contas de off-shores – é imprescindível o fornecimento do número da conta e também o comprovante do depósito.

Mas por vezes o colaborador não detém todas as provas em sua posse.
Vamos supor que ele não tenha o extrato bancário que comprove o depósito do valor da propina. Nesses casos, ele forneceria apenas um início de prova, e caberia ao Ministério Público ou à polícia solicitar ao juiz da causa uma quebra de sigilo bancário para que esse documento seja obtido. O colaborador também deverá indicar o nome de possíveis testemunhas e os meios de localização destas, sendo esses só alguns exemplos de provas a serem entregues.

Assim, uma delação premiada somente será assinada entre os investigadores e o réu colaborador caso a versão apresentada seja verossímil e acompanhada das devidas provas e evidências. Havendo a assinatura do acordo de colaboração premiada, o próximo passo é o encaminhamento do documento ao juiz competente para homologação ou não da delação. Havendo a homologação judicial, as investigações terão continuidade para que outras diligências sejam realizadas, como obtenção de outros documentos; interceptações telefônicas e telemáticas; oitivas de testemunhas e até mesmo diligências mais ostensivas, como busca e apreensão e prisões provisórias dos envolvidos.
Veja Também: Corrupção do mensalão e da Lava Jato existiu de fato, diz Fux

Empreiteiras envolvidas na Lava Jato pretendem rever os acordos de leniência

Voltando à delação de Marcos Valério, ele afirma que era responsável pela administração de R$ 100 milhões pertencentes ao PT e que em 2005 ele foi procurado pelo partido para que entregasse R$ 6 milhões ao empresário Ronan para que ele não revelasse o envolvimento do PCC na morte do ex-prefeito Celso Daniel. Segundo o delator, Celso Daniel teria elaborado um dossiê onde continha nomes de pessoas ligadas ao PT e que receberiam parte desses valores ilícitos. Após a sua morte, esse dossiê não foi localizado.

Evidentemente não se pode afirmar categoricamente que todos esses fatos narrados sejam verdadeiros, pois um operador do direito só poderá dar um parecer nesse sentido caso tivesse acesso a todo o processo. Por outro lado, é possível considerar que há grande possibilidade de que todos esses fatos serem verídicos, pois, como dito anteriormente, uma delação somente será realizada caso haja evidências robustas das acusações trazidas. Quando há evidências de que o delator mentiu, além de ter seu acordo de colaboração rescindido, todas as provas oferecidas por ele poderão ser utilizadas contra ele, que responderá também por denunciação caluniosa.

O importante é que tudo seja apurado e, havendo provas da prática de crimes, que os responsáveis sejam processados, condenados e punidos.

Thamea Danelon, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 26 de março de 2022

Roubaram ou não roubaram? - Carlos Alberto Sardenberg

A Lava Jato, embora tenha sido liquidada por uma manobra jurídica e política, voltará à cena nas próximas eleições. Primeiro porque seus principais nomes, Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, vão disputar votos. Segundo, porque políticos condenados e cujos processos foram cancelados, Lula à frente, também estarão nas urnas

E quer saber? Será um bom momento. Haverá, é claro, um debate jurídico sobre o modo de atuação da Lava Jato, mas também dos tribunais que anularam os processos. Isso é importante, mas não parece um tema que desperte as paixões do público.

Desconfio, entretanto, que restará uma questão central, esta sim de fácil entendimento: roubaram ou não roubaram? Houve ou não a construção de um sistema de assalto à Petrobras, em particular, e aos governos, em geral?

O primeiro debate favorece os condenados e ex-condenados. Estes poderão apresentar decisões jurídicas de várias instâncias, inclusive do Supremo, tornando nulas as sentenças emitidas pela Lava Jato. Aqui está o terreno dos chamados garantistas, do grupo de advogados dos réus, o Prerrogativas, derrotados nos primeiros momentos, vitoriosos ao final. E vitoriosos ao velho estilo: adiando, procrastinando, embananando os processos.

Segundo um levantamento do jornal O Estado de S. Paulo, nada menos que “221 anos e 11 meses de condenações ligadas à Lava Jato foram canceladas por irregularidades processuais” (ou supostas irregularidades, acrescentamos nós).

Depois de cinco anos aceitando que os processos de Lula e de outros corressem na vara federal de Curitiba, sede da Lava Jato, o Supremo de repente decidiu que aquele não era o foro adequado. Todos os processos voltaram ao início, em outras varas, abrindo as condições para a prescrição.
Logo, a rigor, não interessa a discussão jurídica sobre o foro adequado. A súbita virada de posição do STF foi determinada pelo ambiente político. Assim como a mudança que cancelou a prisão após condenação em segunda instância.

Vale lembrar: no auge da Lava Jato, em fevereiro de 2016, o STF, por 7 a 4, aceitou a prisão em segunda instância, que não era admitida desde 2009. Depois, em novembro de 2019, por apertadíssimo placar de 6 a 5, voltou a rejeitá-la. Em dez anos, portanto, o STF deu três cavalos de pau – o que não é normal numa corte estritamente jurídica.

As duas viradas abriram caminho para as anulações de processos e recolocaram no páreo centenas de políticos. Não inocentados, mas, digamos, liberados para voltar. De todo modo, poderão dizer: aqui estamos.
O segundo tema da variante Lava Jato coloca,
entretanto, um óbvio embaraço para os ex-condenados: roubaram ou não roubaram? Houve corrupção, dinheiro surrupiado de cofres públicos?

A resposta é simples: houve, de maneira ampla e sistemática. Qual a melhor prova? Não a confissão de réus que fizeram delação premiada que até pode ser contestada – mas o dinheiro devolvido.

Dois casos emblemáticos e bem documentados. Primeiro, até dezembro passado, a Petrobras havia registrado em seus balanços a entrada de R$ 6,17 bilhões, resultado de diversos acordos de leniência e colaboração com empresas e pessoas. Segundo, Odebrecht e Braskem registram em seus documentos os acordos feitos com a Justiça dos EUA, Brasil e Suíça, pelos quais aceitaram pagar US$ 3,5 bilhões como reparações por conduta criminosa. Trata-se simplesmente do maior acordo já feito na história mundial em caso de corrupção.

Diante disso, a reforma feita pelo Odebrecht no sítio de Atibaia é dinheiro de troco. Mas vai para o debate, que afinal poderá ser resumido assim: qual a tolerância dos brasileiros com a corrupção?

Muitos dizem que esse é mais um problema moral, menos relevante para as grandes questões estruturais que envolvem o país. Errado. Já está mais que demonstrado que um sistema de corrupção política destrói a economia, ao eliminar a legítima competição e premiar os amigos do presidente ou do pastor.

A ver o que o eleitor dirá.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

 

Coluna publicada em O Globo - Economia 26 de março de 2022

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Bolsonaro e os Militares -Banda podre da polícia quer a cabeça de coronel - O Estado de S. Paulo


terça-feira, 27 de julho de 2021

O terrível cenário revelado pela CPI (General Braga Netto pode ser convocado a depor na CPI) - Míriam Leitão

 O Globo

A CPI encontrou rastros de movimentação financeira atípica no montante de R$ 50 milhões ao analisar os documentos resultantes das quebras de sigilo. 
Segundo o senador Alessandro Vieira, transações entre empresas do empresário Francisco Maximiano, da Precisa, e com pessoas físicas. Segundo o senador, são “movimentações sem lastro na realidade, compatíveis com processos de lavagem de dinheiro”. [sempre bom lembrar que desde 2018 tentam transformar movimentações financeiras, que consideram atípicas, em crimes, e fracassam. Motivo do fracasso: crimes precisam ser praticados para existirem. Será este mais um fracasso da Covidão - o senador que nos parece foi, ou é, policial civil ou militar, age na CPI como, provavelmente, agia, nas ruas, quando era agente da PC ou soldado PM. 
Ainda que tais movimentações sejam atípicas dizem respeito a um empresário e pessoas físicas - portanto assunto da Polícia ou da Receita Federal. ]

Vieira acha que não há como fugir da convocação do ministro Braga Netto. “Ele fazia parte da cadeia de comando”. [com a competência que lhe é habitual, a ilustre colunista definiu, na chamada da matéria, o quadro que querem provocar: "Míriam Leitão - General Braga Netto pode ser convocado a depor na CPI"]. O relatório final da Comissão pode ser enviado ao Tribunal Penal Internacional. [detalhe: os fatos enviados ao Tribunal Penal Internacional mostrarão que os  abusos da maior parte das autoridades locais podem ter agravado os efeitos nefastos da pandemia.

Será também comprovado que não cabe responsabilizar o Poder Executivo Federal que, por decisão do STF, foi afastado do comando das ações contra a Covid-19 - o Poder Executivo da União passou à condição de coordenador das ações contra a pandemia, desde que suas decisões não contrariassem as 'autoridades locais'. Coordenar sem contrariar as decisões dos coordenados é a mesma coisa de dizer que o coordenador não manda nada. No máximo paga as contas. Nos parece que o TPI concluirá que a responsabilidade fica com as 'autoridades locais' - governadores e prefeitos; agora o que as 'autoridades locais' serão capazes de fazer, dizer, para se isentar das responsabilidades, ou mesmo dividi-las, só o tempo dirá. ]

Eu entrevistei o senador Alessandro Vieira, membro suplente da CPI, e que está em vários grupos temáticos que têm trabalhado durante o recesso. A entrevista foi ao ar na Globonews, no meu programa de segunda, às 23h30. . Perguntei a ele sobre Airton Cascavel, o personagem cuja história foi contada no programa Conexão Globonews.

Airton Cascavel é uma figura meio estranha. Negociava com governadores de estado a compra de equipamento, liberava dinheiro público do combate à Covid, reuniu-se com parlamentares, trabalhou durante dois meses sendo apresentado como o principal assessor pelo próprio ministro Pazuello e nunca fez parte dos quadros do Ministério da Saúde. O senador admite que a CPI tem limitações e precisa evitar perder-se no cipoal que sempre se forma nos casos de corrupção.  É um risco. A CPI não pode fazer busca e apreensão, interceptação telefônica ou negociar delação premiada. Isso tudo dificulta investigação de maior complexidade. Por outro lado, o foco da comissão é investigar as ações e omissões do governo federal na pandemia. Os erros e as protelações na compra de vacinas e insumos, e a falta de uma campanha de comunicação provocaram centenas de milhares de mortes e isso está provado e documentado. Quando a gente investiga a corrupção é para saber as motivações para os erros. Dois grupos, um de militares da reserva e outro vinculado ao centrão, brigaram nas entranhas do Ministério da Saúde buscando vantagens financeiras. É nessa etapa que a CPI se encontra, mas ela não pode perder o foco, que são as vidas que nós perdemos.

A CPI formou um grupo de juristas que vai preparar um estudo para “dar um encaixe dos fatos e a tipificação penal”, segundo o senador. O professor Miguel Reali chefia o grupo de juristas. [grupo de juristas ou 'milagreiros'? Convenhamos que transformar uma porção de coisas tais como desejos, imaginações, ilações, interpretações criativas em provas é algo dificil. E só provas possuem o condão de sustentar acusações.] Perguntei ao senador o que será feito com o relatório quando ficar pronto: — Os crimes de responsabilidade devem ser encaminhados à Câmara, os crimes comuns à Procuradoria Geral da República e, eventualmente, os fatos podem ser levados ao Tribunal Penal Internacional, para avaliar o cometimento de crime contra a humanidade. É muito grave o que aconteceu no Brasil e o que ainda acontece, nessa gestão totalmente descolada daquilo que a Constituição exige, que é o respeito à vida.

O senador lembrou que existe uma cadeia de comando clara, que vai do ex-secretário executivo do Ministério da Saúde coronel Élcio Franco, o general Pazuello, e ministros Braga Netto e Ramos e o próprio presidente da República. — Não dá para fugir (na hora da responsabilização) da cadeia de comando. Alguns temem fazer a convocação do ministro Braga Netto por conta da posição que ele ocupa agora como ministro da Defesa. Mas ele fazia parte da coordenação da resposta brasileira à pandemia e o resultado foi desastroso. A gente precisa ouvir essas pessoas e, se for o caso, responsabilizá-las sem nenhum tipo de preocupação com a questão de farda. No Brasil, ainda se tem muito medo dos generais, mas quando ele ocupa um cargo civil eu não posso dar um tratamento diferenciado.[o senhor diz que não pode dar um tratamento diferenciado? menos senador, bem menos; o senhor é apenas um voto na Covidão - e esta, conforme o senhor bem reconhece no inicio da entrevista, não pode muitas coisas... portanto, menos. Vossa Excelência precisa ter presente que nas ruas, em ações de policiamento, alguns excessos são relevados, até necessários. Porém, o senhor de forma monocrática - autocrática define melhor - cogitar de enquadrar ministros de Estado, generais e o próprio Presidente da República é um caminho que não leva a lugar nenhum  e mesmo sem volta.]

Sobre o presidente, o senador disse que ele “testa os limites da democracia”, e o país não pode esperar “até outubro de 2022 para saber se vai ter golpe ou não”. Por isso ele entrou com uma interpelação judicial de Bolsonaro junto ao Supremo para que ele diga que provas tem de fraude eleitoral. — O ataque diário é preparação para um auto golpe. Ele mente com foco, com organização. Usa a mentira como método. E tem objetivos. O principal é atacar a democracia. Não dá para tolerar dois anos de mentiras e ataques ao sistema de eleição.

Segundo Alessandro Vieira, a CPI revelou que no Ministério da Saúde atuavam o centrão e o “centrão de fardas”.

Míriam Leitão, colunista - O Globo

 

quarta-feira, 12 de maio de 2021

Pedido de investigação contra Toffoli enfraquece o Supremo - Folha de S. Paulo

Carolina Brígido - Brasília - UOL

Como revelou a Folha, PF pediu abertura de inquérito para investigar suspeita de pagamentos a ministro, que nega ter recebido valores ilegais

A chance de Dias Toffoli ser condenadoou, antes disso, de responder a uma ação penal— é praticamente nula. Ainda assim, o estrago na imagem do STF (Supremo Tribunal Federal) já está feito. Integrantes do tribunal avaliam que o pedido da Polícia Federal para investigar o ministro prejudica não só ele, mas a Corte como um todo.

O momento é delicado para o STF e o Judiciário. Há dois anos, intensificaram-se os ataques nas redes sociais e em protestos contra ministros da Corte. As críticas ensejaram a abertura do polêmico inquérito das fake news, que resultou em dezenas de investigações nos estados contra pessoas que atacaram o tribunal.

Iniciada a pandemia da Covid-19, voltaram à tona os ataques ao STF —dessa vez, patrocinados pelo presidente Jair Bolsonaro e seus aliados.A crítica principal foi à decisão que legitimou medidas tomadas não apenas pela União, mas por estados e municípios para conter o coronavírus. Bolsonaro adotou a narrativa de que o Supremo proibiu o governo federal de agir —e, portanto, a culpa pelas mortes seria dos estados.

Na semana passada, Bolsonaro abriu nova frente nos conflitos com o Supremo. Prometeu editar um decreto para garantir o "direito de ir e vir" e, em recado ao STF, disse que o ato não seria "contestado por nenhum tribunal".  Diante dos ataques vindos do governo, o ministro Edson Fachin abraçou a missão de defender o tribunal publicamente —um papel antes exercido por Celso de Mello, aposentado em outubro do ano passado.

Em declarações à imprensa, Fachin tem alertado para o risco de golpe e falado dos males causados pelo populismo. O próprio Fachin foi alvo dos ataques do presidente. Em março, quando o ministro anulou condenações impostas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Bolsonaro disse que Fachin "sempre teve forte ligação com o PT".

A investigação da PF contra Toffoli enfraquece a defesa do tribunal. Os críticos da Corte acabaram de ganhar mais munição. E, dessa vez, a munição é pesada.  A PF diz que fez uma validação prévia das informações prestadas em delação premiada pelo ex-governador do Rio Sérgio Cabral.[delação que foi homologada pelo ministro Edson Fachin.]  A suspeita é que Toffoli recebeu propina.

Para uma investigação ser transformada em inquérito no STF, é preciso que o procurador-geral da República, Augusto Aras, concorde com isso. É pouco provável que Aras peça a abertura de inquérito contra Toffoli. Não é do perfil dele comprar uma briga desse tamanho com a Corte. Ainda assim, a PF tem uma arma para criar ainda mais incômodo à Corte: é possível recorrer, com o argumento de que o inquérito pode ser aberto apenas com o pedido da polícia, sem o aval da PGR (Procuradoria-Geral da República).

O Supremo, então, teria que discutir essa tese em plenário. Ainda que o inquérito não seja aberto, a discussão é um caminho para expor mais o Supremo —e, dessa forma, deixá-lo ainda mais vulnerável.

Carolina Brigido, jornalista  - UOL/Folha



quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Moro e a contratação indecente pela A&M: é dever de Aras mandar investigar - Reinaldo Azevedo

Passadores de pano estão fazendo um esforço imenso para normalizar a contratação de Sergio Moro pela empresa americana Alvarez & Marsal. O homem se tornou sócio diretor. A A&M cuida da recuperação judicial da Odebrecht e já fez o mesmo com a OAS. Tem entre os clientes a Queiroz Galvão e a Sete Brasil. Todas elas são empresas que caíram na voragem da Lava Jato, a dita "maior operação de combate à corrupção do mundo". 

Fonte: Coluna Reinaldo Azevedo - UOL

É a nossa pororoca policial-judicial. Ocorre que Moro homologou parte dos acordos de delação premiada de diretores da Odebrecht e teve influência no acordo de leniência da empresa. Foi ele, pois, a dar um "sim" às vantagens concedidas aos dirigentes e ao próprio grupo. Agora, migra para a A&M, que recebe proventos milionários da... Odebrecht. É, por si, vergonhoso. É preciso apurar se a coisa vai além da vergonha e avança também para o crime.

Coluna Reinaldo Azevedo – Reinaldo Azevedo, jornalista - UOL

 

Leia em UOL - Política: Consultoria que contratou Moro já faturou R$ 17 mi com crise da Odebrecht

 

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Azares da sorte - Merval Pereira

Interpretação da lei resulta em decisões esdrúxulas

Por esses acasos que regem a política, sobretudo a brasileira, que se transmuda tão rapidamente como as nuvens como identificou o político mineiro Magalhães Pinto, o ex-presidente Lula foi parar na cadeia devido a uma lei sancionada por seu “poste” Dilma Rousseff, e pode sair apoiado por uma lei editada por seu inimigo cordial Fernando Henrique Cardoso.  Foi durante o primeiro mandato de Dilma, em 2013, que a Lei das Organizações Criminosas instituiu a colaboração premiada, vulgarmente chamada de “delação premiada” entre nós. Instrumento que, utilizado pela força-tarefa da  Lava Jato, permitiu a prisão de políticos e empresários envolvidos num esquema de corrupção organizado pelo PT para financiar suas campanhas políticas e as de partidos aliados.

Lula foi condenado por corrupção no caso do triplex do Guarujá devido a provas indiciais e testemunhais, entre elas a delação premiada do proprietário da empreiteira OAS, Léo Pinheiro, que confessou ter dado o apartamento ao ex-presidente em troca de favores recebidos.  Já o artigo 283 do Código de Processo Penal que define, na opinião dos contrários à prisão em segunda instância, o trânsito em julgado como uma das maneiras de se levar alguém à prisão, é fruto de uma reforma legal proposta pelo Governo Fernando Henrique em 2001, aprovada dez anos depois.

Na gestão do ministro da Justiça José Gregori, sendo Advogado-Geral da União o hoje ministro do STF Gilmar Mendes, foi criada uma comissão de juristas para elaborar o projeto de lei, apresentado à Câmara dos Deputados baseado em uma explicação técnica das mudanças assinada pelo então presidente Fernando Henrique. Sobre o trânsito em julgado, diz: “Fora do âmbito da prisão cautelar, só é prevista a prisão por força de sentença condenatória definitiva. Com isso, revogam-se as disposições que permitiam a prisão em decorrência de decisão de pronúncia ou de sentença condenatória, objeto de crítica da doutrina porque representava antecipação de pena, ofendendo o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da Constituição Federal)”.

As ações declaratórias de constitucionalidade 43 e 44 propostas pelo partido PEN e pela OAB pedem que o Supremo declare a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que diz: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.

Para os defensores do trânsito em julgado, esse artigo define os três tipos de prisão que existem legalmente:

1) Flagrante delito; 
2) Em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado; 
3) Prisão temporária ou provisória.

Os defensores da segunda instância alegam que as preposições “em” mostram, claramente, quais são os “casos permitidos” para a “prisão”. A “ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente também permite a prisão, e o ministro Luis Fux disse no julgamento do habeas corpus de Lula que a decisão do Tribunal Regional Federal (TRF-4) está, assim, respaldada.  O que está na Constituição Federal quanto à prisão (art. 5º, LXI)confirmaria essa interpretação, quando diz que ela ocorrerá: “Em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente”.

A interpretação dos textos legais tem proporcionado casos esdrúxulos, como o da ex-presidente Dilma, que foi impedida como presidente da República pelo Senado presidido pelo presidente do STF, na ocasião o ministro Ricardo Lewandowski, mas escapou de ter seus direitos políticos cassados.  Consta na Constituição, no artigo 52, o seguinte: “Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis”.

Uma manobra do presidente do Senado, Renan Calheiros, com a conivência de Lewandowski, e apoio dos partidos de esquerda, levou a que o impeachment e a cassação dos direitos políticos fossem interpretados como punições distintas, e não uma conseqüência da outra.  


Merval Pereira, jornalista - Coluna em O Globo


terça-feira, 24 de setembro de 2019

Lula, a Lava-Jato e os meandros da Justiça - Merval Pereira

O Globo

Os meandros da Justiça

É costumeiro dizer que o tempo jurídico é diferente do da política. Desta vez, eles estão se aproximando. O ex-presidente Lula, pela conta mais conservadora, cumpriu ontem um sexto de sua pena de 8 anos, 10 meses e 20 dias definida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no caso do triplex de Guarujá. Poderia ir para o regime semi aberto.  Ao mesmo tempo, o Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para amanhã o julgamento de um caso semelhante ao do ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras, Aldemir Bendine, que teve a condenação anulada devido ao entendimento da Segunda Turma de que réus delatores devem falar antes dos demais réus, pois seriam auxiliares da acusação. E a defesa deve falar sempre por último.

Se o entendimento da maioria acompanhar o da Segunda Turma, não apenas os julgamentos de Lula, mas de vários outros condenados, podem ser anulados, recomeçando do zero.  Em outro processo contra Lula, o do Sítio de Atibaia, está tudo pronto para o julgamento do recurso da defesa no Tribunal Regional Federal-4 (TRF-4). O ex-presidente foi condenado em primeira instância a 12 anos e 11 meses de prisão pela juíza Gabriela Hardt, que substituiu interinamente Sérgio Moro quando este deixou a magistratura para tornar-se ministro da Justiça.

O desembargador João Pedro Gebran entregou seu voto no dia 11, depois de 90 dias de análise, e o revisor Leandro Paulsen também já terminou seu trabalho, restando agora o presidente do TRF-4, Victor Luiz dos Santos Laus marcar a data do julgamento. Isso quer dizer que Lula poder ser condenado novamente antes mesmo que os trâmites burocráticos para a progressão da pena sejam cumpridos. Ou que fique pouco tempo no regime semi-aberto, tendo que voltar para a prisão fechada.

Nesse caso, as sentenças são somadas e o cumprimento de um sexto da nova pena vai demorar mais. A não ser que, nesse intervalo, uma nova decisão do STF proíba a prisão em segunda instância. O que pode demorar também é a insistência de Lula em não querer pedir a progressão da pena, aguardando ser inocentado ou ter a condenação anulada. [Lula não faz a menor falta fora da prisão;
o pedido de progressão de regime não é atendido automaticamente em função do tempo de cadeia do condenado, ele tem que preencher alguns requisitos.]  Há ainda outro recurso que já pode ser marcado no STJ, onde a defesa de Lula pede, desde maio, que ele, em vez de ir para o regime semi-aberto, pois não há vagas em locais apropriados, vá direto para o aberto.

Com a nomeação do substituto interino do ministro Felix Fischer, relator das ações da Lava-Jato, o caso já pode ser decidido. A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de anular o julgamento que condenou Aldemir Bendine por ter recebido R$ 3 milhões da Odebrecht para facilitar contratos da empreiteira com a Petrobras, que presidia na ocasião, é uma interpretação alargada do direito dos réus, mesma prática de que o juiz Sérgio Moro e os procuradores de Curitiba são acusados.

Como lembrou ontem no twitter o juiz Marcelo Bretas, “no processo criminal brasileiro sempre houve delatores e delatados, réus confessos que depõem contra corréus”. Ambos sempre foram tratados igualmente como réus. A nova interpretação da Segunda Turma, tratando os delatores como auxiliares da acusação, tem espaço devido à figura da “delação premiada”, que não existia no processo penal brasileiro.
Tanto que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) referendaram a decisão de Moro, apesar dos apelos da defesa. Justamente por ser uma decisão sem precedentes, caso semelhante está sendo levado ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).

O caso de Bendine, se estiverem esgotados os recursos do Ministério Público e o acórdão publicado, poderá se tornar único se a maioria do plenário do STF decidir em contrário. Ou pode dar inicio a uma jurisprudência.

Merval Pereira, jornalista - O Globo