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quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

“A torcida do Brasil" - Alexandre Garcia



Gazeta do Povo

Muitos de meus amigos atravessaram meio mundo para ver o Flamengo jogar em Doha, no Oriente Médio. E torceram muito. E na semana passada, a polícia prendeu meia dúzia de torcedores, entre os que vandalizaram o Mineirão no dia do rebaixamento do Cruzeiro. Brasileiros que canalizam sua energia para o futebol, assim como milhões de outros torcedores que vivem em função de seus times favoritos. Que vibram, que sofrem, que conduzem suas relações na base de dar palpites, fazer sugestões, dar ideias, para que seu time seja o vencedor, o campeão, o triunfante.

Lembro quando a Seleção se tornou tricampeã do mundo, na Copa do México, em 1970. Os vitoriosos foram recebidos no Palácio do Planalto pelo presidente de República. E a vitória no futebol se tornou uma vitória do Brasil literal, o Brasil não um time de futebol, mas um time de “oitenta milhões em ação”, porque o entusiasmo do futebol foi canalizado para o país. 



E esse entusiasmo gerou o otimismo que decidiu investimento e criou emprego. E logo o país cresceu em ritmo chinês, e isso passou a ser chamado “milagre econômico” – um crescimento médio de 11,2 ao ano, durante três anos. Pleno emprego e plena produção.
 
[aquela SELEÇÃO era a SELEÇÃO, em maiúsculas e não o timinho dos últimos tempos, com mercenários colocados em destaque.

Aliás, para esta seleção a totalidade, ou quase, dos torcedores do CLUBE DE REGATAS DO FLAMENGO são contrários a que um único jogador seja cedido. Nos bons tempos, para qualquer time de futebol ter um jogador cedido à Seleção era motivo de orgulho, ao contrário de agora em que o time é prejudicado e apenas o jogador é favorecido, valorizado no mercado de futebol - o timinho de agora é formado em sua maioria por mercenários.

A Seleção de 68, 62, 70 e mais as  uma ou duas Copas representaram o com louvor o futebol brasileiro e a Pátria Amada Brasil - as outras envergonham até os jogadores que ainda não são mercenários... ainda tem alguns, poucos é verdade.

A de 70 é especialíssima: conquistou o TRI e a posse definitiva da JULES RIMET, formada na totalidade por CRAQUES DO FUTEBOL e representava um País que tinha o GOVERNO e honrava o lema ORDEM E PROGRESSO escrito em nossa Bandeira.]
 Se nosso otimismo exigir gols contra o adversário da corrupção, do assalto, do homicídio, das drogas, do engodo, da mentira e da impunidade
E exigir que no campo, o juiz do jogo seja justo e puna as faltas, principalmente as mais graves.
E passemos a exigir de todos nós que conquistemos vitórias no investimento, no emprego, no fortalecimento das leis anticrime, no fim da burocracia, contra o excesso de carga fiscal, com o fim de um time pesado e lento, que é o estado brasileiro. Nosso cuidado de torcida evitaria as bolas-fora e exigiria cartão vermelho para os jogadores que, em nosso nome, estivessem se aproveitando para prejudicar o time em causa própria. Não é utopia. Eu já vi isso nos anos 70. Agora já tempos uma base mais sólida para o reerguimento de anos de falta de ética e de administração que nos levou à maior recessão da história, de tal forma que ainda restam 12 milhões de desempregados.

Se demonstramos entusiasmo com um time de futebol, que de retorno pode dar-nos, no máximo, alegrias, então podemos torcer pelo Brasil time de que somos sócios perpétuoscom resultados que vão além de alegrias clubísticas. Podemos provocar bem-estar, emprego, mais riqueza, melhores salários, mais e melhor ensino, mais segurança e, sobretudo, um 2020 melhor. 


Feliz Ano Novo!

Alexandre Garcia, jornalista - Gazeta do Povo 





segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Brasília, a Geni do Brasil

Cidade é completamente independente de senadores, deputados, presidentes, ministros e juízes de tribunais superiores, que vivem fechados em seus ‘planetas’

A população de Brasília está indignada. Em grandes centros como o Rio e São Paulo muito se ouve pelas ruas disparos pejorativos como “essa gente de Brasília”, ou “está pensando que isso aqui é Brasília?”. No imaginário (e ignorância) de muita gente, o brasiliense é um janota que desfila de braços dados com corruptos e outros nefastos que frequentam o noticiário político-policial.

Um reflexo desse bullying bizarro: dias atrás um carro com placa de Brasília parou para deixar um passageiro na Rua México, Centro do Rio. Coisa rápida e normal, mas um taxista que vinha atrás meteu a mão na buzina, abriu o vidro e despejou “Tá pensando que isso aqui é sua terra, malandro?!”.  A intolerância trata os brasilienses ou os candangos (quem lá nasceu) como uma nova “Geni” nacional, numa referência a “Geni e o Zepelim”, clássico de Chico Buarque dos anos 70, que no refrão canta “Joga pedra na Geni!/Joga bosta na Geni!/Ela é feita pra apanhar!/Ela é boa de cuspir!/Ela dá pra qualquer um!/Maldita Geni!”.
Confundem a Praça dos Três Poderes — onde estão o Executivo, o Legislativo e o Supremo Tribunal Federal com a população de três milhões de habitantes do Distrito Federal, onde Brasília é apenas uma pequena fatia. 

A cidade é completamente independente dos senadores, deputados, presidentes da República, ministros e juízes de tribunais superiores, que vivem fechados em seus “planetas”, numa espécie de síndrome de Guilherme Arantes, na base do “meu mundo e nada mais”.
“Ninguém vê essa gente em cinemas, teatros, restaurantes, no comércio, nos shoppings, até porque seriam hostilizados”, comenta o jornalista e pesquisador carioca Cezar Mota, que vive em Brasília há mais de 30 anos. “Até amigos me acusam de viver em ‘uma ilha da fantasia’, distante da realidade brasileira. Ora, nada mais identificado com a realidade brasileira do que a Capital Federal, que tem metade de sua população oriunda de todo o país, principalmente nordestinos e nortistas. Ilha da fantasia é a Zona Sul do Rio de Janeiro, que tem olhos apenas para o próprio umbigo, considera-se o centro do país, despreza a Zona Norte e até mesmo São Paulo. Que dirá Norte e Nordeste.”

Apaixonado pela cidade e indignado com esse “linchamento”, Cezar Motta lembra que o Distrito Federal detém o maior índice de homicídios do Brasil por cada grupo de cem habitantes (mais do que o Rio de Janeiro e São Paulo). “O Distrito Federal tem 31 regiões administrativas. Brasília é apenas uma delas”, observa. De acordo com o portal Congresso em Foco, o D.F. tem quase o dobro de homicídios de São Paulo nas suas 31 regiões administrativas. Em média, foram quase duas execuções por dia. Isso representa 20 assassinatos por grupo de cem mil habitantes/ano. Este índice é quase o dobro de São Paulo, que registra 11 homicídios, latrocínios e lesões fatais por grupo de cem mil por ano.[a violência também está presente, e de forma acentuada, na região administrativa Brasília, inclusive no Plano Piloto, Asas Sul e Norte, Lagos Sul e Norte, bairros que nos tempos que Brasília era uma ótima cidade para se morar, foram considerados área nobre.
Agora a bandidagem, a criminalidade, a violência, nivelou tudo por baixo.
E a qualidade de vida de Brasília piorou desde que criaram a tal Câmara  Legislativa do DF - mais conhecida,  pelos absurdos que produz, como 'casa do espanto'.


É o Plano Piloto, não o D.F., o avião idealizado por Lucio Costa e que tem como cabine a Praça dos Três Poderes, como corpo do avião a Esplanada dos Ministérios e o Eixo Monumental. Nas asas (Sul e Norte) vive a classe média alta. Os muito ricos moram em casas nos Lagos Sul e Norte. Nada, porém, comparado aos condomínios exclusivíssimos de Rio e São Paulo. Em 1990, conversei com Oscar Niemeyer sobre Brasília. Ele desabafou: “Misturam Distrito Federal com Brasília; deformaram tudo. O que era um belo projeto para igualar as pessoas, hoje me causa repulsa”.

Por: Luiz Antonio Mello, jornalista - O Globo