Apenas alguma barbeiragem política grave na base de apoio do governo pode levar a um cenário diferente
O governo do presidente eleito Bolsonaro tem todas as condições iniciais
para dar certo. Este é o meu sentimento quando escrevo a última coluna
do ano. Em primeiro lugar, porque inicia seu governo em um ponto do
ciclo econômico de curto prazo extremamente favorável. A terrível
recessão provocada pela incompetência do governo de Dilma Rousseff
provocou uma correção brutal dos principais mercados no Brasil, criando
as condições necessárias para uma recuperação cíclica bastante sólida.
O presidente Michel Temer, com uma política econômica correta, mostrou o
potencial desta nova fase de crescimento, mas perdeu a oportunidade de
consolidá-lo por questões fora do ambiente econômico. Com isto, o nível
de atividade, nos últimos dois anos, permitiu a manutenção das condições
favoráveis de oferta e demanda em setores importantes do tecido
econômico. Por exemplo, o hiato do produto permitiu que o Banco Central
administrasse um dos mais exitosos processos de desinflação da história
econômica recente. O relatório da reunião do Copom de dezembro mostra a extensão deste
processo de desinflação dos últimos anos ao projetar para 2019 e 2020
uma taxa de aumento dos preços abaixo do centro da meta do BC e, acenar
inclusive, com uma possível redução adicional dos juros Selic em 2019.
Com isto, teremos mantido, por três anos seguidos, o controle da
inflação, sem a utilização de mecanismos espúrios de controle de preços e
outros artificialismos. O novo presidente vai assumir seu cargo sem
nenhuma distorção maior no sistema de preços de mercado ou dos
controlados administrativamente.
Por outro lado, a nova previsão da safra agrícola de 2018/2019,
divulgada pelo IBGE na última semana, reforça este cenário benigno da
inflação pela manutenção, por um prazo seguido de três anos, de uma
oferta abundante de alimentos nos mercados internos. Não vai ser por
problemas de oferta que poderemos ter alguma surpresa desagradável neste
segmento importante de preços e que representa cerca de 40% do IPCA.
Outro efeito importante da produção agrícola prevista para 2019 é a
manutenção de um saldo comercial superior a US$ 60 bilhões em nossa
balança de pagamentos. Sem a ocorrência de uma verdadeira catástrofe nos
mercados externos de capitais, a taxa de câmbio no Brasil deve ficar no
intervalo de R$ 3,50 a R$ 3,80. Cabe aqui ressaltar que, no cenário
econômico e político que espero, a entrada de capitais externos deve
pelo menos manter os níveis atuais de US$ 65 bilhões anuais,
fortalecendo o real.
Além da possibilidade de um crescimento econômico sólido em seu primeiro
ano na Presidência, outro fator extremamente positivo para o novo
governo é o apoio da população, como mostram pesquisas recentes
divulgadas. Com mais de dois terços dos brasileiros confiando no novo
presidente fica mais fácil a relação do Palácio do Planalto com o
Congresso. Esta combinação - crescimento econômico e apoio da população -
é suficiente para que a equipe do presidente possa, pelo menos
inicialmente, encaminhar a questão da reforma da previdência. Isto deve
ser suficiente para acalmar os mais agitados com a questão fiscal e da
dívida pública.
Com isto, creio, estará criada a condição suficiente para a economia
crescer algo como 3% ao ano na parte final do ano próximo. À medida que
este cenário se consolide entre a mídia e os principais analistas
econômicos, a tarefa do governo, em relação à agenda de reformas que se
fazem necessárias para um crescimento econômico sustentado, ficará
facilitada pela manutenção de um otimismo perdido há muito tempo na
sociedade brasileira. Apenas alguma barbeiragem política grave na base de apoio do governo
pode levar a um cenário diferente deste nos próximos meses. A falta de
experiência - política e administrativa - do PSL, partido de Bolsonaro, é
um risco que só pode ser afastado pelo acompanhamento dos fatos nos
próximos meses. A montagem do novo ministério, primeiro teste efetivo do
potencial de governabilidade do governo eleito, terminou com poucos e
negligenciáveis percalços. O próximo desafio será a gestão do processo
de alternância de poder no Senado e Camara de Deputados, agora em
janeiro.
Uma última peça para a montagem de meu cenário para 2019 fica por conta
da economia internacional e, apontada hoje pelos mercados, como maior
fator de risco para a economia brasileira. O estabanado governo do
presidente Trump é hoje responsável por um cenário de confronto nas
relações internacionais e pelo risco real de recessão na maior economia
do mundo. O agravamento do confronto comercial com a China, parte de um
conflito maior entre a economia mundial dominante e a China que em
poucos anos tomará esta posição, pode acelerar os riscos de recessão
econômica já contratada pelos erros cometidos no front fiscal pelo
presidente americano. A combinação destas duas forças desestabilizadoras
pode criar uma situação internacional muito difícil.
Mas o Brasil, dada a situação de nosso ciclo econômico, certamente vai
sofrer menos as consequências deste cenário em 2019. Particularmente não
visualizo riscos maiores para nós vindo do front externo e que
inviabilize o cenário local projetado acima.