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domingo, 24 de outubro de 2021

O incômodo que provoca o caso Allan dos Santos - Gazeta do Povo

Diogo Schelp

Decisão judicial se cumpre e, quando se considera equivocada ou injusta, se contesta por meio dos canais legais. No caso de Allan do Santos, o blogueiro e youtuber bolsonarista, as medidas determinadas pela Justiça, sem entrarmos no mérito se eram justas, não vinham sendo cumpridas. Ele não poderia estar divulgando os conteúdos de seu canal , por exemplo.

Por essas e outras, Alexandre de Moraes, ministro que comanda os dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) em que Allan dos Santos é investigado, acatou o pedido da Polícia Federal para mandar prendê-lo preventivamente — decisão que veio acompanhada de ordem de extradição, já que o blogueiro se encontra nos Estados Unidos, para onde ele se mudou, ao arrepio das leis de imigração locais, depois que começou a ser investigado.

Por enquanto, até o fechamento deste texto, Allan dos Santos ainda não figura entre os procurados pela Interpol, a Organização Internacional de Polícia Criminal. A simples solicitação por parte da PF não garante que uma pessoa entre na lista de alerta vermelho. Isso pode ocorrer nos próximos dias.

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É possível que Allan dos Santos tenha realmente cometido os crimes pelos quais é investigado. A PF afirma ser ele líder de uma "organização criminosa" dedicada a atacar autoridades públicas, a desacreditar o processo eleitoral, a incentivar a polarização política e a provocar a animosidade entre os poderes da República. Além disso, ele é suspeito de incitar outras pessoas a cometer crimes.

O que causa incômodo é que, por mais desprezíveis que sejam as opiniões do blogueiro, por mais antiéticos que sejam seus métodos de comunicação, por mais absurdas que sejam as mentiras que ele cria ou ajuda a espalhar (e são muitas) e por mais que tudo isso possa realmente ser enquadrado como crimes pela lei brasileira, a maneira como o seu caso vem sendo conduzido passa a impressão de seletividade da Justiça, ou seja, de um tratamento mais duro do que normalmente se adota para investigados como ele.

Allan dos Santos se identifica como jornalista e assim também é descrito por seus seguidores. É preciso muita boa vontade para considerar que este é realmente seu ofício. Jornalistas não combinam estratégias com agentes políticos para favorecer determinado projeto de poder. Isso é coisa de militante. Postura, aliás, presente também em certos influenciadores da esquerda que se apresentam como jornalistas — e que também têm a difusão de mentiras e a destruição de reputações como métodos. Como eles, Allan dos Santos é um ativista político. Se sua motivação é ideológica ou financeira, ou ambas, é outra discussão.

O fato de ser militante, porém, não reduz o incômodo de se assistir a alguém ser alvo de uma ordem de prisão preventiva por difundir informações ou, que seja, desinformações. Será que cabe a afirmação de que essa é uma conduta "de elevado grau de periculosidade", como afirmou Moraes em seu despacho?

É bom lembrar que Allan dos Santos é um investigado.  
Não foi ainda julgado e condenado pelos supostos crimes que cometeu. Faz sentido mantê-lo preso até lá? O dano que ele causa estando à solto é maior do que o de, potencialmente, violar um direito fundamental?

E mais, que tipo de precedente isso abre para outras pessoas que, no futuro, venham a se tornar alvo de inquéritos do STF ou a pisar nos calos de seus ministros?

Diogo Schelp, colunista - Gazeta do Povo- VOZES