Não haverá superávit primário enquanto o ralo da Previdência sugar, como ocorre há anos, qualquer sobra acumulada nas contas do Tesouro
Pelos critérios do Fundo, a dívida do
governo geral, no Brasil, bateu em 87,9% do PIB no ano passado e deve
atingir 90,4% neste ano. Campeão dos endividados entre os grandes
emergentes, o Estado brasileiro deverá em 2024 o equivalente a 97,6% da
riqueza produzida no Brasil durante um ano, segundo projeção do Fundo
Monetário Internacional (FMI). Pior: isso ocorrerá mesmo se a reforma da
Previdência for aprovada e o teto do gasto público for mantido. O
quadro poderá ser um pouco melhor se houver maior eficiência na gestão
das contas públicas, mas isso dependerá de novos padrões na
administração pública. Não há terrorismo nas contas divulgadas na última
edição do Monitor Fiscal, uma publicação
periódica do FMI. Pode haver alguma diferença em relação aos cálculos de
Brasília, mas a tendência embutida nas cifras é a mesma. O setor
público brasileiro nem sequer tem conseguido, há alguns anos, pagar os
juros vencidos em cada exercício. Com isso, os compromissos são rolados,
novos papéis são emitidos, juros se acumulam e o passivo do setor
público aumenta sem parar.
Para frear o crescimento da dívida pública, o governo precisará
equilibrar suas contas e em seguida obter superávit primário. O
resultado primário reflete a diferença entre receitas e despesas
contabilizadas no dia a dia da administração pública, sem os custos da
dívida. Quando esse resultado é negativo, falta dinheiro até para os
juros vencidos. Quando positivo, pode-se pagar pelo menos uma parte dos
compromissos. Não haverá superávit primário enquanto o ralo da
Previdência sugar ─ como ocorre há anos ─ qualquer sobra acumulada nas
contas do Tesouro.Há expectativa de melhoras. Se o teto de gastos for mantido e a reforma da Previdência passar em 2019, um pequeno superávit primário, equivalente a 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB), será obtido em 2022. Nas projeções anteriores, divulgadas em janeiro pelo FMI, o resultado positivo seria alcançado em 2023.
Pelos critérios do Fundo, a dívida do governo geral, no Brasil, bateu em 87,9% do PIB no ano passado e deve atingir 90,4% neste ano. O governo geral corresponde aos três níveis da administração pública. O resultado financeiro reflete principalmente as oscilações do poder central, embora os Estados e municípios também estejam em situação difícil e necessitem de mudanças nos sistemas de aposentadorias.
Pelas contas oficiais do Brasil, a relação dívida/PIB é menor, porque os cálculos excluem os papéis do Tesouro na carteira do Banco Central. Mas a diferença, próxima de dez pontos, é pouco relevante. Por qualquer critério, o passivo é enorme e a tendência é de crescimento nos próximos anos. A referência aos números do FMI facilita as comparações internacionais. No ano passado, a dívida do governo geral, nas economias emergentes e de renda média, equivalia em média a 50,8% do PIB, com diferença de 37,1 pontos em relação à condição brasileira.
Enquanto o governo geral acumula déficits primários, a conta de juros se expande, principalmente por falta de pagamento. A soma do saldo primário e dos juros dá o resultado nominal, o mais amplo. No ano passado, pelas contas do Fundo, o déficit nominal brasileiro correspondeu a 6,8% do PIB. A projeção é de 7,3% neste ano e de um recuo seguido até 5,8% em 2024. Nesse ano, o déficit nominal médio dos emergentes deverá chegar a 4,3%; dos latino-americanos, a 3,4%. Se essas projeções se confirmarem, a dívida do governo geral ainda será assustadora no segundo ano do próximo mandato presidencial. Mas as condições de governo serão melhores, se o País tiver avançado no programa de ajustes e reformas. A confiança dos mercados no País será maior, a inflação permanecerá contida e os juros poderão ser mais baixos.
Se o governo do presidente Jair Bolsonaro falhar no cumprimento desse programa, as dificuldades já serão muito maiores antes de qualquer candidato se apresentar para as próximas eleições. Ele mesmo poderá, bem antes do fim de seu mandato, arrepender-se de haver ocupado a sala principal do Palácio do Planalto. A conta será paga pela maior parte dos brasileiros, independentemente de ter apoiado ou rejeitado a pauta de reformas.
Revista VEJA