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quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Riscos de a desordem urbana anular avanços das UPPs

Pacificação tem atraído novos moradores, que se prevalecem da leniência do poder público para ocupar áreas beneficiadas pela política de segurança nas favelas

A instalação das Unidades de Polícia Pacificadora no Rio tem o propósito, em razão da urgência ditada pela dimensão da violência, de resgatar comunidades subjugadas por grupos do crime organizado. Adjacentes a esse objetivo, e tão importantes quanto a ocupação policial, situam-se as ações sociais, um conjunto de iniciativas no âmbito do poder público. Caso da oferta de serviços, urbanização e políticas públicas (entre elas, habitação), em geral ausentes nas favelas, em grande parte devido a barreiras criadas pelas quadrilhas que nelas atuam. Ambas, a retomada de regiões e sua reocupação pelo Estado, são partes indissociáveis de um mesmo programa.

Era de se esperar, por isso, que às ações policiais de asfixiamento dos grupos criminosos e de libertação das áreas por eles controladas, se sucederiam os movimentos do poder público para conduzir tais regiões à formalidade. A constatação de que, nessas comunidades, em lugar de atrair o Estado, a pacificação tem permitido o avanço da favelização é preocupante sinal de distorção dos propósitos do programa das UPPs.

O comentário do secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, de que a desordem urbana nas comunidades com UPPs tem sido cevada, ainda que indiretamente, pela pacificação, é um preocupante alerta. A leniência do poder público estimula um movimento previsível: com oferta de mais segurança para morar, fiscalização precária e sem uma reocupação efetiva do poder público com seus serviços, essas áreas têm atraído novos moradores. Em vez de ações planejadas de urbanização, uma alternativa aberta pelas unidades pacificadoras, dá-se o incremento da invasão desordenada. Esta, por sua vez, realimenta uma cadeia de informalidade propícia ao retorno das quadrilhas do crime organizado. É um deletério jogo que se realimenta no vazio do Estado.

Fenômeno semelhante já havia ocorrido com o Favela Bairro. O programa introduziu uma série de melhorias nas favelas atendidas, mas, sem uma perspectiva mais ampla de mudar o perfil de ocupação dessas regiões, acabou por incentivar o movimento de ocupação desordenada.

É uma lição para a atual pacificação: cumprida, na maioria das favelas, a missão de retomada das áreas para o controle do Estado, fica a sensação de que falta vontade política aos órgãos de governo para dar seguimento aos objetivos mais estratégicos da política das UPPs.

O secretário Beltrame já chamou atenção também para a necessidade de se abrir espaço, via urbanização, para o acesso dos serviços públicos. Vielas e becos são obstáculos intransponíveis nas favelas, e removê-los é um imperativo para a chegada desses serviços — inclusive de segurança. As UPPs, portanto, não podem servir de anteparo para o incremento da desordem urbana. Elas devem ser avalistas das necessárias mudanças do perfil de ocupação das favelas.

Fonte: O Globo - Editorial