Lula não precisa melhorar a biografia. A guerra da comunicação ele já ganhou
Por mais que os estrategistas do partido digam que estão certos, e por mais que se reconheça em Lula um instinto animal quando o negócio é a política, não dá para dizer que a decisão do PT de insistir na candidatura do ex-presidente não é um erro. No debate promovido pela TV Bandeirantes na quinta-feira, os candidatos de oito partidos mostraram sua cara. O do PT não. Lula pode dizer que o candidato é ele. Portanto, muito conhecido, com um índice de aceitação por parte do eleitor suficiente para levá-lo ao segundo turno. Mas Lula está preso, condenado por órgão colegiado a 12 anos e 1 mês por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Portanto, está inelegível, pois enquadrado na Lei da Ficha Limpa.
Lula dirá que a prisão é injusta. Seus seguidores, que o processo, a condenação, a prisão e a segregação social ocorrem porque há um complô do Judiciário, do Ministério Público e dos meios de comunicação para impedir que ele seja novamente eleito. Se Lula pensa mesmo assim, e não em usar uma improvável candidatura para deixar a indesejável cadeia, ele poderia nesse momento estar empenhado em consolidar a candidatura do ex-prefeito Fernando Haddad à Presidência, já conhecido como o plano B para a disputa presidencial. No discurso que fez em 7 de abril, antes de ser preso, Lula disse: “Eu não sou um ser humano. Sou uma ideia. E não adianta acabar com as ideias”.
Ora, se Lula quer mesmo ser uma ideia, chegou o momento de incorporar essa ideia em Fernando Haddad, mandá-lo rodar o País, dar início à campanha do PT. Afinal, uma ideia, já provou a História, é coisa que não se aprisiona. Num contexto de abnegação de Lula, se o PT perder a eleição, poderá dizer que perdeu porque foi impedido de entrar na disputa numa conspiração sem tamanho. Se vencer, poderá dizer que a ideia se multiplicou, entrou nos corações dos eleitores e, apesar da prisão, a ideia prevaleceu. Com certeza, será um discurso arrebatador, capaz de fazer o PT crescer bem mais do que aprisionado à vontade de Lula. O ex-presidente não precisa mais ser candidato para melhorar sua biografia. A guerra da comunicação ele já ganhou. A jurídica é outra coisa. É passageira, como passageira é a vida.
Amarrado como está, Fernando Haddad corre o risco de não ter tempo para se apresentar ao eleitor caso Lula não consiga o registro para se candidatar, o que é muito, mas muito provável. O PT precisa entender que numa campanha eleitoral o partido não fala só para seus militantes. Fala para a população em geral, busca o voto. Se não tiver um candidato para apresentar, para dizer o que pretende fazer caso volte ao governo, ou até mesmo para se tornar um ventríloquo de Lula, já que Lula não pode falar, não tem nada a fazer.
No debate da TV Bandeirantes, Geraldo Alckmin começou a marcar seu território. Num contraponto ao PT, disse que vai abrir a economia ao mercado internacional para gerar mais empregos. Que vai fazer as reformas da Previdência, trabalhista e política. Jair Bolsonaro (PSL) preferiu manter silêncio, para garantir a boa aceitação que tem no eleitorado. Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) falaram de seus projetos, embora superficialmente. Guilherme Boulos, preocupado em fazer o seu PSOL ocupar o lugar do PT, ergueu sua bandeira de esquerda, como Lula e seu partido fizeram há quase 40 anos. Já o PT, zero.
O cabo e o capitão
O deputado Jair Bolsonaro é capitão da reserva do Exército, da arma da artilharia, que frequentou a Academia Militar de Agulhas Negras e se especializou em paraquedismo. O deputado Cabo Daciolo (Patriota) é um cabo do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro que se envolveu nos movimentos grevistas. O cabo pode roubar votos do capitão. Muitos.
O Estado de S. Paulo