J. R. Guzzo
Ministros que estão acostumados a só ouvir políticos bajuladores ficaram em estado de choque em plena sessão; a partir de agora, réus não serão mais julgados em público
O plenário do Supremo Tribunal Federal ouviu
em público e diante das câmeras de televisão, enfim, o que já poderia
ter ouvido há muito tempo. “Os senhores são as pessoas mais odiadas do
Brasil”, disse em plena sessão de julgamento o advogado Sebastião Coelho,
defensor do primeiro réu nos processos de Brasília. Os ministros
ficaram em estado de choque.
Estão acostumados a só ouvir políticos
bajuladores, gente que tem medo deles, elogios da maior parte da mídia e
juras de obediência.
Como alguém poderia dizer uma coisa dessas, na
frente de todos eles? Sua reação automática foi se esconder dos olhares
da população.
A partir de agora, os réus não serão mais julgados em
público.
Os advogados não poderão fazer a defesa oral, um dos direitos
mais elementares de quem é acusado de qualquer crime.
Não haverá
discussão com os ministros que por acaso discordem das condenações já
decididas pelo inquisidor-chefe do processo.
O dr. Coelho, e seus
colegas, terão de trabalhar com uma mordaça.
O público foi expulso. O
julgamento virou “virtual”.
O STF tinha um plano grandioso: fazer do julgamento do “8 de janeiro”
um espetáculo de propaganda do regime político que há anos vem
construindo no Brasil.
Seria um show com aplausos já acertados junto à
plateia, para exibir a força dos ministros e para mostrar que haverá
punições extremas contra os “inimigos da democracia” – tal como a
democracia é entendida hoje pelo Supremo. Foi uma de suas piores ideias.
Abriram espaço para os advogados mostrarem, diante de todo o país, o
momento de infâmia para a justiça brasileira que este processo tem sido
desde o primeiro dia.
É uma combinação inédita de ilegalidade e de
injustiça em estado bruto. Diante da TV, os cidadãos puderam ver o
juiz-chefe dizer que não era preciso provas individuais contra os réus.
Viram sua irritação escandalizada com os advogados de defesa e colegas
que não votaram como ele.
Viram pessoas ser condenadas a 17 anos de cadeia por participarem de um quebra-quebra.
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O
público teve a oportunidade de constatar que os réus estavam sendo
punidos, com penas que só se aplicam aos chamados “crimes hediondos”,
por um delito impossível de ser cometido.
As condenações foram por
“golpe de Estado”, mais “abolição violenta do estado democrático de
direito”.
Como os acusados poderiam dar um golpe se não tinham sequer um
estilingue – ou praticar os dois crimes ao mesmo tempo?
Porque estavam
sendo julgados diretamente no STF – e, portanto, sem possibilidade de
recorrer das suas sentenças – se nenhum deles tinha o “foro especial”
que a lei exige para julgamentos criminais no Supremo?
Era melhor ter
deixado debaixo do tapete essa imposição de ilegalidade maciça, como tem
sido feito nos últimos oito meses.
Mas os ministros quiseram se exibir
como soldados da “democracia” e meter medo na “direita”.
Deu errado – e
tiveram de escapar de novo para trás dos seus computadores, o lugar
ideal para dar as sentenças que estão dando.
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo