A quantas heterodoxias vai se entregar o TSE sob os cuidados desses valentes? Não sei. Mas sabemos bem do que têm sido capaz essa gente no tribunal constitucional
Não deixa de ter a sua graça trágica que
Luiz Fux vá comandar o tribunal durante boa parte do ano eleitoral; que
passe o bastão depois para Rosa Weber e que Roberto Barroso e Edson
Fachin integrem o TSE numa quadra tão complicada da vida nacional (leia post anterior ).
Fux foi o relator da Ação Direta de
Inconstitucionalidade que acabou resultando na proibição da doação de
empresas privadas a campanhas. A decisão veio à esteira da histeria
provocada pela Lava Jato. Como adverti tantas vezes aqui, escolher esse
caminho correspondia a jogar fora a água suja junto com a criancinha.
Mas quê… De pouco adiantou. Fux produziu uma peça verdadeiramente
condoreira contra essa modalidade de financiamento de campanha e,
infelizmente, arrastou o voto de sete outros ministros: Barroso, Dias
Toffoli, Rosa, Cármen Lúcia, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e
Joaquim Barbosa, que ainda integrava o tribunal. Fizeram a coisa certa,
nesse caso, Teori Zavascki, Gilmar Mendes e Celso de Mello.
E por que eu me opunha com tanta
determinação a que se proibissem as doações de pessoas jurídicas? Ora,
em razão de uma questão elementar: é evidente que isso implicará um
aumento do caixa dois nas campanhas. Dinheiro não cai do céu. Nesse
caso, pode vir do inferno. E vem. O narcotráfico lida com grana viva e
sem registro. Já participava marginalmente do processo eleitoral. Agora,
vai entrar para valer. Tantas vezes chamei a atenção para a questão.
Mas foi inútil.
Na sexta-feira, o UOL publicou uma entrevista com
Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, que está preso no presídio
de segurança máxima de Mossoró. Está condenado a 48 anos e amarga
cadeia há 21. Segundo a Polícia, é um dos chefões do Comando Vermelho,
que travou, não faz tempo, uma guerra suja com o PCC, cujo epicentro
está em São Paulo. Marcinho diz com todas as letras: o narcotráfico já
financia campanhas eleitorais. Imaginem o que vai acontecer a partir
deste ano. O bandido, claro, faz essa declaração ao defender a
legalização das drogas, hipótese em que acabaria o tráfico e, pois, as
ilegalidades a ele associados. Nesse particular, o ministro Barroso já
deixou claro que concorda com ele. É outra tese muito influente entre os
inocentes, os energúmenos e os interessados, como Marcinho VP. Já
escrevi muito a respeito neste blog e não me estenderei sobre isso agora
para não perder o foco.
Fux, que vai comandar o TSE, estará à
frente do tribunal ao qual caberá cuidar das sanções às transgressões
eleitorais que seu voto certamente contribuiu para multiplicar a níveis
escandalosos. Depois, o ente passa para as mãos de Rosa Weber, que
aderiu à tese. E, bem…, é preciso lembrar, o regente dessa ópera bufa se
chama Roberto Barroso. Poucos se lembram: aquela Ação Direta de
Inconstitucionalidade que chegou ao Supremo era de sua autoria, quando
ainda atuava como advogado. A ação foi impetrada pela OAB Nacional, e o
agora ministro foi o defensor na causa. Já no tribunal, com o
desassombro que lhe é muito peculiar, não hesitou em dizer “sim” ao
próprio texto.
A quantas heterodoxias vai se entregar o
TSE sob os cuidados desses valentes? Não sei. Mas sabemos bem do que
têm sido capaz essa gente no tribunal constitucional. Fachin fez-se
relator do caso JBS sabendo que este nada tinha a ver com o chamado
“petrolão”. Foi escolhido a dedo, e contra a lei, por Rodrigo Janot, o
que acabou sendo endossado por Cármen Lúcia. Mesmo assim, não teve pejo
em homologar um acordo de delação com Joesley Batista e sua trupe que
entrará para a história, ele sim, como um dos maiores escândalos de que
se teve notícia na corte.
Rosa, Barroso e Fachin, o trio do
barulho que resolveu aplicar a sua própria Constituição, não a que
temos, inventando uma punição para parlamentares que não está prevista
em lugar nenhum — o afastamento, de ofício, com recolhimento domiciliar
— vai se encontrar no tribunal que cuida da espinhosa questão
eleitoral, pedra de toque da democracia. E olhem que só não será o
quarteto a aterrorizar o processo porque Fachin substituirá Fux, já que,
dos sete membros do TSE, são apenas três os membros oriundos do
Supremo. Dois vêm do STJ, e o outro par é escolhido pela Presidência da
República entre juristas.
Para encerrar: os quatro estiveram
juntos, de novo, na mais estupefaciente das votações jamais perpetradas
do STF: aquela que entendeu que na Lei da Ficha Limpa poderia ser
aplicada retroativamente, inclusive sobre a coisa julgada, o que é uma
aberração. As eleições de 2018 se afiguram, desde já tensas, com
elevado potencial de conflitos. Sem as doações privadas, podem se
multiplicar brutalmente as denúncias de irregularidades. E, se isso não
acontecer, é porque estará em curso um pacto entre os praticantes de
ilícitos eleitorais, com o tribunal, que só atua quando é acionado,
fazendo de conta que nada vê. Esses feiticeiros terão a chance de provar que suas poções mágicas funcionam. E, como sabemos, não vão funcionar.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo