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terça-feira, 16 de março de 2021

Com firma reconhecida - Alon Feuerwerker

Análise Política

Documento oficial do governo americano informa que os Estados Unidos atuaram (ainda atuam?) junto ao Brasil para evitar que usássemos (usemos?) vacinas russas contra a Covid-19 (leia). Aparentemente, essa pressão tem sido feita sem a oferta de contrapartidas. Por exemplo, os americanos poderiam oferecer-nos vacinas deles em lugar das do concorrente geopolítico.

Pressões desse tipo são esperadas num ambiente global de acirramento das disputas. A principal hoje é entre os Estados Unidos e a China, mas a polarização entre americanos e russos também vai adquirindo desenhos assemelhados aos da Guerra Fria, que durou do pós-2a. Guerra até o colapso e a consequente  extinção da União Soviética. Mas não é normal que o poder de barganha de um país esteja tão diminuído para uma pressão desse tipo não vir acompanhada de ofertas compensatórias. Afinal, vacinar os brasileiros deveria em teoria interessar ao mundo todo. Ou, pelo menos, ficar bem com o Brasil deveria ser do interesse do ocupante da Casa Branca, qualquer que fosse ele.

O debate político aqui dentro vai muito aquecido, com cada jogador tentando tirar o máximo proveito da desorganização no combate à Covid-19. Parece faltar, entretanto, quem esteja pensando antes de tudo no interesse nacional. E o interesse nacional é um só. Ter e aplicar o maior número de doses de vacina no menor tempo possível.

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político


quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Fazendo a coisa pequena

Há uma cultura hostil ao empreendedor privado 

Pode parecer coisa pequena – isso de ambiente de negócios – mas consideremos o seguinte: o desenvolvimento depende da existência de boas empresas produzindo mercadorias, serviços e empregos; logo, facilitar a vida das empresas equivale a sustentar o desenvolvimento. Óbvio. E se é óbvio, dirão, por que se ocupar desse tema?  No caso brasileiro, por uma razão muito simples: leis, normas, regras, além de uma certa cultura, são hostis ao empreendimento privado.  E não deve ser por acaso que os países mais ricos e/ou que se desenvolvem mais depressa tem legislação e práticas que favorecem a vida de quem ganhar dinheiro honestamente.

Aqui, a inflação está muito baixa, os juros estão caindo, o dólar comportado, há uma certa retomada, mas tente abrir uma empresa para participar dessa história. Você vai entender o que é burocracia e má vontade das autoridades. O Banco Mundial pesquisa anualmente o ambiente de negócios de 190 países. O trabalho chama-se Fazendo Negócios e o último ranking colocou o Brasil em 109º. Mas no item “Abertura de empresas”, o Brasil consegue ser pior que a nota média. Aparece em 140º. A pesquisa, considerando empresas privadas médias, em São Paulo e no Rio, avalia coisas assim: quanto custa abrir uma empresa; quantos procedimentos são necessários; quantos documentos; com quantas autoridades se lida; quanto tempo leva.

Outros itens em que o Brasil vai mal: obtenção de alvarás para funcionamento de qualquer coisa, posição 175ª; registro de propriedades, 137º.
Mas é excepcionalmente ruim a posição brasileira no quesito “Pagando impostos”. Reparem. Não se trata de carga tributária – quanto imposto se paga – mas o tempo de trabalho e os custos que uma empresa tem para manter em dia suas obrigações tributárias. O Brasil fica em 184º, em 190 países. Considerando que os seis últimos são puro desastre – como a Venezuelapode-se dizer que o sistema tributário brasileiro é simplesmente o pior do mundo.  Por isso foi muito importante que o presidente Bolsonaro abordasse o tema em Davos e firmasse uma meta ambiciosa: colocar o Brasil entre os 50 melhores países para se fazer negócios.

As dificuldades impostas às empresas têm duas principais causas. Uma é a burocracia governamental que, em todo lugar do mundo, tem uma tendência “natural” de estender suas amarras por toda parte. É o ambiente dos alvarás, da cópia xerox autenticada, da assinatura com firma reconhecida.
A segunda causa é uma cultura hostil ao empreendedor privado, ao cara que se arrisca para ganhar dinheiro corretamente. Essa cultura tem um viés que vem lá do mundo ibérico – nobres não trabalham, encostam-se no Estado – e um lado religioso, católico – lucro é quase um pecado.

Acrescentou-se de uns tempos para cá uma visão esquerdista, anti-capital. Uma coisa às vezes implícita, muitas vezes escancarada. Os governos petistas, por exemplo, contestavam os estudos do Banco Mundial, considerando-os neoliberais, de gente que queria criar por aqui uma selva capitalista. Claro, não precisam me dizer que o Estado tem que regular as atividades econômicas. Quando se fala de liberdade de empreender, não se trata de permitir rolos ou transporte sem normas no Rio das Pedras, as conhecidas vans clandestinas.

Aliás, essas atividades ilegais aparecem, entre outras coisas, dada a dificuldade de fazer a coisa certa.  Tudo considerado, facilitar o ambiente de negócios exige um conjunto de pequenas ações direcionadas para diminuir as burocracias federais, estaduais e municipais, além de uma lenta e segura mudança de cultura. Estudos do Banco Mundial confirmam que não se trata de coisa pequena. Ou melhor, que o conjunto de pequenas ações pode trazer enormes resultados, como dobrar a capacidade de crescimento do país. Hoje, se estima que o crescimento potencial do PIB brasileiro é de 2,5% ao ano. Com melhor ambiente de negócios, poderia chegar a 5% em médio prazo.
Faz diferença.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista