Em
apenas dois casos de fraudes cambiais, lavagem de US$ 1,5 bilhão nos últimos 12
meses. É
evidência de controles frágeis e de uma lucrativa leniência do sistema
financeiro
Na
quinta-feira 21 de maio, Daniel Rasgdale, diretor do Serviço de Imigração e
Controle de Alfândega dos Estados Unidos, conversou com Leandro Daiello e
Rogério Galloro, chefes da Polícia Federal brasileira.
Na
quinta-feira passada, três semanas depois da reunião em
Washington, agentes federais prenderam 11 pessoas e recolheram papéis nos
escritórios de seis corretoras de valores e um banco em São Paulo, no interior
paulista (Araras, Indaiatuba e Santa
Barbara do Oeste), em Curitiba e em Resende, no Sul fluminense. Todos são
suspeitos de participação em uma rede de
lavagem de dinheiro que opera no Brasil, Venezuela, Estados Unidos, Reino
Unido, Japão e Hong Kong.
Ano
passado, os EUA alertaram a Polícia Federal para a
relevância do núcleo brasileiro, especialmente na lavagem de recursos
subtraídos da estatal de petróleo da Venezuela, a PDVSA, em cumplicidade com
funcionários do governo local. A PDVSA paga quase todo tipo de despesas do governo da
Venezuela. Supostas importações do Brasil eram superfaturadas para
justificar as remessas de Caracas. O que
custaria U$ 20 mil, acabava contabilizado por US$ 1 milhão.
O dinheiro saía da
petroleira e aportava no sistema financeiro do Brasil. Daqui seguia para contas
bancárias em outros países, disfarçado em pagamentos realizados por empresas
brasileiras. Era só papel — lucrativa
ficção montada no sistema de câmbio de comércio exterior. São crescentes as evidências de fragilidades nos controles do Banco Central e
da Receita Federal. Elas se agravam com a leniência de um sistema
financeiro em que bancos e corretoras, voluntariamente, permutam práticas do
tipo “conheça o seu cliente” por
comissões relevantes para os bônus anuais dos executivos.
Em apenas
dois casos, nos últimos 12 meses, somaram-se fraudes cambiais de US$ 1,5 bilhão.
A revelada na semana passada supera US$ 1 bilhão, informa
a polícia. Outra foi descoberta em abril de 2014, durante análise das finanças
de Alberto Youssef, o “operador” de propinas do Partido
Progressista (PP), de empreiteiros, diretores da
Petrobras e, também, do traficante Fernandinho Beira-Mar. Comprovaram-se transferências ilegais de
US$ 444,6 milhões para contas em bancos de 24 países.
Youssef fez 3.649 operações
fictícias de comércio exterior, usando apenas seis empresas de fachada, durante
132 semanas entre 2011 e 2014. Esse foi um dos dutos para propinas pagas no
condomínio político-empresarial que devastou a Petrobras na última década. Sem
bancos e corretoras, tais negócios seriam inviáveis. “As instituições financeiras têm corresponsabilidade, sim”, admitiu
Alexandre Tombini, presidente do BC, em recente audiência na Câmara. “Essa questão de não terem nada a ver com
isso é coisa do passado”, completou Antonio Rodrigues, do Conselho de
Atividades Financeiras, o Coaf.
Quando
flagrados na cegueira deliberada, bancos e corretoras costumam recorrer à “moral de fronteira”, pressupondo o
crime como inevitável e até tolerável. Esgrimiram com
esse argumento no caso do mensalão e acenam com a repetição no caso da
corrupção na Petrobras. Perderam no Supremo, que adotou a jurisprudência
americana. Arriscam-se a nova derrota, porque, na essência, esses casos se
resumem ao lucro às custas da sociedade.
Fonte: O Globo – José Casado