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quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

De Richard.Nixon@com para Temer@gov



Quem me ferrou foram os cabeludos do Washington Post, mas o veneno veio do FBI, fique longe da Polícia Federal

Caro colega,
Em 1974, quando tive que renunciar à Presidência dos Estados Unidos, o senhor estava concluindo seu doutorado e, pelo que sei, não se meteu naquele movimento destrutivo dos anos 60. 

O Roberto Campos, um brasileiro de quem gosto muito desde o tempo em que estávamos aí, me contou que há dias o senhor teve uma conversa com o chefe da Polícia Federal, sem a presença do seu ministro da Justiça. Ele não gostou e pediu que lhe escrevesse.  Saiba, doutor Temer, eu me ferrei no caso Watergate, quando uns doidos da Casa Branca resolveram grampear o escritório do Partido Democrata para apanhá-los arrecadando dinheiro para o que vocês chamam de caixa dois. Era uma mixórdia, e o resto da história é conhecido. Pegaram-me tentando obstruir o trabalho da Justiça, pois eu gravava minhas conversas no Salão Oval.

De fato, eu tentei abafar a investigação do FBI, a nossa polícia federal. Teria conseguido, se não fosse o tal “Garganta Profunda”, o misterioso informante de um repórter do “Washington Post”. Na mitologia que a imprensa cria em seu próprio benefício, ele só teria sido identificado em 2005, 11 anos depois da minha morte. Besteira. Seis dias depois do início do Caso Watergate, quando eu percebi que havia alguém orientando o repórter, suspeitei de Mark Felt, que havia sido preterido na escolha para o lugar de chefe do Federal Bureau of Investigation. Era ele. (O diretor do FBI era homem meu. Serviu para nada.)

Outro dia eu fiz ginástica com o Ben Bradlee, que era o editor do “Washington Post” à época.
Repassamos alguns episódios, e ele me contou coisas muito interessantes, mas pediu-me reserva. Para seu governo: o informante decisivo foi um dos jurados do julgamento dos doidos presos quando punham os microfones na sede do Partido Democrata. Conversar com jurado é crime. Talvez eu só possa revelar essa história quando o repórter chegar aqui. 

Doutor Temer, blinde-se. Há dez dias a Polícia Federal mandou-lhe 50 perguntas relacionadas com uma investigação de práticas corruptas no porto de Santos. Disseram-me que algumas delas são substantivas, outras são vagas, e há também uma meia dúzia simplesmente impróprias. Responda a todas, mas não trate verbalmente do assunto com ninguém. O Trump encalacrou-se porque inventou uma história de que a reunião de sua turma com os russos foi para tratar da adoção de crianças. 

A ideia de conversar com o chefe da Polícia Federal numa audiência que não estava prevista foi desastrosa. Sua assessoria diz que os senhores trataram de assuntos de segurança pública. Permita-me lembrar que o senhor tem um ministro da “Justiça e Segurança Pública”. Receber o chefe da Polícia Federal sem o ministro só serve para alimentar insinuações relacionadas com sua segurança política e mexericos de jornalistas. 

Eles me odiavam e me acertaram. Arrisco dizer-lhe que eles não lhe amam.Como diz um diplomata brasileiro que está aqui, o senhor atravessou a rua para escorregar numa casca de banana que estava na outra calçada. No limite, até para dar boa tarde ao chefe da Polícia Federal, o senhor precisa de uma testemunha.  Com meus votos para que o senhor passe por mais essa provação, este amigo do Brasil despede-se.
Richard Nixon.

Elio Gaspari, jornalista - O Globo

quarta-feira, 23 de março de 2016

De Nixon@pol para Dilma@gov

Não se meta com a Polícia Federal, eu era o homem mais poderoso do mundo, e o FBI foi decisivo na minha fritura

Senhora,
Eu perdi a Presidência dos Estados Unidos em 1974 por causa da minha paranoia, de meia dúzia de áulicos que se julgavam deuses e da raça desprezível dos repórteres, mas quero lhe dizer que quem me fritou foi a Polícia Federal. É por isso que lhe escrevo: não se meta com ela.

Sei que naquele tempo a senhora estava no esplendor da juventude. Saída da cadeia, retomava sua vida torcendo pela minha desgraça. Vi quando a senhora, já sexagenária, tietou o general Giap durante sua visita ao Vietnã, em 2008. Aquele anãozinho era festejado como o gênio da guerra contra os Estados Unidos. Hoje, nossos investimentos no Vietnã já ultrapassaram os US$ 11 bilhões, e eles querem mais.

Eu me danei no escândalo conhecido como Watergate. Uns bestalhões ligados à Casa Branca quiseram grampear o escritório do Partido Democrata em Washington. Estavam atrás do caixa dois dos meus adversários e foram apanhados.  Criou-se a lenda de que foi a imprensa que me fritou. Isso é inexato. O tal “Garganta Profunda” que deu algumas pistas a um repórter era o segundo homem do Federal Bureau of Investigation. Muito antes dessa traição, o próprio diretor do FBI chamou um jornalista do “The New York Times” e contou-lhe que a Casa Branca estava metida no caso. Eu havia mandado o general Vernon Walters, vice-diretor da CIA, travar a investigação dos federais. Piorou. A senhora deve se lembrar do Walters. Em 1964, ele estava no Brasil e ajudou a livrar o país do comunismo.

Fiz muitas bobagens. Uma delas foi demitir o equivalente ao ministro da Justiça brasileiro. Como a senhora livrou-se do seu, estou preocupado. Alarmei-me ao saber que o novo ministro insinuou a possibilidade de trocar o chefe da Polícia Federal. Depois recuou, refletindo o grau de desorientação de seu palácio. O Walters não gosta da senhora, continua conversando com brasileiros e fala bastante com um levantino de bigodes que já dirigiu a Polícia Federal. Seu nome é Romeu, creio que o sobrenome é Tuma. Ele acha que o seu ministro foi ingênuo ao dizer que punirá sumariamente os agentes que estão em equipes de onde saem vazamentos. Essa arrogância revolta qualquer corporação. Não entendi direito uma história que o Walters me contou: “Todo governo acha que a polícia vaza informações contra ele. (Eu continuo achando.) As coisas são mais complexas, imagine um caso de um agente que vazou informações que beneficiavam uma grande empreiteira? E se nesse vazamento houve dinheiro? Mais: como crucificar o intermediário se tiver sido um advogado?” 

É óbvio que deveria haver punição, mas o vazamento interessava a gente do governo. Permita-me uma impropriedade, vazamento é como decote feminino. Pode ser indecência aos olhos do marido, mas na mulher dos outros é espetáculo. A senhora gostou do gesto do Garganta Profunda.  O grampo do Watergate era um crime menor, minhas mentiras não seriam suficientes para me tirar da Presidência. O que me destruiu foi o momento em que acreditei na possibilidade de obstruir as investigações. Eu e a senhora cometemos o mesmo erro inicial, sabíamos mais do que dizíamos e acreditávamos que o palácio prevaleceria. Eu cometi o engano seguinte, fatal. Não faça como Nixon.

Espero ter sido útil e despeço-me, mas não torço pela senhora.
Atenciosamente,
Richard Nixon.
Fonte: Elio Gaspari - jornalista, O Globo