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domingo, 9 de julho de 2023

Sexo em tempos de inteligência artificial - Revista Oeste

Dagomir Marquezi

O uso de IA em atividades pornográficas levanta questões morais complexas


Foto: Shutterstock
 
Três homens entram num banheiro público. Encontram uma faxineira muito jovem fazendo seu trabalho. Os três dominam sexualmente a garota, ali mesmo. São insaciáveis. E, o mais chocante, a menina gosta daquilo. E pede mais. Quando os rapazes finalmente se dão por satisfeitos, partem do banheiro sem dizer nada. E a jovem funcionária volta a limpar os mictórios.

Qualquer menina que fosse filmada fazendo esse tipo de sexo brutal e pervertido deveria estar protegida pela lei
Mas aquela faxineira de seios fartos não conta com nenhum amparo legal. Isso porque ela não existe. 
Assim como não existem os homens que entraram naquele banheiro.

Esse é um hentai, um vídeo pornô made in Japan – país onde a obsessão dos homens por meninas com uniforme de colegial é uma marca da cultura nacional. Por ser uma animação, nada daquilo aconteceu. Ninguém abusou, ninguém foi abusada.  
Uma personagem feita de pixels não vai procurar uma delegacia. Nenhuma ONG vai se preocupar com ela. 

Essa japonesinha com seu balde e escova é apenas uma das centenas de mulheres e homens praticando sexo bizarro nos meandros da internet. Ninguém liga mais para isso. Mas um novo gênero de pornografia está dando o que falar. E o que pensar.

O jornal Washington Post publicou, na semana passada, uma matéria sobre o aumento do tráfego de imagens envolvendo sexo com crianças. 
São fotos realistas criadas em sites de criação de arte por inteligência artificial, como o Dall-e e o Midjourney

Os fóruns de pedófilos da dark web revelam uma excitação maior que a normal com essas imagens. 
Como no caso do hentai japonês, nenhuma criança foi abusada para que aquelas imagens se tornassem possíveis.

As empresas que disponibilizam aplicativos e programas de criação de imagens digitais declaram que estão fazendo todo o possível para banir a criação que envolve imagens de abuso de crianças

A esta altura, é muito ingênuo imaginar que cenas repugnantes para a maioria de nós não sejam produzidas desde sempre e exibidas para quem se interesse por elas. 
Um programa como a Stable Diffusion, segundo o Washington Post, apenas acelerou o processo: “Aumentaram a velocidade e a escala com que os pedófilos podem criar novas imagens explícitas, porque as ferramentas exigem menos sofisticação técnica do que os métodos anteriores, como sobrepor rostos de crianças em corpos de adultos usando deepfakes, e podem gerar rapidamente muitas imagens de um único comando”.Foto: Olivia Brown/Shutterstock

“Porcentagem muito, muito pequena”

As empresas que disponibilizam aplicativos e programas de criação de imagens digitais declaram que estão fazendo todo o possível para banir a criação que envolve imagens de abuso de crianças. O executivo-chefe da Stability AI (que criou o programa Stable Diffusion, aparentemente usado na produção de algumas dessas imagens) garantiu que a empresa colabora com qualquer investigação legal, além de criar um filtro para imagens explícitas. Segundo a matéria do Washington Post, é relativamente fácil driblar esse filtro, mudando o código de programação.

O executivo declarou ao jornal: “Em última análise, é responsabilidade das pessoas saber se elas são éticas, morais e legais na forma como operam essa tecnologia. As coisas ruins que as pessoas criam (…) serão uma porcentagem muito, muito pequena do uso total”. Parece uma declaração omissa, irresponsável e insensível. Mas o dirigente da Stability AI, em outras palavras, individualizou a responsabilidade por atos criminosos. Mal comparando, é a diferença entre os que defendem a ideia do chamado “racismo estrutural” e os que consideram que o preconceito é uma questão que deve ser tratada como um ato criminoso individual (ou grupal, mas não generalizado).
 
O amparo da lei
A questão é complexa até em termos legais nos Estados Unidos. Ainda segundo o Washington Post, “alguns analistas jurídicos argumentaram que o material cai numa zona legal cinzenta, porque imagens totalmente geradas por IA não retratam uma criança real sendo prejudicada”. 
Já existe uma lei (a nº 2.256) no código penal norte-americano que determina que “‘pornografia infantil’ significa qualquer representação visual, incluindo qualquer fotografia, filme, vídeo, imagem gerada por computador, feita ou produzida por meios eletrônicos, mecânicos ou outros, de conduta sexualmente explícita”.

No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente tipifica como crime “produzir, participar e agenciar a produção de pornografia infantil (art. 240); vender, expor à venda (art. 241), trocar, disponibilizar ou transmitir pornografia infantil, assim como assegurar os meios ou serviços para tanto (art. 241-A); adquirir, possuir ou armazenar, em qualquer meio, a pornografia infantil (art. 241-B); simular a participação de crianças e adolescentes em produções pornográficas, por meio de montagens (art. 241-C). Além disso, a atividade de aliciar crianças, pela internet ou qualquer outro meio, com o objetivo de praticar atos sexuais com elas, ou para fazê-las se exibirem de forma pornográfica, também é crime, com pena de reclusão de um a três anos, e multa”.  
Um projeto de lei de autoria do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) está em tramitação visando endurecer essas penas.
 
O crime do deepfake
Outra atividade ligada à inteligência artificial que está provocando reações de revolta é o chamado deepfake. 
Consiste em encaixar o rosto de uma pessoa (quase sempre o de uma mulher) no corpo de uma atriz de filme pornô em plena ação. 
O programa encaixa o rosto de uma mulher qualquer no de outra que esteja praticando sexo explícito. 
O mesmo princípio técnico que fez a falecida Elis Regina “cantar” com sua filha Maria Rita num recente comercial de automóveis.

A funcionária pública norte-americana Nina Jankowicz, que exercia um cargo numa das agências de segurança do governo Joe Biden, escreveu sobre esse drama para a revista The Atlantic. 
Ela ficou sabendo que seu rosto havia sido “encaixado” por alguém no corpo de uma estrela de filmes pornô. 
Sem conhecer o autor do vídeo, não havia muito o que fazer.

No seu artigo, Jankowicz foi honesta o suficiente para não cair no vitimismo político. 
Ela sabe que qualquer mulher famosa pode ser apanhada num deepfake. Cita filmes que usaram os rostos de Hillary Clinton e da ativista Greta Thunberg, além da cantora Taylor Swift e da atriz Emma Watson. Entre outras vítimas da falsificação estavam políticas do Partido Democrata (Kamala Harris e Nancy Pelosi) e do Partido Republicano (Nikki Haley e Elise Stefanik).

O resultado do deepfake geralmente é meio grosseiro. O tom da pele do corpo nem sempre é o mesmo do rosto, as expressões são forçadas e mudam repentinamente. 
De maneira geral, fica claro que aquilo é uma falsificação. 
Mas isso não diminui a violência moral e a covardia de quem o produz.Exemplo de uso de deepfake em rosto humano | Foto: Shutterstock

Produzir ou ser apanhado com material sexualizando crianças é crime pesado. 
Idem a produção, o tráfico e a divulgação de vídeos deepfake. 
Mas quem acha que vai reprimir esse fluxo está dizendo que pode enxugar gelo com uma flanela.

Não existe maneira de eliminar essas atividades criminosas ligadas à inteligência artificial,
provavelmente nem em países extremamente controlados, como a Coreia do Norte ou o Irã. Esse material nasce em computadores anônimos e encontra seus caminhos para chegar aos interessados. Faz parte do lado sombrio da natureza humana.
 
Freud e o pântano pornográfico
Os que acham que combatendo a inteligência artificial vão acabar com imagens de pedofilia ou deepfakes estão querendo desinventar o automóvel para evitar acidentes de trânsito. Voltar no tempo não tem lógica, não tem sentido, é um ato obscurantista e reacionário.

Os mesmos programas que criam imagens de crianças sexualizadas produzem excelentes livros infantis, histórias e fantasias visuais cheias de imaginação, ainda que artificial. Esses aplicativos estão democratizando a capacidade de produzir cultura. Apenas uma pequena minoria chafurda nesse pântano pornográfico. Mas existem questões mais amplas e sutis para reflexão.
 
 
(...)
 
 
 

segunda-feira, 17 de abril de 2023

Brasil lulista vira pária internacional - Gazeta do Povo

Rodrigo Constantino - VOZES

Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.

[comentário sincero e inevitável: já esperávamos que o estulto petista que preside o Brasil, levasse nossa Pátria a merecer o desprezo mundial; como não bastasse ser tal cidadão boquirroto, mentiroso  e ignorante - totalmente néscio em assunto de Estado, especialmente política internacional - ainda leva à tiracolo a chamada primeira-dama, já deu mancadas em suas turnês internacionais que nos inibimos em comentá-las, dado o caráter pessoal dos comportamentos insensatos; e, considerando que o corpo diplomático atual, é dos mais incapazes, estamos, diplomaticamente, na m ,,, .]

Durante o governo Bolsonaro, o Brasil se alinhou ao Ocidente, defendeu Israel, aproximou-se dos Estados Unidos e criticou moralmente a ditadura chinesa sem deixar isso prejudicar nosso comércio. Não obstante, o país era chamado de pária pela mídia, pois Macron criticava a política ambiental de olho em nossa Amazônia.

Era tudo narrativa ideológica e mascarando interesses obscuros, claro. 
O Brasil bolsonarista jamais foi um pária internacional de verdade.  
Já o Brasil lulista... em poucos meses de governo, ficamos de fora de um documento da ONU condenando os abusos da ditadura de Daniel Ortega na Nicarágua, em que mais de 50 países foram signatários. Era só o começo...
 
O presidente Lula culpa a Ucrânia pela guerra que quer solucionar numa mesa de bar. 
Vai à China e defende sair do dólar como moeda de lastro do comércio mundial, além de dar claros sinais de simpatia para com o regime comunista em meio a essa Guerra Fria renovada. [não pode ser esquecido que na Argentina ele, o apedeuta,  e o poste, que está ministro  da Fazenda, tentaram criar a moeda única na América Latina - em que o REAL brasileiro teria o mesmo valor do peso argentino e outras moedas do tipo. 
Felizmente, a ideia foi lançada no esgoto - infelizmente não foi seguida pelos seus dois inventores.] O Washington Post, jornal de esquerda, chega a questionar se Lula é mesmo aliado ocidental, alegando que parece ter uma "agenda própria". A ficha está caindo no mundo todo.
 
Os globalistas ocidentais não são flor que se cheire, mas certamente são menos nefastos do que os regimes tirânicos euro-asiáticos e do Oriente Médio.  
Lula sempre foi próximo do Irã dos aiatolás, e durante o primeiro governo foi companheiro de Ahmadinejad, aquele que pretendia "varrer Israel do mapa". Agora aceitou receber dois navios de guerra iranianos, numa clara afronta ao povo judeu.
 
Nessa disputa geopolítica pelo poder global, Lula deixa cada vez mais claro que pretende colocar o Brasil ao lado dos piores regimes
Se temos inúmeras críticas aos Estados Unidos e ao Canadá, em especial sob tais governos medíocres de esquerda, tais países ainda representam o mundo livre, contra Rússia, Irã e China. 
O Brasil lulista flerta abertamente com a turma detrás da Cortina de Ferro.

Lula vai receber hoje Serguei Lavrov, chanceler russo que faz sua primeira viagem internacional desde o começo da guerra contra a Ucrânia. Para a velha imprensa, Brasil está "sob olhar desconfiado dos principais parceiros do Ocidente". Eufemismo brabo para não dizer que nos tornamos um pária mundial. [nada que preocupe a visita; Nem o visitante vai dar importância as estultices que Lula vai  expelir - servem para criar piadas em rodadas de vodka.]

Até o esquerdista global Caio Blinder, que fez o L, ficou incomodado: "Lavrov, o chanceler da ditadura Putin, inicia hoje no Brasil (pseudoneutro na guerra da Ucrânia) viagem pela América Latina. Para dar a medida da vergonha (para a Rússia e o Brasil), as outras escalas são a santíssima trindade das ditaduras na AL: Venezuela, Nicarágua e Cuba". 
Ora bolas, mas não são os regimes apoiados desde sempre por Lula e seu PT?! Qual a surpresa do esquerdista, então?

O mesmo jornalista militante resumiu: "Lula não merece diminutivos por seu papel em política externa. Lula tem um papelão". Mas tal papelão era totalmente previsível, e só tucanos cegos ou dissimulados não perceberam isso. A ameaça bolsonarista, por outro lado, era totalmente imaginária e exagerada, mas nunca um típico tucano desses vai dar o braço a torcer. Contra Trump e Bolsonaro eles querem qualquer coisa, mesmo quem cospe no legado ocidental e bajula regimes comunistas nefastos.

O mundo vive tempos estranhos e perigosos, pois as lideranças ocidentais são fracas e frouxas, priorizando agendas absurdas como ideologia de gênero ou "ameaças climáticas".   
Os líderes tirânicos inimigos da liberdade aproveitam a avançam. 
Lula colocou o Brasil ao lado dessa gente podre. É uma vergonha, claro. Mas quando o pessoal tucano fez o L, isso era mais do que esperado. Não dá para se fazer de sonso agora...

Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 27 de agosto de 2022

Acredite na velha imprensa, se puder - Ana Paula Henkel

Revista Oeste

Numa série de sabatinas com presidenciáveis, o Jornal Nacional exibiu um “chá das cinco” entre compadres com o ex-presidiário Lula e os apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos

Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Reprodução
Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Reprodução

Há algum tempo tem sido difícil explicar o Brasil para família e amigos na América. Bem, na verdade, tem sido difícil explicar o Brasil até para brasileiros. Os acontecimentos desta última semana, então, transformaram a tarefa em algo impossível. Um ministro da mais alta corte do país, membro do tribunal que deveria salvaguardar a Constituição e aplicar as leis de forma responsável e justa decidiu — mais uma vez — rasgar mais páginas da nossa Carta Magna e ignorar por completo o ordenamento jurídico da República.

Em mais um impulso narcisista e totalmente inconstitucional, Alexandre de Moraes determinou o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra um grupo de empresários que apoia o presidente Jair Bolsonaro e que teria defendido um golpe de Estado em caso de vitória de Lula nas eleições.  
A conversa, que poderia ter acontecido numa mesa de bar, aconteceu em mensagens trocadas privadamente em um grupo de WhatsApp. Bem, o capítulo “Alexandre de Moraes” já não é nem mais um mero “capítulo” no imenso livro “Tente Explicar o Brasil” que seria impossível de ser publicado por qualquer membro da Academia Brasileira de Letras. O arrogante e destemperado ministro se tornou uma série inteira à parte.

A semana do “Tente Explicar o Brasil” também trouxe a sequência do caminho — agora livre — de um político corrupto, condenado em três tribunais com “sobra de provas” e preso. O queridinho do STF agora está, oficialmente, em campanha presidencial. Numa série de sabatinas com presidenciáveis, o Jornal Nacional, da Rede Globo, exibiu na quinta-feira um “chá das cinco” entre compadres com o ex-presidiário Luiz Inácio da Silva e os apresentadores [ou interrogadores.] William Bonner e Renata Vasconcellos. O Brasil, estupefato diante de tantas bobagens e mentiras ditas por um ladrão de dinheiro público, teve de ouvir que o “agronegócio é fascista e direitista” e que um movimento que propaga terrorismo doméstico, o MST, defendido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, “está fazendo uma coisa extraordinária: está cuidando de produzir”

Dê uma chegadinha ali às ferramentas de busca e digite “MST/invasão/animais” e veja com os seus próprios olhos a barbárie que esses terroristas promovem em fazendas e laboratórios pelo Brasil. (Aviso: CENAS FORTES!)

A cereja do bolo do happy hourde Lulinha, Billy Bonner e Rê talvez tenha passado despercebida, já que a pérola foi dita logo no começo da rodada. A conversa de bar foi aberta por Bonner, que, ao tentar questionar, cheio de dedos, sobre os escândalos de corrupção dos governos petistas e mencionar o histórico do ex-enjaulado com a Justiça brasileira, finalizou o comentário dizendo: “O senhor não deve nada à Justiça”.

“O senhor não deve nada à Justiça.”

Repitam comigo, amigos: O – senhor – não – deve – nada – à – Justiça.

É de embrulhar o estômago.

Distopia orwelliana
Mas, calma, temos de voltar a fita. Nesta semana, iniciando a série de sabatinas do Jornal Nacional, também tivemos, de maneira bem diferente, o encontro dos apresentadores do Jornal Nacional com Jair Bolsonaro. Apesar do nosso papel e dever como jornalistas de assistir ao que muitos brasileiros preferem não ver — ainda mais se tratando de Rede Globo —, a análise do que podemos chamar de inquisição do atual presidente e do bate-papo com o ex-presidiário deve ser feita como um dever cívico por cada um de nós. Faço um convite a todos, que percam alguns minutos do dia (recomendo um antiácido antes) e testemunhem diante de seus próprios olhos o que poderia ter saído, tranquilamente, das páginas de uma distopia orwelliana.
 
Entre caras, bocas, risinhos sarcásticos e verdadeiros editoriais dos apresentadores daquele que já foi considerado o programa de notícias mais relevante do país, Renata Vasconcellos usou as seguintes palavras para questionar o atual presidente sobre algo na pandemia: “(…) Medidas socioeconômicas importantíssimas, elas foram adotadas (…) para sustentar o ‘fica em casa’ no pico da pandemia — ‘fica em casa, se puder’”. Com dedinho levantado e ênfase no “se puder.”

“Fica em casa, se puder.”

Fica – em – casa – se – puder. Amigos, amigos…

No mundo da Oceania de 1984, não há mais um senso de devido processo legal, investigação, respeito ao sistema acusatório e muito menos uma presunção de inocência até que se prove a culpa

Ou eu dormi durante dois anos e só acordei agora, ou nunca ouvi esse “se puder”. Para todos os efeitos de justiça com a Renata e seu (err) jornalismo, fiz uma boa busca na internet e não encontrei nenhum registro da expressão “fica em casa, se puder”. Encontrei dezenas e dezenas de artistas, celebridades, jornalistas inclusive a D. Renata Vasconcellos! — bradando o famigerado “Fique em casa!”, “Fique em casa!”, “Fique em casa”… quase que em um transe coletivo.

Um vídeo que viralizou durante o FIQUE EM CASA, sem o SE PUDER, Dona Renata, foi mostrado no programa Profissão Repórter, da emissora em que a senhora trabalha. 

Enquanto jornalistas podiam trabalhar acompanhando a fiscalização de prefeituras que mandavam seus agentes da Gestapo fecharem comércios e multarem quem estivesse aberto, comerciantes entravam em desespero enquanto jornazistas de várias emissoras apontavam o dedo para aqueles que ousassem, por pura necessidade, trabalhar para sustentar a família. Quando as viaturas chegavam, os repórteres que alimentavam os noticiários apresentados por jornalistas que liam os TelePrompTers com caras, bocas e expressões no melhor estilo “que horror, você saiu de casa para trabalhar!” ainda tinham a desfaçatez de culpar comerciantes, lojistas, barraqueiros, vigias… Pais de família que simplesmente “não podiam” ficar em casa imploravam para não serem multados ou presos. Nos mesmos noticiários, famílias sem ter o que comer e crianças há meses sem ir à escola eram mostradas.

Para não dar o braço a torcer para o que o presidente Jair Bolsonaro no Brasil e Donald Trump, nos EUA, alertavam de que não seria prudente trancar tudo e a economia “a gente vê depois”, Renata Vasconcellos decidiu acrescentar um “se puder” em uma frase que — nem de longe — implicava algum tipo de escolha ou opção para cidadãos do Brasil e do mundo. 
Quem não se lembra de outra colega de Renata e Bonner, a apresentadora Maju Coutinho, que, depois de dizer uma das maiores mentiras da pandemia, a de que os especialistas eram unânimes em forçar o lockdown, proferiu naturalmente, mostrando uma insensibilidade inacreditável diante de tanto sofrimento, o famoso o clichêo choro é livre”
Enquanto os mais necessitados, os mais pobres e vulneráveis iam sendo afetados de maneira cruel a cada dia de trancamento forçado, com direito a truculência policial encampada por governadores tiranos, Dona Maju, Dona Renata e toda uma turba de jacobinos globais continuavam trabalhando de estúdios com ar refrigerado ou em home offices enquanto postavam em suas redes sociais “Fique em casa”. Muitos ainda acrescentaram ao mantra “a economia a gente vê depois”.

As imagens de pânico, lágrimas e desespero por não poder trabalhar e trazer comida para casa estão espalhadas por toda a internet. Postei em meu Instagram, logo após o “se puder” global, um vídeo curto, de quatro minutos apenas, com algumas cenas para refrescar a memória da Dona Renata Vasconcellos. 
Gôndolas de supermercados foram bloqueadas, o Estado policialesco decidiu por todos muitos o que eram “itens necessários” que podiam ser comprados. A prefeitura de São Paulo soldou portas de lojas para impedir sua abertura. Trabalhadores ambulantes com carrocinhas de pipoca ou barraquinhas de frutas tiveram seus carrinhos virados por policiais, espalhando tudo no chão. Enquanto ônibus, metrôs e trens permaneciam lotados nas grandes cidades, uma mulher foi espancada e outra algemada nas praias desertas do Rio de Janeiro. Em Araraquara, interior de São Paulo, outra mulher que corria em um parque também deserto da cidade foi abordada pela polícia, recebeu voz de prisão, foi imobilizada por quatro homens e algemada. 
Um deles repetia com calma enquanto ela gritava que não conseguia respirar porque alguém estava lhe aplicando um “mata-leão”: “Não resista. Fique calma e não resista”. SE PUDER, claro.

Nesta semana, nos Estados Unidos, Anthony Fauci, o nome da pandemia na América, o deus da velha imprensa ianque, anunciou sua aposentadoria da vida pública após sua liderança na pandemia permanecer sob forte escrutínio e cheia de controvérsias. Quando o vírus chinês atingiu os Estados Unidos, Dr. Fauci rapidamente se tornou um nome familiar e seu rosto estava em todos os canais de TV 24 horas por dia, sete dias na semana. 
Suas recomendações foram tratadas como evangelho por muitos. Mas, à medida que os efeitos de longo prazo de políticas como máscaras, vacinação experimental compulsória e os efeitos do lockdown vinham à tona, os críticos e a população em geral se encheram de perguntas, e o santo Fauci não gostou de ser questionado. Coisa de ministro de corte suprema tupiniquim.

Na terça-feira dia 23, Fauci foi entrevistado por Neil Cavuto na Fox News, e o âncora da emissora fez perguntas incômodas àquele que é acusado pelos republicanos de ter colaborado com a disseminação do vírus chinês por financiar pesquisas de ganhos de função no laboratório de Wuhan. Na China. Cavuto perguntou: “Olhando para trás em algumas dessas decisões, incluindo a gravidade da própria epidemia, mas fechando praticamente toda a economia norte-americana, você se arrepende particularmente desse passo?”. Fauci, assim como Renata Vasconcellos e William Bonner, diz, como quem está numa realidade paralela — ou alguém que simplesmente quer reescrever a história — que “é preciso deixar bem claro para os telespectadores, para que eles entendam que eu (Fauci) não fechei nada e que não acredito que os lockdowns causaram danos irreparáveis a qualquer pessoa. Se voltarmos, basta ver que queríamos apenas achatar a curva naqueles 15 dias.”

Cavuto, um experiente e intelectualmente honesto jornalista, interrompe aquele que causou graves danos a futuras gerações e dispara: “Mas o senhor não acha que tudo foi longe demais? Quaisquer que tenham sido suas intenções iniciais, o senhor não acredita que tudo passou dos limites, especialmente para as crianças, que não puderam ir para as escolas, e que isso poderá trazer um dano permanente?”. O que o personagem favorito de veículos como o The New York Time e Washington Post disse? “Não acho que haverá dano permanente. Não acredito que prejudicamos alguém, e acho que, se você voltar e puxar coisas sobre mim, eu também fui uma das pessoas que disseram que tínhamos de fazer tudo o que podíamos para trazer as crianças de volta à escola. Sempre disse que era muito importante protegermos as crianças dos efeitos colaterais de mantê-las fora da escola.”

Lendo tudo isso, seu sangue ferve como o meu? O que essa gente, William, Renata, Fauci, pensa que somos? Idiotas? Burros? Que temos amnésia?

Há mais de um ano, em agosto de 2021, escrevi aqui em Oeste um artigo com o título “Ciência, ciência, silêncio”. Naquele momento, a pandemia havia sido controlada nos Estados Unidos, país que já havia vacinado mais de 165 milhões de pessoas. 
Alguns Estados com administrações republicanas, como a Flórida, por exemplo, nem sequer fecharam completamente suas escolas — mesmo em 2020 —, e os números de contágio e mortes não foram superiores aos de Estados que trancaram tudo por mais de um ano, como a Califórnia. Ali, já deveríamos estar voltando à vida normal, o próprio Fauci prometeu que seria um pouco de lockdown, achatar a curva, máscaras por um tempo e estaríamos de volta. Havia, desde outubro de 2020, um manifesto elaborado por especialistas de Harvard, Oxford e Stanford — a Declaração de Barrington — que já revelava que lockdowns totais seriam nefastos não apenas para a economia, mas para as pessoas, sua saúde física e mental; e que o correto seria segregar os mais velhos, doentes e com comorbidades. 
Mesmo com mais da metade da população vacinada, no Brasil e nos EUA, eles continuaram exigindo mais máscaras, mais trancamentos, mais ensino remoto, mais estabelecimentos, escolas, parques, bares… fechados.

“Fique em casa, seu fascista!”
Um estudo recente do Brookings Institute mostrou que as diferenças nas pontuações dos testes entre os alunos das escolas primárias de baixa e alta pobreza cresceram 20% em matemática e 15% em leitura durante as paralisações da pandemia. Muitas crianças no Brasil foram trancadas em casa com seus abusadores, sem alimentação nem ensino básico. Desde os lockdowns, o CDC documentou um aumento de 51% nas tentativas de suicídio entre adolescentes. De acordo com a UCLA, a taxa de mortes por overdose de adolescentes quase dobrou. Há outras dezenas de pesquisas do mesmo gênero espalhadas pelo mundo. Toda a tirania do “Fique em casa, seu fascista!” está amplamente documentada para que figuras como o trio Bonner, Vasconcellos e Fauci jamais tenha a possibilidade de tentar editar o que fizeram, o que falaram, o que apoiaram e o monstro que alimentaram que devorou os mais vulneráveis. As cidades pareciam cidades fantasmas. Jamais esquecerei a entrevista que o prefeito de Aparecida concedeu ao programa Os Pingos nos Is. Com lágrimas nos olhos, Luiz Carlos Siqueira pedia doações de alimentos, agradecia a ajuda do governo federal e relatava que não conseguia retorno da gestão do governador de São Paulo e que a população estava faminta, sem dinheiro, sem trabalho e sem esperanças com o lockdown imposto pelo governador João Doria.

Distorções e mentiras são estratégias protagonistas no famoso 1984, romance de George Orwell. As palavras de Orwell, publicadas em 1949, aumentaram em popularidade nos últimos anos não apenas porque as sociedades modernas estão se tornando cada vez mais parecidas com o que foi descrito na obra fictícia do autor, seja na vigilância em massa seja na guerra cultural perpétua. O romance de Orwell é presciente de várias maneiras, e o livro costura os sintomas da atual sociedade com um tipo de totalitarismo — pregado de forma sistemática por Alexandre de Moraes. Chega a ser assustador ler sobre o Ministério da Verdade da distopia de Orwell, escrita há mais de 70 anos, como se ela profetizasse os atuais tempos. No mundo da Oceania de 1984, não há mais um senso de devido processo legal, investigação, respeito ao sistema acusatório e muito menos uma presunção de inocência até que se prove a culpa. Em vez disso, a ideologia arregimentada — a supremacia do poder do Estado para controlar todos os aspectos da vida de alguém para impor uma ideia fossilizada de qualidade obrigatória — distorce tudo, desde o uso da linguagem até a vida privada.

É também do mundo irreal criado por Orwell que personagens da vida real tiram as distorções e as falácias de quem errou feio e agora tenta editar a história. No livro, mais atual do que nunca, a passagem seguinte chega a ser assustadoramente similar com a atualidade: “Todos os registros foram destruídos ou falsificados, todos os livros reescritos, todos os quadros foram repintados, todas as estátuas e prédios de rua foram renomeados, todas as datas foram alteradas. E o processo continua dia a dia e minuto a minuto. A história parou. Nada existe a não ser um presente sem fim no qual o Partido tem sempre razão. Quem controla o passado controla o futuro; quem controla o presente controla o passado”.

A diferença entre a Oceania, o Brasil ou os Estados Unidos é que agora temos uma coisinha incômoda que Orwell não imaginou. A internet. Para aqueles que tentam — e tentarão, sempre —, seja em debates seja no noticiário, reescrever a história, será um pouco mais complicado realizar essas edições.

Para William Bonner: Lula não está limpo e não está em dia com a justiça. Ele não passa de um descondenado por manobras ativistas, mas jamais foi inocentado. Para Renata Vasconcellos: nunca houve “SE PUDER”, Renata. Nunca. E vocês não reescreverão a história.

Leia também “Temporada de caça às bruxas”

 

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste

 

sábado, 11 de junho de 2022

Ameaça suprema - Rodrigo Constantino

Revista Oeste

Daniel Silveira foi tratado como se tivesse cometido de fato um terrível crime — deixando de lado que quem faz isso acaba sendo solto pelo STF, como uma liderança do PCC pode atestar

Da esquerda para a direita, Erika Kokay, Lula, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Jair Bolsonaro e Daniel Silveira | Foto: Montagem Revista Oeste/Agência Brasil/STF/SCO/Wikimedia Commons
Da esquerda para a direita, Erika Kokay, Lula, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Jair Bolsonaro e Daniel Silveira | Foto: Montagem Revista Oeste/Agência Brasil/STF/SCO/Wikimedia Commons

Um homem da Califórnia carregando pelo menos uma arma foi preso nesta semana perto da casa particular do juiz da Suprema Corte norte-americana Brett Kavanaugh, em Maryland, e levado sob custódia pela polícia. O homem havia dito aos policiais que estava lá para matar o juiz, relatou o Washington Post.

O homem foi descrito como tendo cerca de 20 anos e carregava pelo menos uma arma, relata o Post. A polícia teria sido informada de que essa pessoa poderia representar uma ameaça a um juiz da Suprema Corte antes de fazer a prisão. O suspeito foi levado sob custódia em uma rua próxima à casa de Kavanaugh, no Condado de Montgomery.

De acordo com o Post, o homem queria matar Kavanaugh porque estava chateado com o rascunho vazado de uma opinião majoritária que derrubaria a decisão Roe v. Wade, que criou um direito constitucional ao aborto no país, usurpando direitos estaduais. O homem também estava irritado com os recentes tiroteios em massa, informou o Post.

Isso é o que parece com uma ameaça concreta à Corte Suprema! 
 Mas como o juiz foi indicado por Trump, e como o potencial assassino aponta como motivo a mudança na questão do aborto, a imprensa não dará o devido destaque, já que não se encaixa em suas narrativas “progressistas”. Foi assim quando um apoiador de Bernie Sanders abriu fogo contra congressistas republicanos, quase matando um. A história pouco repercute e logo é abandonada.
 
Agora vamos comparar essa real ameaça, quase levada a cabo, com o caso Daniel Silveira no Brasil. 
O deputado bolsonarista, com imunidade parlamentar, exaltou-se num vídeo e chegou a falar de seu desejo de ver alguns ministros levando uns sopapos. O deputado se arrependeu depois, e ponto. Mas não para o STF. Para o ministro Alexandre de Moraes, isso foi visto como uma grave ameaça que justifica até “flagrante perpétuo”, ao usar o vídeo como se fosse um ato contínuo e infinito.

Moraes criou leis novas de sua cabeça, rasgou a Constituição, aplicou punições extremamente severas ao deputado, confiscou seu dinheiro, o da sua mulher, e Daniel foi tratado como se tivesse cometido de fato um terrível crime deixando de lado que quem faz isso acaba muitas vezes sendo solto pelo STF, como uma liderança do PCC pode atestar.

Nossa velha imprensa, infelizmente, entrou nesse jogo de absurdos ao tratar críticas ao STF, ainda que inflamadas, como ameaças reais. Essa banalização do conceito só interessa a quem quer abusar do poder e praticar o arbítrio, além de poupar aqueles que realmente representam ameaças. O MST, por exemplo, já foi até o prédio em que mora a ministra Cármen Lúcia e jogou tinta vermelha no chão. 
Isso é algo bem mais próximo de ameaça do que palavras indignadas. Mas o MST conta com a simpatia do ministro Fachin, por exemplo, e nada aconteceu com seus líderes.

O ladrão condenado por nove juízes pode ser candidato por truque supremo com base no CEP, mas o juiz que o prendeu não pode ser candidato por mudar o domicílio eleitoral

Qualquer pessoa minimamente atenta e com um pingo de imparcialidade já se deu conta, a esta altura, do ativismo político do STF. Alguns ministros nem tentam esconder seu desprezo ou seu ódio pelo atual presidente, e mobilizam uma escancarada perseguição aos seus apoiadores. Outros tentam ocultar o óbvio em meio ao palavrório jurídico, tentando dar uma aura de legitimidade ao que é, na verdade, pura militância partidária.

Mas ninguém sensato consegue negar os fatos: esses ministros operam para derrubar o presidente eleito, impedir sua reeleição, intimidar seus familiares e apoiadores próximos, tudo isso enquanto o ex-presidente corrupto que indicou vários desses ministros foi “descondenado” por malabarismos patéticos. 
Quem está confortável com esse estado de coisas está flertando com o perigo.
 
O ladrão condenado por nove juízes pode ser candidato por truque supremo com base no CEP, mas o juiz que o prendeu não pode ser candidato por mudar o domicílio eleitoral. 
O CEP salva um, condena o outro. 
Não é que o Brasil não seja para amadores, é que o Brasil é o país dos bandidos mesmo! 
E o “sistema” deixou claro que aceita qualquer um, menos Bolsonaro. Por que será?

Foi nesse contexto que o presidente Bolsonaro voltou a subir o tom nesta semana, num desabafo que também pode ser interpretado como um alerta ao povo brasileiro. “Enquanto aqui a gente está num evento voltado para a fraternidade, amor, compaixão, aqui do outro lado da Praça dos Três Poderes uma turma do STF, por 3 a 2, condena um deputado por espalhar fake news. Ele não espalhou fake news porque o que ele falou na live eu falei também, que estava tendo fraudes nas eleições de 2018″, afirmou Bolsonaro, durante evento no Palácio do Planalto.

Dizendo-se indignado com a decisão, o presidente criticou duramente os ministros Alexandre de Moraes, futuro presidente do TSE, e Edson Fachin, atual presidente do tribunal, a quem acusou de cometer um “estupro contra a democracia” ao se reunir com embaixadores de outros países para falar sobre as eleições de outubro próximo. Bolsonaro afirmou que ganha as eleições no Brasil “quem é amigo dos ministros do TSE”.

O duplo padrão realmente é escancarado. A deputada petista Erika Kokay, por exemplo, afirmou que houve fraude eleitoral em 2018, mas para beneficiar Bolsonaro
Deixando de lado o ridículo disso, vale perguntar: pode então dizer que a eleição foi fraudada ou não? 
A resposta, claro, sabemos: depende de qual lado você está! Se for um garoto-propaganda de Dilma Rousseff, por exemplo, pode até ser ministro supremo e repetir que está preocupado com hackers russos bem ao lado do colega ministro que garante a inviolabilidade das urnas!
 
É tudo tão bizarro que não dá mais para esconder a ameaça suprema, a verdadeira ameaça à democracia, que vem de militantes togados, que tratam como grave ameaça qualquer desabafo mais enfático, passando a perseguir seus autores. 
Não há ninguém carregando uma arma perto das casas particulares dos nossos ministros. 
Mas eles não se importam de rasgar a Constituição sob o pretexto de que precisam se defender dos “ataques” contra a instituição.

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Rodrigo Constantino, colunista - Revista OESTE


sábado, 4 de junho de 2022

Uma vitória contra os hipócritas - Ana Paula Henkel

Revista Oeste

Johnny Depp na entrada do Tribunal de Justiça, durante o julgamento que condenou Amber Heard | Foto: Michael Reynolds/EPA-EFE/Shutterstock
Johnny Depp na entrada do Tribunal de Justiça, durante o julgamento que condenou Amber Heard  - Foto: Michael Reynolds/EPA-EFE/Shutterstock
 
Vários anos atrás, a atriz norte-americana Amber Heard escreveu sobre uma experiência angustiante em que, sem citar nomes, relatava ter sido abusada pelo ex-marido e ator Johnny Depp. Ela alegou graves abusos físicos e emocionais durante todo o casamento, incluindo alegações de que ele havia chutado e espancado seu rosto. Quando eles se divorciaram, após menos de dois anos de casamento, ela se tornou uma voz importante no movimento feminista Me Too, quando as mulheres das indústrias do entretenimento, música e mídia resolveram denunciar tratamentos abusivos, quase sempre de natureza sexual, que sofreram de homens poderosos. Amber protocolou um pedido de medida protetiva contra ele, e, em decorrência disso, Depp foi prontamente excluído de todas as produções das quais participava, assim como teve todos os contratos cancelados de produções pré-agendadas para o futuro. Seu milionário contrato em Piratas do Caribe foi cancelado, e o ator foi excluído da sociedade, da mídia e de eventos da indústria do entretenimento. A imprensa não poupou esforços para seguir alimentando a demonização de Depp acerca da suposta violência doméstica que havia cometido.

Nesta semana, a história de Amber contra Depp desmoronou e expôs, mais uma vez, a perigosa espinha dorsal do movimento. Ainda em 2018, Johnny Depp processou Heard, dizendo que ela o difamou ao acusá-lo de abuso doméstico e, com as falsas alegações, fez com que ele perdesse contratos importantes e, principalmente, seu nome. No julgamento, iniciado há seis semanas, ele precisou provar não apenas que nunca agrediu Heard, mas que o artigo que a atriz escreveu para o Washington Post o difamava. Também teve de comprovar que Heard escreveu o artigo com malícia real, e, para reivindicar danos, Depp afirmou que o texto causou severos prejuízos à sua reputação.

A batalha judicial acalorada e televisionada entre Johnny Depp e Amber Heard finalmente acabou na última quarta-feira, e um júri de sete membros no veredito afirmou que Heard o difamou e que prevaleceu a vitória do ator nas três reivindicações do processo. A atriz terá de pagar ao ex-marido a quantia de US$ 10 milhões em danos compensatórios, além de danos punitivos de US$ 5 milhões. O caso, no entanto, vai além do que mais um mero show hollywoodiano comentado enfaticamente pelos fãs de ambos. O episódio mostra as vísceras do vil movimento atual feminista, que não está interessado em pautas pertinentes e justas para as mulheres, mas no ganho político e financeiro à custa das reais vítimas de abusos e da demonização de todos os homens.

Como pessoas de diferentes esferas, experiências diversas e pontos de vista variados convivem pacificamente dentro de uma sociedade civil?  
Qual é o principal ingrediente necessário para a democracia prosperar? 
É claro que nada se resume a um ponto apenas, mas acredito que podemos resumir em uma palavra: confiança. Uma sociedade civil saudável é construída sobre relacionamentos, amizades e associações que promovem a confiança no próximo. A liberdade e uma comunidade forte florescem em uma cultura de confiança, e, infelizmente, estamos perdendo isso há algum tempo. Vemos esse cenário não apenas na paisagem norte-americana em vários graus, mas no mundo de forma geral.

O politicamente correto, instaurado no Ocidente pelos globalistas fãs de Marx, prega que os pobres não devem confiar nos ricos, os negros nos brancos, os filhos nos pais. Na vida real, atualmente os eleitores não confiam nos políticos e os cidadãos não confiam na mídia. Sentimos tanta desconfiança que ficamos insensíveis a ela. Por muitas vezes, alimentamos esse sentimento sem pensar. Afinal, não achamos que a desconfiança gerada “lá fora” na política e nas mídias sociais pode afetar nossa vida diária. Mas afeta e está se expandindo. Como uma doença, essa desconfiança está infectando nosso relacionamento mais fundamental, o alicerce de uma sociedade civil livre — o relacionamento entre homens e mulheres.

Guerra dos sexos
 
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Em tempos de totalitarismo social e político, o sexo era severamente regulamentado e relacionamentos amorosos entre homens e mulheres proibidos

Tudo o que envolve a dinâmica sexual saudável é essencial para o relacionamento entre homens e mulheres. Para que a confiança floresça, essa realidade não pode ser negada e deve ser tratada com respeito, cuidado e honestidade, e não simplesmente apagados da vida moderna. Não pode haver abuso nessa relação, e uma parte da polaridade — seja masculina seja feminina — não pode ser rotulada como tóxica, brutal ou maligna, inclusive como foi feito no passado por certas religiões totalitárias em relação à sexualidade feminina. Uma vez que esse rótulo é colado, a desconfiança é gerada em detrimento de todos. Se as mulheres acreditam que todos os homens são perigosos, não pode haver confiança entre os sexos. Os homens não vão se tornar eunucos, mudar e se tornar como as mulheres, abandonando sua masculinidade natural. Essa é a identidade e a natureza dos homens, e ela não pode ser expurgada sem destruir quem eles são como indivíduos livres, como homens e protetores.

A destruição da liberdade
O movimento feminista Me Too concedeu uma exceção perigosíssima ao princípio justo de qualquer devido processo legal de inocência até que provem o contrário. O problema, não apreciado pela gritaria das atuais feministas, é que, se todos os homens são vis, tóxicos e abusadores, ninguém é. Se toda masculinidade é apenas o compartimento de um estuprador em potencial, os reais abusadores conseguem se dissipar na multidão e seus crimes passam a não ter o peso que merecem. Quando nossos relacionamentos mais íntimos e fundamentais são governados pelo medo e pela desconfiança, a liberdade que constrói relações sólidas e saudáveis entra em colapso. Quando você não confia mais em outras pessoas e elas precisam ser monitoradas, controladas e incansavelmente investigadas ou observadas, como o atual feminismo prega com todos os homens, a própria liberdade é destruída. É por isso que o totalitarismo prospera na desconfiança.

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Leia também “Luz em tempos de escuridão”

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste- MATÉRIA COMPLETA


segunda-feira, 22 de novembro de 2021

Tecnocracia autoritária - Rodrigo Constantino

Foto: Montagem Revista Oeste/STF Divulgação
Foto: Montagem Revista Oeste/STF Divulgação

Pouco depois, o ministro Dias Toffoli deu uma declaração bem estranha em evento em Portugal, afirmando que o Brasil já tem um regime de semipresidencialismo na prática, com o STF no papel de Poder Moderador, e ainda citou o exemplo da pandemia para ilustrar seu ponto. O Brasil não realizou nenhum plebiscito para mudar de regime, e, pelo que consta em nossa Constituição, somos um país presidencialista, com atribuições claras a cada Poder para criar um mecanismo de freios e contrapesos, impedindo o abuso de algum deles.

O que os dois casos parecem ter como denominador comum é uma mentalidade vigente principalmente na elite tecnocrática que trai certo desprezo pela opinião popular. Nos discursos, todos defendem a democracia, a soberania nacional, a pluralidade. Mas, na prática, muitos servidores do Estado alimentam uma crença arrogante de que são ungidos e precisam guiar as massas mais ignorantes, “empurrar a história” rumo ao “progresso”.

Isso não vem de hoje. Bismarck tinha fé semelhante nos burocratas da Prússia, e os democratas americanos tentam há décadas criar uma casta de especialistas que deveria concentrar mais poder. Woodrow Wilson e os “progressistas” basearam-se nos exemplos dos intelectuais tecnocráticos da Revolução Francesa, como Henri de Saint-Simon, ao defender que o governo poderia ser confiado a uma classe profissional de funcionários não eleitos, mas “especialistas”, os precursores dos modernos “tecnocratas”.

Sob essa ótica, o povo seria muito ignorante e emocional para ter autonomia
O crescimento do poder burocrático tem sido assustador, e se serve dessa mentalidade elitista. 
Em 2019, cerca de 450 agências federais americanas contavam com 2,7 milhões de burocratas. O Federal Register agora numera mais de 175 mil páginas de vários códigos, abrangendo 235 volumes. Seu tamanho aumentava anualmente — até 2017 e os esforços de última hora de Donald Trump na desregulamentação radical e algum enfraquecimento da burocracia.

O grande denominador comum dessa gente é o desprezo em relação às escolhas populares

Esse sentimento elitista ficou ainda mais escancarado durante o governo Trump, pois a elite “progressista” se recusou a aceitar o resultado das urnas, e desde o começo fez de tudo para derrubá-lo. Trump prometeu “drenar o pântano” em Washington, declarou guerra ao deep state, e este reagiu de maneira um tanto golpista. Inúmeras declarações de representantes dessa tecnocracia mostram como esses servidores de Estado embarcaram numa cruzada política, imbuídos da crença de que estavam lutando para impedir a destruição da própria democracia e uma suposta ameaça fascista. Para preservar as instituições, esses tecnocratas esgarçaram as próprias instituições republicanas.

O caso de maior destaque talvez seja o de James Comey. O ex-diretor do FBI involuntariamente simboliza o tema de maneira irônica em seu livro de memórias, A Higher Loyalty. Comey inadvertidamente publicou a noção hipócrita dodeep statede que violar leis e protocolos a serviço de suas supostas agendas éticas mais elevadas — neste caso, a oposição ao polêmico presidente Trump — era mais do que justificado. E, de fato, Comey deixou bem claro que não tinha lealdade às funções de seu cargo, mas, sim, ao seu messianismo de eliminar Trump da política. Com essa postura, arrastou a imagem do FBI para a lama.

Ao contrário da crença popular, o termo “deep state” nunca implicou uma cabala secreta. Muito menos agora transmite qualquer noção de filiação oficial. Em vez disso, é uma aliança natural e frouxa daqueles que se consideram guardiões permanentes do poder, da moralidade e da influência dos Estados Unidos. O Washington Post publicou um editorial em 2020 cujo título já estampava essa crença, alegando que era chegada a hora de as elites terem mais voz na escolha do presidente. O grande denominador comum dessa gente é a desconfiança ou mesmo o desprezo em relação às escolhas populares.

Robert Nisbet observou há muito tempo a irônica simbiose entre democracia e burocracia: “Por meio da democracia, a burocracia tem se expandido constantemente, resultado do número crescente de funções sociais e econômicas assumidas pelo Estado Democrático. Mas, quando a burocracia atinge um certo grau de massa e poder, ela se torna quase automaticamente resistente a qualquer vontade, incluindo a vontade eleita do povo, que não seja de sua própria autoria”.

Esses burocratas não eleitos querem não só proteger seus privilégios, mas governar os demais, mesmo que ignorando suas próprias escolhas democráticas. Ideologia de gênero, mudança climática, mulheres nas unidades de combate da linha de frente e casamento gay, entre 2008 e 2020, foram transformados de tópicos de discussão e debate legítimos em ortodoxias rígidas e politicamente corretas — muitas vezes mais por reguladores do que legisladores. O poder de legislar vem sendo usurpado do povo e delegado aos tecnocratas “iluminados”.

As metáforas são abundantes para o relacionamento entre democracia e burocracia, seja o parasita que eventualmente corrói seu hospedeiro, o monstro Frankenstein que não pode ser controlado por seu criador humano ou o computador de ficção científica que se torna rebelde e devora seu inventor. A necessidade de separar o poder entre legisladores, executivos e juízes repousava em uma visão pessimista da natureza humana: os funcionários sempre procurariam consolidar o poder e o fariam sob o pretexto de servir ao bem público ou a causas nobres.

O establishment americano usou muito a expressão “adultos na sala” para justificar a obstrução ao governo do presidente eleito, pois julgava Trump incapaz e perigoso para os “interesses nacionais”. A ameaça burocrática à cidadania clássica, segundo o historiador Victor Davis Hanson, é a ascensão de uma aristocracia virtual não eleita ou oligarquia fraudulenta que exerce o poder de uma maneira que não reflete um governo consensual. Com Trump, esse risco saltou aos olhos da maioria.

Seus opositores se autoproclamavam “a resistência”, como se fossem os guardiões da democracia fingindo que não fora a própria democracia quem colocara o magnata no poder. Os oponentes do presidente não se autodenominavam a tradicional “oposição leal” ou mesmo se viam como meros “oponentes”. Em vez disso, eles escolheram deliberadamente um termo da França ocupada na Segunda Guerra Mundial. Os combatentes do La Résistance formaram alianças “clandestinas” em toda a sociedade francesa, especialmente para organizar ataques militares às forças de ocupação nazistas e seus colaboradores de Vichy. Se a meta é tão nobre como expulsar nazistas, então vale tudo!

O establishment tem um papel importante na condução das coisas de Estado, sem dúvida. O staff carrega conhecimento importante para dar continuidade aos trabalhos durante as trocas políticas nos comandos. Mas de uma ideia razoável chegamos a um estágio preocupante, em que esse staff quer mandar em tudo, independentemente de quem o povo escolha como comandante. Isso é antidemocrático e extremamente perigoso. Hoje, é impossível ser um verdadeiro defensor da democracia e não condenar esse abuso de poder de uma tecnocracia cada vez mais autoritária.

Leia também “A volta do tribalismo”

Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste