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sábado, 10 de março de 2018

As goleadas sofridas por Lula

Já são nove juízes (atente para o número!), nove magistrados de tribunais distintos, de instâncias variadas, de escolas de pensamento diversas, a apontar para a inevitabilidade da prisão de Lula. Além de Moro, que o condenou a 12 anos e um mês de cadeia (no primeiro dos seis processos em que é réu), ele amargou o placar de três a zero na apelação em Porto Alegre e engoliu outros cinco a zero no Superior Tribunal de Justiça, na semana passada, quando foi solicitar um habeas corpus preventivo. 

Lula perde de goleada a cada recurso, sem sequer um voto favorável a seu intento de escapar das grades. E não é para menos. O petista e o time de advogados estrelados que o cerca adotaram uma tática, no mínimo, temerária. Querem ganhar no grito, procrastinar a ação, falando em “julgamento político”, evitando confrontar os fatos. Não fazem uma sustentação concreta que desabone as provas e evidências. Anseiam agora a revisão da lei, pura e simplesmente, no que configuraria um casuísmo gritante, sem precedentes. No STJ, no STF, no TRF-4 e mesmo nas barras da comarca do juiz Moro o que se viu, nas defesas orais ou através das petições de apelação, foi a soberba do acusado e dos que o representam. Às favas com a Lei. O que diz Lula, por exemplo? Dias atrás, em um vídeo gravado logo após a última derrota, saiu-se com essa: “eles vão ter que arcar com o preço de decretar a minha prisão”, ameaçou. O que leva Lula a pensar que é diferente de qualquer outro condenado e que está a merecer tratamento especial? 

O próprio PT entrou numa chicana de pressões imorais visitando, um a um, os gabinetes de vossas excelências para convencê-los, na base da camaradagem e de um poder de influência que ainda imagina deter, a dar uma colher de chá para o seu líder. É o fim do mundo a agremiação, através dos emissários, se achar na condição de forçar a mais alta Corte do País a encontrar um modo de rever a jurisprudência – já votada duas vezes e colocada em prática há menos de um ano –, que estabelece o cumprimento da pena após confirmação em segunda instância. Os petistas “cobram” urgência de um recurso que livre Lula da cadeia. E o pior é a disposição de algumas cabeças coroadas do Supremo em atender a exigência, colaborando nesse sentido. Elas tentam a todo custo fazer um ajuste sob encomenda no entendimento em vigor para acomodar as pretensões de Lula – mesmo que isso represente a desmoralização completa do colegiado. 

Pelo atalho em discussão, o cumprimento da sentença ocorreria só após a terceira instância, retardando em várias etapas a aplicação da justiça. Será deveras escandaloso qualquer jeitinho que se dê no momento ou interpretação contrária ao acertado anteriormente. Não dá para imaginar logo o Supremo “se apequenando”, como bem definiu a presidente Cármen Lúcia. Mas essa possibilidade, que ainda paira no ar, é hoje lamentavelmente o maior fator de insegurança jurídica do País. As convicções precárias de certas excelências resvalam na politicagem e cedem aos encantos dos poderosos que os colocaram naquele lugar. Não deveria ser assim. Ao zelar pela Constituição, como guardiões da ordem e do sentimento de que a Lei vale para todos, nenhum dos magistrados poderia se arriscar a provocar tamanha instabilidade institucional pedindo vistas de uma regra já aprovada – mesmo tendo ele sido voto vencido na sessão anterior. Qualquer brecha aberta nesse sentido será vergonhosa, e deixará a Nação às portas da anarquia por não acreditar mais na Justiça. 

O correto seria o STF deixar o devido processo legal seguir os trâmites dentro das regras em vigor, sem interferência oportunista. Qualquer ameaça de uma eventual volta atrás na atual conjuntura configurará um golpe fatal na Lava Jato e na batalha que vem sendo travada contra a corrupção. Sem o mecanismo da prisão em segunda instância, as chances de denunciados desistirem da colaboração e de acordos de delação, devido à possibilidade de postergar suas acusações até a prescrição, são enormes. É inevitável verificar um certo desespero dentre os petistas e esperar que eles saiam para o tudo ou nada. O Partido está em frangalhos. Sem opções, repleto de processos por desvios bilionários, com uma debandada de quadros históricos, e vive agora uma cizânia interna. Intelectuais correm atrás de alianças, desobedecendo à orientação central. Setores descontentes buscam um “plano B”, sem sucesso. Reina a indefinição. Mas nem por isso magistrados podem ser indulgentes com malfeitos e cederem a apelações dessa turma por mero sentimento de dívida de gratidão. Seria um retrocesso e tanto no conceito de que a Lei é cega e imparcial.

Carlos José Marques é diretor editorial da Editora Três