Já são nove juízes (atente para o número!), nove magistrados de
tribunais distintos, de instâncias variadas, de escolas de pensamento
diversas, a apontar para a inevitabilidade da prisão de Lula. Além de
Moro, que o condenou a 12 anos e um mês de cadeia (no primeiro dos seis
processos em que é réu), ele amargou o placar de três a zero na apelação
em Porto Alegre e engoliu outros cinco a zero no Superior Tribunal de
Justiça, na semana passada, quando foi solicitar um habeas corpus
preventivo.
Lula perde de goleada a cada recurso, sem sequer um voto
favorável a seu intento de escapar das grades. E não é para menos. O
petista e o time de advogados estrelados que o cerca adotaram uma
tática, no mínimo, temerária. Querem ganhar no grito, procrastinar a
ação, falando em “julgamento político”, evitando confrontar os fatos.
Não fazem uma sustentação concreta que desabone as provas e evidências.
Anseiam agora a revisão da lei, pura e simplesmente, no que configuraria
um casuísmo gritante, sem precedentes. No STJ, no STF, no TRF-4 e mesmo
nas barras da comarca do juiz Moro o que se viu, nas defesas orais ou
através das petições de apelação, foi a soberba do acusado e dos que o
representam. Às favas com a Lei. O que diz Lula, por exemplo? Dias
atrás, em um vídeo gravado logo após a última derrota, saiu-se com essa:
“eles vão ter que arcar com o preço de decretar a minha prisão”,
ameaçou. O que leva Lula a pensar que é diferente de qualquer outro
condenado e que está a merecer tratamento especial?
O próprio PT entrou
numa chicana de pressões imorais visitando, um a um, os gabinetes de
vossas excelências para convencê-los, na base da camaradagem e de um
poder de influência que ainda imagina deter, a dar uma colher de chá
para o seu líder. É o fim do mundo a agremiação, através dos emissários,
se achar na condição de forçar a mais alta Corte do País a encontrar um
modo de rever a jurisprudência – já votada duas vezes e colocada em
prática há menos de um ano –, que estabelece o cumprimento da pena após
confirmação em segunda instância. Os petistas “cobram” urgência de um
recurso que livre Lula da cadeia. E o pior é a disposição de algumas
cabeças coroadas do Supremo em atender a exigência, colaborando nesse
sentido. Elas tentam a todo custo fazer um ajuste sob encomenda no
entendimento em vigor para acomodar as pretensões de Lula – mesmo que
isso represente a desmoralização completa do colegiado.
Pelo atalho em
discussão, o cumprimento da sentença ocorreria só após a terceira
instância, retardando em várias etapas a aplicação da justiça. Será
deveras escandaloso qualquer jeitinho que se dê no momento ou
interpretação contrária ao acertado anteriormente. Não dá para imaginar
logo o Supremo “se apequenando”, como bem definiu a presidente Cármen
Lúcia. Mas essa possibilidade, que ainda paira no ar, é hoje
lamentavelmente o maior fator de insegurança jurídica do País. As
convicções precárias de certas excelências resvalam na politicagem e
cedem aos encantos dos poderosos que os colocaram naquele lugar. Não
deveria ser assim. Ao zelar pela Constituição, como guardiões da ordem e
do sentimento de que a Lei vale para todos, nenhum dos magistrados
poderia se arriscar a provocar tamanha instabilidade institucional
pedindo vistas de uma regra já aprovada – mesmo tendo ele sido voto
vencido na sessão anterior. Qualquer brecha aberta nesse sentido será
vergonhosa, e deixará a Nação às portas da anarquia por não acreditar
mais na Justiça.
O correto seria o STF deixar o devido processo legal
seguir os trâmites dentro das regras em vigor, sem interferência
oportunista. Qualquer ameaça de uma eventual volta atrás na atual
conjuntura configurará um golpe fatal na Lava Jato e na batalha que vem
sendo travada contra a corrupção. Sem o mecanismo da prisão em segunda
instância, as chances de denunciados desistirem da colaboração e de
acordos de delação, devido à possibilidade de postergar suas acusações
até a prescrição, são enormes. É inevitável verificar um certo desespero
dentre os petistas e esperar que eles saiam para o tudo ou nada. O
Partido está em frangalhos. Sem opções, repleto de processos por desvios
bilionários, com uma debandada de quadros históricos, e vive agora uma
cizânia interna. Intelectuais correm atrás de alianças, desobedecendo à
orientação central. Setores descontentes buscam um “plano B”, sem
sucesso. Reina a indefinição. Mas nem por isso magistrados podem ser
indulgentes com malfeitos e cederem a apelações dessa turma por mero
sentimento de dívida de gratidão. Seria um retrocesso e tanto no
conceito de que a Lei é cega e imparcial.
Carlos José Marques é diretor editorial da Editora Três
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