Rodrigo Constantino
Todo o comportamento supremo exala partidarismo, arrogância, autoritarismo e desprezo pela democracia, uma vez que o presidente que seus ministros tentam derrubar foi eleito com quase 60 milhões de votos
A postura de nossa Corte Suprema se tornou totalmente partidária e enviesada, e não faltam exemplos para ilustrar o que todos já sabem. Temos ministros do STF que consideram o presidente Bolsonaro a incorporação do “mal”, do atraso, e que por isso tentam “empurrar a história” para certa direção, almejando derrubar o atual presidente. Há também ministros que perseguem bolsonaristas sem a menor cerimônia, ao arrepio das leis e da Constituição, inventando crimes novos de opinião e punindo até deputado com imunidade parlamentar.
A ala militante da imprensa, porém, fala em “atrito” entre os Poderes, e ainda dá um jeito de responsabilizar o presidente pela situação. O truque é semântico: chamar críticas ao STF de “ataques”, colocar a pecha de antidemocrático no presidente, e assim justificar cada ato irregular que vem do Supremo. A narrativa do momento é o suposto golpe bolsonarista, isso porque o presidente, ao lado de milhões de brasileiros, desconfia do processo eleitoral opaco que temos e clama por maior transparência. Isso seria inaceitável para quem confia cegamente em Barroso e garante que nossa urna é inviolável, a despeito de o sistema ter sido violado.
A relatoria caiu com Dias Toffoli, o ex-advogado do PT e criador do inquérito das fake news, que apontou no “dedaço” a relatoria para Moraes. Toffoli rejeitou a ação em tempo recorde, de bate-pronto, mandando arquivá-la, para a surpresa de ninguém. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, falou depois em “anormalidade institucional”, referindo-se à ação de Bolsonaro. Só não apontou quais seriam as tais anormalidades
A mídia trata as Forças Armadas como uma espécie de apêndice bolsonarista, como se os militares fossem capachos do presidente
O caso das urnas é igualmente chocante: numa canetada suprema, eis que um simples (e obsoleto) aparato tecnológico virou algo sacrossanto, uma cláusula pétrea da Constituição, blindada de qualquer crítica popular. Externar qualquer desconfiança com o processo eleitoral centralizado no TSE virou crime, pela ótica distorcida dos ministros. Mas, como escreve a procuradora Thaméa Danelon em sua coluna na Gazeta do Povo, “cada indivíduo é livre para acreditar ou não em determinados equipamentos eletrônicos; e também o é para ter sua opinião sobre qual mecanismo de apuração de votos é o mais adequado”. Ela lança uma pergunta retórica e provocadora: “Afinal, penso que vivemos em uma democracia, certo?”
Voltemos à cronologia dos fatos, pois isso é revelador: o próprio TSE convidou os militares para um tal Comitê de Transparência, sem muita transparência. [Transparência em que o sigilo é a regra - como bem diz Guilherme Fiuza em sua coluna na Gazeta do Povo:" 1) Criar uma Comissão de Transparência e colocar em sigilo todos os dados dessa comissão. Como todos sabem, a alma da transparência é o sigilo." ]
As Forças Armadas, com os melhores técnicos de informática do setor público, até porque precisam lidar com guerra cibernética e garantir a defesa da soberania nacional, apresentam várias críticas, apontam os pontos fracos e oferecem sugestões. Isso tudo é tratado pelo TSE como mera “opinião”, e cada uma das sugestões é rejeitada.
É tudo tão bizarro, tão surreal que é preciso ser muito alienado ou cínico para simular normalidade no processo eleitoral deste ano. A ficha já caiu para milhões de brasileiros: o “sistema” quer se livrar de Bolsonaro custe o que custar, e não por eventuais defeitos seus, mas, sim, por suas virtudes. A patota do butim quer voltar a abrir torneiras que foram fechadas. A turma da pilhagem quer ministérios tratados como feudos partidários uma vez mais. Empresários safados querem a volta da corrupção comandada desde dentro do Palácio do Planalto. Artistas querem tetas estatais suculentas novamente. Ongueiros clamam desesperados pelo retorno de suas boquinhas. São muitos grupos de interesse organizados por motivos obscuros, e mascarando isso como “defesa da democracia”.
A julgar pelo grau de ousadia dos canalhas, seu desejo era logo decretar Lula o novo presidente e não precisar passar pelo esforço constrangedor do fingimento. O problema é que tem o povo, esse “ingrato”, essa cambada de “imbecis” que agora possuem voz pelas redes sociais. E há também as próprias Forças Armadas, que não parecem muito contentes com o teatro patético de quem tenta destruir nossa democracia em seu nome.
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Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste