Análise Política
Os números são os números. Luiz Inácio Lula da Silva chegou na frente no
primeiro turno da eleição presidencial e ficou perto de concluir a
fatura. Mas no Congresso Nacional manteve-se, reforçada, a maioria
esmagadora do centro para a direita. E, com exceção de quatro estados
onde o PT já é governo (no Ceará informalmente), o desempenho da
esquerda regionalmente não foi bom.
Como olhar esse paradoxo? Por que a esquerda lidera na majoritária
nacional e enfrenta dificuldades nos demais níveis?
Entre as possíveis
explicações, uma parece imediata: a vantagem numérica de Lula na corrida
federal até o momento decorre não propriamente de uma inclinação do
eleitorado à esquerda, mas de dois outros fatores:
1) a memória da
prosperidade nos governos Lula e, principalmente,
2) a rejeição pessoal a
Jair Bolsonaro.
O presidente tenta enfraquecer o primeiro ponto estimulando a recordação
das dificuldades econômicas surgidas no período Dilma Rousseff. Mas
isso vem tendo um efeito apenas relativo, pois o PT tem operado com
sucesso a separação entre os períodos Lula e Dilma.
Ela ficou com o
passivo, enquanto ele preservou o ativo eleitoral.
O flanco algo vulnerável da maioria numérica lulista é o segundo, a rejeição a Bolsonaro.
Se Bolsonaro conseguir relativizar sua rejeição no juízo do eleitor, e
elevar a de Lula, pode fazer até eleitores do petista no primeiro turno
concluírem que, apesar de não gostarem da figura do presidente, talvez
valha a pena mantê-lo, pois afinal a economia está melhorando.
É esse
vaso comunicante que pode levar alguns eleitores de Lula no primeiro
turno a mudar de lado.
É raro e difícil de conseguir, mas vamos lembrar
do que aconteceu em 2006.
Na aritmética, Lula está perto de levar a taça, mas eleição está mais
para o tênis, ou o vôlei, do que para o futebol.
Não basta esperar o
tempo passar e administrar a vantagem, você tem de fechar o jogo. O que
falta para Lula fechar o jogo?
Evitar que Bolsonaro transforme a maioria
política do centro para a direita em maioria eleitoral no segundo
turno.
Não parece tão difícil assim, mas não está tão fácil quanto
indicam os números tomados pelo valor de face.
O risco para Bolsonaro está em Ciro e Simone garantirem a Lula uma
transferência de votos suficiente para impedir que Bolsonaro transforme a
maioria política em maioria eleitoral.
O risco para Lula está em a
esmagadora maioria política de Bolsonaro nas demais regiões,
especialmente no Sudeste, acabar se transformando em uma maioria
eleitoral capaz de neutralizar a resiliente vantagem do petista no
Nordeste.
Pois no Nordeste Lula parece estar quase no teto, mais que Bolsonaro no Sudeste.
Alianças políticas costumam ser fundamentais em segundo turno, mas é
preciso um certo cuidado para não as reduzir a alianças partidárias ou
com candidatos derrotados no primeiro turno. Há muito tempo a política
deixou de ser monopólio dos partidos.
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Publicado na revista Veja de 12 de setembro de 2022, edição nº 2.806