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sábado, 14 de fevereiro de 2015

A vaca no brejo – e tossindo

A política brasileira, na Era PT, ganhou novos cenários: tribunais, camburões, carceragem da Polícia Federal, Papuda. Nenhum governista dorme hoje tranquilo 

O PT reage à hipótese de impeachment, em curso, dentro e fora do Congresso, com argumentos de pretenso fundo moral, os mesmos que desprezou quando na oposição. O partido, que teve protagonismo no impeachment de Collor, tentou reeditá-lo, sem êxito e sem fundamento -, no início do segundo mandato de FHC.

Hoje, prova do próprio veneno.


No caso Collor, não teve o monopólio da causa, bem-sucedida porque fundamentada e com apoio na sociedade. No caso de Fernando Henrique – o inacreditável “Fora, FHC!”, de 1999 -, pretendeu impugná-lo com base em acusações ideológicas. Não havia um só fato concreto – e não encontrou ressonância. Hoje, o partido, que protagoniza o maior escândalo financeiro de que se tem notícia, o Petrolão, alega que o impeachment não passa de manobra golpista. Não é: o instituto está na Constituição, que prevê seu rito e circunstância; acioná-lo, portanto, é ato legítimo, que não fere as regras do jogo.

Se não houver consistência, a parte questionada tem meios para reverter a situação e dela até sair fortalecida. Há dias, o senador Lindbergh Faria (PT-RJ) chamou a atenção, em tom perplexo, para o fato de que, tendo o governo menos de dois meses de empossado, não pode ser submetido a tal cobrança. Ora, o “Fora, FHC!” teve início aos vinte e cinco dias do mandato do presidente reeleito. Tarso Genro, cabeça coroada do partido, em artigo publicado na Folha de S. Paulo, no dia 25 de janeiro de 1999, propôs não o impeachment, mas a deposição pura e simples do presidente e novas eleições.

Reconhecia não haver tal demanda na sociedade – que, no entanto, dizia ele, precisava “superar o estupor e a letargia e desencadear um amplo processo de articulação” -, nem os meios legais, o que o impelia a conclamar o Congresso a que votasse emenda à Constituição para depor o presidente recém-reeleito. Nem ousava propor o impeachment, por sabê-lo plenamente descabido. Aquilo, sim, seria golpe.

Apenas um argumento de então, com relação a prazos, aplica-se ao que hoje ocorre. A reeleição impõe ao novo mandato a responsabilidade pelo anterior, já que se trata de continuidade. Nesse caso, Dilma não está sendo cobrada pelos dois meses atuais, mas também pelos quatro anos anteriores.  A rigor, não apenas: sendo herdeira do governo Lula, responde não por quatro, mas por 12 anos e dois meses de gestão período em que vigeu o Petrolão -, cujo teor ético faz com que seu governo ocupe hoje mais as páginas policiais que as de política.

A política brasileira, na Era PT, ganhou novos cenários: tribunais, camburões, carceragem da Polícia Federal, Papuda. O Congresso tornou-se caixa de ressonância daqueles ambientes. É o que lá acontece que hoje move as peças do tabuleiro de xadrez (sem trocadilho) da política. A nomeação de ministros passa pelo exame das chances de que não venha a ser imputado criminalmente. Nenhum governista dorme hoje tranquilo.
Enquanto o “Fora FHC” alegava, para sustentar a deposição do presidente, um suposto “estado de ingovernabilidade do país” – e o acusava de transferir “a responsabilidade constitucional de governar” para “os gestores dos organismos financeiros das grandes potências e para os especuladores internacionais” – Dilma vê-se diante de questões bem mais concretas e palpáveis.

Além do escândalo do Petrolão, que excede qualquer outro e que, segundo o jurista Ives Gandra Martins, já oferece elementos para enquadrá-la em crime de responsabilidade, ainda que sem dolo -, arca com o ônus de prática explícita de estelionato eleitoral.  A mentira dos palanques pode até não configurar ilegalidade, mas é assim percebida pela opinião pública. Basta ver os efeitos constatados por recente pesquisa do Datafolha, em que a presidente é vista como mentirosa pela maioria da população.

Mas a campanha não foi fraudada apenas por falsas promessas. O uso ilegal da máquina administrativa como no caso dos Correios em Minas Gerais, que não distribuiu o material de campanha da oposição, postado e pago, e usou gratuitamente os estafetas da empresa como garotos-propaganda do PT – é suficiente para impugnar uma eleição.

O Petrolão está apenas começando a ser exposto. Há evidências de que financiou as campanhas de 2010 e 2014. Há também sinais de que o PT mantém contas secretas no exterior. As delações premiadas não se esgotaram. Ao contrário, a fila é longa e há coerência e convergência nos relatos. O pano de fundo desse cenário é uma economia deteriorada, um ministério chinfrim e a (imensa) conta do desastre remetida ao contribuinte. 

A presidente jurou que não faria o que está fazendo, “nem que a vaca tussa”. Pois a vaca, já no brejo, não para de tossir. O impeachment pode não resolver, pode inclusive não vir mas sua discussão de modo algum é descabida, nem golpista.

Fonte: Ruy Fabiano, jornalista 

 

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

PT cobra coerência de Dilma



Em resolução política aprovada sexta-feira, 6, em Belo Horizonte, o Diretório Nacional do PT cobra coerência entre o discurso adotado durante a campanha eleitoral e a prática adotada nos primeiros dias do governo Dilma Rousseff. No texto de três páginas divulgado nesta terça-feira, 10, o PT diz apoiar o diálogo entre governo e movimentos sociais no sentido de "impedir" que o ajuste fiscal anunciado pelo governo recaia sobre direitos trabalhistas.

"(O partido decide) Propor ao governo que dê continuidade ao debate com o movimento sindical e popular, no sentido de impedir que medidas necessárias de ajuste incidam sobre direitos conquistados - tal como a presidenta Dilma assegurou na campanha e em seu mais recente pronunciamento. Nesse sentido, é necessário formalizar o processo de diálogo tripartite entre governo, partido e movimento sindical e popular, principalmente no que se refere às medidas 664 e 665", diz o documento.

As medidas provisórias 664 e 665, que fazem parte do ajuste fiscal, determinam novas regras que restringem o acesso dos trabalhadores a direitos como seguro-desemprego, abono salarial e auxílio-doença. O documento aprovado pela direção petista deixa explícito o mal-estar causado pelas medidas em diversos setores do partido, principalmente as alas sindical e parlamentar. A Central Única dos Trabalhadores, cujos principais dirigentes são ligados ao PT, e representantes das bancadas do partido no Senado e na Câmara trabalham no Congresso para alterar as medidas propostas pelo governo.

A resolução propõe que o partido recoloque na pauta do dia a criação de um imposto sobre grandes fortunas e uma ampla reforma fiscal como alternativas para reequilibrar as finanças públicas sem restringir direitos trabalhistas. A manutenção destes direitos foi uma das principais promessas de campanha de Dilma, durante um ato em Campinas, que não prejudicaria os trabalhadores "nem que a vaca tussa".

Impeachment
O PT também defende a criação de uma ampla frente popular incluindo partidos de esquerda, movimentos e entidades com objetivo de "ampliar a governabilidade para além do Parlamento". A criação de uma frente de esquerda foi tema do discurso do presidente do PT, Rui Falcão, durante a festa de aniversário de 35 anos da sigla, sexta-feira, na capital mineira.

Na resolução, o partido aponta a necessidade de unificar "propostas democráticas" de reforma política para combater "o permanente flerte com o golpismo daquelas elites que não conseguem vencer nem convencer pelas ideias". O trecho faz parte da estratégia petista de usar as ameaças de impeachment defendidas por setores da oposição como catalisador para reunificar a tropa governista, hoje desagregada devido a divergências quanto aos ajustes fiscais, a disputa pela presidência da Câmara e as denúncias de corrupção investigadas pela Operação Lava Jato.

Embora volte a defender a apuração dos desvios na Petrobras, o PT cobra que as investigações sejam "conduzidas rigorosamente dentro dos marcos legais e não se prestem a ser instrumentalizadas, de forma fraudulenta, por objetivos partidários" sem, no entanto, esclarecer quais seriam estes interesses.

O texto foi aprovado um dia depois de o tesoureiro do PT João Vaccari Neto ter sido conduzido à força pela Polícia Federal para depor sobre supostos desvios de dinheiro da estatal para doações ao partido. Vaccari nega as acusações e reclamou, durante a reunião em Belo Horizonte, da forma como foi conduzido pela PF.

Fonte: Editorial – O Estado de São Paulo