Reforma da Previdência evita o pior cenário na economia, mas governo e Congresso terão que fazer mais reformas para acelerar o PIB
A aprovação da reforma da Previdência pode evitar o pior, mas ela
sozinha não garante o cenário que está sendo vendido por alguns
integrantes do governo e os mais entusiastas do mercado financeiro.
Alguns economistas, mais realistas, calculam que mesmo com a aprovação
da reforma o teto de gastos não se sustentará nos próximos anos. Outras
medidas no campo fiscal terão que ser implementadas para aumentar a
competitividade e acelerar o crescimento do PIB. Mas antes disso será
preciso aprovar a reforma. Não será fácil.
Há uma tendência entre defensores da reforma de apresentá-la como uma
panaceia. Ela é absolutamente indispensável, mas é o primeiro passo de
uma difícil caminhada para resolver problemas crônicos do país. O
economista Pedro Schneider, especialista em política fiscal do Itaú
Unibanco, fez um cálculo a pedido da coluna. Mediu o impacto da reforma
sobre a despesa primária do governo. Hoje, a Previdência consome 58% do
Orçamento e, mesmo com a economia prevista de R$ 1,1 trilhão em 10 anos,
esse percentual subirá 17 pontos percentuais, até alcançar 75% no fim
desse período. Por causa desse forte crescimento, o teto de gastos
aprovado pelo governo Temer, e que congela as despesas em termos reais,
não ficará de pé. A Previdência continuará drenando recursos da saúde,
educação, dos investimentos e de várias outras áreas cruciais para o
país. — A reforma da Previdência não é suficiente nem para o teto de gastos,
nem para o reequilíbrio fiscal. O teto de gastos precisa de medidas além
da Previdência, já em 2020, dado que o impacto da reforma é mais de
médio prazo. As medidas principais, além da reforma, são a redefinição
da regra de reajuste do salário mínimo e o controle de reajustes do
funcionalismo público — disse Schneider.
Como não foi aprovada a reforma do governo Temer, o país perdeu tempo.
Muito provavelmente este ano será consumido pela tramitação da nova PEC.
O governo prevê que a reforma será aprovada nas duas Casas do Congresso
até junho, mas não explica como se dará uma tramitação tão célere de
uma proposta que já enfrenta bloqueios e críticas. É preciso ficar
atento ao risco sobre o qual o presidente da Câmara dos Deputados,
Rodrigo Maia, está alertando: o de perder a batalha da comunicação. Maia
alerta que não há ganho visível com a medida que muda o Benefício de
Prestação Continuada (BPC), ou a que iguala idade mínima de homem e
mulher na área rural, dado que na área urbana as idades são diferentes.
Podem ser bodes na sala. Ou serem equívocos que elevarão resistência ao
projeto.
Os técnicos do governo garantem que o projeto vai gerar uma economia de
R$ 1,1 trilhão em dez anos, mas o relator da PEC 287, de Temer, deputado
Arthur Maia (DEM-BA), duvida, argumentando que não há tanta diferença
entre o substitutivo dele, que economizaria, R$ 450 bilhões, do projeto
atual que reduziria o gasto em mais que o dobro disso. São parecidos em vários pontos, mas o atual é mais abrangente e tem
regras de transição mais curtas. Até chegar ao Congresso a proposta dos
militares, a PEC da reforma ficará em banho-maria. Se a mudança dos
militares vier com um plano de carreira que eleve salários, vai ser
outro ponto de polêmica. Até agora já se sabe que a paridade e a
integralidade serão mantidas. Isso será um problema enorme para as
finanças estaduais, por causa dos gastos com a Polícia Militar.
Muitas polêmicas começam a se formar. Algumas são criadas por grupos que
têm muitas vantagens em deixar tudo como está, outras são produzidas
pela incapacidade que o governo demonstrou até agora de ter boa
comunicação e boa articulação. Há outras críticas, como a do senador
Randolfe Rodrigues, da Rede. Com a autoridade de quem abriu mão do
direito à aposentadoria especial dos políticos, o senador critica o fato
de as regras não serem mais duras para os que têm mandato atualmente.
Só os futuros políticos serão enquadrados. Randolfe poderia requerer
aposentadoria ao fim do atual mandato, com 16 anos de senatoria. Esses
pontos vão ser usados por quem não quer a reforma de maneira alguma. E a
Previdência é só a primeira batalha da economia brasileira.
Miriam Leitão - O Globo