Se não houver uma
alteração de última hora, o programa político do
PT vai ao ar depois de amanhã, dia 6, com a presidente Dilma e o partido estreitando-se, como na poesia, num abraço insano, em horário nobre. O
país deve ouvir, então,
o maior panelaço-apitaço da história,
numa espécie de avant-première dos protestos do dia 16 de agosto. Se o governo achava que, com Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) contra as cordas, teria alguma folga, então é porque ignora a
dinâmica da realidade.
A prisão de José
Dirceu, agora pela atuação no escândalo do petrolão, faz a crise atingir
um novo patamar e, mais uma vez, a
exemplo do mensalão, bate à porta de Lula. Nem tanto porque os dois fossem
íntimos — o que, a bem da verdade, nunca
foram —, mas porque ambos sempre
ocuparam posições de mando, formais ou informais, na organização que
lhes garante o poder: o PT.
E há mais estragos à
vista. Marlus Arns, o novo advogado constituído por Renato Duque, homem do
partido na Petrobras, negocia os termos de sua delação premiada. Seus outros
defensores, por discordarem do procedimento, abandonaram a causa. Tido
habitualmente como homem de Dirceu na Petrobras, é evidente que todos reconhecem nessa
qualificação de Duque só um modo de dizer. Dirceu não dispunha um exército privado na legenda. Os “seus homens” eram os
“homens do PT”. Ainda que possa ter usado as posições de mando ou de influência para
obter benefícios pessoais, todos reconheciam nele uma personagem a serviço de
uma causa.
E essa “causa”, obviamente, tinha um chefe: Luiz Inácio Lula da Silva. Imaginar que ele passará incólume também por essa
avalanche desafia o bom senso. A fala de Roberto Podval, defensor de
Dirceu, segundo quem seu cliente é um “bode
expiatório”, pode traduzir um sentido muito específico, intencional ou não: o ex-ministro não
deixa de ser oferecido como uma espécie de elemento ritual que purga todas as
culpas do PT, inclusive as que não são suas (do próprio Dirceu) — ou, vá lá, não são exclusivamente suas. O ex-ministro não era o dono de um partido
dentro do partido. Quem acredita nisso? Li em algum lugar que o juiz Sergio
Moro estaria espantado com a abrangência do esquema criminoso. Quem conhece a forma
com se organizou o PT e os seus valores não está, de modo nenhum, espantado. Já a ousadia e o
desassombro, ancorados na certeza da
impunidade, isso, sim, chama a atenção. Os dados da investigação que vêm à
luz indicam que o processo do mensalão,
embora ocupasse o noticiário com força avassaladora, não intimidou de nenhum modo a turma. Ao contrário: parece ter lhe
excitado a imaginação para descobrir caminhos novos para a falcatrua.
É evidente que a coisa toda assume uma
perspectiva que chega a ser apavorante. A promiscuidade entre políticos,
empreiteiros, lobistas e toda sorte
de intermediários passou
por uma devassa na Petrobras e
talvez seja esmiuçada na Eletrobras,
mas cabe a pergunta óbvia: há alguma razão objetiva para que as coisas tenham
se dado de maneira diversa nas demais áreas do governo? A resposta é,
obviamente, negativa. Se as personagens eram as mesmas, se os mesmos eram os
métodos, e se também não variava a forma de ocupação dos cargos públicos, por
que haveria de ser diferente?
O PT constituiu um
estado dentro do estado. O PT criou
um governo dentro do governo. O PT governou um outro
Brasil dentro do Brasil. O PT expropriou a
população dos bens do seu país. O PT usou a democracia
para tentar solapá-la.
Nada escapou do governo
paralelo. Milton Pascowitch, por exemplo, que fez delação premiada, afirmou à
Justiça ter entregado na sede do PT, em
São Paulo, R$ 10,532 milhões de
propina em dinheiro vivo. Desse total, R$ 10 milhões seriam relativos a um contrato da
Engevix com a Petrobras para construir cascos de oito plataformas do pré-sal.
Os outros R$ 532 mil seriam parte da
propina em razão do contrato da empreiteira com o governo para as obras de Belo
Monte.
Vejam que coisa: pré-sal, Belo Monte, refinarias da Petrobras… Eram os projetos nos
quais se ancorava o discurso ufanista do
lulo-petismo, que
sempre teve, sabemos, uma gerentona,
que acabou sendo vendida ao distinto púbico como a mãe dos brasileiros, a “Dilmãe”, não é assim?
Os que imaginam que
Dilma pode ficar por aí — como Marina Silva, por exemplo — vão indagar onde está a digital da presidente ordenando esta ou aquela
falcatruas ou, ao menos,
condescendendo com elas. Se Dilma ocupasse só uma função técnica no
governo, talvez a gente pudesse se contentar com o escopo apenas penal de sua
atuação.
Mas ela é uma liderança política. Ocupa a Presidência da República e é, queira ou não, produto dessa máquina corrupta que tomou conta do estado. Eleita e reeleita, foi sua beneficiária direta, uma vez que a estrutura criminosa financiava também o processo eleitoral.
Mas ela é uma liderança política. Ocupa a Presidência da República e é, queira ou não, produto dessa máquina corrupta que tomou conta do estado. Eleita e reeleita, foi sua beneficiária direta, uma vez que a estrutura criminosa financiava também o processo eleitoral.
Se Lula não tem para
onde correr, Dilma tampouco tem
onde se refugiar. Ocorre que, no momento, o país é,
em parte, refém das prerrogativas que
detém a mandatária. Por isso mesmo, ela
tem de libertar o Brasil, ou o Brasil tem de se libertar dela.
Presidente, é preciso saber reconhecer o momento: acabou!