O Estado de S.Paulo
PGR em chamas, MP, PF, Receita e ex-Coaf são peças do quebra-cabeças lançado por Moro
A Procuradoria-Geral da República está em chamas e a força-tarefa da
Lava Jato reclama do “caráter inusitado” da ação da subprocuradora geral
Lindôra Araújo, braço direito de Augusto Aras e ligada à família
Bolsonaro, que desembarcou em Curitiba exigindo arquivos e dados
sigilosos das investigações e criando a impressão de uma devassa na Lava
Jato que pode atingir até o ex-ministro e ex-juiz Sérgio Moro. Esse,
porém, é apenas mais um fato “inusitado” num país com quase 60 mil
mortos de covid-19.
[Os livros de autoajuda costumam ensinar que quanto mais se concentra em algo, mais fácil fica obter o desejado - nos livros talvez funcione, mas na vida real vale o 'morte desejada, vida alcançada', que adaptado para a política vale dizer que quanto mais os arautos do mal apregoarem derrotas do presidente Bolsonaro e do Brasil - situação advinda de uma impossível vitória dos inimigos do Brasil, da democracia e da liberdade - mais o presidente será vencedor.
Quanto ao quebra-cabeças do ex-juiz, será devidamente montado e a única peça que ficará de fora, por política e irremediavelmente quebrada, será a correspondente ao ex-juiz.]
A audácia de Lindôra corresponde à sucessão de mentiras ridículas do
advogado Frederick Wassef, capaz de inventar até “forças ocultas” que
queriam matar Fabrício Queiroz para atingir o presidente Jair Bolsonaro.
E lembra o pedido inusual da delegada da PF Denisse Ribeiro para o
Supremo suspender as investigações sobre bolsonaristas golpistas e,
assim, evitar “risco desnecessário para a estabilidade das
instituições”. Tudo muito inusitado.
O mais grave, porém, é que a ida da procuradora a Curitiba ocorre quando
o presidente Jair Bolsonaro é investigado pelo Supremo justamente pela
acusação, feita por Moro, de intervir politicamente na Polícia Federal. E
tudo num contexto maior de controle dos órgãos de investigação do País,
não só para proteger filhos e amigos, como admite o presidente, mas
também para perseguir adversários, como suspeitam governadores,
ministros do STF, cúpula do Congresso e o próprio Moro. Ou seja, os
alvos.
Lindôra, aliás, também exigiu os arquivos da Lava Jato em São Paulo e
Rio e já tinha requisitado de todos os Estados e DF as investigações
contra governadores. Ela alega que é coordenadora da Lava Jato na PGR e
isso faz parte do trabalho, mas seus próprios pares desconfiam dessa
“justificativa técnica”, convencidos de uma ação política coordenada.
Tanto que três procuradores pediram demissão do grupo de trabalho e uma
quarta já tinha saído por divergências.
Assim como Bolsonaro é investigado por intervir na PF e Lindôra invade
investigações do MP em Curitiba, Rio e São Paulo, vale lembrar que,
depois de revelar ao mundo a existência de um tal de Queiroz, o Coaf
saiu do Ministério da Justiça, pulou de galho em galho e foi parar no
Banco Central com o nome de UIF. E Bolsonaro, segundo o Estadão em 30/4,
já pressionou a Receita Federal para perdoar dívidas milionárias de
igrejas evangélicas.
Tudo somado, tem-se que Bolsonaro e seus seguidores têm uma visão muito
particular e pouco republicana dos órgãos de investigação: PF, MP,
Receita e Coaf, agora UIF. Essas peças vão montando o quebra-cabeças
lançado por Moro a partir da demissão do competente delegado Maurício
Valeixo da PF e das sucessivas mexidas na superintendência do Rio. Foram
inusitadas, mas fazem todo o sentido.
Com Bolsonaro acuado e os militares passando a estabelecer
(finalmente...) claros limites entre governo e Forças Armadas, veio à
tona o personagem “Jairzinho Paz e Amor”, que dialoga com Judiciário e
Legislativo, baixa o tom, ameniza a expressão, para de incendiar o País a
cada manhã e de atiçar golpismos a cada domingo. Paz e amor, porém,
implicam também órgãos de Estado e de governo independentes,
apartidários, sem ações de “caráter inusitado” para salvar filhos e
amigos e massacrar “inimigos”. Paz é paz, guerra é guerra.
Saúde
Reunido na quinta-feira para definir as promoções, o Alto Comando do
Exército manteve em aberto e não indicou ninguém para a vaga de general
de Divisão de Eduardo Pazuello, que foi cuidar da logística na Saúde e
acabou ministro. Ele avisou que volta à Força em três meses. É a
previsão para o fim da pandemia?
Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo